quarta-feira, 6 de abril de 2022

Bernardo Mello Franco: Lira quer petróleo

O Globo

O reinado de Severino Cavalcanti ficou marcado por uma frase célebre. Ao assumir a presidência da Câmara, o deputado exigiu sua parte na Petrobras. Queria a diretoria que “fura poço e acha petróleo”.

Hoje as ambições de Severino seriam consideradas modestas. O herdeiro de sua cadeira, Arthur Lira, não se interessa por cargos de segundo escalão. Prefere escolher logo o presidente da estatal.

O deputado era entusiasta da indicação de Adriano Pires. Apesar do padrinho influente, o consultor caiu antes de tomar posse. O governo já virou a página, mas Lira ainda parece estar na fase da negação.

Na segunda-feira, o chefe do Centrão esbravejou contra a derrubada de Pires. Disse que ele foi vítima de “falso moralismo” e “julgamento precipitado”. “Tem que pegar um arcebispo para ser diretor da Petrobras?”, ironizou.

Ontem o deputado continuou enfezado. Reclamou da Lei das Estatais e disse que a Petrobras “causa inconveniente para todo o país”. Acrescentou que a empresa não teria “responsabilidade com o Brasil nem com ninguém”.

Lira imitou Jair Bolsonaro: ao ter seus interesses contrariados, passou a defender a privatização da Petrobras. O capitão nunca foi um adepto da ideia. No passado, chegou a defender o fuzilamento do presidente Fernando Henrique Cardoso após a venda da Telebrás.

A lei não exige que os dirigentes da Petrobras sejam arcebispos. Basta que não tenham ligações com concorrentes da estatal. Pires foi derrubado por um caso clássico de conflito de interesses. Passou as últimas décadas a serviço de competidores da empresa.

O consultor se recusou a revelar sua carteira de clientes. E ainda tentou manter os negócios abertos em nome do filho, o que é expressamente proibido pela Lei das Estatais.

Além de atender gigantes estrangeiras, Pires fez lobby para as distribuidoras de gás de Carlos Suarez. O empresário cultiva relações próximas com o Centrão. Foi apontado como o principal beneficiário dos jabutis que aliados de Lira incluíram na MP da Eletrobrás.

Severino era um amador. Caiu por cobrar um “mensalinho” de R$ 60 mil do dono do restaurante da Câmara. Lira é um profissional. Depois de comandar o orçamento secreto, que drenou R$ 16 bilhões apenas no ano passado, queria mandar na maior empresa do país.

 

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