Como estamos pensando e nos posicionando
frente a esta complexa realidade?
O conflito militar envolvendo a Ucrânia e a
Rússia é uma das pontas do iceberg que expressa as contradições do mundo em que
vivemos, onde a cultura da guerra fria ainda sobrevive através principalmente
dos EUA e dos seus aliados da OTAN, frente a uma realidade mundial multipolar
que apresenta a China, a Rússia, o Japão e a própria União Europeia como atores
relevantes do atual cenário internacional.
Desde fevereiro, o conflito militar entre a
Rússia e a Ucrânia ocupa papel de destaque no noticiário internacional. Envolve
diretamente os EUA, a OTAN, a União Europeia e, indiretamente, a China. São
disputas geopolíticas, como aconteceu e acontece hoje em diversas regiões do
planeta, inclusive durante o século XX no desencadeamento das duas guerras
mundiais e no período da guerra fria.
Hoje, por exemplo, qual seria a razão de
existir da própria OTAN? Como sabemos, ela
foi criada depois da segunda guerra mundial para impedir a expansão da ex-União
Soviética, que não mais existe desde 1991. Como estão e vão se desenvolver as
relações entre os EUA e a China e o papel da União Europeia e da Rússia neste
contexto?
São questões a serem colocadas para um melhor entendimento do atual cenário internacional e o papel dos distintos atores envolvidos.
Portanto, a guerra na Ucrânia coloca em
cheque o anacronismo das organizações multilaterais, a exemplo da ONU que ainda
funciona com a lógica dos vencedores da segunda guerra mundial, com o poder de
veto da Rússia (substituindo a URSS), EUA, China, Inglaterra e França.
Segundo a ONU, existem atualmente no mundo
30 regiões em conflito, a maioria armados. Os conflitos envolvem disputas
territoriais, diferenças étnicas, religiosas e recursos naturais, inclusive a
água. Existem zonas de tensão geopolítica, a exemplo da Coreia do Norte, do Irã
e da Palestina. Ainda movimentos separatistas que criam instabilidades
políticas e econômicas regionais, como na Irlanda do Norte, no Pais Basco e na
Catalunha (Espanha), no Quebec (Canadá) e na Colômbia, entre outros.
Em tempo real, de maneira dramática e
espetacular, o mundo acompanha a tragédia da Ucrânia. Enquanto pouco é noticiado em relação aos
conflitos regionais que acontecem na América, na África, na Ásia e na própria
Europa, há décadas.
Assim, estão em disputa os modelos de
hegemonia a nível internacional: a unipolaridade dos EUA consagrada após o
esgotamento do modelo soviético em 1991 ou a perspectiva de um mundo multipolar
– processo em andamento, um mundo onde a União Europeia, o Japão, os BRICKS,
aqui incluídos a China e a própria Rússia entre outros países, teriam uma
participação mais efetiva na ONU e nos Organismos Multilaterais, construindo uma
nova ordem mundial, mais ampla e aberta à cooperação internacional.
Sob qual perspectiva nos colocamos? O que temos a dizer como sociedade brasileira e mundial no processo de construção de uma cultura de Paz como caminho da sustentabilidade do planeta e da própria humanidade?
Os desafios atuais e o futuro
Neste contexto mundial é que devemos
avaliar as guerras e os conflitos regionais ora em curso e os impactos das
declarações e ações das principais lideranças dos EUA e da Europa, destacando ainda
a China, a Rússia e os países diretamente envolvidos nas guerras e conflitos
regionais.
A lógica da guerra, de resolver os
conflitos entre os países, manu militare, não interessa à maioria da
humanidade. Interessa aos complexos industrial e militar historicamente
construídos, consolidados nos tempos da guerra fria e que sobrevivem até à
atualidade, trazendo aos senhores da guerra lucros fantásticos no processo de
destruição e reconstrução dos territórios atingidos pelos conflitos, matando,
na maioria das vezes, as crianças, a juventude e a população civil em geral,
além de destruição da própria natureza, da arquitetura e da cultura milenar da
humanidade.
O imperativo que se coloca é a luta em
defesa e ampliação da democracia como caminho para a construção de novas
relações centradas na vida e na preservação da natureza, colocando a cultura e
a educação para a Paz como fundamentos de novas relações nacionais,
continentais e internacionais.
A pactuação desta construção, através do diálogo
e da cooperação permanentes, são desafios colocados às dificuldades que estamos
vivendo no Brasil e em toda a humanidade, ainda em pandemia. A pandemia e,
particularmente, os conflitos regionais e os impactos das mudanças climáticas
desnudam as fragilidades dos sistemas políticos, econômicos e sociais em que
vivemos, desafiando a humanidade na perspectiva de construção de novas relações
entre sí e com a própria natureza.
A sociedade desnudada pela pandemia nos
agride no Brasil e em qualquer lugar do Planeta: nas ruas e nas redes, é
visível a tragédia social de milhões de pessoas, à margem das conquistas
sociais elementares: educação, trabalho, alimentação, moradia, saúde-saneamento
básico, mobilidade e uma renda básica, assegurados na Declaração Universal e
nas Constituições Nacionais, inclusive na atual Constituição brasileira.
A tecelagem de uma alternativa democrática às
crises política, econômica, social, sanitária e ambiental em que vivemos nos
desafia a construir de maneira inadiável a unidade das forças democráticas,
dialogando com o mundo do trabalho e da cultura para a mobilização de uma
frente democrática que garanta o Estado de Direito e o exercício da Cidadania
garantindo a melhoria de vida da população brasileira e da planetária. Há
espaços, no Brasil e no mundo, para a construção de novas relações políticas,
econômicas e sociais, direcionando os investimentos hoje utilizados para a
guerra a favor da cultura, da educação e da ciência & tecnologia, no
enfrentamento dos reais problemas econômicos, sociais e ambientais da
humanidade.
As sustentabilidades política, econômica,
social e ambiental planetária estão em pauta. Estamos desafiados à construção
de sociedades democráticas no caminho de uma cultura de paz para o Brasil e para
toda a humanidade.
Portanto, a luta pela Paz é a luta pela
Sustentabilidade do Planeta, é a luta pela Vida de cada um de nós. A política,
a diplomacia e a cidadania mundial devem juntas agir no sentido de resolução
dos conflitos militares, dos refugiados ou de qualquer outro tipo. A ONU deve
ser o espaço privilegiado no caminho de resolução dos conflitos militares entre
a Rússia e a Ucrânia, de todos os outros conflitos militares ou de qualquer
natureza em curso no planeta. Cada ser humano é importante, independente da sua
nacionalidade, da sua pele, opção sexual ou religião.
Assim, como nunca, devemos trabalhar e
lutar por uma cultura de Paz. Afirmar e reafirmar os valores que nos fazem
humanidade: a cooperação, a solidariedade, a luta pela igualdade, liberdade e
fraternidade, valorizando , defendendo e consolidando a democracia como caminho
e instrumento fundamental deste processo.
Os caminhos e as alternativas estão colocadas:
as opções entre a democracia e a barbárie continuam postas. É um processo
permanente, em construção. A questão
democrática, a sustentabilidade e a cultura da paz se colocam como valores para
a sociedade contemporânea nas suas relações entre si e com a própria natureza,
no caminho de sermos uma melhor humanidade.
Estamos desafiados!
*Professor Doutor da Oficina da Cátedra da UNESCO-Sustentabilidade da UFBA e do Conselho do Instituto Politécnico da Bahia
Um artigo abrangente que nos propõe reflexões de importancia essencial.
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