domingo, 24 de abril de 2022

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Teto de gastos é esperança contra a bomba fiscal

O Globo

A ruptura do teto de gastos no Orçamento deste ano serviu para acomodar todo tipo de despesa, algumas defensáveis (como a expansão do Bolsa Família para criar o Auxílio Brasil), outras sem nenhum nexo (caso das emendas do relator, base do orçamento secreto). Não foi, porém, suficiente para conter as pressões sobre o governo no ano eleitoral. Num cálculo feito com os números previstos para este ano com base nos disponíveis até março, o economista Marcos Mendes estimou em meros R$ 3 bilhões a folga disponível em relação ao teto, estipulado em R$ 1,68 trilhão no Orçamento. Isso significa que, novamente, o equilíbrio fiscal está ameaçado.

As pressões vêm de todos os lados, na forma tanto de novas despesas quanto de isenções de impostos. No ambiente permeável aos lobbies em Brasília, leva mais quem conta com a simpatia do Planalto ou tem acesso aos demais centros de poder (leia-se Congresso e ministérios). Cada demanda pode até fazer sentido em si, e o impacto individual pode parecer pequeno diante da imensidão orçamentária. Mas a soma de tudo é implacável.

Só em auxílios não previstos no Orçamento que tramitam no Congresso ou estão à espera de sanção presidencial, a conta feita por Mendes chega a R$ 25,5 bilhões. O piso salarial a enfermeiros e agentes de saúde custará R$ 4,5 bilhões. O alívio ao setor cultural trazido pelas leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo deverá sair por R$ 7 bilhões. Além de R$ 2,5 bilhões em transferências, o setor de eventos levará isenções fiscais de R$ 2,6 bilhões. O subsídio ao transporte público, R$ 5 bilhões. Ajuda às Santas Casas e instituições beneficentes, outros R$ 2 bilhões. À agricultura familiar, mais R$ 3 bilhões. Não entraram nessa conta o aumento linear prometido ao funcionalismo, outros R$ 6 bilhões, nem os R$ 5 bilhões de auxílio-gás e vale-combustível. De bilhão em bilhão, o dinheiro escorre do caixa.

Em matéria de renúncia fiscal, o resultado é ainda mais desfavorável ao governo, pois a maioria das isenções já está em vigor. O setor cultural está longe de ser o único beneficiado. A redução de IPI para a indústria custará R$ 10 bilhões aos cofres públicos. O corte de tributos sobre combustíveis, outros R$ 15 bilhões. A desoneração da folha de pagamento de 17 setores, R$ 6 bilhões. Benefícios fiscais aos taxistas, R$ 2 bilhões. À indústria de semicondutores e equipamentos de informática, meio bilhão. O aumento do limite de faturamento para microempreendedores individuais, mais R$ 3 bilhões. Somando tudo, Mendes estima as novas renúncias fiscais em quase R$ 40 bilhões, ou 0,4% do PIB (estimam-se em R$ 367 bilhões os subsídios tributários já regulares, ou 3,8% do PIB).

Nada disso seria uma questão relevante se o país gerasse recursos para pagar tudo. Não é o caso. O impulso recente na arrecadação que tem animado Brasília a conceder toda sorte de benesse é resultado de uma conjuntura muito específica: a alta das commodities no mercado internacional com a recuperação da pandemia e a inflação no mercado interno que aumenta vários impostos. Há, diz Mendes, uma relação inequívoca entre a receita do governo federal e o preço das exportações. No período entre 2004 e 2013, quando houve uma explosão no mercado internacional de commodities, a despesa do governo cresceu ininterruptamente. Assim que a maré virou, começaram a faltar recursos para cobrir o buraco, o Brasil passou a acumular sucessivos déficits, e a dívida pública explodiu.

Há duas diferenças agora. Primeiro, a reforma da Previdência e o congelamento salarial do setor público durante a pandemia seguraram as despesas. Se fosse seguir a tendência desde 2010, o gasto total do governo com pessoal, aposentadorias, pensões, abonos e auxílios teria chegado perto de R$ 1,4 trilhão neste ano. Em vez disso, ficará em R$ 1,22 trilhão. Para o segundo semestre e o início do ano que vem, contudo, já estão praticamente contratados aumentos do funcionalismo federal que se espalharão pelos outros setores do Estado a ponto de reduzir boa parte desse ganho fiscal.

A segunda diferença é que agora o país dispõe do teto de gastos como ferramenta de contenção das despesas. É o único mecanismo com que podemos contar, ainda que enfraquecido, para evitar o pior quando vier o refluxo da onda favorável. Entre 2013 e 2016, ano de implantação do teto, os gastos subiram de pouco mais de 17% para quase 20% do PIB. Depois do pico inesperado da pandemia (quando passaram de 26%), voltaram a cair a 18,2% (excluindo os precatórios parcelados, ou 18,6% com eles). Nas palavras de Mendes: “O estrago não é maior porque o teto ainda está segurando as pontas. Se for mais afrouxado neste governo, ou ruir no próximo, as condições fiscais se deteriorarão bastante”.

O país não pode correr o risco de voltar a acumular déficits, sob pena de a dívida pública voltar a dar um salto, minando a confiança do mercado e fazendo ressurgir a incerteza que marcou o período hiperinflacionário. Para estabilizar a dívida, levando em conta que o país não consegue crescer mais de 1,5% ao ano de modo sustentável, o ajuste fiscal necessário seria da ordem de 2,5 a 3,3 pontos percentuais do PIB (entre R$ 245 bilhões e R$ 318 bilhões). Será esse o principal desafio do próximo presidente da República, quem quer que seja. É preciso preservar o teto de gastos até que a bomba fiscal seja desarmada — ou então ela explodirá.

Clube do retrocesso

Folha de S. Paulo

Le Pen integra o grupo que no Ocidente desafia o Estado democrático de Direito

O eleitor francês decide neste domingo (24) quem presidirá a república pelos próximos cinco anos, se o atual mandatário, o centrista Emmanuel Macron, ou a desafiante, a ultranacionalista Marine Le Pen.

Repete-se o confronto do segundo turno do pleito de 2017. Daquela feita, a súbita ascensão de Macron dialogava criticamente com o resultado de dois escrutínios ocorridos no ano anterior: o que definiu a saída do Reino Unido da União Europeia e o que conduziu Donald Trump à Casa Branca.

A surpresa na França não foi menor que a produzida nos processos americano e britânico —aos 39 anos, sem nunca ter disputado eleição, um ex-executivo da finança privada e ex-ministro de governo socialista desbancava partidos tradicionais e conquistava o Eliseu.

Mas o sinal da vitória por margem folgada de Emmanuel Macron contrastou vivamente com o dos triunfos do populismo nacionalista na América do Norte e na Grã Bretanha. O novo presidente francês representava tolerância, multilateralismo e abertura econômica.

Apesar de ter-se mantido nessa linha e atuado, com a alemã Angela Merkel, como contraponto de lucidez ao terremoto diplomático da gestão Trump, Macron viu fortalecer-se o radicalismo doméstico à esquerda —com Jean-Luc Mélenchon, terceiro colocado no primeiro turno— e à direita, com Le Pen.

Na França e em outras nações ocidentais, a anteposição política mais frequente deixa de ser a entre centro-esquerda e centro-direita para tomar a forma da rivalidade entre forças comprometidas com o Estado democrático de Direito, de um lado, e correntes que questionam esse arcabouço, do outro.

Atua nesse segundo polo o nacionalismo exacerbado de Marine Le Pen, mal disfarçado por uma fina camada de verniz para tentar diferenciá-la das boçalidades segregacionistas defendidas pelo extremista Éric Zemour no primeiro turno.

A eleição de Le Pen, que não haja dúvidas sobre isso, desencadearia não apenas uma reviravolta reacionária na política imigratória francesa. Representaria também uma ameaça constante de restrição de direitos da população não branca.

Todos os desafios que exigem colaboração internacional para ser enfrentados, da mitigação do aquecimento global ao enfrentamento de autocracias belicosas, encontrariam em Le Pen um obstáculo.

A invasão da Ucrânia pela Rússia colocou em termos claros o que está em jogo quando adversários do avanço civilizacional que a muito custo neutralizou o exercício tirânico do poder de Estado encontram substrato favorável para prosperar.

Marine Le Pen, admiradora de Vladimir Putin —também elogiado por Donald Trump—, é sócia dileta desse clube do retrocesso.

A peneira de Aras

Folha de S. Paulo

PGR mostra ignorar pilar da democracia ao processar colunista que o criticou

Augusto Aras, na condição de procurador-geral da República, resolveu tapar o sol com a peneira. Reprovado amiúde por inverter o sentido do cargo que ocupa, fez o que lhe pareceu mais fácil: processou um de seus críticos.

Trata-se de Conrado Hübner Mendes, professor de direito constitucional da USP e colunista desta Folha. O procurador-geral quer vê-lo condenado por calúnia, injúria e difamação devido a postagens em redes sociais e uma coluna intitulada "Aras é a antessala de Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional".

Aras não gostou de ser chamado de "Poste Geral da República", de "servo do presidente" e de grande fiador da crise vivida no Brasil em decorrência da Covid, expressões utilizadas por Mendes para caracterizar a omissão do PGR diante dos desmandos de Jair Bolsonaro (PL).

Na primeira instância do Judiciário, deu-se o mais natural. A juíza federal Pollyanna Kelly Alves, lembrando o valor inestimável que tem o direito de liberdade de expressão dos pensamentos e ideias, entendeu não ter havido ofensa à honra de Aras e rejeitou a queixa-crime.

A surpresa surgiu no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, quando os juízes federais Marllon Sousa e Maria do Carmo Cardoso votaram a favor do recurso de Aras, vencendo a posição sustentada por Olívia Merlin Silva e determinando que o processo volte a tramitar.

Ignoraram, com isso, decisões em que o Supremo Tribunal Federal estabeleceu que, numa sociedade democrática, não cabe a repressão penal ao pensamento, sobretudo quando a crítica, por mais severa e ácida que seja, venha inspirada pelo interesse público.

Para o STF, a liberdade de imprensa abrange o direito de informar, de buscar a informação, de opinar e de criticar.

Não se confundam tais prerrogativas com um vale-tudo. Criticar é uma coisa, ameaçar e coagir são outra. Existem limites, mas eles não são cruzados quando os comentários expressam opiniões negativas, ainda que mordazes ou irônicas, a respeito de figura pública.

Autoridades públicas estão sujeitas a maior escrutínio em sociedades democráticas, e não será com a abertura de processos penais que esse pilar sairá fortalecido.

Aras, ao ascender à PGR, deveria saber que atrairia para si mais luzes do que nunca. Talvez seja impossível passar pelo cargo sem sofrer críticas, mas elas certamente são pouco numerosas e menos duras para quem honra a função.

Fiascos autocráticos

O Estado de S. Paulo

Os reveses da China e da Rússia fissuram a ideia de que ‘a autocracia funciona’. As forças democráticas do Ocidente têm a oportunidade de desmoralizar suas lideranças

Há mais de uma década a democracia global está em recessão e a autocracia, em ascensão. Em 2019, Vladimir Putin declarou o liberalismo “obsoleto”. Assim como ele, Xi Jinping na China consumou manobras constitucionais para se perpetuar no poder. A narrativa da “decadência ocidental” despertou uma legião de emuladores nas democracias liberais.

Tipicamente, esses populistas e autoritários se apresentam como indispensáveis – “só eu posso consertar as coisas” disse Donald Trump nos EUA. De Varsóvia a Nova Délhi, de Ancara a Brasília, lideranças estimulam um culto à personalidade, apresentam-se, domesticamente, como campeões do “povo” contra as “elites” e, internacionalmente, como encarnações de suas nações. À direita, em especial, a nostalgia nacionalista, o conservadorismo cultural, a intolerância com minorias e o desprezo pelo “politicamente correto” galvanizaram o Brexit na Inglaterra, a eleição de Trump ou os eurocéticos na União Europeia.

O presidente Jair Bolsonaro, usualmente tão desconfortável nos palcos internacionais, fez questão de visitar Putin e Viktor Orbán para se banhar em sua aura de “líderes fortes”. Recentemente, Luiz Inácio Lula da Silva se derramou em loas à China, como “um modelo de desenvolvimento para o mundo inteiro”, “capaz de lutar contra o coronavírus tão rapidamente porque tem um partido forte e um governo forte, porque o governo tem controle e poder de comando”.

De fato, a pandemia parecia o laboratório ideal para testar a potência das tecnocracias centralizadoras e a virilidade de seus líderes. Do mesmo modo, uma ocupação rápida e massiva da Ucrânia confirmaria Putin como “mestre estrategista”. Mas os fatos caminham em outra direção. Os tanques russos sucateados na Ucrânia e as ruas desertas de Xangai com centenas de milhões de chineses confinados com fome e medo são a imagem mais eloquente desse revés.

Paradoxalmente, a potencial desmoralização dos autocratas e seus admiradores não tem raízes morais. Fosse o caso, ela já teria acontecido após as atrocidades na Síria ou em Xinjiang. Não é um problema de moralidade, mas de competência.

A resistência ucraniana foi bem mais feroz do que Putin previa. Assim também a coordenação ocidental. Novos países querem se juntar à Otan. O fiasco militar e econômico despertou focos de dissidência entre celebridades, oligarcas e mesmo militares russos.

A estratégia da “covid zero” na China se tinge com as cores de uma distopia. O partido não preparou os cidadãos para conviverem com o vírus, suas vacinas são menos eficientes e não cobriram todos os vulneráveis. O controle sobre seu empresariado, com um misto de subsídios e intimidação, arrisca enfraquecê-lo no mercado global de capitais e deixá-lo para trás na corrida pela inovação. O apoio a Putin pode ferir as relações com a Europa e os EUA.

Não que se deva subestimar as autocracias. Irã, Cuba e Venezuela já se mostraram notavelmente resistentes às sanções ocidentais. A popularidade de Putin parece ter crescido após a guerra. A economia chinesa segue em ascensão e o mero tamanho de seu mercado sempre tentará as multinacionais a contornar seus padrões éticos. Mas a pandemia e a guerra expuseram suas vulnerabilidades. A obsessão com o controle da vida privada, a húbris resultante da desnecessidade de prestar contas a uma burocracia de sicofantas e a ojeriza a admitir seus erros continuam imorais como sempre, mas estão se mostrando ineficazes como nunca.

O abalo à ideia de que “a autocracia funciona” é uma ameaça existencial aos populistas e autoritários no Ocidente. Como disse o articulista Thomas Friedman, “enquanto ainda pudermos votar para nos livrar de líderes incompetentes e manter ecossistemas de informação que exponham mentiras sistêmicas e desafiem a censura, seremos capazes de nos adaptar numa era de rápidas mudanças”. Mas essas vantagens competitivas só serão reais se forem postas em prática. Se os líderes autocráticos estão mais vulneráveis, os democráticos ainda têm um longo caminho para resgatar a confiança de suas populações.

CPMI das Fake News era necessária

O Estado de S. Paulo

Com a CPMI das Fake News, o Congresso identificou uma das principais frentes do bolsonarismo contra o regime democrático. Provas reveladas não podem ser abandonadas

Em julho de 2019, deputados e senadores requereram a abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar, entre outros temas, “os ataques cibernéticos que atentam contra a democracia e o debate público” e “a utilização de perfis falsos para influenciar os resultados das eleições 2018”. Instaurada em setembro daquele ano, a CPMI das Fake News funcionou até março de 2020, quando sua atividade foi suspensa em razão da pandemia. Após promessas de reativação, a comissão continua parada, sem expectativa de retomada dos trabalhos.

É uma pena esse desfecho da CPMI das Fake News, sem conclusão formal das investigações. Em seus meses de funcionamento, a comissão descobriu indícios muito significativos sobre as campanhas de desinformação no País e suas estruturas de financiamento.

Houve depoimentos reveladores, como o da deputada Joice Hasselmann (PSDB-SP), que confirmou a existência do “gabinete do ódio” no Palácio do Planalto. Formado por assessores especiais da Presidência da República – ou seja, bancado com dinheiro público –, o grupo tinha o objetivo de propagar notícias falsas e difamações. “De maneira, digamos, legal, comprovável imediatamente, (são destinados) praticamente R$ 500 mil, de dinheiro público, para perseguir desafetos”, disse a deputada na ocasião.

Além de depoimentos reveladores, a CPMI das Fake News obteve provas documentais importantes. A partir de requerimento dos parlamentares, o Facebook identificou que o perfil do Instagram “snapnaro”, vezeiro em atacar e difamar adversários do bolsonarismo, foi editado a partir de uma rede de computadores do Senado entre fevereiro e maio de 2019. No período, foram feitos 95 acessos pela rede do Senado. No mesmo dia em que Joice Hasselmann prestou depoimento à comissão, o perfil “snapnaro”, que existia desde maio de 2017, foi apagado. Esse é apenas um exemplo, entre tantos outros, de como a CPMI das Fake News conseguiu de fato revelar esquemas ilegais operados a partir da estrutura estatal. 

Noutro caso, o Facebook informou à CPMI das Fake News que uma página usada para desferir ataques virtuais contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso havia sido registrada a partir de um telefone utilizado por um assessor parlamentar do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Ou seja, a comissão cumpriu de fato sua tarefa de investigar os ataques cibernéticos contra a democracia. E talvez seja exatamente por isso, por ela ter feito o seu trabalho, que houve e há tanto interesse em mantê-la suspensa, sem término formal.

O contraste entre a relevância de suas descobertas e a atual situação da CPMI das Fake News é ainda mais estridente tendo em vista que a desinformação e os ataques contra a democracia só cresceram desde 2019. É de reconhecer que o Congresso foi muito certeiro na abertura dessa investigação no primeiro ano de governo Bolsonaro, identificando logo uma das principais frentes do bolsonarismo contra o regime democrático. Basta ver a campanha de desinformação que, ao longo de todo o governo, Jair Bolsonaro vem empreendendo contra o sistema eleitoral.

É preciso admitir, no entanto, que o Legislativo, depois desse acerto inicial com a CPMI das Fake News, reduziu consideravelmente sua participação na defesa do Estado Democrático de Direito. Dentro do sistema constitucional de freios e contrapesos, essa retração do Congresso – em especial, da Câmara dos Deputados sob a presidência de Arthur Lira (PP-AL) – acabou por destacar, em tom de protagonista, a atuação do STF em defesa da Constituição.

Tudo fica um pouco desequilibrado quando o Congresso não cumpre seus deveres constitucionais até o fim. Às vezes, o maior obstáculo surge exatamente quando o Legislativo começa a realizar bem seu trabalho, o que desperta resistências. Foi assim com a CPMI das Fake News e, também, com a CPI da Pandemia. Depois de tudo o que veio à tona, verifica-se um enorme esforço para que tudo volte à escuridão e ao esquecimento. É papel do Congresso não permitir que seu bom trabalho seja jogado fora.

Brasil de novo atrás, segundo o FMI

O Estado de S. Paulo

Fundo melhorou a projeção para 2022, mas crescimento estimado para o País está abaixo dos padrões internacionais

Com crescimento de 0,8% neste ano e de 1,4% no próximo, o Brasil continua correndo bem atrás dos outros emergentes e até dos países mais desenvolvidos, segundo os balanços e projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI). Já observado nos últimos dez anos, esse descompasso deve continuar nos próximos cinco, em todo o horizonte coberto, portanto, pelo Panorama Econômico Mundial (World Economic Outlook), na versão divulgada na terça-feira. Pelas novas estimativas, severamente afetadas pela guerra na Ucrânia, a produção global das economias avançadas deve aumentar 3,3% em 2022 e 2,4% em 2023. Para o conjunto dos países emergentes e em desenvolvimento as taxas previstas para esses períodos são 3,8% e 4,4%, com alguma moderação do desempenho chinês.

Com a invasão da Ucrânia, já foram cortadas as projeções de crescimento de todos os grupos de economias. Terminar a guerra é a maior prioridade, afirmou o economista-chefe do FMI, Pierre-Olivier Gourinchas, levando em conta, além da tragédia humanitária imediata, os efeitos econômicos do conflito e das sanções à Rússia.

Sem ter ainda vencido os desajustes ocasionados pela pandemia, o mundo enfrenta agora a crise provocada pelo governo russo. Menor crescimento e inflação maior ameaçam a economia global, revertendo as perspectivas de recuperação. Pelos novos cálculos, o crescimento mundial deve ser, neste ano, 0,8 ponto inferior ao estimado em janeiro. A taxa prevista para 2023 ficou 0,2 ponto menor que a indicada no início do ano.

A guerra, segundo Gourinchas, agrava os choques de oferta enfrentados pela economia global nos últimos anos. Seus efeitos devem propagar-se “como ondas sísmicas de choques” pelos mercados de produtos básicos e pelos canais financeiros.

Diante dos novos desajustes, foram revistas para baixo as perspectivas de médio prazo de todos os grupos de países, mesmo daqueles exportadores de commodities, porque deverão beneficiar-se da alta dos preços da energia e dos alimentos.

O Brasil é um desses exportadores e deve, portanto, ser um dos beneficiários do aumento das cotações internacionais de produtos básicos. Esse efeito benéfico já tem sido observado nas contas externas do País. Nenhum desses detalhes foi examinado na apresentação geral de Gourinchas, mas o crescimento previsto para o País neste ano ficou 0,5 ponto maior que o projetado em janeiro. O estimado para 2023, no entanto, diminuiu 0,2 ponto. Além disso, a economia brasileira se destaca, na análise do FMI, pela inflação já elevada e persistente, pela perspectiva de baixo crescimento e pelo alto desemprego.

Neste ano e no próximo, o crescimento do Brasil deve ser inferior às médias da América do Sul, de 2,3% em 2022 e de 2,1% em 2023. As médias anuais da inflação brasileira, estimadas em 8,2% para este ano e 5,1% para o próximo, devem ser maiores que as taxas da maior parte dos sul-americanos. O desemprego, calculado de acordo com critérios do FMI, deve ficar em 13,7% e 12,9%, superando também os números da maior parte do continente.

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