sábado, 23 de abril de 2022

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Graça concedida a Daniel Silveira foi afronta ao Judiciário

O Globo

Foi uma afronta ao Judiciário o decreto do presidente Jair Bolsonaro perdoando o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) dos crimes que resultaram em sua condenação, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a oito anos e nove meses de prisão. É inaceitável que o presidente da República use o poder da graça, que lhe é concedido pela Constituição, apenas para favorecer um aliado político condenado — com toda a justiça e dentro do devido processo legal — por ter agredido as instituições e a democracia de forma flagrante.

Pela primeira vez desde a Constituição de 1988, um presidente usou o poder de conceder indulto individual. E sem nexo com o calendário nem critério jurídico. Só isso não deixa dúvida de que, embora tenha alegado agir em nome da liberdade de expressão e dos direitos de parlamentares, a motivação de Bolsonaro foi puramente pessoal. Não é de hoje que seus aliados promovem campanha contra ministros do Supremo e tentam minar a confiança nas instituições democráticas. A tentativa inusitada de derrubar uma decisão da Corte, atribuindo-lhe conteúdo político, é uma forma de atiçar sua claque.

Dentro do regramento democrático brasileiro, o STF é a instituição adequada para tomar a decisão sobre os crimes atribuídos a Silveira. Numa votação quase unânime — por 10 votos a 1, com apoio até do ministro André Mendonça, recém-indicado por Bolsonaro —, a Corte concluiu que os atos do deputado não estão protegidos nem pela liberdade de expressão nem pela imunidade parlamentar. A decisão ainda está sujeita a recurso, a pena não é definitiva, e o decreto presidencial baixado no dia seguinte à condenação, antes do trânsito em julgado da sentença, só contribui para trazer mais turbulência a um processo já em si delicado.

Tanto a defesa de Silveira quanto a Câmara se preparavam para recorrer. Não faltam dúvidas a esclarecer. A principal é sobre a extensão da pena no que diz respeito aos direitos políticos. O presidente da Câmara, Arthur Lira, argumenta que o STF não deveria ter autonomia para cassar o mandato de um deputado sem aval da Casa. Ao mesmo tempo, a defesa alega que Silveira não deveria ser considerado inelegível antes da sentença definitiva. Com o decreto de Bolsonaro, tais questões ficaram ainda mais confusas.

É inegável que o presidente da República dispõe da prerrogativa constitucional de conceder graça a quem quiser, quando quiser. Em seu voto sobre o indulto natalino no governo Michel Temer, o ministro Alexandre de Moraes — relator no caso Silveira e alvo dos bolsonaristas — foi taxativo ao afirmar que a Constituição “não limita o momento em que o presidente da República pode conceder o indulto, sendo possível isentar o autor de punibilidade mesmo antes de qualquer condenação criminal”. Por paradoxal que pareça, é defensável o perdão antes da sentença.

Ao mesmo tempo, também é legítima a interpretação de que, mesmo com o indulto, Silveira continuaria inelegível (ele pretende se candidatar a senador pelo Rio), reforçada por uma súmula do Superior Tribunal de Justiça. Há, contudo, divergência sobre o tema, que deverá ser analisado pelo STF no âmbito das ações que contestarão o decreto. A Corte precisa se debruçar sobre elas com serenidade e rapidez. Não apenas para dirimir as dúvidas jurídicas, mas para afastar as acusações de motivação política e resgatar um mínimo de sobriedade e equilíbrio institucional, essenciais neste ano eleitoral.

Terror em Guarapuava expõe a falta de uma política de segurança no país

O Globo

Mais uma cidade é sacudida pelo terror imposto pelo “novo cangaço”, modalidade de crime em que quadrilhas especializadas fortemente armadas invadem pequenos municípios para praticar assaltos cinematográficos. Durante a noite de domingo e a madrugada de segunda, o cenário de mais um capítulo dessa história de horror foi Guarapuava, cidade do interior do Paraná com pouco mais de 180 mil habitantes, a 250 quilômetros da capital Curitiba.

Cerca de 30 bandidos usando carros blindados e armamento pesado tentaram assaltar uma transportadora de valores. A quadrilha não conseguiu abrir o cofre da empresa e acabou fugindo sem roubar nada, mas a ação deixou marcas profundas na cidade. Para dificultar a reação da polícia, os criminosos metralharam um batalhão da PM, incendiaram dois veículos em frente ao quartel e forçaram cidadãos a servir de escudo humano. Um morador e dois policiais foram baleados — um dos agentes levou um tiro na cabeça.

A polícia do Paraná deu início a uma caçada aos criminosos, ainda sem muito sucesso. Um suspeito de fornecer armas à quadrilha foi preso e liberado depois de depor. Acredita-se que os bandidos sejam de outro estado.

Ataques do novo cangaço têm se tornado frequentes nos últimos anos. A estratégia é sempre a mesma: quadrilhas numerosas, uso de explosivos, ataques a delegacias e quartéis para impedir ou atrasar a reação da polícia, sequestro de moradores para servir de escudo humano. O despreparo dos governos é outro traço comum. Em dezembro de 2018, um assalto a dois bancos no município de Milagres (CE) deixou 14 mortos — seis eram reféns.

Na última segunda-feira, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, chamou de terrorismo a ação dos bandidos em Guarapuava e defendeu o endurecimento da legislação. Disse que o pacote de segurança enviado pelo governo ao Congresso inclui a proposta de tipificar esse tipo de crime e aumentar as penas. Por mais relevante que seja, só isso não resolverá. É pouco provável que os bandidos desistam de praticar mega-assaltos só porque a lei se tornará mais rigorosa. Como nem sempre a polícia consegue localizar os assaltantes, não há garantia nem de que eles serão punidos.

O inaceitável episódio de Guarapuava é mais um a expor a falta de uma política de segurança pública do governo Bolsonaro. Em quase três anos e meio, as principais decisões nessa área foram a liberação do uso de armas e o enfraquecimento das normas de rastreamento. Enquanto Bolsonaro incentiva cidadãos a se armar, o que só faz agravar a violência, perde-se a chance de investir numa política séria, que privilegie as ações de inteligência e integração entre as diversas forças de segurança para enfrentar quadrilhas cada vez mais sofisticadas. É preciso se antecipar às ações, impedindo que elas aconteçam.

A verdade é que, com excesso de armas em circulação, a população está cada vez mais desprotegida. A imagem de cidadãos de mãos dadas servindo de escudo para facínoras é o retrato da agonizante segurança pública do país.

Indulto à arruaça

Folha de S. Paulo

Se prisão imposta a deputado parece exagerada, perdão de Bolsonaro é um desvario

O indulto presidencial se justifica por razões humanitárias e pelo princípio de que condenados por faltas menos graves, que já cumpriram parte da pena e não representam ameaça podem ser reintegrados à sociedade. Como faz com tudo em que toca, Jair Bolsonaro (PL) aviltou o instrumento.

Aproveitou-se da prerrogativa constitucional em favor de seus caprichos pessoais, para beneficiar um parceiro de arruaças, o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) —e sobretudo para reavivar sua cruzada de fundo golpista contra o Supremo Tribunal Federal.

Personagem minúsculo da vida congressual, Silveira deveria ter tido o mandato cassado por seus pares depois que, em fevereiro de 2021, gravou vídeo em que distribuía ataques chulos e ameaças veladas a ministros do STF e à corte.

Estava mais do que caracterizada a quebra do decoro parlamentar, seja pela baixeza das imprecações, seja pelo desrespeito ao convívio democrático pelo qual um legislador eleito deveria zelar.

Encorajado pela vexatória omissão da Câmara, o baderneiro prosseguiu na afronta ao tribunal, onde se tornara réu. Mesmo a subserviente Procuradoria-Geral da República entendeu que ele cometera os crimes de tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes, coação no curso do processo e incitação à animosidade entre as Forças Armadas e outras instituições.

Sem dúvida o Supremo —que condenou Daniel Silveira a oito anos e nove meses de prisão, além de cassação do mandato e suspensão dos direitos políticos— tinha diante de si uma decisão difícil e potencialmente controversa.

Ao plenário cumpria, como advogou esta Folha, traçar com clareza as divisas entre o exercício da livre expressão e a incitação ao crime.

Isso foi feito. Como argumentaram convincentemente 10 dos 11 ministros, menções a atos da ditadura, surras nos magistrados e a uma invasão violenta do Supremo, dirigidas a fanáticos incitados pelo bolsonarismo contra as instituições, ultrapassam a mera manifestação de pontos de vista.

Em outras circunstâncias, a boçalidade antidemocrática do deputado obscuro teria caído no vazio e poderia ser ignorada pelo STF. Mesmo no contexto atual, o encarceramento imposto ao delinquente parece exagerado.

São ponderações que acabam nubladas, porém, pelo indulto vil de Bolsonaro, a jogar por terra os ritos e os objetivos de uma medida dessa natureza somente para, mais uma vez, trocar as responsabilidades de governo pelo conflito farsesco com inimigos inventados.

Haverá, decerto, argumentos para uma eventual derrubada da medida esdrúxula. Acima do aspecto jurídico, entretanto, a reação das instituições e das forças políticas deve ser pautada pela responsabilidade e pela grandeza que faltam ao presidente da República.

Correndo atrás

Folha de S. Paulo

Com maior inflação em 4 décadas, banco central dos EUA pode produzir recessão

Diante da maior pressão inflacionária em décadas, o banco central americano, o Fed, terá a tarefa de retomar as rédeas da política monetária sem causar uma recessão, que poderia se tornar global.

É um desafio e tanto, quando se leva em conta o ponto de partida. A alta de preços ao consumidor nos 12 meses encerrados em março ficou em 8,5%, a maior desde 1981.

Até meados do ano passado dava-se crédito à ideia de que parte das pressões seria transitória, ocasionada por problemas de oferta em vários setores durante a pandemia.

A expectativa de reversão, contudo, foi frustrada; logo ficou claro que as pressões eram mais persistentes. Mesmo expurgando os preços de energia e alimentos, a inflação americana está em 6,5% e abarca grande variedade de itens. Na Europa esse corte mostra taxa bem menor, por volta de 3%.

A diferença decorre do mercado de trabalho muito mais aquecido nos Estados Unidos. O desemprego em março ficou em 3,6%, e os salários sobem no ritmo de 5,6% ao ano, o que é incompatível com a meta de inflação do Fed (2%).

Se duradoura, a combinação de preços e salários em alta pode reforçar um processo de inércia, fenômeno comum no Brasil. Quando isso ocorre, fazer a inflação retornar à meta exige aperto mais agudo na política monetária e maior perda de atividade econômica.

Por fim, há o risco de uma disparada nas expectativas de consumidores e empresas a respeito da evolução dos índices.

Em retrospecto, fica claro que os estímulos monetários e fiscais adotados nos EUA foram excessivos. Cerca de 25% do Produto Interno Bruto em gastos públicos, boa parte em auxílios diretos à população, e a avalanche de dinheiro criada pelo Fed resultaram num choque de demanda muito além da capacidade produtiva do país.

Nesse quadro, a autoridade monetária reconheceu seu atraso e indicou juros mais altos e reversão mais rápida dos estímulos. A expectativa para a taxa básica no fim deste ano passou de 0,75% para 2,5% anuais. Até meados de 2023, seriam ao menos 3,25%.

A experiência sugere que uma contração rápida das condições financeiras deve ser bem-sucedida em conter a inflação, mas também que raramente isso ocorre sem uma recaída recessiva.

Bolsonaro escarnece da República

O Estado de S. Paulo

Ao conceder indulto ao meliante bolsonarista, Bolsonaro testa uma vez mais as instituições. Não cabe passividade perante esse abuso de poder. Congresso e PGR têm de agir

Não resta dúvida de que o presidente da República tem competência de conceder indulto a condenados. É um poder de longuíssima tradição humanitária, que a Constituição de 1988 acolheu entre as atribuições presidenciais. Mas o que fez Jair Bolsonaro na tarde de quinta-feira nada tem de constitucional ou mesmo humanitário: é pura pirraça de quem, incapaz de acolher uma ordem judicial que lhe desagradou, deseja afrontar as instituições democráticas.

Ao atuar assim, Jair Bolsonaro confirma o acerto da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de condenar o deputado Daniel Silveira. O que o bolsonarismo faz não é simples exercício da liberdade de opinião. É aberta agressão contra o regime democrático. Com atos aparentemente legais – seja o vídeo de um obscuro parlamentar, seja o decreto concedendo a graça a uma pessoa –, o que se tem é a subversão dos princípios republicanos, com debochada insubmissão à lei e às instituições e com despudorado exercício do poder para fins pessoais. Não é assim que funciona o regime constitucional de 1988.

A decisão do STF ainda não transitou em julgado, podendo, em tese, ser modificada. Não está apta, portanto, a gerar efeitos jurídicos. Aos olhos da Justiça, ainda recai sobre o deputado bolsonarista o véu da presunção de inocência. Mas nada disso importa a Bolsonaro. Para afrontar o Judiciário, o presidente da República não teve nenhum inconveniente em fazer de Daniel Silveira um precoce condenado, em tentativa farsesca de transformar o agressor em vítima.

Não que isso diminua a gravidade de seus atos, mas o bolsonarismo é descuidado em suas manobras. Ele mesmo expõe seus equívocos. Com o decreto afirmando que Daniel Silveira estava “resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição”, Jair Bolsonaro explicitou que, com o ato presidencial, não estava concedendo perdão a um condenado (que nem sequer estava juridicamente condenado). A rigor, no ato de quinta-feira, Jair Bolsonaro não exerceu nenhuma competência prevista no art. 84 da Constituição. De forma inteiramente inconstitucional, ele assumiu o papel de órgão revisor do Supremo, com a desfaçatez de interpretar e aplicar a Constituição em sentido diverso ao que havia sido definido no dia anterior pelo Supremo.

Ao atuar assim, Jair Bolsonaro expõe uma vez mais ao ridículo todos aqueles que vêm tentando, ao longo desses três anos e quatro meses, contemporizar os atos presidenciais, como se seu descompasso fosse mera questão de estilo, um inocente despojamento de protocolo, mas que, na essência, não afrontaria a Constituição. Jair Bolsonaro sabe exatamente o que vem fazendo, como já sabia, nos tempos do Exército, que seu comportamento na época não se coadunava com a disciplina, a hierarquia e o espírito militares.

Por exemplo, Jair Bolsonaro tinha plena consciência de seus atos no 7 de Setembro do ano passado. Nada do que se viu naquelas manifestações foi mera destemperança verbal. Ele sabia exatamente o que desejava instigar no País. Como também tinha plena consciência do que fez, dois dias depois, com seu simulacro de recuo. Assim como o autoritarismo, a covardia também tem método.

É preciso retirar, de uma vez por todas, o manto da irresponsabilidade sobre os atos de Jair Bolsonaro. Quando, menos de 24 horas depois de uma decisão do plenário do Supremo, o presidente usa o poder de conceder indulto para afrontar, de maneira explícita, o Poder Judiciário, tem-se uma violação da Constituição. Há um estrito abuso de poder. E mais: há a mensagem de que nada o deterá em suas pretensões e devaneios autoritários. Se assim Jair Bolsonaro trata uma decisão do órgão máximo do Judiciário, simplesmente já não existe mais nenhum limite.

Nesta situação de teste forte das instituições, cabe, de forma especial, ao Congresso e à Procuradoria-Geral da República (PGR) exercerem suas atribuições constitucionais de controle dos atos do Executivo, com a responsabilização de quem vem abusando não apenas da lei, mas da paciência dos brasileiros. Na República, há limites.

Negacionismo legislativo

O Estado de S. Paulo

Arthur Lira defende emendas de relator como algo transparente e necessário para demandas do País por investimentos; para ele, R$ 16 bilhões é pouco

A duras penas, o País teve de arcar com os efeitos do negacionismo na saúde, com mais de 660 mil mortes, atraso na compra de vacinas, uso de medicamentos ineficazes para o combate à covid-19 e sabotagem às medidas de prevenção. Na economia, o ministro Paulo Guedes pode repetir quantas vezes quiser que respeitou o teto de gastos, mas o mercado sabe muito bem o que foi feito da âncora fiscal e cobrou seu preço. No Legislativo, porém, o negacionismo, representado na figura do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), segue imbatível, apesar das revelações do Estadão envolvendo o “orçamento secreto” e das exigências de transparência por parte do Supremo Tribunal Federal (STF).

Desafiando a realidade, Lira, em entrevista ao jornal O Globo, defendeu as emendas de relator, mecanismo utilizado pelo governo federal para compra de apoio de parlamentares. Classificar como “orçamento secreto” uma rubrica cercada de sigilo, a não ser sobre seu volume bilionário, é “insensatez”, nas palavras do presidente da Câmara, ainda que até hoje o Congresso ignore a ordem do STF para divulgar ofícios que comprovem a autoria dessas emendas. No mundo paralelo descrito por Lira, haveria um site em que todos esses documentos estariam cadastrados, e os deputados e senadores estariam divulgando informações de forma voluntária, por meio de, pasmem, postagens em suas próprias redes sociais – promovidas a ferramentas oficiais de prestação de contas sobre a aplicação do dinheiro público.

Mas o que chama a atenção mesmo na fala de Lira é a tendência que se descortina para o futuro. Destinar mais de R$ 16 bilhões às emendas de relator ainda é insuficiente para atender a toda a demanda do País, afirma o presidente da Câmara. “Falamos de R$ 16 bilhões achando que é muito. O Brasil tem pouco investimento. Estamos aqui com R$ 3 trilhões (do Orçamento) brigando por R$ 16 bilhões. Não que seja pouco, porque R$ 16 bilhões é muito mesmo, mas ainda é insuficiente para as demandas do Brasil”, disse. Na versão apresentada por Lira, portanto, as emendas de relator foram fundamentais para encorpar os parcos R$ 42,3 bilhões autorizados para investimentos no Orçamento deste ano – e não um instrumento que salvou Jair Bolsonaro do impeachment ao beneficiar parlamentares fiéis ao governo, agora em busca de sua reeleição.

Aqui cabem esclarecimentos. A definição de investimento no Orçamento compreende planejamento e execução de obras, aquisição de imóveis, instalações, equipamentos e material permanente ou ainda aumento de capital de empresas que não sejam de caráter comercial ou financeiro. Ainda que seja bastante amplo, o conceito certamente não alcança obras precárias de pavimentação ou licitações superfaturadas para compra de tratores, como se viu no “orçamento secreto”. 

Não há dúvidas de que a participação dos investimentos na proporção do PIB é pequena e deve ser elevada, não apenas para melhorar a infraestrutura existente, mas também para impulsionar o intermitente crescimento econômico registrado nas últimas décadas. Todos os indícios revelados pela imprensa a respeito das emendas de relator, no entanto, não apontam nessa direção, mas sim para desperdício de dinheiro público e favorecimento de empresas vinculadas a caciques políticos. Decerto não é desse tipo de investimento que o País precisa. Direcionar verbas para obras realmente necessárias, no entanto, pressuporia a existência de projetos consistentes e demandaria do presidente Jair Bolsonaro o ato de governar, habilidade que ele foi incapaz de demonstrar em mais de três anos no cargo.

Fica claro, pelas declarações de Lira, que não há a menor intenção de reduzir a fatia das emendas de relator dentro do Orçamento. Trata-se de algo permanente, independentemente do presidente que for eleito, e, se depender do presidente da Câmara, com tendência de crescimento nos próximos anos. O fato de que não há qualquer valor reservado para essa rubrica no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2023 não quer dizer absolutamente nada. No governo do Centrão, a LDO é apenas mais uma peça de ficção a serviço do negacionismo.

Policiais militares mais protegidos

O Estado de S. Paulo

Boas políticas de segurança são mais eficazes para proteger os agentes do que a apologia à violência

A instalação de câmeras corporais, as chamadas bodycams, nas fardas dos policiais militares (PMs) do Estado de São Paulo foi uma das melhores políticas de segurança pública implementadas pelo Palácio dos Bandeirantes em muitos anos. À medida que o tempo passa, os resultados extremamente positivos dessa providência aparecem, um após o outro.

Logo após a ampliação do uso das câmeras corporais em todo o Estado, em meados do ano passado, a letalidade policial caiu a zero nos 15 batalhões da Polícia Militar cujos agentes passaram a trabalhar com o novo equipamento. Mas não apenas a integridade física da população foi resguardada com o registro imagético das ações policiais. Os próprios PMs ficaram mais protegidos.

De acordo com a Polícia Militar, quatro agentes morreram em serviço ao longo de 2021, conforme dados obtidos pela Folha de S.Paulo. Três desses óbitos foram causados por acidentes de trânsito durante o deslocamento de viaturas. Em 2020, foram registradas 18 mortes de PMs em serviço, sendo uma dezena delas em confronto. Ou seja, no ano passado, quando grande parte dos PMs já trabalhava com as bodycams instaladas, houve uma impressionante redução de 78% no número de mortes de agentes em todo o Estado de São Paulo.

A gravação ininterrupta das intervenções policiais, sem possibilidade de edição de imagens pelos agentes, resguarda a integridade física da população e contribui decisivamente para abordagens policiais mais eficientes e dentro dos limites da legalidade. Agora, os novos dados revelam que a instalação das câmeras também levou ao aumento da segurança dos próprios policiais.

São boas políticas de segurança pública, como a adotada pelo governo de São Paulo, que protegem, a um só tempo, tanto a população em geral como os policiais militares, que lidam diariamente com o patrulhamento ostensivo, e não o estímulo ao armamento desenfreado e ao confronto, como apregoa o presidente Jair Bolsonaro. Na visão torpe de Bolsonaro e de grande parte de seus apoiadores, uma “boa” política de segurança é materializada em uma fileira de cadáveres de “meliantes”, pouco importando o devido processo legal ou mesmo a morte eventual de policiais que o presidente diz defender.

O ungido pelo Planalto para concorrer ao governo de São Paulo, o ex-ministro da Infraestrutura Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), afirmou que, se for eleito, vai acabar com as câmeras corporais porque os equipamentos “colocam em risco a vida dos policiais”. O bom senso e as evidências mostram exatamente o contrário. O projeto de implementação das bodycams na Polícia Militar de São Paulo vinha sendo estudado havia mais de sete anos. Foi pensado, elaborado e testado com rigor técnico, e agora mostra resultados altamente benfazejos para toda a sociedade. Que os eleitores se lembrem disso ao escolherem o próximo ocupante do Palácio dos Bandeirantes.

Todos ganham com uma Polícia Militar menos letal e mais protegida. Direitos dos cidadãos são garantidos, o processo judicial ganha provas robustas, os maus policiais podem ser identificados e punidos e os bons, valorizados.

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