quarta-feira, 11 de maio de 2022

Fernando Exman: Alguns riscos eleitorais já aparecem no radar

Valor Econômico

É urgente o debate sobre as soluções para os problemas do país

Tem origem no latim a palavra que não sai da cabeça de empresários e investidores neste período pré-eleitoral: risco.

Alguns verbetes remetem-na a “risicare”, cujo significado é “ousar”. Em outros, lê-se “aquele que corta, o que corta separando”, vindo do vocábulo “resecum”. É uma referência ao período das navegações, quando as embarcações precisavam passar perto de rochas pontiagudas colocando em perigo as vidas e riquezas que transportavam.

Especialistas apontam que o Renascimento foi um marco para o desenvolvimento dos estudos desta área. Foi a época em que mais pessoas começaram a se sentir à vontade para desafiar as crenças do passado e arriscar o presente, de olho no futuro.

Colheu-se, entre outros resultados, o período das grandes descobertas. Recursos até então inexplorados fizeram girar a economia, a qual passou por um intenso processo de mudança. Diante de turbulências religiosas, muitos se voltaram para a ciência.

Unindo a noção de risco com o conceito de probabilidade, desenvolveu-se a estatística. Era evidente a necessidade de redução das incertezas que envolviam a evolução do sistema financeiro e a expansão das trocas comerciais.

Com o tempo, o conceito de “risco” transcendeu os cálculos feitos pelos navegadores. E agora faz parte do glossário das mais variadas áreas, entre elas a análise de conjuntura.

Hoje, o risco político no Brasil é uma preocupação relevante entre empresários e investidores. Por vários motivos.

Os atritos entre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Ministério da Defesa têm gerado dúvidas em relação à clareza de setores do governo oriundos das Forças Armadas quanto ao seu comprometimento com a manutenção da estabilidade institucional. Estes não deveriam se deixar envolver pelo presidente Jair Bolsonaro em sua cruzada contra um sistema eleitoral reconhecido internacionalmente.

O ambiente democrático pressupõe a disputa pelo poder. E os políticos precisam considerar a possibilidade de terem que passar pacificamente à oposição, em caso de derrota. Cabe às instituições assegurar que esse processo ocorra sem grandes turbulências, principalmente instituições de Estado como os órgãos do Poder Judiciário e as Forças Armadas.

Ainda há tempo para uma pacificação institucional, embora infelizmente este não seja o cenário mais provável a curto prazo. Os efeitos na economia tendem a ser negativos.

Essa, contudo, não é a única preocupação. O meio ambiente transformou-se num tema central. Nas palavras de um integrante do governo, não há conversa com investidor ou autoridade estrangeira - de direita, centro ou esquerda - que não aborde o desmatamento na Amazônia e a ainda deteriorada imagem do Brasil. A definição dos rumos da política ambiental é um ponto de atenção.

Na seara fiscal, os três principais pré-candidatos a presidente têm dado sinais de que o teto de gastos pode desabar. À esquerda, com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou Ciro Gomes (PDT), a ideia é aumentar o volume de investimentos públicos.

Já aliados do presidente Jair Bolsonaro, depois de criarem um puxadinho para viabilizar o pagamento de precatórios, falam em abrir uma chaminé no teto para manter os programas sociais a partir de 2023. Onde se vê fumaça existe fogo.

Persiste a dúvida se o ministro da Economia, Paulo Guedes, permanece num eventual segundo mandato, caso Bolsonaro rasgue de vez o livro de receitas liberais. E nada se diz oficialmente sobre a equipe econômica de um governo Lula.

Há incertezas em relação à formulação do Orçamento do ano que vem. Se ganhar, o PT pode tentar impedir que o Congresso o aprove na atual legislatura. A peça seria renegociada com o Parlamento que tomará posse em fevereiro, diante de uma nova dinâmica na relações entre Executivo e Legislativo. A máquina federal seria tocada com os meios possíveis até fevereiro ou março.

As perspectivas para a reforma administrativa não são das melhores. Bolsonaro não a encampou e seus principais adversários até agora não a defenderam. O tamanho do Estado segue sendo um problema.

Há dúvidas sobre como ficará a legislação trabalhista, caso Lula vença. Não há detalhamento ainda sobre o que pensa cada pré-candidato a respeito da reforma tributária.

Condena-se, em várias frentes, o lucro - instituto fundamental do capitalismo e conceito que deveria ser inatacável em um país que pretende se apresentar como economia de mercado. Um exemplo recente foi a declaração do presidente sobre o resultado da Petrobras. Bolsonaro chamou-o de criminoso. Surge, novamente, o risco de intervenção nesse mercado.

Por outro lado, o que podem esperar os empresários que se aproximaram de Bolsonaro, caso Ciro Gomes arranque nas pesquisas de intenção de voto? Noutro dia, o pré-candidato do PDT acusou um deles de sonegar impostos e assegurou que em seu governo este e outros empreendedores bolsonaristas não prosperariam.

Aliados de Lula já conseguiram contê-lo depois de alguns deslizes, mas outros candidatos ainda perseveram num caminho tortuoso. Seria positivo que evitassem ser enquadrados na “Lei de Dilma”, aquela segundo a qual se faz o diabo para ganhar uma eleição.

Todas as declarações estão sendo acompanhadas de perto, e elas têm impacto direto no humor do mercado. Num momento em que o Brasil luta para combater a inflação acima de dois dígitos e fortalecer a retomada da atividade econômica, não se pode perder de vista que a atração de capital externo tem efeito sobre o câmbio, que, por sua vez, influi no preço de diversos produtos. Políticos, partidos e agentes públicos precisam compreender as consequências de seus atos.

Diante disso, uma reflexão se impõe: o fim das coligações majoritárias. O Brasil está há meses discutindo a formação de alianças partidárias para o primeiro turno do pleito presidencial, enquanto fica em segundo plano o debate detalhado sobre as urgentes soluções dos problemas nacionais. Essa iniciativa também ajudaria a deixar o mar menos revolto.

 

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