O Globo / Folha de S. Paulo
Uma coisa é discutir o desmatamento ou a
falta de atenção para os indígenas, outra é olhar para a região como hospedeira
do crime organizado, com seu braço do narcotráfico
O desaparecimento do indigenista Bruno
Araújo e do jornalista inglês Dom Phillips se tornou um capítulo no debate
internacional em torno da Amazônia. O governo brasileiro, que já estava mal na
foto, ficou pior. Uma coisa é discutir o desmatamento ou a falta de atenção
para os indígenas. Bem outro é olhar para a região como hospedeira do crime
organizado, com seu braço do narcotráfico.
Os estrategistas de Brasília, que gostam de
brincar com tabelas, arriscam transformar a Amazônia numa ameaça à segurança de
outros países. A debilidade do Estado brasileiro na região estimulará discursos
intervencionistas, bem ou mal-intencionados. Para um europeu ou
norte-americano, o aquecimento global pode ser um assunto secundário, já a
cocaína exportada para suas cidades é um risco próximo. Basta lembrar que o
latino-americano mais famoso mundo afora é o falecido narcotraficante
colombiano Pablo Escobar. Ele foi tema de algo como 30 filmes e séries de TV,
mais dezenas de livros publicados no mercado de língua inglesa.
As facções criminosas competem com os órgãos federais de segurança e meio ambiente. Lá estão o Comando Vermelho carioca, o paulista Primeiro Comando da Capital, mais a Família do Norte, o Comando Classe A e Os Crias. Elas são um dado da equação. A conexão dos garimpos ilegais com essas facções criminosas é outra. Junta-se a essas duas anomalias a rede de interesses de grileiros, desmatadores e garimpeiros ilegais confortados pela retórica de Jair Bolsonaro.
Há mais: o governo do presidente do Peru,
Pedro Castillo, anunciou uma vontade de legalizar o plantio das folhas de coca
na sua parte da floresta. Nas palavras de Ruben Vargas, ex-ministro do Interior
daquele país, “estamos entrando na linha perigosa de nos convertermos num
narcoestado“. Isso porque os plantadores de coca teriam dois mercados, o
estatal e o dos traficantes.
Numa trapaça da História, Bruno Araújo e
Dom Phillips estavam no Vale do Javari, região onde fazem fronteira o norte do
Brasil, Peru e Colômbia. Por lá passou o explorador Pedro Teixeira, a quem se
deve a fundação, em 1639, do povoado de Franciscana. Foi graças a ele que, no
século seguinte, o diplomata Alexandre de Gusmão, expandiu as terras
brasileiras a Oeste da linha do Tratado de Tordesilhas.
Franciscana sumiu e sua localização é
controversa. Sabe-se apenas que ficava nos “ejavaris, nas bocaínas do Rio do
Ouro”. No século XVIII, entendeu-se que esse lugar ficava em terras que hoje
são do Equador. Mais tarde, acreditou-se que ficasse mais a Leste, na foz do
Rio Juruá. A pesquisadora Maria do Carmo Strozzi Coutinho levantou uma terceira
hipótese: Franciscana ficava na foz do Rio Javari. A chave estaria na expressão
“ejavaris“. Era comum que os rios fossem identificados pelo nome dos habitantes
do seu entorno. Havia os rios dos “tapajoses“ e dos “tocantines“. Eram o
Tapajós e o Tocantins. Assim, a terra dos ejavaris estaria no vale do Rio
Javari. Faz sentido.
Contrabandistas naquele vale são coisa
antiga. Em 1752, o governador do Grão-Pará, irmão do Marquês de Pombal, pediu a
Lisboa a fundação de uma vila no vale do Javari porque ali estava “a porta por
onde se faz comércio clandestino”. Naquele tempo, contrabandeava-se a prata dos
Andes. Hoje, circulam cocaína e algum ouro.
Foi graças a homens como Pedro Teixeira,
Pombal e seu irmão, que Alexandre de Gusmão empurrou as fronteiras do Brasil
para Oeste da linha de Tordesilhas, que ia da Ilha de Marajó a Santa Catarina.
Naquele tempo, uma viagem de São Luís do Maranhão a Lisboa levava cinco semanas.
Hoje, mesmo com os jatos e a internet, o
Vale do Javari continua longe da atenção do governo brasileiro.
Wilson Quintella viu a beleza da vida
Morreu na semana passada, aos 95 anos,
Wilson Quintella. Ele presidiu a empreiteira Camargo Corrêa. Seus 40 anos de
serviço na empresa confundiram-se com as grandes obras da engenharia nacional,
de Brasília a Itaipu.
Aqui vai uma história desse empresário. Ela
mostra como a vida pode ser bela.
Nos início dos anos 60, Quintela ia em seu
automóvel, retornando de uma obra ferroviária em Bauru (SP). Na estrada de
terra, passou por uma senhora que caminhava com duas crianças. Ofereceu-lhes
carona. Na conversa a menina, contou-lhe que o pai, carpinteiro, estava
desempregado e tentava um lugar na obra da Camargo Corrêa. O empresário
disse-lhe que fosse ao canteiro e se apresentasse, em nome de Wilson Quintella.
A senhora com as crianças desembarcaram, e
o empresário nunca mais soube do carpinteiro japonês que precisava de trabalho.
Passaram-se uns 20 anos. Wilson Quintella
havia sido chamado pelo ministro da Fazenda Ernane Galvêas para acompanhá-lo
num voo de Nova York a Tóquio, durante o qual conversariam. Tudo bem, mas
Quintella estava na Venezuela. Tomou um avião para Nova York e foi para o
balcão da Japan Airlines, no aeroporto Kennedy, buscando um lugar no voo de
Galvêas.
O avião estava lotado e havia lista de
espera. Na fila, Quintela deu um cartão de visitas à atendente da Japan
Airlines, para que ela copiasse o nome. Até então, falavam em inglês, mas a
atendente passou a falar em português e disse-lhe:
— O senhor vai embarcar, nem que eu tenha
que tirar o piloto.
Era a menina da carona na estrada de Bauru.
Bolsonaro, Guedes e Noel
Bolsonaro e Paulo Guedes anunciaram um
pacote de medidas destinadas a baixar o preço dos combustíveis. A conta é
simples: A União zera seus impostos e ressarce os Estados que reduzirem seus
tributos.
O plano poderá custar algo entre R$ 25
bilhões e R$ 50 bilhões. Parte desse dinheiro virá da venda da Eletrobras.
Antes de conceber o pacote que vende uma
estatal para baixar o preço do combustível, Bolsonaro e Guedes, ouviam Noel
Rosa cantando “Palpite”:
“Ser
palpiteiro neste mundo é uma sina
Vendeste o carro pra comprar a gasolina.”
De Simonsen@edu para Guedes
Caro Paulo,
Você quer que os supermercados segurem
preços até 2023. Tente outra. Em abril de 1979, eu quis segurar os preços por
60 dias. Perdi meu tempo e em agosto deixei o ministério.
Quando me despedi do presidente João Figueiredo,
ele me perguntou:
Mário, você acha que o meu governo está uma
merda, não?
Respondi: Presidente, eu estou indo
embora...
A inflação fechou o ano em 77%. Eu estava
no Leblon.
Um abraço,
Mário Henrique
Saúde na Justiça
As guildas dos planos de saúde reclamam do
que chamam de “judicialização” de suas atividades. Em 2021, só no Tribunal de
Justiça de São Paulo foram julgadas 16.286 ações da freguesia contra as
operadoras. A Justiça deu razão aos fregueses em 81% dos casos.
Quem tem advogado se protege. Quem não tem
(o andar de baixo), rala.
Desse jeito, falta pouco para que as famílias precisem comprar planos casados. Num, compram serviços médicos; noutro, garantem-se com um advogado.
O crime organizado tomou a Amazônia de assalto,já que o poder público é tão desorganizado.
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