O Estado de S. Paulo
Uma brigada jurídica para combater as fake news é essencial em ano eleitoral
Uma pesquisa mostrou que a média de QI vem
caindo na França. O grupo extremista português O Bom Europeu usou essa notícia
real para cunhar uma fake news racista, xenófoba e ultrajante: a média estaria
sendo puxada para baixo por imigrantes africanos. Segundo o sociólogo político
Gabriel Guimarães, estudioso do fenômeno, O Bom Europeu se inspira em Jared
Taylor, guru da extrema direita americana. Banido do Facebook, o grupo foi
parar no Telegram – que, no Velho Continente, tornou-se latrina de fake news e
discursos de ódio.
Como lidar juridicamente com os que espalham mentiras nas redes sociais? A era digital criou desafios para o mundo do Direito, e alguns desses desafios serão discutidos no Fórum Jurídico de Lisboa, que começa na segunda-feira 27. “É preciso enfrentar essas questões e, ao mesmo tempo, manter a liberdade e a vitalidade da internet”, diz o ministro Gilmar Mendes, um dos participantes do fórum. Ele é o entrevistado no minipodcast da semana.
O debate sobre o direito digital vem
avançando na Europa, puxado pela Alemanha, país onde as plataformas digitais já
são responsabilizadas pelos conteúdos que publicam. Na área da desinformação,
infelizmente, o Brasil ainda está bastante atrasado. O Marco Civil aprovado em
2014 ficou obsoleto diante da evolução tecnológica.
“No Brasil, a plataforma digital só é
responsabilizada após descumprimento de decisão judicial – e a Justiça, como
sabemos, é lenta”, diz Ricardo Campos, professor da Universidade Goethe, de
Frankfurt, e um dos maiores especialistas brasileiros na área. “A lei alemã
(Netzdg) e o novo regulamento europeu Digital Services Act (DSA) preveem
mecanismos mais modernos e eficientes para o combate de discurso de ódio e fake
news.”
Os desafios do Direito na era digital se
estendem também à proteção de dados, de maneira, por exemplo, a evitar a
discriminação dos cidadãos. Ricardo Campos cita um caso hipotético em que
convênios médicos rejeitariam pacientes ao ter acesso indiscriminado a seus
prontuários – que são informações privadas. Nesta área, felizmente, o Brasil
está mais avançado. O regulamento europeu que entrou em vigor em 2018 inspirou
fortemente a lei brasileira de 2019.
A programação do Fórum Jurídico de Lisboa
terá vários brasileiros, incluindo cinco integrantes do Supremo Tribunal
Federal. Além de Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski,
André Mendonça e Alexandre de Moraes. Que das discussões resulte uma brigada
jurídica para combater as fake news – essencial para que, em ano eleitoral, os
brasileiros decidam com base em informações e não em mentiras.
*Escritor, professor da Faap e doutorando
em ciência política na Universidade de Lisboa
O telegram virou curral da extrema-direita.
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