Folha de S. Paulo
Nos anos 70, proibir o aborto não era pauta protestante nem do Partido Republicano
A Suprema Corte dos EUA revogou a decisão
Roe vs Wade, de 1973, que garantia o
direito ao aborto. Onze estados já baniram a prática, inclusive em
casos de estupro, incesto e nos quais a gravidez coloca em risco a saúde da
mulher. Estima-se que mais estados integrarão essa lista.
A decisão de 1973 se baseou na 14ª emenda da Constituição, que proíbe governos estaduais de privar pessoas da vida, liberdade ou propriedade sem um procedimento legal justo. Segundo a Corte, leis como a do estado do Texas, que permitiam aborto apenas se a vida da gestante estivesse em risco, violavam a liberdade de escolha das mulheres sobre uma questão de foro íntimo.
Cinco dos juízes que formaram a maioria
em Roe vs Wade foram
indicados por presidentes republicanos. O presidente da corte era um
republicano defensor da legalização do aborto. O aborto era uma questão
católica, não protestante. Em 1973, o evangélico James Dobson, por exemplo,
apontou que a Bíblia nada diz sobre o aborto e que um feto não era um ser
humano completo.
Porém, a partir do final dos anos 70, o
tema do aborto passou a ser usado como discurso unificador da ala religiosa
radical da direita sem prestígio no Partido Republicano. O motivo? O fim de
isenção de impostos para escolas evangélicas que impunham segregação racial.
Como defender abertamente a segregação não era bem visto e poderia dificultar a
adesão de eleitores, a proibição do aborto virou um artifício mais respeitável
para chegar ao poder e impedir avanços dos direitos civis, como o fim da
segregação. O livro "Bad Faith: Race and the Rise of Religious Right"
("má fé: raça e o nascimento da direita religiosa", em tradução
livre), de Randall Balmer, descreve essa história.
A revogação de Roe vs Wade não foi uma
vitória moral, e sim uma vitória política da direita radical construída ao
longo de décadas. Agora, 11 estados têm leis antiaborto similares às do
Afeganistão e do Irã, países teocráticos que subjugam mulheres. Será difícil
para os EUA manterem a imagem de maior democracia liberal do mundo assim.
Na minha concepção,tanto o embrião quanto o feto já é uma vida.
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