Editoriais
O PIB de 2023
Folha de S. Paulo
Economia não surpreende no 1º trimestre;
cumpre evitar estagnação no próximo ano
O comentário mais comum sobre o desempenho
da economia no primeiro trimestre notou que o resultado
do Produto Interno Bruto foi melhor do que o esperado no início
do ano, mas que é provável uma contração no segundo semestre. Ademais, as
primeiras previsões para 2023 são de estagnação.
Entre a discreta melhora e as estimativas
pouco animadoras se interpõe o efeito mais relevante da alta das taxas de
juros, além do fim dos aumentos transitórios de renda e do processo de
normalização da atividade do setor de serviços.
Foi apenas na passagem de 2021 para 2022
que os juros chegaram a um nível que deve ter efeitos de contenção da atividade
econômica. O impacto do aperto monetário deve ser mais sentido a partir da
segunda metade deste ano.
A recuperação expressiva do nível de
emprego contribuiu para o bom resultado do consumo das famílias. Entretanto a
média dos salários continua no pior patamar da década —em boa parte por causa
da inflação, que permanecerá muito alta, além dos 10% ao ano, até o terceiro
trimestre ao menos.
Também em meados do ano devem se exaurir os aumentos de renda derivados do saque parcial do FGTS e da antecipação do 13º pagamento de benefícios do INSS. O setor de serviços, que contribuiu de modo importante para o crescimento de 1% do PIB entre janeiro e março, deve perder ímpeto depois da recuperação propiciada pelo fim das restrições maiores impostas pela epidemia.
Aumentos salariais em estados e municípios,
além de reduções de impostos, devem dar o alento restante e cadente para a
economia neste segundo trimestre, que até aqui apresenta bons indicadores de
atividade e confiança.
Antes mesmo dos ventos frios do próximo
semestre, no entanto, nota-se que o investimento teve queda significativa já
nos três meses iniciais. É improvável que o indicador possa se recuperar em
ambiente de crédito mais caro, previsões baixistas de crescimento, incerteza
eleitoral e expectativas nebulosas para a economia global.
O ainda bom desempenho do PIB mundial e a
alta do preço das commodities contribuiu para o avanço brasileiro no início do
ano. As exportações cresceram e as importações diminuíram —no caso, também um
sinal de economia com demanda reduzida e dificuldades de importar, dada a crise
internacional de abastecimento.
Em suma, a economia parecia recuperar o
ritmo observado entre 2017 e 2019. A crise inflacionária tende a interromper a
volta a essa normalidade menos que medíocre.
Talvez ainda seja possível evitar a estagnação
de 2023. Em parte, essa hipótese depende do nível de sensatez dos candidatos e
de quem vier a ser eleito em outubro. Um governo racional teria de dar início,
ainda neste ano, a um programa reformista e de pacificação. Mais que o PIB
deste 2022, essa é a discussão econômica crucial.
Ameaças eleitorais
Folha de S. Paulo
Tensão política leva PF a adotar plano para
proteger os candidatos a presidente
A campanha eleitoral nem começou, mas o
cenário de tensão política já provoca notícias incômodas acerca do pleito de
outubro.
Na terça-feira (31), a Polícia Federal
apresentou um esquema de
proteção inédito para os candidatos à Presidência da República.
Entre outros pontos, planeja-se criar um grupo de inteligência e definir uma
metodologia para identificar riscos a cada um dos postulantes.
Reportagem desta Folha mostrou
como a preocupação com a segurança tem levado o PT a adaptar as agendas do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Uma semana antes, soube-se que uma palestra
a ser realizada em Bento Gonçalves (RS) foi cancelada porque, após pressão de
bolsonaristas, a organização do evento passou a temer pela segurança do
conferencista —ninguém menos que Luiz Fux,
presidente do STF (Supremo Tribunal Federal).
O pano de fundo comum aos episódios é a
polarização entre Lula e o presidente Jair Bolsonaro (PL). Os dois, segundo o
mais recente Datafolha, mantêm folgada distância dos demais competidores.
Sozinha, contudo, essa variável não explica
muito. Diversas disputas presidenciais entre o PT e o PSDB começaram e
terminaram sem que o nível de preocupação com a truculência de manifestantes
chegasse aos patamares atuais.
O que mudou? Para a PF, ao menos dois
elementos são novos: o histórico do pleito de 2018, quando Bolsonaro levou uma
facada, e a ampla disseminação das redes sociais, que não só ampliam os canais
de mobilização como estimulam um clima de hostilidade.
A agressividade que o próprio presidente da
República alimenta contra instituições poderia ser acrescentada a essa equação.
Não se pode menosprezar o retrocesso
representado por esse clima de violência. Ele ameaça uma grande qualidade da
democracia, que é permitir disputas pelo poder e resolvê-las de forma pacífica.
Se há uma boa notícia nesse quadro é que a
PF se mostra disposta a agir. Espera-se que ela e todas as forças de segurança
cumpram o compromisso constitucional de preservar a ordem pública e a
incolumidade das pessoas e do patrimônio, mantendo-se distantes das paixões
políticas.
PIB confirma desalento da economia
O Globo
Os resultados do PIB do primeiro trimestre corroboram o
desalento que se abate sobre a economia brasileira no final do governo Jair
Bolsonaro. É certo que o Brasil continua a crescer, mas a mistura de incerteza
eleitoral, inflação, petróleo em alta e um cenário global em desalinho revela o
custo elevadíssimo a que o país está sujeito pela dificuldade em enfrentar os
problemas que impedem um crescimento mais robusto — os mesmos que o assombram
há décadas.
Na ponta do lápis, a atividade econômica
está 1,7% abaixo do ponto mais alto já registrado, no primeiro trimestre de
2014. Isso significa basicamente oito anos sem engatar um ritmo minimamente
aceitável de crescimento, período em que a população aumentou, e o mundo não
ficou parado. O retorno da inflação a um patamar superior a 10% só contribuiu para
tornar o brasileiro ainda mais pobre. É essa a realidade visível nas ruas das
nossas cidades.
Quem olha a curva do PIB acumulado em
quatro trimestres observa nitidamente que o número registrado em março (4,7%)
parece representar o pico da recuperação pós-pandemia. Sinais de esgotamento foram
captados em diversos setores: agropecuária, indústria de máquinas e aparelhos
elétricos, metal, plásticos, borrachas, móveis ou farmacêuticos. O ímpeto
positivo que manteve o crescimento veio do setor de serviços, com a retomada
das atividades presenciais. Obviamente é algo que não se repetirá — e nada
significa em termos de perspectivas.
Talvez o dado mais preocupante seja a queda
na taxa de investimentos, de 19,7% do PIB para 18,7% — quando o mínimo
necessário para o país recuperar infraestrutura e competitividade está em torno
de 25%. Jamais atingimos esse ponto, mas a recuperação que se desenhava desde o
terceiro trimestre de 2020 se inverteu, em razão da incerteza política e do
ambiente cronicamente inóspito para negócios.
Seria fácil e confortável atribuir a
Bolsonaro toda a responsabilidade pelos resultados decepcionantes. Ele
certamente haverá de pagar o preço nas urnas, já que inflação e economia são
apontadas como principais preocupações do eleitorado. Seria fácil e
confortável, mas injusto. Apesar da tentativa descabida de intervir na
Petrobras e nos mercados de energia, Bolsonaro não é culpado pelo choque do
petróleo, pela desaceleração global ou pela inflação externa. Tudo isso é
resultado do conflito na Ucrânia, da queda da demanda chinesa e do choque
logístico provocado pela pandemia. Sua responsabilidade não é muito distinta da
que cabe a vários antecessores: ele foi incapaz de promover uma agenda que
tornasse o Brasil um país acolhedor para investimentos e de tornar nossa
economia mais vibrante e inovadora.
É uma agenda que todos conhecem de cor.
Inclui privatizações, reformas tributária e administrativa, desburocratização e
modernização das relações trabalhistas. Também inclui investimentos em educação
básica, produção de conhecimento científico e tecnologia. Inclui, por fim, uma
visão estratégica capaz de entender as vantagens comparativas do Brasil — entre
elas, preservação ambiental e agronegócio — e de promover uma inserção
inteligente do país num cenário global desafiador. Em 2018, Bolsonaro enganou
muita gente com um programa de governo que prometia fazer deslanchar parte
dessa agenda e, uma vez no poder, fez muito pouco ou retrocedeu. Em 2022, não
engana mais ninguém.
Governo faz bem em tentar promover novos
leilões de aeroportos em agosto
O Globo
Enfim saiu a esperada autorização do
Tribunal de Contas da União (TCU) para a concessão do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, e outros 14
menores espalhados por diferentes estados. A data dos leilões está
agora prevista para agosto. No mesmo bloco de Congonhas, estão aeroportos em
Mato Grosso do Sul (Campo Grande, Ponta Porã e Corumbá), Minas Gerais
(Uberlândia, Uberaba e Montes Claros) e Pará (Santarém, Marabá, Altamira e
Carajás). Jacarepaguá (RJ) e Campo de Marte, na capital paulista, formam um
segundo bloco. Belém e Macapá, um terceiro.
A expectativa do governo é que haja
investimentos superiores a R$ 7 bilhões nos terminais ao longo de três décadas,
sem contar os ganhos de produtividade e qualidade de serviço para os
passageiros. O modelo que une um aeroporto grande e lucrativo a outros menores
— e, em muitos casos, deficitários — parece acertado ao incentivar
investimentos fora das grandes capitais.
Congonhas é o último dos maiores aeroportos
do país ainda nas mãos da Infraero. Por lá embarcaram 11 milhões de passageiros
em 2019, último ano antes da pandemia — mais que a soma do Santos Dumont e do
Tom Jobim para voos domésticos. O terminal paulistano responde por 11% das
decolagens desse mercado, atrás apenas de Guarulhos (13%), também em São Paulo,
e à frente de Brasília (7%), o terceiro colocado. Por isso a tendência é que o
bloco de Congonhas atraia mais interessados. O lance mínimo para a outorga é R$
255 milhões, e os investimentos obrigatórios somam R$ 5,9 bilhões.
A vocação do bloco que reúne Jacarepaguá e
Campo de Marte é a aviação executiva. Com lance mínimo de R$ 138 milhões e
investimento de R$ 560 milhões, é um leilão em que a possibilidade de
exploração imobiliária oferecida aos concessionários também serve como
atrativo. Para os aeroportos de Belém e Macapá, os valores mínimos são R$ 57
milhões pela outorga e R$ 875 milhões de investimento.
O Santos Dumont, no Rio, ficou fora dessa
rodada para que faça parte de um outro leilão, levando em conta a
complementaridade com o Tom Jobim/Galeão, cuja concessão foi devolvida. Ambos
deverão ser leiloados conjuntamente. O governo já perdeu tempo demais com o
modelo equivocado que incentivava uma competição fratricida entre os dois por
voos internacionais, resultando em prejuízos ao estado e à cidade. Felizmente
mudou de ideia. O fundamental, agora, é que a nova licitação também seja
acelerada.
O programa de privatizações do governo
ainda está muito aquém do prometido, por isso mesmo é preciso andar rápido.
Para conceder mais aeroportos à iniciativa privada antes das eleições, o
governo federal luta contra o tempo. A expectativa é que a Agência Nacional de
Aviação Civil (Anac) aprove o edital na semana que vem. Aeroportos privatizados
já demonstraram que o saldo é positivo para os passageiros.
É isto um democrata?
O Estado de S. Paulo
Lula pretende se apresentar como ‘salvador da democracia’ no País, mas sua natureza autoritária seimpõe, ao debochar do PSDB e da inteligência do eleitor
Há poucos dias, diante de simpatizantes
reunidos em um teatro da capital paulista, o ex-presidente Lula da Silva
decretou o fim do PSDB, com ar de deboche. “Um senador do PFL disse uma vez que
era preciso acabar com a ‘desgraça do PT’, o Jorge Bornhausen. O PFL acabou.
Agora, quem acabou foi o PSDB”, disse o eterno candidato petista à Presidência.
Eis aí a natureza de Lula em seu esplendor.
O chefão petista diz e repete que pretende ser líder de um amplo movimento
suprapartidário para nada menos que “salvar a democracia”, mas, quando está
entre os seus, deixa claro o que entende por “democracia”: um regime em que o PT
governa sem oposição.
Um genuíno democrata, especialmente quem se
arvora em líder insubstituível de uma formidável “frente ampla” pela
democracia, jamais celebraria o fim de um partido. E não é o fim de um partido
qualquer, mas um que desde sua fundação, em 1988, legou à sociedade brasileira
um vistoso conjunto de conquistas civilizatórias como poucos partidos jamais
farão. O PT de Lula sempre negou todas essas conquistas.
Mais tarde, talvez advertido por assessores
sobre a gravidade dessa agressão gratuita, especialmente no momento em que
tenta atrair o apoio de lideranças tucanas para sua candidatura, Lula tentou
contemporizar, afirmando que o Brasil “era feliz quando a polarização era entre
PT e PSDB”. Segundo o petista, tratava-se de uma relação “civilizada”. Nada
mais distante da realidade.
Quando estiveram na oposição, os petistas
pediram o impeachment do tucano Fernando Henrique Cardoso e sabotaram os
esforços para estabilizar a economia, resumidos no Plano Real. Em São Paulo,
são inesquecíveis as imagens da agressão física cometida por militantes
petistas contra o então governador de São Paulo, Mário Covas, em junho de 2000.
“Eles (os tucanos) têm de apanhar nas ruas e nas urnas”, disse à época o prócer
petista José Dirceu. O Brasil não era feliz e sabia.
Uma vez no poder, Lula inventou que havia
recebido uma “herança maldita” dos governos tucanos, criando um inimigo para
levar a culpa por todos os problemas e, de quebra, excitar a militância petista
contra qualquer forma de oposição. Não há malandragem discursiva capaz de mudar
essa história – que, de resto, está na gênese do esgarçamento das relações
sociais que culminaram com a desmoralização da política como meio de
concertação democrática no Brasil. Triunfou o vale-tudo.
Fosse Lula um candidato nanico, nada disso
teria muita importância. Mas o petista é o líder das pesquisas de intenção de
voto e aparece hoje como favorito para vencer a eleição de outubro, razão pela
qual tudo o que diz sinaliza o que potencialmente está por vir. E a perspectiva
é sombria.
O perigo de uma eventual vitória de Lula
não se manifesta somente nos momentos em que reafirma sua vocação autoritária.
Preocupa igualmente sua visão tacanha de mundo. Em vários momentos, Lula parece
que está disputando a direção de um centro acadêmico, não a Presidência da
República.
Num discurso constrangedor, disse que o
presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, “nunca fez um discurso para dar 1
dólar para quem está morrendo de fome na África” enquanto destina US$ 40
bilhões à Ucrânia para “comprar armas”. Imagine-se o regozijo da militância
petista, para quem os Estados Unidos são o que há de pior no mundo, mas o pior
ainda estava por vir: na sequência, Lula prometeu cancelar a privatização da
Eletrobras e ainda sugeriu que as empresas privadas querem se apropriar não só
da energia, mas “das águas dos nossos rios”.
Num mesmo fôlego, Lula – que se apresenta
ao País como “democrata” e que se pretende “moderno”, em contraste com o atraso
bolsonarista – exercitou o mais retrógrado antiamericanismo, demonstrou
profunda ignorância sobre a agressão criminosa da Rússia contra a Ucrânia,
ameaçou romper contratos de privatização e, de quebra, caracterizou
investidores privados como piratas insaciáveis dos recursos naturais do País.
Esse é o Lula – irredutível demagogo e
incorrigível autoritário – que quer ser visto como o redentor do Brasil.
O prejuízo das obras ‘estruturantes’
O Estado de S. Paulo
Caso da Usina de Santo Antônio mostra como palavras bonitas justificam decisões públicas que, em nome dointeresse nacional, geram pesadas perdas para sociedade
Às vésperas da privatização, a Eletrobras
terá que lidar com um problema que ficou por anos guardado debaixo do tapete.
Furnas, uma de suas principais subsidiárias, será obrigada a fazer um aporte de
mais de R$ 1,5 bilhão na Santo Antônio Energia, concessionária responsável pela
usina de mesmo nome no Rio Madeira. O dinheiro servirá para sanear dívidas
relacionadas à construção do empreendimento, alvo de um processo de arbitragem
movido pelos sócios e perdido pela empresa pública. Com a injeção de recursos,
a participação de Furnas na hidrelétrica subirá de 43% para 70% – ou seja, a
maior parte do capital de Santo Antônio terá origem estatal por alguns dias,
até que a privatização seja concluída.
Esse imbróglio se arrasta desde 2015, mas
os problemas da usina são de origem e remetem a mais um equívoco na condução de
políticas públicas, traço da história brasileira que infelizmente atravessa
governos de distintos campos da disputa política. Em 2007, Santo Antônio foi a
primeira das três grandes hidrelétricas leiloadas com pompa e circunstância durante
a gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; em 2008, foi a vez de
Jirau; e em 2010, de Belo Monte. Com o potencial hidráulico já explorado nas
Regiões Sudeste e Centro-Oeste, o Executivo buscou projetos no Norte para
ampliar o parque gerador e preparar o País para o crescimento econômico que era
esperado para os próximos anos.
Com as usinas, a meta era prover segurança
energética aos investidores privados e afastar qualquer fantasma de
racionamento. Até aí, tudo bem. É função de qualquer governo planejar ações que
tenham efeito de médio e longo prazos, e esse era o caso das três
hidrelétricas. A forma como tudo foi conduzido, no entanto, expõe uma sucessão
de erros. Pelo alto risco inerente aos negócios, não haveria concorrência pelos
projetos. A alternativa foi criar consórcios compostos por subsidiárias da
própria Eletrobras, cuja presença era vista como uma verdadeira garantia, pelos
“patrióticos” fundos de pensão das estatais e por grandes empreiteiras que,
além de sócias, assumiriam a construção das obras, num evidente – mas ignorado
– conflito de interesses.
De fato, os leilões registraram preços de
energia historicamente baixos. O que o governo não explicou, no entanto, foram
todas as manobras artificiais que levaram a esse resultado, desde empréstimos
subsidiados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) à
antecipação de receitas aos sócios antes da conclusão das usinas. Atrasos nas
obras, desafios ambientais e realocação das comunidades afetadas geraram gastos
adicionais. O custo das extensas linhas de transmissão para conectar os
empreendimentos ao Sudeste foi rateado entre os consumidores sem qualquer ônus
para as concessionárias.
Santo Antônio, Jirau e Belo Monte eram
chamadas de usinas “estruturantes”, termo frequentemente adotado para
justificar decisões questionáveis e que desconsideram requisitos econômicos,
técnicos e ambientais. Há quem prefira utilizar a palavra “estratégico” ou “de
interesse nacional” para esse tipo de empreendimento – é o tratamento que a administração
de Jair Bolsonaro dá, por exemplo, à caríssima central Angra 3 e à construção
de termoelétricas em locais onde não há reservas de gás ou gasodutos. Que não
haja engano: ao fim e ao cabo, as expressões significam gastos faraônicos
bancados, quase sempre, pelo bolso do cidadão. O mais recente capítulo do caso
da Santo Antônio Energia figura como exceção – por enquanto, vai sobrar para a
Eletrobras, mas a tentativa de repassar essa conta às faturas de eletricidade
no futuro não pode ser completamente descartada. Em comum a todos esses
projetos está a clássica arrogância de governos populistas que acreditam saber
o que é melhor para o País, prática que induz setores à ineficiência e que
socializa os custos dessas escolhas entre todos, inclusive os mais pobres.
Enquanto isso, o Congresso discute medidas paliativas, como a redução das
alíquotas de ICMS sobre a energia elétrica.
PIB puxado pelo avanço da vacinação
O Estado de S. Paulo
Beneficiado pela vacina e pela relação presencial, o setor de serviços continuou liderando a recuperação da economia
Com avanço de
1% no primeiro trimestre, a economia brasileira cresceu 4,7% em 12 meses,
manteve o ritmo anual de 2021 (4,6%) e continuou pouco acima do padrão anterior
à crise da pandemia, em 2020, quando o Produto Interno Bruto (PIB) recuou 3,6%.
O desempenho da indústria continuou modesto, como tem sido há anos, e a
atividade foi puxada pela recuperação do setor de serviços, o mais atingido
pela pandemia. Graças à vacinação, puderam reanimar-se negócios como viagens,
hotelaria, alimentação e serviços pessoais, dependentes do contato presencial.
Foi uma vitória do bom senso contra os desatinos do presidente Jair Bolsonaro.
Responsável principal pelo atraso da imunização, ele ainda se empenhou na
distribuição de fake news sobre as vacinas contra o coronavírus.
O balanço dos primeiros três meses ficou
dentro das expectativas e, embora positivo, em nada contribui para uma elevação
das projeções econômicas para 2022 e 2023. A produção industrial, 0,1% maior
que a do trimestre final de 2021, foi 1,5% inferior à de um ano antes e cresceu
3,3% em 12 meses, bem menos que a dos serviços (5,8%). Nem sequer se esboçou, nos
últimos três anos e meio, uma política de revitalização e de modernização da
indústria, um setor emperrado na maior parte do último decênio.
Mas a negligência quanto às condições do
crescimento tem sido muito mais ampla. Praticamente nada se tem feito, em
Brasília, para estimular ou mesmo manter o investimento em máquinas,
equipamentos e obras, a chamada formação bruta de capital fixo. No primeiro
trimestre, o valor aplicado nesse conjunto de meios de produção foi 3,5% menor
que o dos três meses precedentes e 7,2% inferior ao de um ano antes. O total
acumulado em quatro trimestres foi 10,1% maior que o dos 12 meses anteriores,
mas a base de comparação inclui grande parte da pior fase da pandemia.
O desastre na área do investimento fica
mais claro quando se examina outro indicador. Entre os primeiros três meses de
2021 e os três primeiros de 2022 a taxa de investimento fixo caiu de 19,7% para
18,7% do PIB. Nos últimos 20 anos a relação raramente superou 20%. Para
sustentar um crescimento econômico anual na faixa de 4% a 5% o País deveria
investir, no entanto, algo próximo de 25% do PIB em meios físicos de produção,
como rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, máquinas, instalações
industriais, sistemas de geração e distribuição de energia e redes de água e
saneamento.
O investimento bancado pelo setor público
quase sumiu há vários anos. Concessões e privatizações seriam a alternativa
mais evidente, mas o poder federal pouco tem avançado nessa área. No setor
privado tem havido algum investimento, mas limitado pela escassez de
financiamento e pela pobreza das perspectivas econômicas, essenciais para a
decisão de investir.
Uma nova etapa de firme crescimento dependerá da instalação de um novo governo em 2023. Mesmo um governo sério gastará boa parte de seu mandato, no entanto, reparando danos e preparando o País para tomar um rumo e avançar.
Queda de investimento limita avanço do PIB
a 1%
Valor Econômico
É muito provável que o avanço do primeiro
trimestre será o maior do ano
O desempenho da economia no primeiro
trimestre de 2022 foi bom: o PIB cresceu 1% em relação ao último trimestre de
2021 e 1,7% ante o primeiro do ano passado. As previsões pessimistas do início
do ano, de pequena expansão ou mesmo recessão não se confirmaram, mas, por
outro lado, a dificuldade em crescer permanece intacta em um resultado que
ainda não reflete aumentos de 10,75 pontos percentuais na taxa básica de juros.
É muito provável que o avanço do primeiro trimestre será o maior do ano. Ao
transmitir impulso maior para os três meses seguintes, o PIB do ano poderá ser
semelhante à média medíocre dos últimos anos, 1,5%.
A expectativa para o segundo trimestre,
segundo pesquisa feita com 82 instituições pelo Valor, é de crescimento de
0,4%. O que acontecerá no segundo semestre explica a gangorra recente das
previsões. Para os analistas, o PIB de 2022 será melhor do que o antevisto, mas
as expectativas para o do próximo ano foram bastante rebaixadas. Fatores
negativos em série podem levar a economia para dois trimestres de retração a
partir de julho.
O PIB cresceu puxado por serviços,
especialmente outros serviços (hotéis, restaurantes etc, com peso de 21,9% no
setor) e transporte, armazenagem e correios. Houve a normalização do setor mais
atingido pela pandemia nos últimos dois anos, após a disseminação das vacinas e
o fim das restrições à mobilidade. Porém grande parte das atividades de
serviços são dependentes da evolução do emprego e dos salários. Enquanto o
primeiro melhora (10,5% no trimestre encerrado em abril), o segundo só piora -
queda de 8% em 12 meses. Não é possível esperar um fôlego maior dos serviços
diante do recuo salarial, que tende a ser acentuado pela própria recomposição
de preços do setor, que caminha para os dois dígitos.
Os mesmos fatores, e outros mais, afetam
negativamente o consumo das famílias, que avançou 0,7% no primeiro trimestre e
2,2% em relação ao mesmo período do ano passado. O consumo depende não só da
renda, mas também da capacidade de saldar ou não compromissos financeiros
assumidos (grau de endividamento e inadimplência) e da oferta de crédito a preço
acessível. O endividamento não é pequeno, a inadimplência não é baixa e os
juros dispararam. Há três trimestres a evolução do consumo é a mesma,
0,8%-0,7%.
O PIB do primeiro trimestre não mostrou uma
composição promissora. A demanda doméstica, na verdade, caiu 0,3%, enquanto que
a do setor externo somou 1,32 ponto percentual do resultado, calcula Alberto
Ramos, diretor de pesquisas para a América Latina do Goldman Sachs. Os
investimentos (Formação Bruta de Capital Fixo) recuaram 3,5%, mesmo com a soma positiva
da variação de estoques (R$ 29,9 bilhões, a maior desde os primeiros três meses
de 2021). O consumo privado aumentou 0,4 ponto.
Não há motivos para esperar uma reação
razoável dos investimentos diante das incertezas conjugadas de eleições
presidenciais, aumento dos juros internos e aperto monetário nos principais
países desenvolvidos. Segundo o BIS, de 38 BCs, mais de 60% passaram a subir
juros entre o fim de 2021 e maio deste ano (Valor, ontem). Incluído o BCE, 80% dos países do
G-20 estão em ciclo de restrição monetária. Com isso, a atividade econômica
global deve desacelerar, com a contribuição importante da China, assim como se tornará
mais difícil financiar investimentos com dívida externa, no caso de países
emergentes.
A desaceleração global pode também suavizar
os preços das commodities, um dos principais impulsos ao crescimento em 2022
(Ricardo Barboza e Bráulio Borges, “O PIB comoditizado”, Valor, 17-5). Além disso, a
interrupção de fornecimentos que abala as cadeias produtivas, tanto pelo choque
da guerra como pelas paradas súbitas no coração industrial do mundo, a China,
ajudam a retardar a tímida recuperação da indústria de transformação no Brasil
(1,4% no primeiro trimestre). O choque climático antes, e agora o aumento de
preços e possível escassez relativa de insumos para a próxima safra agrícola
(especialmente fertilizantes) devem retirar vigor futuro da agropecuária, em
queda há três trimestres consecutivos.
O governo tem dado estímulos eleitorais de
curto prazo, enquanto prepara encrencas de longa duração, como intervenções nos
preços dos combustíveis, que provavelmente se esgotarão antes das eleições.
Seja quem for vencedor, terá de enfrentar sem mágicas o desafio do baixo
crescimento.
É claro que os bolsonaristas são mais agressivos que os lulistas,que não são santos.Nunca esqueço daquele político,o Major Olímpio,que invadiu o palácio dos Bandeirantes pra bater no Doria,o que fizeram com a Joice também é coisa de louco.
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