O Estado de S. Paulo
Para Marcos Mendes, o atual sistema
político-eleitoral é o principal fator por trás do fracasso dessas políticas.
Marcos Mendes é um economista de destaque
entre seus pares e tem recebido merecida atenção da mídia, como neste jornal e
na Folha de
sábado passado, ao lançar outro livro. Tem graduação e mestrado em Economia
pela Universidade de Brasília e doutorado na mesma área pela Universidade de
São Paulo (USP). É consultor legislativo do Senado Federal – cargo obtido por
concurso público –, e tem se afastado para exercer outras atividades da sua
área de interesse, finanças públicas. Em 2016, no governo Temer, tornou-se
assessor especial do ministro da Fazenda.
Seu livro mais conhecido é Por que é difícil fazer reformas econômicas no
Brasil? (Elsevier, 2019). Adotei-o como livro-texto do curso
de Economia Brasileira que atualmente leciono na USP. Fui atraído pela pergunta
que intitula o livro, pois sei dessa dificuldade, procurando entendê-la e
buscar soluções, conforme se depreende de artigos meus neste espaço.
O livro começa examinando a dificuldade de que trata seu título, inclusive internacionalmente, ao abordar exemplos de vários países, como Índia e México. Dedica um capítulo à coesão social, cuja ausência dificulta o processo de reforma, no que examina o caso da Austrália.
Ensina que “(...) a maior propensão a fazer
reformas liberalizantes, voltada à estabilidade fiscal e aumento da
produtividade, ocorre em países que: são pequenos; fizeram reformas antes da
abertura política; estão num dos extremos da escala de democracia – plenamente
democráticos ou autoritários –; têm sistemas político-eleitorais que facilitam
a formação de maiorias no Parlamento; têm clara delimitação e separação dos
Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo; são países com governos unitários;
têm Constituições pouco detalhistas ou facilmente alteráveis; são vizinhos de
outros países que foram bem-sucedidos na promoção de reformas; têm oportunidade
de aderir a blocos econômicos com países vizinhos que tenham economias maiores
e mais desenvolvidas; e têm elevado nível de coesão social, representado por
baixa desigualdade de renda e baixos índices de violência, que levam a alto
nível de confiança mútua. O Brasil não possui essas características”.
Contudo, Mendes não desiste e busca o
enfrentamento dos difíceis problemas. Ressalta que “(...) precisamos estar
preparados para mais de duas décadas de debates e resistência ao novo (...),
não sendo uma corrida de 100 metros, e mais uma maratona”. Dedica um capítulo à
dificuldade para fazer reformas no Brasil e o capítulo final, com o
título O que fazer, tem
20 seções temáticas que se desdobram num grande número de propostas
específicas.
No novo livro, Para não esquecer: políticas públicas que
empobrecem o Brasil, que ainda não li, Mendes organizou uma
coletânea em que especialistas discutem políticas que fracassaram. Na
entrevista a este jornal, citada no início deste meu artigo, indagado sobre o
principal fator por trás da baixa qualidade das políticas públicas, apontou o
sistema político-eleitoral que gera representação muito fragmentada, com muitos
partidos que, de sua parte, também têm interesses muito pulverizados. E, muitas
vezes, os parlamentares respondem mais ao interesse de grupos específicos –
quando não ao próprio interesse, acrescento – do que ao de uma programação
político-partidária.
No momento, por exemplo, estão focados na
sua reeleição ou na eleição de outros, recorrendo, inclusive, a mecanismos
espúrios, como as emendas de relator, que cevam clientelas políticas municipais
em troca de votos. Essas emendas constituem um financiamento indireto de
campanhas eleitorais, beneficiando desigualmente os incumbentes, e estes sendo
também beneficiados relativamente a candidatos sem mandato, embora a
Constituição, no seu artigo 5.º, estabeleça que todos são iguais perante a lei.
Mas o que ocorre é um show de desigualdades mediante essas emendas.
Em que pese a fragmentação política, Mendes
argumentou, no primeiro livro citado, que uma reforma política não seria a “mãe
de todas as reformas”. Após examinar as dificuldades de uma reforma rápida desse
tipo, propôs uma gradual e citou a dos regimentos internos da Câmara e do
Senado Federal, elaborados à época do regime militar, com seu sistema
bipartidário. E argumentou que: “Sua extensão para o contexto multipartidário
(...) torna a tramitação dos projetos morosa e muito sujeita a chicanas e
obstruções excessivas”. Em conversa recente, contudo, ele disse que os
regimentos foram revistos, infelizmente com maus resultados, pois o Centrão os
tornou mais expeditos para passar suas boiadas, também impulsionadas pelas
sessões remotas trazidas pela pandemia de covid.
Mas ao menos uma obstrução ainda ocorre
pela prerrogativa que o presidente da Câmara tem de decidir isoladamente sobre
o andamento de pedidos de impeachment do presidente da República. Soube que há
muitos pedidos desse tipo, mas ele não coloca o assunto em discussão. É um
presente do Centrão ao presidente da República. E que custa muito caro para o
País.
*Economista (UFMG, USP E HARVARD), é
consultor econômico e de ensino superior
Sugiro ao Marcos Mendes ler o artigo "a mãe de todas as reformas" no blog Democracia e Socialismo
ResponderExcluirO impeachment não passaria no congresso e bolsonaro e bolsonaristas ficariam piores ainda.
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