O Globo
As similaridades entre Hugo Chávez e Jair
Bolsonaro vão além do estilo populista e nacionalista demonstrado por ambos
Você provavelmente já ouviu o termo “bolsochavismo”
antes. Mas, antes que você feche as portas para essa ideia, eu peço alguns
minutos de sua atenção. Esta coluna busca entender se o silogismo faz sentido.
À primeira vista, uma comparação entre Hugo
Chávez e Jair Bolsonaro pode parecer esdrúxula. Chávez entrou para história
como um líder de esquerda, que se dizia marxista e levou adiante o “socialismo
do Século XXI”. Já Bolsonaro parece ser o oposto de tudo isso: alguém de
direita e antissocialista.
Claramente, Bolsonaro e Chávez não são iguais em seus ideários. Contudo, há consonâncias em seus métodos de governo, histórias pessoais e estilo de fazer política.
De partida, tanto Bolsonaro quanto Chávez
são militares e começaram suas carreiras políticas dentro do exército.
O capitão do exército brasileiro formou-se
em Agulhas Negras durante a ditadura brasileira e teve como seu primeiro ato
político a escrita de um manifesto por melhores salários dos militares. Logo
depois, planejou a operação Beco Sem Saída, em que supostamente arquitetou
plantar bombas em quartéis como protesto contra os baixos salários.
O tenente-coronel do exército venezuelano
formou-se na Academia Militar de lá. Dentro do Exército, criaria o Movimento
Bolivariano Revolucionário 200, que arquitetaria um golpe de estado frustrado
contra a democracia venezuelana, em 1992.
A cooptação das Forças Armadas dos
respectivos países é algo que tanto Bolsonaro quanto Chávez buscaram enquanto
presidentes.
O chavismo aumentou em muito o orçamento
das Forças Armadas. Os militares com maior proximidade ao governo faziam parte
de uma elite conhecida como “boliburgueses”, com acesso ao dólar pelo câmbio
oficial, muito subvalorizado, e que por isso desfrutavam de uma qualidade de
vida pouco acessível para o venezuelano comum.
O bolsonarismo também deu privilégios aos
militares. Além de retirar a categoria dos ajustes da Reforma da Previdência,
que atingiu todos os outros funcionários públicos, o governo federal aumentou
os salários de militares e policiais federais.
Como já mostrado nestas páginas (“Funcionalismo
na década perdida”), estas carreiras foram uma das poucas com ganhos reais
de salário na última década.
Um terceiro paralelo entre os dois regimes
é o esforço para armar seus partidários.
No Brasil, o número de registro de armas
subiu quase 600% desde o começo do governo Bolsonaro. Esse aumento se dá sob o
pano de fundo de episódios de violência política banalizada, como o caso do
bolsonarista que matou um petista que celebrava seu aniversário com a temática
homenageando Lula. É difícil não conjecturar uma possível relação entre os
fenômenos.
Na Venezuela, o governo criou uma “milícia
bolivariana” como nova Força Armada que, segundo dados oficiais, tem 2 milhões
de recrutas da reserva e o objetivo ideológico explícito de defender a
“revolução bolivariana”. Parte desses milicianos, armada pelo governo, foi
conclamada às ruas quando dos conflitos entre oposição e governo e praticou
atos de violência política.
Outro aspecto de similitude é o de violação
do espírito das leis por artifícios formais. Muitas vezes não é preciso sequer
mudar a lei para mudar a prática: basta mudar as regras não escritas.
Um exemplo ocorrido sob o chavismo é a
utilização do Banco Central para financiar gastos do governo. A Lei que rege o
funcionamento do BC venezuelano proíbe a impressão monetária para financiamento
do Orçamento — como tentativa de colocar limites à inflação. O governo, então,
burlava a lei usando o BC para financiar a empresa estatal de petróleo e
utilizando esta para gastos sociais.
No Brasil, este ano, o governo federal
utilizou o instrumento que previa o decreto de estado de emergência para burlar
as regras de gasto em ano eleitoral. Embora não haja mais emergência, governo e
Congresso se uniram para decretar um falso estado de emergência e suspender
todos os limites de gasto público antes de uma eleição, como relatado nesta
coluna há algumas semanas (“O
país tornou-se uma grande Sucupira”).
Como visto, as primeiras impressões
realmente enganam. As similaridades entre Chávez e Bolsonaro vão além do estilo
populista e nacionalista, como demonstram os exemplos citados aqui, que não são
exaustivos. Levando a comparação a sério, fica claro que, embora Chávez e
Bolsonaro não sejam iguais, Bolsochavismo não é uma contradição em termos.
Pelo menos o Chaves era engraçado.
ResponderExcluirBolsonaro está venezuelizando o Brasil... Isto depois de ter acusado o PT de pretender fazer o mesmo na última campanha presidencial. Seguia a máxima: Acuse seus adversários por aquilo que você mesmo está fazendo!
ResponderExcluir''O Chaves era engraçado'',qual Chaves?
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