Folha de S. Paulo
Isso foi o que o Senado fez e é o que a
Câmara está sendo ativada por seu presidente, Arthur Lira
Descaracterizar o texto constitucional para
favorecer o candidato Jair
Bolsonaro com o direito de gastar, nos 90 dias anteriores à eleição,
dezenas ou centenas de bilhões a pretexto de benefícios sociais é, em sua
escancarada imoralidade, ladroagem eleitoral. Foi
o que o Senado fez.
É o que a Câmara está sendo ativada por seu
presidente, Arthur Lira, para fazer nesta semana.
É injustificável e vergonhoso que a
oposição, incluída a chamada esquerda, tenha votado e vote outra vez a
favor desse
golpe parlamentar-eleitoral, que cria até o perigoso estado de emergência.
A alegação oposicionista, de que não poderia opor-se aos auxílios sociais
infiltrados nessa mudança constitucional, é oportunista ou, em eventual
sinceridade, obtusa. A mistura ardilosa e má-fé são explícitas.
O preço da cesta básica está maior do que o
salário mínimo porque, entre suas causas, o aumento dos combustíveis foi logo
repassado aos preços do transporte de carga. E R$ 1.000 de vale-caminhoneiro
nada soluciona. O vale-gás proposto é engodo duplo.
Um botijão de 13 kg para a família por dois
meses é ridículo e encobre a falta de verificação governamental da relação
custo/lucro do botijão de gás para as distribuidoras.
Esses dois exemplos servem
para outras verbas do pacote, como os R$
200 a mais no Bolsa Família rebatizado e piorado com o abandono da
condicionante ao número de filhos.
Há meses o governo vinha falando nos
auxílios agora encaminhados e que então prescindiam de ataque à Constituição e
ao Código Eleitoral.
Bastaria racionalizá-los e dar-lhes as verbas de gastos patifes e mesmo criminais, como o corrupto orçamento secreto.
A protelação transitou sob a vadiagem da
oposição, há muito desinteressada de ações públicas e a histórica indiferença
social da chamada mídia. Ao custo de piores dificuldades de vida para a maioria
da população, Bolsonaro e Paulo Guedes empurraram o auxílio segundo a
conveniência eleitoral. Auxílio Social que, a rigor, deve se chamar Auxílio a
Bolsonaro.
Esse arrombamento dos cuidados eleitorais
da Constituição e da legislação é infernal: ou Bolsonaro vence ou trava o
governo do sucessor.
Com o também proposto "orçamento
impositivo" que se junta ao orçamento secreto, obrigando o futuro governo
a exaurir-se em gastos determinados por parlamentares ou com as obrigações
financeiras que Bolsonaro crie nos três meses da campanha.
As carências sociais atingidas pela
pandemia e, agora, pela guerra ucraniana agravaram-se mais no Brasil do que em
grande parte do mundo. Mesmo em nossa vizinhança. Mas as necessidades pedem o
encaminhamento de soluções, não paliativos espertos e efêmeros, que logo
tornarão a pobreza mais pobre, a fome mais desesperante.
Com soluções, Bolsonaro, Paulo Guedes e
os militares influentes não consumiram nem um minuto sequer. Mas a desgraça
social não pode servir para ardis e êxito dos que a tornam sempre maior.
Bolsonarista ou oposicionista, quem votou
no Senado e quem votar na Câmara pela emenda que derruba a proibição de gastos
eleitoreiros nos 90 dias antes da eleição —fundamento das regras anticorrupção
eleitoral—, não está dando um voto.
Está contribuindo para a permanência dos
assediadores de mulheres, a já prometida liberação geral do porte
de arma, as milícias, o desmatamento e as extrações ilegais da Amazônia, o
garimpo e o contrabando, os cortes de verbas da saúde e da educação, a
repressão à cultura, os privilégios a militares e policiais, o racismo e
variadas fobias desumanas.
E o ódio às mulheres, esse sentimento —para
dizer o mínimo, muito esquisito— que Bolsonaro representa tão bem na convicção
de que gerar a filha foi, por ser mulher, uma fraquejada sua.
Tão amigos.
Aos que não pude levar agradecimentos diretos, vai aqui minha gratidão por suas delicadezas no meu indelicado nonagésimo ano. Com franqueza, foram comoventes.
Falou o decano da nossa imprensa.
ResponderExcluirMillôr reclamava porque o único povo do mundo que produzia "sábios" era o povo chinês. Ele não conheceu o Jânio de Freitas aos 90: um sábio brasileiro!
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