Editoriais
Ministério da Defesa não é fiscal de
eleições
O Globo
Tentativa de usurpar atribuição do TSE é
inconstitucional e corrói credibilidade das Forças Armadas
As Forças Armadas têm um papel essencial
nas eleições: auxiliar no transporte das urnas e garantir a segurança da
votação em certas áreas. Não devem ser toleradas pela sociedade, portanto, as
tentativas de extrapolar essas funções, semeando dúvidas falsas sobre a
segurança do sistema eleitoral, muito menos pondo em prática qualquer plano de
fiscalização paralela do resultado das urnas. A Constituição cita o Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) — e apenas ele — como órgão máximo da Justiça
Eleitoral. Também subordina as Forças Armadas aos demais Poderes da República e
não lhes confere nenhuma atribuição de fiscalizar ou tutelar os demais.
Em 2021, as Forças Armadas foram convidadas
pelo TSE a participar da Comissão de Transparência das Eleições (CTE). Também
foram chamados representantes do Tribunal de Contas da União (TCU), da Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB), da Polícia Federal (PF) e representantes de
universidades e da sociedade civil. A iniciativa, tomada de boa-fé diante das
insinuações infundadas plantadas pelo presidente Jair Bolsonaro a respeito do
sistema de votação, foi infelizmente desvirtuada. O representante do Ministério
da Defesa usou a oportunidade para apresentar dúvidas de toda ordem — várias
sem cabimento —, recebeu respostas detalhadas e, mesmo sem apontar nenhum
indício de fraude, o ministério continua a semear confusão em torno de um
sistema reconhecido no mundo todo pela eficácia e credibilidade.
Em audiência recente na Câmara, o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, disse ter um plano de ação para as eleições e sugeriu uma auditoria posterior no resultado. Para tentar pôr em prática uma fiscalização própria, os militares solicitaram novas informações técnicas ao TSE. Na audiência, Nogueira insistiu em dar “melhores condições de auditabilidade” ao processo eleitoral e reclamou de dificuldades para conversar com o TSE. Na prática, tem agido como se quisesse preparar a tal “apuração paralela” aventada por Bolsonaro para pôr em xeque a credibilidade do TSE. Nada disso, é óbvio, faz sentido algum.
Não é papel do ministro da Defesa, seja
quem for, usurpar a missão da Corte Eleitoral. A CTE foi criada para ouvir
sugestões, que poderiam ser acatadas ou refutadas de acordo com sua relevância
ou viabilidade. Não cabe ao Ministério da Defesa decidir. Assim como não
caberia a PF, OAB ou TCU se tivessem o mesmo comportamento ou opinião.
É inegável que os militares conhecem e
respeitam seu papel na democracia brasileira. Aeronáutica, Exército e Marinha
têm um vasto histórico de vitórias e feitos notáveis. Por vezes assumem funções
além da defesa, como a formação de jovens de todos os cantos do país, o auxílio
a comunidades distantes dos grandes centros ou pesquisas em áreas de alta
tecnologia.
As Forças Armadas são uma das principais
instituições da República, mas, como todas as demais, sua ação é limitada pelo
texto constitucional. Construíram arduamente por décadas uma relação de
respeito e credibilidade com a sociedade. É inaceitável que tal vínculo seja
abalado pela adesão de alguns de seus integrantes a teorias conspiratórias
sobre as urnas eletrônicas.
Inadimplência recorde põe em xeque
ampliação do crédito consignado
O Globo
Empréstimos a beneficiários do Auxílio
Brasil poderão aumentar o endividamento das famílias
Em mais uma iniciativa do pacote de
bondades para alavancar a popularidade do presidente Jair Bolsonaro a menos de
três meses das eleições, o Senado aprovou na semana passada uma Medida
Provisória que libera o crédito consignado a beneficiários de programas sociais
do governo, como Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família) e Benefício de Prestação
Continuada (BPC). Ficou patente a correria para aprovar a medida antes das
eleições. A votação não estava na pauta, mas foi incluída às pressas a pedido
do relator, senador Davi Alcolumbre (União-AP).
Com a medida, já aprovada na Câmara e à
espera de sanção presidencial, os beneficiários dos programas poderão autorizar
a União a descontar de seus benefícios o valor das parcelas de empréstimos e
financiamentos. A MP também aumenta de 35% para 40% o percentual da renda que
pode ser comprometido para empregados com carteira assinada, servidores
públicos, pensionistas e militares.
O argumento do governo é facilitar o
crédito às famílias pobres, obrigadas a recorrer a fontes informais, geralmente
mais caras. Há um erro conceitual aí. Um programa social como o Auxílio Brasil
se destina a famílias de baixa renda com carências básicas. Na realidade, o
governo está apenas criando uma quimera para beneficiários e instituições
financeiras. Os programas sociais mal têm preenchido a necessidade de quem os
recebe, pressionada pela inflação em alta. Para a maioria dos contemplados,
tomar empréstimos significará comprometer parte da renda já sem folga — e ficar
devendo dinheiro acrescido de juros que só têm subido.
No mundo real, as famílias brasileiras já
estão por demais endividadas. Pesquisa do
Serasa Experian de Inadimplência do Consumidor divulgada nesta semana mostrou
que, desde o início do levantamento em 2016, nunca houve tantos brasileiros com
dívidas atrasadas: quase 67 milhões, ou 31% da população. Só neste ano 4
milhões se tornaram incapazes de tomar crédito no mercado.
As dívidas estão distribuídas pelos
segmentos de bancos e cartões (28,2%), contas como água, luz e gás (22,7%),
varejo e financeiras (12,5% cada), serviços (10,8%) e telefonia (7,1%). Os
idosos inadimplentes cresceram de 10,6 milhões para 11,5 milhões. É uma
situação esperada diante de um cenário de pandemia, desemprego, crise econômica
e inflação alta, que não deverá mudar, ao menos no curto prazo.
O governo argumenta que o acesso facilitado
ao crédito poderá representar injeção da ordem de R$ 77 bilhões na economia.
Servirá aos propósitos eleitoreiros de Bolsonaro, mas não às famílias pobres
que dependem dos benefícios e tenderão a se endividar, anulando o efeito do
próprio auxílio. O governo faria muito mais por elas se zelasse pelo equilíbrio
fiscal e deixasse de lado propostas estapafúrdias como a PEC cheia de bondades
que compromete as contas públicas na tentativa desesperada de facilitar a
reeleição.
O ataque do Ministério da Defesa às
eleições
O Estado de S. Paulo
É inconstitucional a pretensão da Defesa de fiscalizar eleições. Na Presidência, Bolsonaro causa mais danos às FA do que quando ameaçava colocar bombas em quartéis
Não bastasse difundir desinformação contra
as urnas eletrônicas, o presidente Jair Bolsonaro tem envolvido, de forma cada
vez mais intensa, o Ministério da Defesa em suas tramoias inconstitucionais
contra o sistema eleitoral brasileiro e a Justiça Eleitoral. Segundo revelou
o Estadão, a pasta da administração federal relativa às Forças Armadas
(FA) está preparando um plano de fiscalização paralela para as eleições deste
ano. Foi montada uma equipe de oficiais do Exército, da Marinha e da
Aeronáutica com a missão específica de elaborar o roteiro para uma atuação
ampliada dos militares nas eleições.
O que o presidente Jair Bolsonaro vem
fazendo com o Ministério da Defesa é de enorme gravidade, a exigir imediata
contenção. Além de afrontar as regras eleitorais, está em curso uma explícita
subversão da ordem constitucional.
A configuração do Estado Democrático de
Direito está desenhada para que as Forças Armadas estejam submetidas ao poder
civil. É precisamente esse o papel institucional do Ministério da Defesa:
assegurar que a condução política dos assuntos militares e da defesa esteja
plenamente integrada à administração geral do Estado. No entanto, o presidente
Jair Bolsonaro vem fazendo o exato contrário. Está usando o poder civil para
tentar desvirtuar o bom funcionamento das Forças Armadas.
Eis a loucura bolsonarista. Em vez de ser
elemento de tranquilidade institucional, assegurando e confirmando o
funcionamento constitucional das Forças Armadas, o Ministério da Defesa do
governo Bolsonaro tem sido a fonte de tensões e embates com a Justiça Eleitoral.
Sob o pretexto de ter sido convidado a integrar a Comissão de Transparência das
Eleições do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o órgão da administração federal
relativo aos militares atribuiu a si mesmo o papel de revisor das eleições. Tal
pretensão é rigorosamente inconstitucional.
Para piorar, como essa atribuição faz parte
da campanha bolsonarista contra a confiança nas urnas eletrônicas, o Ministério
da Defesa vem executando a inconstitucional tarefa de maneira espalhafatosa,
confrontando publicamente o TSE. Essa atuação em nada se assemelha à usual
contribuição abnegada e silenciosa das Forças Armadas em diversas áreas de
interesse público, como emergências de defesa civil, proteção ambiental e
campanhas de vacinação. Ou seja, além de executar uma tarefa que não lhe cabe,
atentando contra a Constituição, o Ministério da Defesa do governo Bolsonaro
envolve publicamente o bom nome das Forças Armadas nessas manobras.
Ao imiscuir-se no processo eleitoral, o
Ministério da Defesa erra de duas formas graves. Em primeiro lugar, trata-se de
um órgão da administração federal e, por óbvio, as eleições não são matéria de
competência do Poder Executivo. Não é papel da administração federal questionar
a legislação eleitoral, revisar as eleições e, menos ainda, rivalizar com a
Justiça Eleitoral.
O segundo erro é ainda mais grave. Ao
envolver-se em tema eleitoral, o Ministério da Defesa transmite a ideia de que
as Forças Armadas têm a pretensão de interferir nas eleições. Essa mensagem é
perigosíssima e desperta preocupação em todos. Esse tipo de interferência não
tem lugar em um regime democrático. Não é assim que dispõe a Constituição. Não
é assim que funcionou até aqui. Uma vez que o presidente Jair Bolsonaro e o seu
Ministério da Defesa vêm tentando inconstitucionalmente envolver as Forças
Armadas em questões eleitorais – ação que constitui crime de responsabilidade
(art. 7.º, incisos 4 e 7, da Lei 1.079/1950) –, é dever dos três comandantes
das Forças Armadas reiterarem seu compromisso com a Constituição, bem como sua
distância em relação às tramoias inconstitucionais daquele que, quando esteve
no Exército, ameaçava colocar bomba nos quartéis. O perigo agora é imensamente
maior.
Essa movimentação do Ministério da Defesa
deve despertar também a atenção do Ministério Público. É preciso, assim manda a
Constituição, defender a ordem jurídica e o regime democrático. Não cabe apatia
perante tão grave ameaça.
Desmatamento exige urgência da Justiça
O Estado de S. Paulo
Pesquisa do Imazon mostra a enorme distância que separa o crime ambiental consumado e a efetiva responsabilização de quem praticou a ilegalidade
O combate ao desmatamento ilegal da
Amazônia envolve atores variados. E a Justiça desempenha papel decisivo na
responsabilização de quem derruba ou queima a floresta em desrespeito à
legislação. Um recente estudo sobre as decisões de juízes de primeira instância
nos nove Estados que compõem a Amazônia Legal, a partir de processos ajuizados
pelo Ministério Público Federal (MPF) no programa denominado Amazônia Protege,
mostra que o Judiciário, no caso de juízes de primeira instância, precisa
acordar para a urgência da punição de quem promove o desmatamento ilegal.
O levantamento foi feito pelo Instituto do
Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), uma organização da sociedade civil
de interesse público. Ao mapear o andamento de 3.561 ações civis públicas
movidas pelo MPF entre 2017 e 2020, o Imazon constatou a enorme distância que
separa o crime ambiental consumado − a destruição da floresta − e a efetiva
responsabilização de quem praticou a ilegalidade.
A pesquisa revelou que 650 ações (18% do
total monitorado) haviam ensejado sentenças de primeiro grau até outubro de
2020. A partir desse universo de decisões judiciais já proferidas, os
pesquisadores constataram que apenas 51 delas (8%) tiveram como resultado a
condenação dos acusados na esfera cível. Nesse sentido, um outro dado reforça a
preocupação diante dos entraves e da morosidade da Justiça para efetivar
punições pelo desmatamento da Amazônia: das multas aplicadas nessas 51 ações em
que os réus foram condenados, somente 2 já haviam sido efetivamente pagas, no
valor total de R$ 42 mil, segundo o Imazon. As demais estavam em diferentes
fases do processo, fosse aguardando o cumprimento da sentença ou o julgamento
de recursos.
Por óbvio, a mera denúncia por parte do
Ministério Público não significa que tenha ocorrido crime. Do contrário, não
haveria necessidade da figura do juiz. Como se sabe, é da lógica processual
que, ao Ministério Público, cabe submeter à Justiça os casos em que considera
haver provas e indícios de crime − ao passo que, ao juiz, cabe o julgamento do
mérito, isto é, se houve ou não ilegalidade. O mesmo vale para a fixação de
multas e de indenizações: é comum que valores demandados pelo Ministério
Público sejam reduzidos na decisão judicial, o que também foi detectado no
referido estudo.
Sem perder de vista tais considerações,
porém, é inegável que os dados levantados pelo Imazon sugerem que algo parece
estar escapando à percepção dos juízes de primeira instância. E o próprio
estudo indica onde pode estar o problema: as ações civis públicas ajuizadas
pelo MPF utilizaram imagens de satélites e dados públicos oficiais sobre as
terras desmatadas, caso do Cadastro Ambiental Rural (CAR). Aparentemente, no
entanto, tal inovação não estaria sendo acolhida por boa parte dos magistrados
de primeira instância. No caso das 650 ações já julgadas, 506 (78%) foram
extintas “sem resolução do mérito”, ou seja, os juízes entenderam que o MPF não
havia apresentado elementos que justificassem o prosseguimento dos processos.
Os pesquisadores foram além e analisaram o
andamento de recursos em instâncias superiores do Judiciário. Aqui uma novidade
importante: o Superior Tribunal de Justiça (STJ), de acordo com o levantamento,
passou a validar provas obtidas remotamente, como é o caso das imagens de
satélite. Eis um passo decisivo para o combate à impunidade. “A expectativa,
agora, é que esse entendimento seja adotado de forma mais célere nas decisões
em primeira instância”, afirmou Jeferson Almeida, pesquisador do instituto.
Ora, o planeta vive uma emergência
climática, e isso não é novidade para ninguém. Com os olhos do mundo voltados
para a Amazônia, é dever das instituições brasileiras aplicar a legislação e
proteger o meio ambiente. Eis um desafio para todos os níveis de governo, para
todas as Casas Legislativas e, sobretudo, para todo o Judiciário − de cuja
atuação depende a responsabilização de quem desmata. A preservação ambiental
passa também pela maior conscientização dos juízes.
O equívoco das usinas emergenciais
O Estado de S. Paulo
Governo deve aproveitar rara chance de corrigir um erro e rescindir contratos de energia de empreendimentos atrasados
É bastante raro que erros cometidos por
governos na elaboração e execução de políticas públicas possam ser corrigidos
antes que gerem consequências e sem que a sociedade seja obrigada a pagar por
eles. Felizmente, esse é o caso do leilão emergencial de energia realizado em
outubro pela gestão Jair Bolsonaro. Preocupado com os impactos que a decretação
de um racionamento e a ocorrência de apagões poderiam causar na competitividade
da candidatura presidencial à reeleição, o Ministério de Minas e Energia (MME),
de afogadilho, deu aval à realização de um procedimento simplificado que
resultou na contratação de 17 usinas em outubro. A um custo de R$ 39 bilhões
para os consumidores até 2025, os vencedores da disputa teriam um único
compromisso: gerar eletricidade a partir de 1.º de maio deste ano.
Se à época os termos do leilão já haviam
sido criticados pelo gasto bilionário, o balanço final expõe o fracasso de
decisões orientadas pelo desespero eleitoral. Das 17 usinas, apenas uma
conseguiu cumprir o prazo determinado; ato contínuo, a empresa solicitou
rescisão contratual, alegando que o aumento do custo de compra de combustível
teria inviabilizado a sustentabilidade do projeto. Três ficaram prontas em
junho; outras 13 não passam de uma caríssima promessa. O preço médio da energia
adquirida no leilão emergencial foi de quase R$ 1.600 por megawatt-hora (MWh) –
sete vezes o obtido em licitações realizadas pela Agência Nacional de Energia
Elétrica (Aneel) nos últimos anos. Até o momento, segundo revelou reportagem do Estadão,
as multas impostas às usinas atrasadas somam R$ 413 milhões. O valor deve subir
nas próximas semanas; ainda assim, elas têm todo o interesse em manter os
contratos. Afinal, ainda que as penalidades sejam vultosas, são muito
inferiores às receitas anuais, projetadas em R$ 11,7 bilhões.
Para justificar o atraso, as empresas que
venceram o leilão adotaram o mesmo expediente que a administração Bolsonaro tem
usado em defesa da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do desespero: as
consequências da guerra na Ucrânia. Alguns empreendedores apelaram até para
tentativas de acordos mirabolantes, como a substituição de usinas que já
deveriam ter ficado prontas por outra unidade antiga, construída há anos. Fato
é que não faltou energia para o País, não por mérito das termoelétricas
emergenciais, mas em razão de chuvas intensas que encheram os reservatórios das
hidrelétricas.
Agora, o governo tem uma alternativa viável e legal para corrigir o equívoco que ele mesmo cometeu: cumprir a portaria que regulamentou o leilão, que garante o rompimento dos contratos caso as usinas não sejam entregues até 1.º de agosto. Além de ser a melhor solução econômica para os consumidores, já pressionados pelos reajustes nas contas de luz, a rescisão seria uma lição pedagógica para uma parte do setor elétrico. Segurança jurídica e respeito aos contratos são princípios inquestionáveis, mas que devem ser cumpridos por ambas as partes – inclusive pelo setor privado.
Mistério populacional
Folha de S. Paulo
ONU mostra queda inédita da expectativa de
vida e projeta pico de habitantes antes do fim do século
Como sabe qualquer consumidor de suspenses
policiais, desfechos esperados desde o começo também são capazes de provocar
surpresa: não se trata de saber se o detetive desvendará o mistério, e sim de
ver como ele fará isso.
O relatório
demográfico da ONU lançado nesta segunda-feira (11) cumpriu seu
papel ao revelar como a Covid afetou a dinâmica populacional. A ninguém
escapava que haveria algum impacto, mas todos esperavam saber seu tamanho.
Pois a expectativa média de vida global
caiu de 72,8 anos em 2019 para 71 em 2021, ou 1,8 ano a menos no período.
Trata-se da primeira desaceleração em cinco décadas.
Se o recuo geral atesta a gravidade da
pandemia, a média esconde diferenças entre os países. O Brasil, por exemplo,
experimentou redução maior, de 75,3 anos para 72,8 (queda de 2,5 anos)
—resultado que tem na incúria de Jair Bolsonaro (PL) o seu fator decisivo.
De acordo com a ONU, felizmente, as
tendências de longevidade devem se recuperar em todos os países até 2025, a
depender, entre outras coisas, do índice de cobertura vacinal —área em que,
apesar de Bolsonaro, o Brasil vai bem em termos comparativos.
Isso não significa, contudo, que o panorama
vislumbrado pela ONU seja carregado de alvíssaras; as projeções para o futuro,
foco principal do estudo, andam na corda bamba em que as previsões demográficas
se equilibram há mais de 200 anos.
Aos olhos otimistas ganhará destaque o fato
de o novo pico calculado para a população mundial ser de 10,4 bilhões de
pessoas, menos que os quase 11 bilhões estimados antes. Não só a pandemia mas
também a Guerra da
Ucrânia contribuem para isso.
Menos habitantes num planeta em crise
ambiental pode ser uma boa notícia, mas o crescimento continuará elevado em
países pobres, como República Democrática do Congo, Egito, Etiópia, Nigéria,
Tanzânia, Paquistão, Filipinas e Índia –que, por sinal, deverá ultrapassar a
China como mais populoso do mundo já em 2023.
Todos terão a oportunidade de aproveitar o
acréscimo de jovens em idade de trabalho, mas, se não adotarem políticas
públicas adequadas, terminarão apenas com as consequências negativas da mudança
populacional.
Foi o que
aconteceu com o Brasil. Prestes a ser ultrapassado pela Nigéria no
ranking das maiores populações, o país ainda não soube se preparar para seu
perfil etário envelhecido e tenderá a sofrer com desafios para os sistemas de
saúde e de Previdência.
Nesse caso, não há mistério: a
responsabilidade é de todos os governantes que, de olho apenas no curto prazo,
negligenciaram as projeções para o futuro.
Dois pesos
Folha de S. Paulo
Prefeito de SP manda apurar gasto com
evento pró-Lula, mas se omite sobre marcha com Bolsonaro
Nos últimos meses, uma profusão de casos
injustificáveis de uso de dinheiro público para custear shows e eventos, muitos
deles com clara conotação político-partidária, ganhou visibilidade, colocando
em evidência uma prática tão disseminada quanto condenável.
O exemplo mais recente ocorreu na Marcha para
Jesus, que reuniu em São Paulo uma multidão de pessoas no sábado
(9).
Com as presenças do presidente Jair
Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição, e dos pré-candidatos ao governo estadual
Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Rodrigo Garcia (PSDB), entre outros, o
encontro de igrejas cristãs mal conseguiu disfarçar o caráter eleitoreiro.
Ao discursar em um carro de som, Bolsonaro
evocou novamente alguns de seus tresloucados temas de campanha, como a luta do
bem contra o mal e o risco de o Brasil tornar-se uma nação socialista. Não fez
outra coisa, pois, senão pedir votos de forma implícita —algo que a legislação
veda nesta fase da corrida eleitoral.
Não bastasse ter servido de palanque, o
evento foi ainda financiado com dinheiro do contribuinte paulistano, um recurso
que deveria ser destinado às necessidades mais prementes de São Paulo.
Juntos, os vereadores João Jorge (PSDB) e
Missionário José Olímpio (PL) consagraram ao encontro, via emendas
parlamentares, nada menos que R$ 1,7 milhão do Tesouro municipal, numa confusão
de interesses evidente.
O bolsonarismo não é o único a se
beneficiar desse uso distorcido das verbas públicas. Nos festejos
de Primeiro de Maio na capital paulista, centrais sindicais
promoveram uma comemoração, também bancada com emendas de vereadores, a favor
do presidenciável do PT, Luiz Inácio Lula da Silva.
De modo correto, a Controladoria
Geral do Município suspendeu o pagamento de R$ 160 mil à
cantora Daniela Mercury, estrela da festa, enquanto uma sindicância aberta a
pedido do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), apura as circunstâncias
do evento.
Causa espécie, assim, que o alcaide
paulistano —presente à marcha, ressalte-se—, desta vez não veja motivos para
que o poder público proceda a uma averiguação do encontro de sábado.
Ocioso dizer que cabe a Nunes zelar pelo
bom uso dos recursos públicos em todas as situações —e não apenas quando o alvo
do constrangimento são adversários no campo político.
Dólar segue tendência de fortalecimento
global
Valor Econômico
Embora seja arriscado fazer prognósticos
sobre taxas de câmbio, a tendência de valorização do dólar deverá perdurar por
um bom tempo
É irônico que o dólar se valorize com tanta
força, como vem acontecendo nas últimas semanas, pouco tempo depois de vários
economistas preverem o fim de seu reinado como moeda internacional de reserva.
Ontem, foi mais um dia de alta, encostando na paridade com o euro.
Segundo uma visão relativamente popular, o
dólar vinha em uma trajetória de decadência, depois de anos de estímulos
monetários e fiscais. A aceleração da inflação - que corroeu o valor de ativos
em dólares, inclusive a própria dívida pública dos EUA - parecia confirmar os
piores temores.
Mais recentemente, o dólar teria ficado
menos confiável aos olhos de outras nações, depois que os Estados Unidos
congelaram as aplicações russas nos mercados de Nova York, em retaliação à
invasão da Ucrânia. Dizia-se que, por questões geopolíticas, bancos centrais de
países não alinhados deveriam buscar outras alternativas, como o yuan.
É possível que ainda esteja valendo essa
tendência de longo prazo de corrosão do protagonismo do dólar. Mas, no dia a
dia dos mercados, tudo vem operando como usual. O aperto monetário pelo Federal
Reserve (Fed) para baixar a maior inflação em 30 anos serviu como um fator de
atração de capitais estrangeiros para os Estados Unidos.
A relação entre o dólar e o euro segue o
que dizem os livros-texto. O diferencial de juros das duas áreas monetárias se
ampliou. Os Estados Unidos já começaram a subir a sua taxa básica, hoje no
intervalo entre 1,5% a 1,75%, enquanto que o Banco Central Europeu (BCE) ainda
se move para realizar duas altas nos próximos meses.
No futuro, os juros em dólar tendem a
continuar maiores do que em euros. Embora os mercados estejam questionando, a
todo momento, o apetite do Fed pelo aperto monetário, diante dos riscos de uma
recessão, a margem de manobra nos Estados Unidos é bem maior. Na Europa, os
riscos de forte desaceleração são potencializados pela crise de energia
provocada pela guerra.
É provável que a inflação persista mesmo
num ambiente de desaceleração econômica. Nessas circunstâncias, os Estados
Unidos também parecem mais bem posicionados para seguir subindo os juros até
completar a tarefa de desinflacionar a economia. A simples indicação de início
de aperto monetário pelo BCE levou a estresse no mercado de dívida pública da
Itália.
Quando os investidores internacionais
colocam dinheiro nos Estados Unidos, no fundo estão dando um voto de confiança
de que o Fed vai preservar o poder de compra da moeda. É um sinal da
resiliência da economia americana, além de um atestado de que o dólar segue
como porto seguro em períodos de forte aversão a risco global.
Por suas próprias razões, é difícil que o
real escape ileso da tendência de fortalecimento do dólar em âmbito mundial.
Ontem, foi mais um dia de pressão na nossa taxa de câmbio, com a cotação da
moeda americana chegando a R$ 5,43.
O Brasil está mais adiantado que o BCE no
processo de aperto monetário, com os juros chegando a 13,25% ao ano. Isso nos
garante um imenso diferencial de juros em relação aos EUA, o que, em tese,
deveria preservar a nossa moeda. Mas é bom lembrar que, dentro desse
diferencial de juros, também está a remuneração que o investidor deve receber
por assumir o risco Brasil.
Com todas as manobras fiscais adotadas pelo
governo Bolsonaro e pelo Congresso Nacional, destruindo as âncoras fiscais do
país, a percepção de risco foi para as alturas. O clima de incerteza é
amplificado pelas eleições presidenciais. Os títulos de longo prazo do Tesouro
Nacional já estão pagando taxas de juros superiores a 6% ao ano, acima da
inflação.
Por ora, o impacto da valorização global do
dólar tem sido atenuado, aqui no Brasil, pelos preços ainda favoráveis de
commodities, apesar do recuo recente, no caso de alguns metais e produtos
agrícolas. Mas há dúvidas sobre quanto tempo esse ciclo deverá perdurar, com os
receios de uma recessão global e também sobre a capacidade de a China sustentar
níveis relativamente altos de crescimento econômico.
Embora seja arriscado fazer prognósticos sobre taxas de câmbio, a tendência de valorização do dólar ante as demais moedas deverá perdurar por um bom tempo, com repercussões maiores sobre paises emergentes. A forte posição de reservas cambiais do Brasil ajuda como a primeira linha de defesa, mas não garante imunidade se os fundamentos econômicos seguirem fragilizados.
Atenção para o Português empregado, Valor! "Alter", em Latim, significa "outro, segundo nos ensinava nosso professor emérito, o jornalista Emir Macedo Nogueira, digno Presidente do sindicato dos Jornalistas em plena Ditadura, além de Editor de Política Internacional da então requisitada Folha da Noite. assim, dizer "outra alternativa" implica pleonasmo que deveria ser evitado por tão conceituado órgão de imprensa. Afinal, cabe a vocês - e as nossas professorinhas- ao menos tentar preservar a pureza da "flor do Lácio", não?
ResponderExcluirBolsonaro desmoralizou as forças armadas.
ResponderExcluir''Unknown'' encontrando pelo em ovo,parece o Caetano Veloso,que fala muito mal,as vezes,fiscalizando as falas do Lula,que fala muito bem.
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