sábado, 23 de julho de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Atacar as fake News

Folha de S. Paulo

TSE acerta ao enfrentar a desinformação, mas não pode descuidar da liberdade de expressão

Contra a proverbial lentidão da Justiça, o ministro Alexandre de Moraes foi célere no último domingo (17) ao tomar uma decisão provisória a favor do PT, que contestava a divulgação de notícias falsas em redes sociais de bolsonaristas.

Membro do STF (Supremo Tribunal Federal) e próximo presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Moraes estava no plantão desta segunda corte quando determinou a remoção de conteúdos que, na sua avaliação, não passavam de mentiras veiculadas com o propósito de prejudicar Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Algumas das notícias derrubadas por prescrição do ministro faziam conexões falsas entre a facção criminosa PCC, o PT e o assassinato de Celso Daniel em 2002, quando era prefeito de Santo André (SP) e filiado ao Partido dos Trabalhadores.

A ordem de Moraes também atingiu postagens que distorciam os fatos para dar a entender que o ex-presidente Lula teria igualado pobres a papel higiênico, ou então que associavam o PT ao nazismo e ao fascismo.

Entre os propagadores da desinformação figuravam parlamentares como o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e os deputados Hélio Lopes (PL-RJ), Otoni de Paula (MDB-RJ) e Carla Zambelli (PL-SP), todos do círculo próximo do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Dado que Lula lidera as pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República, não surpreende que bolsonaristas o transformem em alvo preferencial de sua máquina de moer reputações.

Não surpreende, mas consterna. São conhecidos os mecanismos de que lançam mão Bolsonaro e companhia em seu vale-tudo pelo poder. A eleição de 2018 é um exemplo pronto e acabado; o famigerado gabinete do ódio, instalado em pleno Palácio do Planalto, é outro.

Nada sugere que haverá mudança de comportamento na disputa deste ano; na verdade, dá-se o contrário, como atesta a insólita reunião de Bolsonaro com embaixadores estrangeiros, convocada para que o presidente desfiasse mentiras sobre as urnas eletrônicas.

Se o governante age dessa forma à luz do dia e sob os olhares atentos da imprensa mundial, pode-se imaginar o que ele e seu bando farão sob a égide do anonimato nas redes sociais. Decerto atuarão como milícias virtuais, tendo como fim último conspurcar o debate público.

É bom saber que o futuro presidente do TSE se empenha em afastar essas maquinações covardes e rasteiras. É bom que ele busque proteger a liberdade do voto e o exercício da cidadania.

Mas é bom que, nesse mister, não perca de vista a liberdade de expressão, também ela um traço fundamental das democracias.

Espiral negativa

Folha de S. Paulo

Sem clareza sobre o futuro do endividamento, sobem os juros e desvaloriza-se a moeda nacional

A imprevidência do governo de Jair Bolsonaro tem enormes custos para o país. Novos gastos eleitoreiros são mais um golpe na claudicante credibilidade da política econômica. Inflação e juros em alta, com nefastas consequências sociais, são o resultado direto.

Sem considerar as desonerações tributárias oportunistas, como as isenções federais para reduzir os preços dos combustíveis, o custo da farra de gastos já chega a R$ 150 bilhões desde o ano passado.

Embora parcialmente compensadas pelo aumento surpreendente da arrecadação, ele próprio derivado em grande medida da inflação, as mudanças casuísticas nas despesas têm enorme consequência.

O dano se dá principalmente pela sinalização de que não se pode confiar nas regras fiscais, concebidas para evitar que um governo de plantão desequilibre o jogo eleitoral com benesses populistas.

Desde que se intensificaram os ataques ao teto de gastos inscrito na Constituição, foi praticamente revertida a tendência de queda dos juros que vinha desde 2017.

Sem clareza sobre o que esperar em horizontes mais longos, sobem os custos de financiamento do governo e desvaloriza-se a moeda nacional. Depois de atingir 2% no auge da pandemia, a taxa básica de juros (Selic) já chega a 13,25% e deve continuar a subir.

O arrocho monetário se torna a única ferramenta contra a inflação, que não dá sinais de recuo relevante. Depois de marcar 10,06% em 2021, o principal índice ao consumidor, o IPCA, deve subir mais 8% neste ano.

Descontada a inflação esperada para os próximos 12 meses, a chamada taxa real de juros está em 8,5%, apenas um pouco abaixo do pior momento observado no final do governo Dilma Rousseff (9,6%).

Despesas maiores para rolar a dívida pública estreitam a já diminuta margem no Orçamento. Longe de significar uma conspiração de rentistas, tal dinâmica é resultado direto de escolhas irresponsáveis do governo e do Congresso. Pior, os sinais são de que as pressões nos preços vão adquirindo caráter inercial, sempre difícil de debelar.

Será necessário um longo e penoso trabalho de restauração da qualidade do processo orçamentário, o que dependerá de reformas.

Sem um compromisso crível do próximo governo de que não será permitida uma disparada do endividamento, de modo a reverter as expectativas altistas para a inflação e os juros, não haverá retorno do crescimento sustentável.

As férias do sr. Aras

O Estado de S. Paulo

Omissão atual é ainda pior que excessos pretéritos do MP. O PGR tem direito ao descanso, mas tem também o dever de trabalhar: há um regime democrático a ser defendido

O procurador-geral da República, Augusto Aras, está de férias. Trata-se de um direito constitucional de todos os trabalhadores. No entanto, no caso de Augusto Aras, há uma peculiaridade. Não é fácil identificar a diferença entre seu período de trabalho e o de descanso. Seria injusto, portanto, atribuir às férias de Augusto Aras o que ocorreu nesta semana: a absoluta indiferença da Procuradoria-Geral da República (PGR) perante o mais novo ataque do presidente Jair Bolsonaro contra as eleições e contra o País. Se o procurador-geral da República não estivesse de férias, muito provavelmente suas ações (ou, melhor dizendo, omissões) não seriam muito diferentes.

Como se sabe, o presidente Jair Bolsonaro utilizou uma reunião com embaixadores estrangeiros, no dia 18 de julho, para dizer ao mundo que o Brasil não é uma democracia confiável, falar mal das instituições nacionais e de políticos adversários e incentivar sua patota a não respeitar o resultado das eleições. Segundo Jair Bolsonaro, as urnas eletrônicas da Justiça Eleitoral são uma fraude. Não tem nenhuma prova, mas acha-se no direito de disseminar desconfiança e revolta contra o sistema eleitoral.

Ante esse ataque, o Brasil e o mundo reagiram imediatamente. Os Estados Unidos emitiram nota atestando que as eleições aqui são modelo para a comunidade internacional. Internamente, instituições públicas e entidades civis manifestaram-se. No entanto, o procurador-geral da República não viu no episódio nenhum motivo de alarde. Talvez tenha considerado irrelevante o caso, tão irrelevante que não se deu ao trabalho de sequer emitir uma mísera nota.

Depois de três dias, questionado pelo País inteiro sobre qual seria a resposta da PGR, Augusto Aras afinal publicou, na quinta-feira, um vídeo com trechos de falas suas, gravadas antes da reunião do dia 18 de julho, expressando sua confiança no sistema eleitoral. Ora, a opinião do sr. Aras é absolutamente irrelevante para o País; o que interessa são as providências do procurador-geral da República contra essa intolerável ofensa do presidente à democracia e ao Brasil. E essas providências não vieram.

Há um abismo entre o comportamento de Augusto Aras e a missão institucional do Ministério Público, de “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, como dispõe a Constituição. Perante uma escalada de ameaças e ataques contra o sistema eleitoral por parte do presidente – uma situação de contínua afronta à Constituição e à legislação eleitoral –, o procurador-geral entendeu que bastava lembrar suas convicções pessoais. No tal vídeo, Aras diz que não acredita que se repita no Brasil a invasão do Capitólio por seguidores de Donald Trump, inconformados com a derrota do presidente americano na eleição de 2020. E declara que não aceitará alegações de fraude.

O vídeo de Augusto Aras é tão constrangedor quanto sua atuação como procurador-geral, total e deliberadamente alheio aos fatos do País e às demandas da Constituição. Ou será que Augusto Aras entende que é papel do presidente da República cuidar do funcionamento e da apuração das eleições, envolvendo na empreitada o Ministério da Defesa? Será que o procurador-geral da República não vê nenhum problema no uso das funções públicas e da máquina pública por Bolsonaro para desacreditar as eleições e a legislação eleitoral?

Augusto Aras pode não querer ver, mas todo ataque de Jair Bolsonaro à Justiça Eleitoral é ataque direto à legislação eleitoral, definida pelo Congresso. E isso constitui crime de responsabilidade. É afronta às atribuições do Legislativo. É tentativa de interferência no trabalho do Judiciário. É desrespeito às regras do jogo democrático.

Os excessos pretéritos do Ministério Público – entre outros, performances midiáticas de procuradores e denúncias ineptas baseadas em delações duvidosas – causaram muitos danos ao País, e seus efeitos são ainda diariamente sentidos. Mas não se corrige excesso com omissão. Há direito às férias, mas há também o dever de trabalhar. Há uma ordem jurídica e um regime democrático a serem defendidos.

A Codevasf é uma farra

O Estado de S. Paulo

Sob Bolsonaro, a ‘estatal do Centrão’ é um festim com recursos públicos. PF deflagrou nova operação para apurar corrupção e enriquecimento ilícito envolvendo a empresa

A Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) foi transformada em um sorvedouro de dinheiro público nesse consórcio formado pelo presidente Jair Bolsonaro e o Centrão, sob a liderança do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI). Nem uma folha de papel é carimbada no mais remoto escritório da chamada “estatal do Centrão” sem a anuência, no mínimo, de um dos dois chefões do grupo que sustenta Bolsonaro no cargo à custa da cupinização da República, por meio da privatização do Orçamento da União.

Há algum tempo o Estadão tem revelado uma série de escândalos de corrupção num governo que Bolsonaro garante ser imune à corrupção. Em larga medida, os casos passam pela Codevasf, a começar pelo famigerado “orçamento secreto”, uma indecência desde o nome. Criada em 1974 para viabilizar a construção de rodovias e executar projetos de irrigação que visavam ao desenvolvimento econômico e social da região do Vale do Rio São Francisco, a estatal, hoje vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional, foi bastante inchada no atual governo, a ponto de abranger projetos obscuros – em geral, de pavimentação e compra de equipamentos – que chegam a distar até 1,5 mil quilômetros das águas dos rios que a batizam. Cerca de mil novos municípios, pasme o leitor, passaram a compor a área de atuação da estatal recentemente.

Ou seja, a razão de existir da Codevasf, que, a bem da verdade, já havia sido desvirtuada, chegou ao paroxismo nos últimos três anos a fim de saciar interesses antirrepublicanos do grupo político que ora está no poder. A ampliação do escopo de atuação da empresa, é evidente, só favorece a corrupção.

O mais novo caso envolvendo a Codevasf foi revelado no dia 21 passado. A Polícia Federal (PF) no Maranhão deflagrou uma operação que investiga suspeitas de fraudes em licitações da empresa no Estado. De acordo com a PF, uma “associação criminosa estruturada”, tendo a empreiteira Construservice à frente, engendrou um “engenhoso esquema” de fraude em licitações, desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro que envolve cerca de R$ 140 milhões. Apontado como sócio oculto da Construservice, Eduardo José Barros Costa, conhecido como “Imperador”, foi preso temporariamente. Malas de dinheiro vivo, joias e relógios foram apreendidos na casa do empresário.

A Codevasf tem uma longa história de corrupção e fisiologismo nesses seus quase 50 anos de existência. No entanto, foi justamente na vigência da aliança entre o presidente Bolsonaro e o Centrão que seu orçamento foi robustecido em nível recorde: R$ 2,73 bilhões apenas no ano passado. Grande parte desse montante é fruto de emendas parlamentares, daí a posição estratégica que a estatal adquiriu no esquema do “orçamento secreto”. Por meio de “convênios” com a Codevasf, parlamentares usaram esse dinheiro para comprar veículos agrícolas, tratores e ônibus escolares, entre outros ativos, por meio de contratos superfaturados. Os contratos firmados por meio de convênios com a Codevasf estão sujeitos a escrutínios públicos bem menos rígidos do que aqueles firmados por Ministérios, por exemplo.

No governo Bolsonaro, a Codevasf já foi usada para contratar um sem-número de obras, algumas jamais executadas; outras, a rigor, seriam de competência de governos estaduais.

Além do óbvio enriquecimento ilícito, o objetivo do aparelhamento da Codevasf também é político. Trata-se de transformar a estatal em um duto de recursos públicos que são mobilizados para atender a interesses eleitorais muito particulares e localizados. Portanto, sem prejuízo da responsabilização de parlamentares e agentes públicos por eventuais crimes cometidos contra a administração pública, essa espécie de “privatização branca” da Codevasf por uma grei de oportunistas é um ataque direto contra a democracia representativa, na medida em que desequilibra a disputa eleitoral por favorecer, em detrimento de outros candidatos, o grupo político que já detém o poder.

Incúria perigosa

O Estado de S. Paulo

Falha do Exército ao emitir registro de CAC para integrante do PCC presume descontrole na licença para ter armas

O Primeiro Comando da Capital (PCC), a mais poderosa e perigosa organização criminosa em atuação no País, com ramificações na América Latina e Europa, já promovia o terror, em São Paulo e no Brasil, mesmo tendo acesso a armas e munições somente por meio ilegal. Agora, contudo, aparentemente o bando está prestes a adquirir capacidade de aumentar seu poder de fogo por meios legais, ludibriando as autoridades.

Uma pequeníssima amostra desse pesadelo foi dada há poucos dias, quando veio a público a notícia de que um integrante da facção criminosa conseguiu obter do Exército, em junho de 2021, um certificado de registro de Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador (CAC) apresentando documentos falsos. De posse do certificado, o homem comprou um pequeno arsenal, no valor de quase R$ 60 mil: duas carabinas, duas pistolas, dois revólveres e um fuzil.

É extremamente grave essa falha do Exército, sobretudo porque era muito fácil saber que o sujeito não tinha a menor condição de ter acesso ao armamento.

De acordo com o juiz José Humberto Ferreira, da Justiça Federal de Uberlândia (MG), que expediu o mandado de busca e apreensão das armas no âmbito da Operação Ludibrio, deflagrada pela Polícia Federal (PF), bastava “uma simples consulta no Google” para ver que o comprador era réu em nada menos do que 16 ações criminais, uma delas pelo crime de homicídio qualificado. “Causa espécie verificar que os responsáveis no Exército Brasileiro pela apreciação de pedidos administrativos foram enganados e emitiram um certificado de CAC em favor de um representado sem, sequer, fazer uma pesquisa de vida pregressa”, afirmou o juiz em seu despacho. “Uma simples consulta no Google em nome de X acenderia uma luz amarela, a indicar que outras diligências teriam de ser tomadas”, disse o magistrado, cuja estupefação certamente é a mesma de todos os brasileiros.

Ora, não é à toa que o Exército é o responsável por autorizar a compra de armamento controlado por civis. É o Exército que tem expertise nesse tipo de controle. Se esse controle falha, o que resta? A investigação da Polícia Federal, neste caso particular, funcionou, e as armas foram apreendidas. Mas, é lícito inferir, quantos outros processos de emissão de certificado de CAC podem ter falhado?

É preciso destacar que o erro não decorreu de lacuna na legislação, que é bem clara ao impedir que cidadãos com antecedentes criminais possam adquirir armas de fogo, sobretudo armamento controlado. A falha talvez tenha decorrido da sobrecarga do Exército em virtude do aumento exponencial dos pedidos de emissão de certificados de CAC no governo do presidente Bolsonaro. De acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número de CACs registrados em 2022 no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma) é dez vezes maior, pasme o leitor, do que cinco anos atrás.

Nada de bom haveria de vir dessa fixação de Bolsonaro por armas de fogo e pelo armamento desenfreado da população. Se o fácil acesso a armas já era preocupante nos casos envolvendo civis bem-intencionados, mais aflitivo é quando bandidos passam a explorar as vulnerabilidades do sistema de controle.

Nova legislação estadual e federal ameaça Pantanal

O Globo

Lei do Mato Grosso incentiva desmate — e tramita em Brasília projeto para excluir o estado da Amazônia Legal

Pouco lembrado quando o assunto é devastação florestal, Mato Grosso foi no primeiro semestre o estado com o maior número de queimadas na Amazônia — 70% dos 5.200 focos detectados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Muitos deles são de responsabilidade de agricultores que usam o fogo para preparar o campo para o cultivo. Mas o descaso com o meio ambiente vai além da atividade predatória e chega aos gabinetes políticos. A Assembleia Legislativa em Cuiabá acaba de aprovar Projeto de Lei para permitir a criação extensiva de gado, a exploração do ecoturismo e do turismo rural em reservas legais no Pantanal, sob a oposição de ambientalistas.

O presidente da Comissão de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Recursos Minerais da Assembleia, deputado Carlos Avallone (PSDB), garante que as alterações feitas na Lei do Pantanal têm respaldo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Não é bem assim. Nota técnica da empresa informa que o uso de reserva legal só deveria ocorrer em áreas de campo e Cerrado, apenas entre abril e junho, restrições que não constam do projeto aprovado.

O meio ambiente mato-grossense também corre risco no Congresso. Tramita Projeto de Lei do deputado Juarez Costa (MDB-MT) para retirar o estado da Amazônia Legal. Caso seja aprovado, a obrigatoriedade de manter como reserva 80% da floresta cairia para 20% e, segundo Herman Oliveira, secretário executivo do Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente, haveria uma anistia para crimes ambientais.

O que acontece com o meio ambiente em Mato Grosso termina ofuscado pela devastação metódica em curso no Pará e no Amazonas, responsabilidade de madeireiros e garimpeiros ilegais que atuam praticamente sem fiscalização durante o governo Bolsonaro. Com a maior área destinada ao cultivo de grãos e a mais elevada produtividade do país, o estado é um caso de sucesso no agronegócio e um desafio a quem defende a convivência da preservação com o cultivo da terra.

Como mostra reportagem do GLOBO, Mato Grosso converteu 13,7 milhões de hectares de floresta em pastos e áreas para o plantio de grãos a partir da metade da década de 1980, de acordo com dados do MapBiomas. Agora surgiu um novo ciclo de pressão para ampliar espaço para agricultura e pecuária. “Mesmo tendo fazendas aptas a abastecer o mercado internacional, muitos ocupam ilegalmente novas áreas para desmatar”, diz Ane Alencar, diretora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). Repete-se o conhecido enredo da destruição ambiental, apesar de ser sabido que o Brasil pode ampliar sua produção agrícola por ganhos de produtividade, com a recuperação de áreas desmatadas e sem destruir florestas e outros biomas.

Mato Grosso ainda abriga 30,9 milhões de hectares da Floresta Amazônica, mas parte está degradada pela exploração de madeiras cobiçadas no mercado. Do território, 21% estão protegidos por lei como reservas indígenas ou ambientais — mas não livres da exploração predatória. Com três bacias hidrográficas — do Amazonas, do Prata e do Tocantins-Araguaia —, Mato Grosso é crucial para o Pantanal, para o Sul-Sudeste e abastece o Aquífero Guarani, que se estende por Paraguai, Argentina e Uruguai. É inadmissível que a legislação torne o meio ambiente no Pantanal ainda mais vulnerável.

Inflação e inépcia contribuem para impopularidade recorde de Biden

O Globo

Democrata tem pior desempenho para esta altura do mandato entre todos os presidentes desde a 2ª Guerra

A vitória de Joe Biden em 2020 sugeria que, em contraste com Donald Trump, ele manteria ao menos parte do apoio com que entrou na Casa Branca. O que se vê, porém, é um desgaste muito além do esperado. Desde que alcançou o auge de 55% em março de 2021, a aprovação a seu governo só caiu e está hoje pouco acima de 37% — a reprovação, acima de 57%. É o pior desempenho de todos os presidentes a esta altura do mandato desde a Segunda Guerra, segundo levantamento do site FiveThirtyEight.

Biden pode apontar a pior inflação em 40 anos como responsável pela insatisfação recorde entre os americanos. Mas, mesmo para os democratas, Biden tem sido visto como um presidente sem a firmeza e a habilidade imprescindíveis para governar. O cenário é desafiador em razão da polarização e da maioria frágil que os democratas detêm no Congresso (dependente do voto de desempate da vice, Kamala Harris, no Senado). O risco de perder controle de Câmara e Senado nas eleições legislativas de novembro só tem crescido.

A responsabilidade pela impopularidade não cabe só às circunstâncias. As gafes sucessivas e as frustrações que se acumulam demonstram a inépcia de Biden para lidar com problemas de toda ordem. Emparedado, consumiu parcela razoável do primeiro ano e meio de governo em negociações no próprio partido para viabilizar sua agenda. O resultado é decepcionante.

No início do mandato, conseguiu aprovar legislação para facilitar o combate à Covid-19 e lançou um pacote de investimentos em infraestrutura de US$ 1 trilhão. Depois, todas as demais iniciativas fracassaram, e sua popularidade desabou. Na derrota mais recente, soçobrou o pacote de US$ 6 trilhões prevendo apoio a americanos de baixa renda, articulado à transição para energias limpas e a uma reforma tributária aumentando a taxação dos mais ricos. Era o projeto dos sonhos da ala esquerda dos democratas. Na negociação, porém, Biden se viu forçado a reduzir a ambição para US$ 1 trilhão — e nem assim conquistou o voto essencial, do senador democrata da Virgínia Ocidental, estado produtor de carvão mineral.

Políticos que no início da pandemia apoiavam mais gasto público e um governo mais ativo se tornam mais reticentes com a inflação e o temor de recessão. Sem espaço no Congresso, Biden baixou por decreto um programa modesto, de US$ 2,3 bilhões, para financiar projetos ligados às mudanças climáticas, tentativa de sair do imobilismo. A iniciativa deixa sua agenda exposta ao ativismo da Suprema Corte, que recentemente suspendeu decretos ambientais de Barack Obama.

Biden deu outra demonstração de inépcia em viagem recente ao Oriente Médio. Em busca de petróleo barato, visitou a Arábia Saudita do príncipe Mohammed bin Salman, apontado pela CIA como mandante do assassinato e esquartejamento do jornalista saudita Jamal Khashoggi na Turquia. Nada garantiu em relação ao óleo e queimou ainda mais sua credibilidade. Se concorrer à reeleição em 2024, é alta a chance de derrota para o rival republicano, provavelmente Donald Trump.

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