Folha de S. Paulo
Quem não der um basta ao golpe vai se
juntar ao novo e grande partido autoritário
Os manifestos
pela democracia do 11 de Agosto criam dificuldades importantes para os
avanços do golpe em curso e para uma tentativa de institucionalização
autoritária, caso Jair
Bolsonaro e cúmplices cheguem às vias de fato.
Quanto mais adesões tiverem, mais
empecilho. Mas uma tentativa de contenção, apenas. Há muita gente que subscreve
o programa autoritário, com ou sem Bolsonaro; se não em 2022, depois. Há uma corrente
social e política grande, profunda, a favor do regresso, da reação e da
violência, institucional ou direta, na rua. Os omissos vão se juntar a quem
subscreve a carta antidemocrática.
Não é uma crise circunstancial. Grupos, categorias, classes, o nome que se dê, acharam conveniente defender seus interesses e reclamar mais poder ou a representatividade que julgam merecer por meio de Bolsonaro ou se identificam com o que pensa.
O agro ogro, empresários dos institutos do
ultraliberalismo caricato, o partido militar, o partido evangélico e os
inimigos individuais da diversidade humana e da igualdade de direitos são as
faces mais conhecidas dessa corrente antidemocrática. Nem se mencionem seus
integrantes francamente fora da lei (milícias, garimpo, criminosos ambientais
etc.).
Não quer dizer que qualquer evangélico,
militar ou empresário rural faça essa política, mas que esses
"partidos", no sentido amplo, dominam a representação desses grupos e
dão uma certa conformação a seus interesses. No momento, Bolsonaro é o veículo
do fortalecimento político deles, que assim subscrevem a de destruição do
"sistema", das garantias institucionais democráticas, e a captura do
Estado, para resumir uma história complicada.
Como se sabe, querem a politização final do
Supremo, a religião no meio da política, aceitam a desativação de instituições
de controle, como a Procuradoria-Geral, e o uso da Constituição como
instrumento de reles disputa partidária e de desmonte de normas de controle
(fiscais, criminais, eleitorais), como tem se visto nos atos do centrão,
negocista e por ora, ao menos, bolsonarista.
Várias associações empresarias e outras da
assim chamada "sociedade civil" vacilam diante do convite para
assinar uma das duas cartas de apoio à democracia que serão os motes dos atos
do dia 11 de agosto, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Uma delas foi lançada por pessoas ligadas à
São Francisco, a escola de direito da USP e é assinada por indivíduos. O
movimento em torno de outra dessas cartas está
sendo tocado pela Federação das Indústrias de São Paulo, a Fiesp,
"agora sob nova direção", e já
obteve o apoio da Febraban.
Como faltam ainda 15 dias para a
manifestação e muita associação diz ainda não ter visto nem sequer esboço do
documento, não é correto listar titubeantes, quiçá omissos ou até discutir seus
motivos. Mas em breve vamos saber quem nada na corrente antidemocrática. Quem
nem ao menos quer dar um basta a um golpe explícito —é o mínimo, pois haverá
muito mais a fazer para reconstruir a democracia, a começar pelos partidos.
O manifesto redigido na São Francisco diz o
que é esse mínimo democrático, em termos apartidários: a ideia de civilidade
básica programada na Constituição de 1988. Isto é, lidar com "profundas
desigualdades sociais", "com carências em serviços públicos
essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública",
desenvolvimento econômico e ambiental, respeito pela diversidade humana, um
Estado eficiente para dar conta disso tudo. Pode haver planos muito diferentes
para enfrentar tais problemas, tema de discussão para quem assina a carta
democrática. Para os outros, não tem discussão, "e ponto final".
Bolsonaro sempre foi um político pé de chinelo,no sentido moral do termo,diga-se.
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