Folha de S. Paulo
A política pertence à esfera pública; a
religião, à esfera privada
Michelle Bolsonaro proclamou que
o Palácio do Planalto era "um lugar consagrado a demônios" e
liderou um culto evangélico na sede do governo. Jair, seu marido que ainda
finge governar, isentou os pastores de contribuição previdenciária, violando o
princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei e inaugurando uma via
expressa para negócios camuflados de religião. São atos tão anticonstitucionais
quanto pregar o fechamento do STF. Mas funcionam.
Sondagem do Datafolha
confirma a larga dianteira de Bolsonaro entre os eleitores evangélicos.
Mesmo na faixa dos mais pobres, o presidente empata com
Lula, em resultado contrastante com o do conjunto do eleitorado. A
"guerra santa" é o único terreno favorável ao golpista que ocupa o
Planalto. Lula, Ciro e Simone Tebet não ousam formular a resposta certa à
armadilha político-religiosa.
Tebet participou da Marcha para Jesus, em São Paulo, veiculando a mensagem de que também caminha com Deus. Lula convocou um pastor evangélico para viajar com ele e produzir conteúdo de campanha destinados a afastar os fiéis da "bolha bolsonarista". Mais: apesar de criticar a "guerra santa", proclamou que "Bolsonaro usa Deus e Deus usa o Lula". A disputa por Deus serve, exclusivamente, para normalizar a cruzada bolsonarista.
Lula não deixou de defender a laicidade
estatal. Explicou que não é "candidato de uma facção
religiosa", rejeitou
estabelecer "rivalidade entre as religiões" e
enfatizou o lugar da religião "é para cuidar da nossa fé, da nossa
espiritualidade, não para fazer política". Contudo, atestando sua
perplexidade diante do tema, insinuou uma crítica descabida aos fiéis:
"Quando quero falar com Deus, não preciso ter padre ou pastores; posso me
trancar no meu quarto e conversar com Deus quantas horas quiser".
Ciro foi à raiz do problema, associando a
proteção da liberdade religiosa ao Estado laico e a manipulação da
religiosidade ao fundamentalismo autoritário. Mesmo assim, não conseguiu sair
da defensiva.
O artigo 19 da Constituição veda aos
governos federal, estaduais ou municipais "estabelecer cultos religiosos
ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles
ou seus representantes relações de dependência ou aliança". A determinação
dupla está deliberadamente expressa numa única sentença.
Quando o Estado alia-se a uma denominação
religiosa ou igreja, discrimina contra todas as outras, violando a liberdade de
religião. É precisamente isto que faz o governo Bolsonaro, sem ser incomodado
pelo Ministério Público ou pelo Congresso.
A política pertence à esfera pública; a
religião, à esfera privada. Só o Estado sem religião propicia a liberdade
religiosa às mais diversas crenças. Os fiéis de todas as religiões, inclusive
evangélicos, são capazes de entender a encruzilhada —com a condição de que os
candidatos assumam, nítida e ofensivamente, o discurso da laicidade.
O tema pode ser abordado na linguagem da
religião: "Não tomarás em vão o nome do Senhor, o teu Deus, pois o Senhor
não deixará impune quem tomar o seu nome em vão". Pode, ainda, ser
traduzido no idioma da política: todas as igrejas têm os mesmos direitos – e,
por isso, o governo está proibido de interferir no domínio da religião. No
lugar de marchar em procissões ou participar de cultos, os adversários da
"guerra santa" precisariam mobilizar lideranças religiosas para
explicar o valor da laicidade estatal.
A política identitária está na moda, pela
direita e pela esquerda. "Evangélico vota em evangélico"; "negro
vota em negro" – inexiste diferença de natureza entre a proposição
bolsonarista e a racialista. A distinção encontra-se, porém, na eficácia. A
bandeira racialista circula numa bolha quase irrelevante de ativistas
profissionais. Já o estandarte da "guerra santa" tem impacto
nacional. É hora de confrontá-lo.
A Micheque se enganou: o palácio é habitado por demônios nos últimos 5 anos! Como o genocida que dorme com ela de vez em quando...
ResponderExcluirDeus foi sempre invocado por Bolsonaro nos seus 3 anos e meio de crimes e mentiras! E Deus não nos salvou das maldades bolsonaristas... Mas os eleitores agora é que vão se salvar, escolhendo outro candidato pra substituir o mau militar e péssimo presidente que afundou o Brasil com sua arrogância e o auxílio luxuoso de milhares de militares tão incompetentes quanto ele. Em que país do mundo um GENERAL é ministro da Saúde??
ResponderExcluirO colunista está errado ao afirmar que Lula "insinuou uma crítica descabida aos fiéis" ao dizer: "Quando quero falar com Deus, não preciso ter padre ou pastores; posso me trancar no meu quarto e conversar com Deus quantas horas quiser".
ResponderExcluirLula apenas expôs sua opinião, sem fazer qualquer crítica a fiéis ou religiosos! O preconceituoso colunista sempre que pode distorce ou deturpa fatos e interpretações, tentando prejudicar posições políticas que vão contra seu conservadorismo ideológico.
Lula já dizia de Fernando Collor de usar Deus como cabo eleitoral,o ex-presidente só usa o nome do criador para se defender de ataques infundados.
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