O Globo
As rachadinhas não foram punidas. O
processo perdeu-se nos meandros de uma Justiça cheia de juízes que sonham ser
ministros
O inverno no Rio é ameno e ensolarado. Do
ponto de vista do clima, sentimo-nos no melhor lugar do mundo e quase
esquecemos a tragédia que envolve nossa vida pública. O
governo do estado tem mais de 20 mil funcionários secretos no ano
eleitoral e gasta com eles em torno de R$ 270 milhões.
É um dinheiro pago na boca do caixa. Só
uma agência de banco em Campos dos Goytacazes registrava um saque a
cada 49 segundos, sem dúvida um recorde.
No Rio, alguns dos governadores foram
presos, e possivelmente o estado deverá manter essa tradição num futuro
próximo. Mas não é um lugar isolado no Brasil. Digamos que é apenas a capital
do país que tem um orçamento secreto e, nos últimos meses, decreta sigilo de
cem anos sobre algumas decisões e documentos oficiais.
Outro dia, numa mesa entre amigos em
Brasília, discutíamos o que fazer após as eleições. Mencionavam-se alguns
destinos possíveis, caso o resultado fosse tenebroso, Uruguai, Portugal.
De qualquer forma, seguirei aqui, esse é o
meu plano. Já vivi muitos anos fora do Brasil e há algumas dezenas de lugares,
dentro do país, onde viveria bem.
Não se trata de desistir do Brasil, assunto que já foi tema de campanha presidencial.
Na minha idade, desisti de desistir. O
simples fato de sobreviver cada dia é um ato de resistência. E além do mais,
ainda que fique indignado e reclame, o Brasil é inesgotável em suas loucuras.
Às vezes, sinto-me culpado por continuar
vivendo no Rio, como se nada acontecesse na esfera política. Tenho procurado
votar bem, acompanho a trajetória dos candidatos que escolhi, participo de
grupos de debate sobre a reconstrução a partir da sociedade. “E daí?”, me
pergunto. Há uma barreira impenetrável quando se pensa em ajustar a máquina
pública aos interesses do Estado.
Outro dia vi o debate entre candidatos ao
governo do Rio. Fiquei um pouco deprimido. O governador é um tipo de político
que me parece de outra galáxia. Não há por onde discutir, por onde criticar,
aliás ele nem se importaria com isso:
—Vocês reclamam nas redes sociais, mas
amanhã cedo retomo meu trabalho pelo povo do Rio de Janeiro.
Naturalmente, retoma seu trabalho dirigindo
mais de 20 mil funcionários secretos, provavelmente “aspones” (assessores de
porra nenhuma) para obter um resultado que, de resto, cairá na rubrica do
sigilo por cem anos.
O Rio é capital das trevas bolsonaristas.
Aqui, o filho do presidente foi acusado de rachadinhas, a Justiça conseguiu
neutralizar a acusação; afinal, é um filho de presidente num país em que juízes
sonham ser ministros.
Das rachadinhas passamos à rachadona. Se
fosse apenas um mundo paralelo com seus deputados, “aspones”, governador e
presidente, não me importaria tanto. Acontece que esse mundo paralelo se
alimenta de dinheiro público, essencial para manter escolas, hospitais, aparato
de segurança. Provavelmente alguns de nós não dependem dessas escolas, nem dos
hospitais, e possam até manter segurança própria. Mas aí é que está a
perversidade do esquema: ele se alimenta de dinheiro essencial para manter
serviços de educação e saúde para quem não pode comprá-los no mercado.
As rachadinhas não foram punidas. O
processo de Flávio Bolsonaro perdeu-se nos meandros de uma Justiça cheia de
juízes que sonham ser ministros e querem agradar ao presidente.
No final do conto da carochinha, o
filho do presidente foi para Brasília, comprou a mansão de R$ 6 milhões e será
feliz pelo resto da vida.
Por isso, digo, é importante ficar e
resistir para contar essas histórias. Perversos com os pobres são generosos com
escritores em busca de histórias. Imaginem 20 mil funcionários secretos
enfileirados diante do caixa do banco, sacando freneticamente a cada 49
segundos; imaginem a rotina de mais um governador na cadeia, embalando o
presídio com cantos religiosos e um violão.
Durante muitos anos, o realismo mágico
reinou na literatura latino-americana. No Brasil oficial, vivemos a ressaca do
realismo mágico: triste e vulgar.
Caro escritor Gabeira, já dei muitas risadas no seu livro de memórias em que você conta a participação no sequestro do embaixador alemão em um ato violento usando revólveres e metralhadoras , e o mantiveram em cativeiro por vários dias, um bando de estudantes de esquerda sem noção, achando que estavam fazendo a revolução
ResponderExcluirRealmente hilário, mas eu gostaria de aproveitar oportunidade fora a brincadeira, de ouvir a sua opinião sobre as declarações do escritor Mário Vargas Llosa, premio Nobel de literatura, nas quais ele diz que de maneira alguma votaria no Lula, por ter um histórico de muita corrupção
Apesar de não simpatizar com Bolsonaro , ele vê em Lula um perigo enorme não só para o Brasil como toda América Latina, visto que quatro presidentes peruanos foram corrompidos por Lula quando presidente , o que causou graves problemas políticos e econômicos para o país
E todos os problemas que Bolsonaro já causou ao nosso país? Nosso país está hoje isolado das demais nações, é um pária internacional, para orgulho do ministro das Relações Exteriores. EUA, China, Alemanha, Inglaterra, França, Itália, nenhum destes governos respeita Bolsonaro. O genocida apostou todas as fichas no canalha do Trump, e perdemos... Só Putin e a Turquia tem interesse em Bolsonaro... Logo o "comunista" russo é amigo do capitão, que faz propaganda anticomunista por aqui... Bolsonaro é uma catástrofe nacional e internacional... O Brasil levará décadas pra se recuperar do desastre Bolsonaro!
ResponderExcluirSó Jesus na causa.
ResponderExcluirPeço licença ao meu xará Gabeira para responder ao anônimo que pediu um comentário à fala de Vargas Llosa sobre Lula. O grande escritor se comportou como um membro da classe média pudibunda. A corrupção é inerente ao capitalismo ou existe algum país capitalista isento de corrupção? Aprofundando esse pensamento, todo capitalista é um ladrão, espécie de ladrão social dentro das leis: códigos civil, penal, Constituição e em última instância os destacamentos especiais de homens armados que vão dos esquadrões da morte às FFAA. Não ia ser Lula que faria funcionar um capitalismo sem corrupção. E o boçal é pior do que Lula nesse sentido. Já vi um homem do povo defender Lula com o seguinte argumento: "Ele rouba menos, porque só tem nove dedos". Bolsonaro e a orcrim familiar somam 50 dedos. Fora os dedos dos homens do centrão.
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