quarta-feira, 10 de agosto de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Surpresas podem mudar quadro eleitoral consolidado

Valor Econômico

Quadro eleitoral ainda pode ter mudanças significativas, como ocorreu em pleitos anteriores

Com o fim das convenções partidárias, o jogo eleitoral começa oficialmente agora. A polarização eleitoral se exprimiu em uma rigidez nas pesquisas eleitorais, com poucos movimentos desde o início do ano entre o favorito, Luiz Inácio Lula da Silva, e o segundo colocado, o presidente Jair Bolsonaro. O número de eleitores convictos de seu voto em um dos dois é o mais alto em muitos pleitos com tanta antecedência e esse é um dos grandes obstáculos à terceira via, ela própria perdida entre a ausência de rumos, demora na escolha do candidato e traições políticas. Muita coisa pode mudar a partir de agora, e o retrato da faixa de largada importa para avaliar as chances iniciais dos candidatos.

Os votos contra o presidente e seu péssimo governo estão vindo por gravidade para Lula. O ex-presidente formou a maior coalizão partidária (9 partidos, um subjudice) e terá o maior tempo de propaganda na rádio e TV. O PT quer liquidar a fatura no primeiro turno, entusiasmado pela manutenção de seu enorme favoritismo no Nordeste e entre os eleitores com até dois salários mínimos, contingente que representa mais da metade em pesquisas como as do Datafolha. Seu avanço no Sul, que se inclinou para Bolsonaro em 2018, e a formação de fortes palanques estaduais em São Paulo e Minas Gerais, os dois maiores colégios eleitorais, além da ampla rejeição a Bolsonaro, abrem uma fresta para a vitória em um turno. Esse cenário não é o mais provável, porém.

A mobilização multiforme de recursos fiscais e parafiscais com fins eleitoreiros pelo governo pode permitir que Bolsonaro leve a disputa para o segundo turno. Com estímulos de mais de R$ 300 bilhões para impulsionar o crescimento, que deve ser maior, diminuir o desemprego, o que está acontecendo, e ampliar o auxílio social houve um início de reação do candidato oficial, ainda que esmaecida.

Bolsonaro reagiu entre os eleitores de baixa renda e do sexo feminino, segmentos nos quais sua rejeição é maior. Algumas pesquisas captam a lenta diminuição da diferença entre os dois candidatos. A percepção de que a rejeição a Lula está subestimada será testada agora no calor da campanha.

O parto moroso de um candidato de terceira via deixou por tempo demais o campo eleitoral ocupado pelos dois principais contendores. As divergências acirradas no PSDB sobre quem seria o candidato ao Planalto, João Doria ou Eduardo Leite, terminou com o fato inédito desde 1994 de os tucanos ficarem fora da disputa presidencial. A emedebista Simone Tebet teve de esperar o resultado desta guerra intestina e assistir às manobras pirotécnicas de Luciano Bivar, do União Brasil, que rompeu com a terceira via sem jamais ter entrado nela para, no final da comédia, sequer se lançar à corrida ao Planalto.

Simone Tebet é a terceira candidata com mais tempo de propaganda na TV. Seu maior problema está, desde o início, em seu próprio partido, uma federação de interesses regionais com inapetência para concorrer ao Executivo federal. Por isso, caciques do MDB, como Renan Calheiros, apostam em Lula - escolha esmagadora nos diretórios da região Nordeste. As divisões e a demora para o lançamento da candidatura a deixaram também sem palanques estaduais nos maiores colégios eleitorais, com exceção de São Paulo e Rio Grande do Sul, e, no total, em apenas 8 Estados.

Uma campanha bem feita e boas propostas podem mudar parte do jogo a seu favor. Tebet é a única “cara nova” relevante na disputa, e tem baixa rejeição, o que lhe abre algum espaço. Ela pode atrair boa parte dos eleitores tucanos e desgarrados da centro-direita, com chances de trazer mais problemas para Bolsonaro do que para Lula.

O veterano Ciro Gomes, diferentemente de Tebet, tem um partido até coeso atrás de si, o PDT, mas é o exército de uma legenda só. Ciro tem palanques estaduais em 11 Estados, mas na maior parte deles com candidatos pouco competitivos. Ele está parado em terceiro lugar nas pesquisas, com ao redor de 8% das preferências. É também o terceiro candidato mais rejeitado, com 25% (Datafolha).

A possibilidade de derretimento da candidatura Bolsonaro em prol da terceira via tornou-se remota, embora seu descontrole, que muitas vezes passa por estratégia, possa fazer muito contra si. Mas, mesmo cometendo barbaridades, tem ainda entre 25% e 30% do eleitorado a seu favor. O apoio das raposas políticas o Centrão podem consertar alguns estragos, mas nem todos. Em um par de semanas as eleições entrarão no radar dos brasileiros e o quadro pode ter mudanças significativas, como ocorreu em vários pleitos.

Não às provocações

Folha de S. Paulo

Afastamento de coronel que espalhava mentiras sobre urnas expõe despreparo das Forças Armadas

Duas medidas tomadas pelo Tribunal Superior Eleitoral nesta segunda (8) mostraram ao comando das Forças Armadas que não há tolerância para quem quiser tumultuar o pleito de outubro.

Pela manhã, a corte comunicou ao ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, o descredenciamento de um dos militares indicados pelas Forças Armadas para participar dos trabalhos de fiscalização do processo eleitoral.

O coronel do Exército Ricardo Sant’Anna foi posto para fora após a descoberta de publicações que fez nas redes sociais, disseminando mentiras e teses fantasiosas sobre a segurança da votação eletrônica.

Como explica o ofício do tribunal, assinado pelos ministros Edson Fachin, que preside o TSE, e Alexandre de Moraes, que assumirá o posto na próxima semana, constatou-se que o coronel não tem isenção para fiscalizar nada, e por isso não merece a confiança do tribunal.

Se é espantoso que o Ministério da Defesa tenha nomeado alguém assim para atuar na auditoria das eleições sem submeter sua ficha a escrutínio, surpreende também a leniência com que o coronel foi tratado por seus superiores.

Embora normas disciplinares do Exército proíbam manifestações políticas dos militares em redes sociais, não se tem notícia de que o regulamento tenha sido aplicado a Sant’Anna —nem mesmo após a revelação de suas postagens pelo site Metrópoles, na última sexta (5).

Na tarde do mesmo dia em que afastou Sant’Anna, Fachin rejeitou pedido esdrúxulo apresentado por ele e outro representante das Forças Armadas em busca de informações das eleições de 2014 e 2018.

Na resposta aos militares, o tribunal informou que o prazo para tais solicitações expirou há anos e alguns dos arquivos requisitados já estão até disponíveis no site do TSE.

Os constrangimentos colocam em xeque a credibilidade dos militares e expõem seu despreparo para a missão que tentam desempenhar desde que o tribunal os convidou a participar da fiscalização do pleito.

Há uma semana, o ministro da Defesa chegou a enviar um ofício em caráter "urgentíssimo" para pedir dados que estão há meses disponíveis. Questionamentos no início do ano basearam-se em erros de cálculo e suposições equivocadas.

Em sua campanha para desacreditar as urnas e tumultuar o ambiente político, Jair Bolsonaro (PL) sugere que só respeitará o resultado das eleições se as Forças Armadas atestarem a lisura do processo.

Lamentavelmente, tudo que os militares fizeram até aqui foi dar corda às patranhas do mandatário, sem exibir um fiapo de prova de que exista algo errado nas urnas. O desgaste da imagem das Forças Armadas mostra que a associação com os provocadores custará caro.

Cortina aberta

Folha de S. Paulo

Nova lei de fomento à cultura promete estimular diversidade na produção, com menos burocracia

É sabido que a cultura figurou entre os setores mais afetados pela pandemia. Da noite para o dia, teatros, casas de espetáculo, cinemas e museus fecharam, e assim permaneceram por meses a fio, deixando à míngua artistas e profissionais que têm no público sua principal fonte de renda e financiamento.

Face a esse quadro dramático, o Congresso aprovou a Lei Aldir Blanc, em 2020. O socorro de R$ 3 bilhões foi destinado ao pagamento de um benefício temporário de R$ 600 mensais a profissionais da área, a subsídios para manutenção de espaços culturais, cooperativas e organizações do setor cultural, e a financiamento de projetos.

Diante das mudanças promovidas pelo governo Jair Bolsonaro (PL) na Lei Rouanet, que limitaram o uso dos benefícios que ela proporciona e trouxeram insegurança para o setor, o Congresso agiu mais uma vez, criando a Lei Aldir Blanc 2.

O novo diploma fez da ajuda emergencial uma política permanente de fomento à cultura, com previsão de repasses anuais de R$ 3 bilhões a estados e municípios por cinco anos a partir de 2023. Bolsonaro vetou a lei, mas o Congresso reverteu a decisão na última semana.

Bastante comemorada pelo setor, a iniciativa assegura um montante inédito de verbas para a cultura. Em comparação, a Lei Rouanet movimenta R$ 1,2 bilhão por ano. Mais importante ainda é para onde o dinheiro está indo —e são promissores os sinais colhidos até agora.

Dados sobre os incentivos distribuídos pela primeira Lei Aldir Blanc na pandemia mostram que o montante não só chegou a muitos profissionais que não vinham recebendo apoio como financiou projetos menores, estimulando, em tese, maior diversidade da produção artística e cultural.

Assim, foi possível preencher uma lacuna deixada pela Rouanet, que tende a concentrar verbas num número menor de projetos.

Segundo o Observatório da Economia Criativa da Bahia, 63% dos contemplados pela Aldir Blanc não recebiam recursos públicos desde 2016. A média por projeto foi de R$ 24 mil, ante R$ 461 mil da Rouanet.

A capilaridade e o volume sem precedentes trazem juntos o desafio da fiscalização do uso correto dos recursos. Com o fim de desburocratizar e simplificar a prestação de contas, a lei estabeleceu como objeto principal de avaliação o produto cultural entregue. Para benefício dos próprios artistas, é crucial que isso seja feito da forma mais transparente possível.

A relevância de uma âncora fiscal

O Estado de S. Paulo

Qualificar o debate sobre a importância da austeridade é o primeiro passo para que o País possa elaborar políticas públicas para solucionar problemas históricos

Os ataques do presidente Jair Bolsonaro ao teto de gastos anteciparam uma discussão que deve monopolizar as atenções do governo a ser eleito em outubro deste ano. Diante da desmoralização do dispositivo, candidatos à Presidência da República têm sido questionados sobre a âncora fiscal que adotariam em caso de vitória na disputa. Antecipando-se a esse cenário, servidores públicos de carreira começaram a desenhar alternativas a serem apresentadas. A mais recente, revelada pelo Estadão em meados de julho, é a que impõe uma meta e uma banda de flutuação para a dívida pública na proporção do PIB, a exemplo do sistema de metas de inflação adotado há 23 anos pelo Banco Central (BC).

À primeira vista, a sugestão pode parecer um voluntarismo da equipe liderada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, protagonista na destruição do arcabouço fiscal. Trata-se, no entanto, de algo que já estava previsto para ser regulamentado desde março de 2021, quando da promulgação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Emergencial. O texto, além de garantir o socorro aos vulneráveis, estabelecia que a União deveria conduzir sua política fiscal de forma a manter a dívida pública em nível sustentável, especificando os indicadores de sua apuração e uma trajetória de convergência atrelada a limites definidos em uma nova legislação, bem como medidas de ajuste, suspensões, vedações e planejamento de alienação de ativos.

Todos estes detalhes devem constar de uma lei complementar ainda em elaboração, a ser submetida à apreciação do Congresso após a eleição. Definir uma meta para o endividamento público pode ser perigoso em se tratando da administração atual. Com uma dívida bruta de R$ 7 trilhões, o equivalente a 78,2% do PIB, cada ponto porcentual significaria cerca de R$ 90 bilhões a serem cortados ou liberados, a depender da trajetória do endividamento. Para que se tenha uma ideia da relevância da discussão, o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias prevê apenas R$ 108,2 bilhões em despesas discricionárias para todo o ano de 2023.

Bem mais simples que uma meta para a dívida, o teto de gastos foi fundamental para resgatar a credibilidade do País após o desastre da administração Dilma Rousseff. O dispositivo criado em 2016 não deixava espaço para questionamentos. Ao limitar o crescimento das despesas à variação da inflação, a regra impediria que receitas extraordinárias fossem usadas para aumentar a proporção do dispêndio público, conduzindo a um superávit ao longo do tempo. O vigor do teto, no entanto, sempre dependeu de um compromisso do País com reformas estruturais. Nesse sentido, Bolsonaro explicitou as consequências nefastas da vitória de um presidente sem liderança e de um governo sem projeto. A construção de uma maioria parlamentar cooptada por emendas não garantiu a aprovação de propostas para tirar o País da estagnação econômica, mas assegurou que o teto fosse alterado cinco vezes. A mais recente, em julho, serviu para autorizar gastos eleitoreiros e dar algum fôlego a seu projeto de reeleição.

O resultado dessa gastança desenfreada é que hoje a dívida pública está muito acima dos 60%, patamar que é considerado referência para economias emergentes. É o tamanho do endividamento que explica o fato de a inflação e os juros estarem tão mais altos no Brasil em relação à maioria dos países do mundo. Qualificar o debate sobre a importância da austeridade fiscal é o primeiro passo para que o País possa elaborar todas as outras políticas públicas necessárias para solucionar problemas históricos, tais como o crescimento pífio, a falta de investimentos, os gargalos na saúde, a baixa qualidade da educação básica e o retorno da fome. Combater essas mazelas sem resgatar a credibilidade perdida será impossível. Dado o histórico da gestão Bolsonaro, a definição da âncora, neste momento, é indiferente – se o teto foi violado, a meta para a dívida também o seria. O essencial é que tal âncora exista e que ela seja efetivamente respeitada por todo e qualquer governo.

Famílias em crise no radar da CNI

O Estado de S. Paulo

Pesquisa detalha redução de consumo, endividamento e inadimplência de consumidores; mesmo com a melhora de alguns indicadores, o quadro geral permanece muito difícil

Cortar gastos, baixar o padrão de vida, pechinchar, endividar-se e atrasar pagamentos têm sido soluções encontradas por milhões de famílias para sobreviver, mesmo com algum aumento do emprego e outros sinais de reativação econômica. A gravidade do quadro acaba de ser evidenciada, mais uma vez, por uma detalhada pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Pesquisas sobre endividamento e inadimplência são publicadas, habitualmente, por entidades de representação do comércio ou especializadas em informações de mercado. Nesse campo, a CNI raramente vai além das sondagens sobre a confiança do consumidor. O empenho da entidade em examinar o assunto mais de perto é mais um importante sinal de alerta, apesar de um toque de otimismo introduzido pelo presidente da entidade, Robson Braga de Andrade. Depois de citar indícios de retomada, ele falou de uma “perspectiva de superação, ainda que gradual”, das atuais dificuldades.

Essa perspectiva parece influenciar muito limitadamente, por enquanto, a maioria dos consumidores. Só 14%, segundo a pesquisa, pretendem aumentar os gastos até o fim do ano, embora 61% das pessoas com o consumo já reduzido demonstrem otimismo, qualificando as atuais dificuldades como temporárias. A cautela, no entanto, é muito compreensível, depois das duras experiências dos últimos meses.

Quase dois terços – 64% – dos consumidores cortaram gastos desde o início do ano, 68% pechincharam, 34% atrasaram contas de luz ou água, 19% deixaram de pagar plano de saúde e 16% venderam algum bem para liquidar dívidas.

Um em cada quatro reclama de falta de dinheiro para pagar todas as contas mensais e apenas 29% se declaram capazes de guardar algum dinheiro. Um em cada cinco recorreu a algum empréstimo ou assumiu algum outro tipo de dívida nos últimos 12 meses. Pesquisas de outras entidades, como a Confederação Nacional do Comércio (CNC) e a Serasa, têm mostrado o endividamento crescente e a inadimplência em níveis dificilmente atingidos em outros anos. Segundo a CNC, em julho 78% das famílias estavam endividadas e 29% tinham compromissos em atraso. Um ano antes esses números eram 71,4% e 25,6%.O porcentual de famílias com dívidas em atraso foi o maior da série iniciada em 2010.

As causas do endividamento crescente e do agravamento da inadimplência são conhecidas de empresários e de analistas. As más condições de emprego, a inflação acelerada e os juros altos – agravados pelas condições internacionais – têm pressionado as famílias. Mesmo com a melhora de alguns indicadores, o quadro geral permanece muito difícil para os brasileiros. O desemprego pode ter recuado para perto de 9% da população ativa, mas esse porcentual ainda é elevado e, além disso, há muita informalidade e a população subutilizada é muito grande – superior a 20%.

Ainda que haja alguma retomada neste semestre, as condições do emprego continuarão precárias e parte da melhora será apenas sazonal. Além disso, a recuperação da atividade será modesta, segundo as estimativas correntes. Apesar do otimismo exibido por alguns empresários, poucos apostam em crescimento econômico superior a 2% neste ano. Pela mediana das projeções do mercado, o Produto Interno Bruto (PIB) aumentará 1,98% em 2022 – resultado inferior aos de outros emergentes e de vários países avançados. Além disso, as estimativas para 2023 têm diminuído e a mediana agora aponta um avanço de 0,40%, com inflação de 5,36% e taxa básica de juros ainda em 11%. São péssimos prenúncios para o próximo governo e também, é claro, para a maioria das famílias. Essas projeções aparecem na pesquisa semanal Focus, do Banco Central.

Alguma melhora pode logo evaporar-se. Bondades eleitorais, como o aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, estão previstas para acabar em dezembro. Podem ser prorrogadas, mas falta saber como continuar financiando esses benefícios com dinheiro público. Os dirigentes da CNI têm razões consideráveis para se preocupar com as condições, atuais e previsíveis, dos consumidores e também do Tesouro.

Causas da inflação permanecem

O Estado de S. Paulo

Medidas para baratear combustíveis e energia puxaram a deflação de julho; riscos inflacionários continuam

Prevista há semanas pelos especialistas, a deflação de 0,68% em julho proporciona poucos motivos para comemoração, principalmente por causa dos preços da comida, com aumentos de 1,30% no mês e 14,72% em 12 meses. Dos nove grupos de bens e serviços pesquisados, só transportes e habitação tiveram variação negativa, puxada pelos preços dos combustíveis (-14,15%) e da energia elétrica residencial (-5,78%). Os outros sete continuaram em alta. A taxa de -0,68%, a mais baixa da série iniciada em janeiro de 1980, resultou de manobras político-eleitorais para baratear combustíveis e eletricidade – reduções de impostos e revisões extraordinárias de tarifas. Derrubaram-se alguns preços, mas nenhuma causa de inflação foi atacada. Os números são do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Embora tragam algum alívio imediato, medidas eleitoreiras podem resultar em novas pressões inflacionárias nos próximos meses e, muito provavelmente, no próximo ano. Cortes de impostos, aumento do Auxílio Brasil, benefícios a caminhoneiros, outras bondades fiscais e as incertezas sobre o futuro das contas públicas tendem a causar instabilidade de preços. Esses fatores estão no radar do Copom, o Comitê de Política do Banco Central (BC).

Na semana passada o comitê elevou de 13,25% para 13,75% ao ano a taxa básica de juros. Se houver novo aumento em setembro, será provavelmente para 14%. Mas essa e outras altas dependerão do exame de novos dados. Segundo a ata da última reunião do Copom, realizada nos dias 2 e 3, “políticas temporárias de apoio à renda” podem elevar os prêmios de risco, afetar a trajetória das contas públicas e aumentar as expectativas inflacionárias. Essas políticas incluem, obviamente, as bondades eleitoreiras com custo estimado em R$ 41,2 bilhões neste ano.

Além das pressões inflacionárias internas, o Copom leva em conta as cotações internacionais de produtos básicos, a inflação nas grandes economias e as ações – basicamente aumentos de juros – implementadas no mundo rico para conter a alta de preços. Na política de aperto contra a inflação, o banco central dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed), é o mais avançado, até agora.

Juros mais altos nesses países mexem com os fluxos de capitais e com as taxas de câmbio. Isso favorece a saída de recursos dos países emergentes e a valorização do dólar, limitando o campo de ação dos bancos centrais do Brasil e de vários outros países. Também por isso o Copom terá menos espaços, no futuro próximo, para afrouxar sua política.

Mas esse é apenas um dos motivos para manter elevada a taxa básica de juros. Com a insegurança fiscal agravada neste ano e seus prováveis efeitos em 2023, o Copom terá motivos locais para manter os juros elevados por bom tempo e reduzi-los lentamente. Pelas estimativas atuais, a inflação deverá ficar bem próxima da meta em 2024, segundo ano do próximo governo, quando o centro do alvo estará em 3%. Até lá o Copom terá de persistir no esforço para frear a alta de preços, mesmo com o custo de restringir o crescimento econômico.

Programas de presidenciáveis precisam ser sérios

O Globo

Planos de governo não passam de amontoados de devaneios. Os eleitores merecem mais respeito

Os partidos têm até a próxima segunda-feira para protocolar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um documento com as diretrizes dos respectivos planos de governo de seu candidato à Presidência. Da extrema direita à extrema esquerda, a exigência legal é encarada como formalidade burocrática. Não deveria ser assim. Em vez de textos delirantes, feitos muitas vezes às pressas por marqueteiros, os documentos deveriam fazer jus ao nome — um plano de governo — e servir para informar os eleitores.

Em 2018, o então candidato Jair Bolsonaro apresentou um vergonhoso conjunto de slides de PowerPoint à guisa de programa. Batizado “O caminho da prosperidade”, já era uma aberração antes de o governo começar. Passados quase quatro anos, orçamentos secretos e o reinado do Centrão no Congresso, vários trechos soam hoje tragicômicos, em especial aquele que prometia “um governo sem toma lá dá cá, sem acordos espúrios”.

Segundo reportagem do GLOBO, neste ano a campanha de Bolsonaro tentará caprichar, evitando o estilo de apresentações projetadas na parede. No formato, será um avanço. Em termos de conteúdo, porém, aparentemente as propostas serão novamente superficiais ou, pior, sem sentido. A promessa estapafúrdia de ampliar acesso a armas de fogo está na versão preliminar. A manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600 a todos os beneficiados consta do plano sem ressalvas, mesmo depois das críticas à falta de foco do programa de transferência de renda.

Bolsonaro, que não abriu o país à competição internacional, interveio na Petrobras para baixar o preço do combustível e insiste em delírios nacionalistas à base de nióbio e grafeno, tem ainda a desfaçatez de se apresentar como ícone do liberalismo. Parece piada. Não é a única. Como se a atual administração não tivesse batido recordes sucessivos de devastação da Amazônia, o rascunho da proposta fala em “uso responsável dos recursos naturais”.

O plano de governo apresentado recentemente ao TSE pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, elaborado depois de debates intermináveis, também não fica atrás. Mostra que o PT aprendeu pouco com os erros do passado. Como se a administração de Dilma Rousseff jamais tivesse existido, defende “recompor o papel indutor e coordenador do Estado e das empresas estatais” na economia. Lamentável.

Promete “adotar uma estratégia nacional de desenvolvimento justo, solidário, sustentável, soberano e criativo…”, numa mostra de que os programas partidários no Brasil aceitam todo tipo de devaneio. Só faltou dizer que usará a mesma varinha de condão para livrar o país de todas as maldades e pecados. Para concluir, o PT também insiste, como Bolsonaro, em prejudicar a Petrobras. O documento fala em mudar a política de preços que garante a saúde financeira da empresa.

O eleitor precisa ter acesso a programas minimamente realistas, feitos a partir de uma análise honesta, informada e intelectualmente consistente do que deu certo e errado no passado, sem promessas vazias e ilusórias. O Brasil exige planos que não se resumam apenas a palavras de efeito ou chavões ideológicos para ludibriar os menos atentos.

Incerteza fiscal é principal risco que ameaça a queda da inflação

O Globo

Deflação reflete redução no preço de combustíveis e impõe a futuro governo desafio de recobrar confiança perdida

Enquanto os exegetas monetários se debruçam sobre a ata do Copom para identificar sinais dos próximos movimentos dos juros, a inflação dá sinais consistentes de trégua. Como era previsto diante da profusão de malabarismos do governo para reduzir o preço dos combustíveis, julho registrou deflação. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou o mês em 0,68% negativo, menor taxa desde 1980. No acumulado em 12 meses, caiu de 11,9% para 10,1%, patamar compatível com dezembro de 2021.

O sentimento de que os produtos estão mais baratos pode não ser notado nas gôndolas dos supermercados, mas a inversão da trajetória de alta dos preços é inequívoca. Ainda assim, as expectativas do mercado são ambivalentes. Muitos analistas julgam se tratar de queda pontual, resultado apenas do barateamento dos combustíveis. Ao mesmo tempo, ela derruba as expectativas pessimistas. O transporte mais barato acabará por influir nos demais preços. É razoável esperar uma inflação mais suave pelo menos até o final deste ano.

A maior dúvida diz respeito ao próximo. Para reduzir o preço do combustível, o governo armou uma bomba fiscal imponderável. Adiou o pagamento de dívidas (precatórios), adiou aumentos para o funcionalismo, antecipou a receita de estatais superavitárias (em particular a Petrobras) e obteve do Congresso autorização para diversas despesas de caráter eleitoreiro, acima do permitido pelo teto de gastos, como o bônus para beneficiários do Auxílio Brasil.

É certo que, como resultado da alta na arrecadação, as contas públicas fecharão o ano com déficit aquém do previsto, talvez até fiquem no azul pela primeira vez em oito anos. Mas o futuro é uma incógnita, em razão das dúvidas que pairam sobre o próximo governo.

Dá-se em Brasília como certa a manutenção do valor “provisório” do Auxílio Brasil em R$ 600, além de uma onda de reajustes ao funcionalismo. Na surdina, os dois primeiros colocados na pesquisas preparam mecanismos para revogar o teto de gastos, única âncora que tem mantido as despesas públicas sob controle. O resultado esperado de gastos sem lastro é óbvio: aumento no déficit e na dívida pública.

Para dissipar a dúvida, cabe aos candidatos esclarecer como recobrarão a confiança fiscal antes da eleição, e nenhum dos líderes tem feito isso a contento. O Ministério da Economia estuda estabelecer, no lugar do teto, uma meta para a dívida pública caso o presidente Jair Bolsonaro seja reeleito, mas é difícil avaliar a eficácia dessa nova âncora sem esclarecer seu formato preciso. O principal candidato de oposição, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se limita a afirmar que criará um novo mecanismo para a manutenção do equilíbrio fiscal. Tudo ainda vago. Nada contribuirá tanto para alimentar a expectativa inflacionária — e para novos aumentos de preços — quanto a incerteza fiscal.

Um comentário:

  1. Gostaria de insistir que algum das mídias presente nessa coluna comentasse a última pesquisa da Brásmarket publicada na segunda-feira dia oito, que pela primeira vez coloca Bolsonaro a frente na intenção de voto para presidente com 39.8%, contra Lula 33.1%
    Diferença bem acima da margem de erro

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