Folha de S. Paulo
Criança com fome e sem escola resume futuro
que Bolsonaro oferece
Muita coisa subiu e caiu no governo
Bolsonaro. Muita coisa subiu e caiu por escolha governamental
independente das contingências, do STF, das jornalistas, do vírus e do PT. Por
opção consciente.
Subiu o superpatrimônio da família adquirido em dinheiro vivo, método de crime organizado; explodiram os supersalários militares, os desvios orçamentários para destinos secretos; subiram os ataques racistas, homofóbicos e neonazistas; subiu a violência contra a mulher. Inventou-se na oficina de criatividade bolsonarista o uso de crianças para incentivar violência armada, e o assédio a criança grávida por estupro, sob ordem de ministra.
Subiram a pobreza, a fome, a população em situação de rua; explodiu o número de armados e o escoamento de armas legais para o crime organizado. Explodiram o desmatamento e o ataque a indígenas. Contrataram o subdesenvolvimento e o colapso climático: dilapidar o maior tesouro da economia do século 21 para investir em economia extrativista e neocolonial.
Caiu, e em alguns casos se extinguiu, a proteção
de direitos e liberdades. Atividades-fim e atividades-meio da civilização
sofreram cortes brutais nos orçamentos: de saúde e educação em todos os níveis,
de cultura e ciência. A Farmácia
Popular teve corte de 50%. Não foi pela eficiência de gastos. E não
falamos dos desvios para corrupção nem da intimidação que paralisa o estado.
Nem falamos de mortes encomendadas na pandemia.
Caiu nossa capacidade institucional para
assegurar obediência à lei. Facilitaram a delinquência sem consequência.
Despencou a relevância do país no mundo. Líderes da Hungria, Polônia, Guatemala
e Sérvia formam a potente liga que Bolsonaro consegue integrar.
Descrever esse legado exigiria um "montão de amontoado de
muita coisa escrita". Pesquise na rede cada fato acima. E outro
montão de amontoado de fatos que não couberam.
Mas Bolsonaro precisava garantir que o
futuro fosse interditado em definitivo. E resolveu expandir a fome de crianças.
Pois uma infância faminta produz resultados individuais, familiares e sociais
para sempre. Causa não só trauma, mas debilitamento físico e intelectual. Um
legado irreversível como nenhum outro: vetou
reajuste de merenda.
Crianças agora dividem o ovo ou comem
bolachas e tomam suco. Não basta o país
voltar ao mapa da fome, é preciso que metade dos lares com crianças
no Norte e Nordeste passe fome. E, assim, proporcionar a crianças o barato da
tontura e do tremor. Carolina Maria de Jesus passou por isso: "A tontura
da fome é pior do que a do álcool. A tontura do álcool nos impele a cantar. Mas
a da fome nos faz tremer."
A fome não é só tragédia social. Não viola
só direitos à saúde, à vida e à dignidade. Fome é uma técnica de dominação.
Viola, antes de tudo, a liberdade. Quem elaborou de forma célebre esse
argumento foi o brasileiro mais homenageado da história, com 29 títulos honoris
causa e terceiro teórico mais citado no mundo das humanidades.
Ele entendia que, para a "radicalidade
democrática", não bastava reconhecer alegremente sujeitos "de tal
modo livres que têm o direito até de morrer de fome ou de não ter escola para
seus filhos e filhas ou de não ter casa para morar. O direito, portanto, de
morar na rua, o de não ter velhice amparada, o de simplesmente não ser."
Para esse brasileiro, alfabetização não era
apenas aprender a ler e escrever palavras, mas a ler e escrever o mundo. E daí
entender que analfabetismo, fome e pobreza não eram produtos da fortuna, da
falta de esforço e capacidade, mas escolha social. Almejava seres alfabetizados
como cidadãos, não autômatos programados a obedecer para sobreviver. Seres que
possam ler uma Constituição, reivindicar justiça e pedir abolição.
Esse brasileiro é o pensador mais odiado
pela família Bolsonaro, por apoiadores imbecilizados e por seus ministros da
educação. Paulo Freire veio,
afinal, "daqueles locais onde nada poderia sair dali a não ser esse tipo
de gente". E faria 101 anos nesse dia 19 de setembro.
O covarde autoritário reivindica
irresponsabilidade por todos os males, e mérito por bens que não produziu. Cabe
à democracia responsabilizá-lo. Pela lei, pelo voto, pela cultura política,
pela clareza moral.
*Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC
Magnífico texto do colunista! Parabéns a ele e ao blog que o divulga! É importante entender o motivo de tanto ódio dos bolsonaristas contra Paulo Freire! O grande Educador, tão criticado e agredido pelos cúmplices do genocida e pelo próprio miliciano mentiroso, certamente se revoltaria com tantos crimes praticados por este DESgoverno Bolsonaro na saúde e na Educação! Bolsonaro não é só incompetente e mentiroso, ele é insensível e maldoso, faz o mal intencionalmente, contra crianças pobres, indígenas, mulheres! Nem os militares da ditadura foram tão perversos! Torturavam e matavam seguindo ordens. Bolsonaro ainda se orgulha de dar as ordens que levam às mortes e à tortura dos brasileiros doentes e/ou famintos. E DEBOCHA do nosso sofrimento! É muita monstruosidade... E ainda se considera RELIGIOSO...
ResponderExcluirColuna correta do colunista,Conrado é o cara certo.
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