O Globo
Campanha de Lula pelo voto útil no primeiro
turno mostra incongruência do petista
O ex-presidente Lula está demonstrando,
mais uma vez, que é uma metamorfose ambulante. Muda de opinião dependendo de a
situação ser favorável a ele ou não. Agora se empenha em pedir o voto útil em
seu nome já no primeiro turno da eleição e garante que sempre disputou eleição
para vencer direto, o que nunca conseguiu, desde 1989, primeira vez em que
concorreu à Presidência.
Mas sua visão sobre voto útil já foi
diferente. Em 2020, na disputa pela Prefeitura de São Paulo, o PT se recusou a
apoiar Guilherme Boulos, do PSOL, contra o então prefeito Bruno Covas. O
candidato petista, Jilmar Tatto, ficou nos 6% dos votos e, mesmo assim, não
abriu mão da disputa. Não tinha a menor chance de vencer, como aparentemente
não têm hoje Ciro Gomes e Simone Tebet, mas se recusou a retirar seu nome em
favor do candidato de esquerda mais bem colocado. Acabou vencendo o então
prefeito tucano. O que demonstra que não havia voto suficiente na esquerda para
vencer a eleição, no primeiro ou no segundo turno.
Lula justificou-se dizendo que o primeiro turno é para votar no candidato preferido, no segundo faz-se o acordo. Hoje, o PT faz pressão para que eleitores de Ciro e Tebet votem em Lula no primeiro turno, com base em várias presunções: eles não têm chance de vencer; votar neles seria ajudar Bolsonaro a ir para o segundo turno; não votar em Lula é ser bolsonarista.
Querer ganhar no primeiro turno é um desejo
normal de qualquer candidato, especialmente para Lula, que já sentiu a dor de
perder duas vezes no primeiro turno para Fernando Henrique. Mas insinuar que os
eventuais eleitores de seus adversários sejam fascistas, direitistas,
bolsonaristas, enfim, não é uma atuação democrática. Nem inteligente, pois
esses eleitores são os que poderão dar a Lula a votação extra para vencer no
segundo turno. Se Lula não vencer no primeiro turno, é porque não terá obtido
votos suficientes para tal. Ciro tem razão de ficar irritado, pois seu
eleitorado, majoritariamente de esquerda, é o principal alvo dos petistas para
acrescentar “o tiquinho que falta” para vencer no primeiro turno.
É direito de qualquer candidato fazer
campanha para vencer no primeiro turno. Considero essa abordagem, no entanto,
um erro político do PT, porque, se não conseguir a vitória, além de animar o
adversário, abaterá o moral de sua militância, que entrará desanimada no
segundo turno, como aconteceu em 2006 contra o então candidato do PSDB, Geraldo
Alckmin, que obteve surpreendentes 41% de votos no primeiro turno. Lula não
conseguiu ganhar direto, embora tenha obtido 48,61% dos votos.
Ficou tão deprimido que desapareceu durante
uma semana. Alckmin aceitou parar a campanha por esse período e deu fôlego para
que o adversário se recuperasse. Teve menos votos no segundo turno que no
primeiro. No final, não acredito que Bolsonaro tenha votos para vencer no
segundo turno, mas há divergências entre as pesquisas. Algumas dão de seis a
oito pontos de diferença entre Lula e Bolsonaro, enquanto Datafolha e Ipec, que
têm maior estrutura, dão de 13 a 15.
A alegação é que a amostragem de segmentos
está prejudicada porque o país não faz Censo há 12 anos, e os institutos têm
dificuldade para chegar a uma amostra realmente representativa. Uns trabalham
com o índice de 57% de brasileiros na faixa de dois salários mínimos, outros
com 38%, sem que haja números oficiais. Uns usam pesquisas por telefone, os
mais bem equipados fazem pesquisas presenciais. Essas explicações, no entanto,
não invalidam o fato de as pesquisas de opinião influenciarem o ânimo dos
candidatos e apoiadores.
Como as pesquisas mudam a expectativa da
eleição a cada semana, podem criar ambiente psicológico negativo para Lula se
Bolsonaro chegar ao segundo turno com números mais favoráveis. O certo é que,
com o aumento da tensão, Ciro ficará neutro no segundo turno. Vai para Paris ou
outro lugar, mas não apoiará Bolsonaro, nem fará campanha para Lula. Pela
lógica, o PDT é partido de esquerda, e o eleitor de Ciro deverá votar
majoritariamente em Lula num segundo turno, ou mesmo ainda no primeiro, se a
campanha pelo voto útil for exitosa. Mas, como nossa política partidária não
tem lógica, uma parcela do eleitorado pode ir para a direita, como mostram as
pesquisas. Outro fator relevante será a abstenção na votação, que neste ano,
tudo indica, será maior devido ao medo da violência.
Merval escreve bem e com certa lógica, mas hoje esqueceu ou preferiu ignorar alguns pontos fundamentais, brilhantemente mostrados por Conrado Mendes hoje neste mesmo blog. A leitura da coluna do Conrado é necessária para uma mais ampla compreensão destas questões!
ResponderExcluirConrado Mendes,adoro,vou ler agora sua coluna.
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