Valor Econômico
O desenho malfeito e a expansão sem
planejamento do programa têm causado problemas para a principal política de
transferência de renda do país
O desenho malfeito e a expansão sem
planejamento do Auxílio Brasil têm causado problemas para a principal política
de transferência de renda do país, além de gerar incertezas sobre as contas
públicas. O programa que sucedeu o Bolsa Família recebe críticas de
especialistas principalmente pelo fato de destinar um valor fixo por família, a
despeito do número de integrantes. Isso provoca estragos no Cadastro Único, o
banco de dados usado numa série de programas sociais.
O governo de Jair Bolsonaro também atropelou regras fiscais para elevar o valor do benefício e o total de famílias atendidas. A mais recente manobra foi por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Kamikaze, aprovada em julho. Com a medida, o Auxílio Brasil subiu de R$ 400 a R$ 600, além de terem sido instituídos o bolsa caminhoneiro e o auxílio taxista. A PEC foi o mais recente drible no teto de gastos, com o objetivo de tentar melhorar a qualquer custo a popularidade do presidente, afetada em especial pela inflação alta.
A mudança do Bolsa Família para o Auxílio
Brasil se deu em novembro de 2021, levando a um salto do número de famílias
atendidas e do volume de recursos destinados à transferência de renda. Naquele
momento, o Bolsa Família chegava a cerca de 14,5 milhões de famílias. A partir
do penúltimo mês do ano passado, foi substituído pelo Auxílio Brasil, ampliado
inicialmente para 17 milhões de famílias. Em setembro deste ano, o programa
pagou o benefício de R$ 600 para mais de 20,65 milhões de famílias, segundo números
do Ministério da Cidadania.
“Um programa que custava cerca de R$ 35
bilhões aumentou para mais de R$ 150 bilhões [contando com um valor de R$ 600
para todo o ano que vem] em muito pouco tempo, sem nenhum critério”, resume
Fernando Veloso, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação
Getulio Vargas (FGV Ibre) - que destaca, ainda, “as mudanças frequentes, que
geram enorme incerteza para as famílias”. Em 2020, para combater os efeitos da
pandemia da covid-19, o extinto auxílio emergencial chegou a atender mais de 67
milhões de pessoas.
De 2008 a 2010, os gastos com o Bolsa
Família equivaliam a cerca de 0,35% do PIB, número que subiu para 0,39% do PIB
em 2011 e oscilou próximo a 0,45% do PIB de 2012 até o fim da década passada.
Já o Auxílio Brasil deve somar aproximadamente 1,4% do PIB em 2023,
considerando que o valor do benefício será de R$ 600 durante todo o próximo
ano. As estimativas são do economista Bráulio Borges, da LCA Consultores e
pesquisador associado do FGV Ibre.
Como o programa paga o mesmo valor por
família, houve uma explosão do número de pessoas que declaram viver sozinhas.
“Enquanto para toda a população brasileira a proporção de pessoas morando
sozinhas está em torno de 15%, entre beneficiários do Auxílio Brasil essa
proporção saltou para cerca de 25% em poucos meses”, diz a socióloga Letícia
Bartholo, especialista em políticas públicas e gestão governamental. “Isso
indica claramente que as pessoas estão se inscrevendo no Cadastro Único de
forma isolada, e não na família em que residem”, afirma ela, ex-secretária
nacional adjunta de Renda de Cidadania no governo Dilma Rousseff.
Segundo Letícia, “além de ser extremamente
prejudicial à focalização da transferência de renda, esse ‘desmembramento de
famílias’ no Cadastro Único prejudica toda a capacidade de o banco de dados
funcionar como o orientador das políticas públicas às famílias mais vulneráveis
do país”. Ela destaca que, “além do Auxílio Brasil, mais de 20 programas
sociais usam o Cadastro Único para seleção ou acompanhamento de beneficiários”.
Sócio da BRCG Consultoria, Vinícius Botelho
diz que esse é um problema “dificílimo de ser revertido”, porque será
necessário rever “esses cadastros todos”, o que não é trivial. Ele também
ressalta o crescimento do número de famílias com uma só pessoa a partir de
novembro de 2021, que aumentou de 2,2 milhões naquele mês para 3,8 milhões em
junho deste ano, de acordo com dados do Ministério da Cidadania. “Depois de
arrumar o desenho da transferência de renda para algo que leve em conta as
necessidades de cada família e a capacidade de auditoria do Estado, será
preciso fazer uma agenda técnica grande de revisão desses cadastros”, afirma
Botelho, ex-secretário do Ministério do Desenvolvimento Social no governo
Michel Temer e ex-secretário do Ministério da Cidadania no começo do governo
Bolsonaro. Para ele, pode levar “um governo inteiro para arrumar o estrago que
parece ter ocorrido no Cadastro Único”.
E o programa ficou grande demais? Para
Veloso, o tamanho poderia ser adequado se o desenho tivesse sido bem feito. “Eu
diria que ele cresceu muito rápido, sem nenhum critério”, reitera ele, autor de
uma proposta para a ampliação do Bolsa Família, feita com Botelho e o
economista Marcos Mendes, chefe da assessoria especial do ministro da Fazenda de
2016 a 2018. Pelo projeto, divulgado em setembro de 2020, haveria fusão do
programa com o abono salarial, o seguro defeso e o salário família, respeitando
o teto de gastos, a um custo de R$ 57 bilhões. De lá para cá, o IPCA subiu
quase 20%. Além da inflação, uma revisão de valores teria de levar em conta a
evolução da renda e da pobreza.
Veloso lembra que havia na proposta uma
simulação com um orçamento de R$ 100 bilhões, mostrando melhores resultados na
redução da pobreza e aumento da cobertura dos mais vulneráveis. “Mas nós também
chamamos atenção para a necessidade de financiar essa expansão do programa de
forma adequada. Caso contrário, o resultado é mais inflação e instabilidade da
renda, o que prejudica exatamente o público-alvo do programa”, diz Veloso. Sem
isso, há uma piora da percepção sobre as contas públicas, o que tem efeitos
desfavoráveis sobre a inflação, por fazer o câmbio ficar num nível mais
desvalorizado e o risco país mais alto do que seria possível.
Para Letícia, um programa que destine 1,4%
do PIB aos 25% mais pobres da população não é exagerado. “O problema não está
na proporção do PIB dedicada ao programa, mas em como isso foi feito: sem
planejamento, com um desenho péssimo, gerando problemas de focalização que
fazem com que, ao mesmo tempo em que o orçamento da transferência de renda
tenha crescido substantivamente, continuemos a ver pessoas passando fome”, diz
ela.
Uma política de transferência de renda mais
ampla é importante num país desigual e com níveis elevados de pobreza como o
Brasil. Isso requer, porém, um programa bem desenhado e financiado com
responsabilidade fiscal, duas pré-condições deixadas de lado pelo governo
Bolsonaro.
Guedes e Bolsonaro são completamente incompetentes e desinteressados nas políticas de transferência de renda. Sempre foram contra, só mudaram de posição quando a população começou a se revoltar e a se posicionar contra Bolsonaro perto das eleições, depois que o Brasil voltou ao mapa da fome no mundo e que mais de 30 milhões de brasileiros sofrem com este drama. Queriam um novo programa, que não fosse associado ao de Lula e do PT, e precisavam mudar coisas pra poder alterar o nome. Quase todas as mudanças foram pra pior, embora os valores sejam mais altos. Ou seja, o governo gasta mais, mas a eficiência é muito menor. O programa de Lula foi sendo corrigido e aperfeiçoado, o de Guedes e Bolsonaro é só demagógico, mal planejado e mais caro. Vai durar só até a eleição...
ResponderExcluirTudo degringolou no País de Bolsonaro.
ResponderExcluir