Folha de S. Paulo
Em cenário quase estável e apertado, nichos de eleitorado podem decidir a eleição no dia 2
Faz mês e meio, as diferenças nas pesquisas
Datafolha sobre a eleição presidencial têm sido pequenas. Seria
possível até dizer que, em caso extremo, improvável, a diferença entre Lula da
Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) praticamente
não se alterou nessas semanas. Não parece ser o caso, dado o
conjunto das estatísticas, como a diminuição da vantagem petista também no
segundo turno ou a melhora discreta da avaliação do governo. Mas a eleição pode
se decidir em detalhes, em nichos, em punhados de votos.
Antes de continuar, três lembretes:
1. Lula tem 48% dos votos válidos no primeiro
turno (já teve quase 52%, em fins de julho);
2. Eleitores não muito decididos de Ciro Gomes
(PDT) e Simone Tebet (MDB) podem render dois pontos para Lula, no limite;
3. Parece ninharia, mas recorde-se: Lula passou para o segundo turno da eleição para presidente de 1989 com uma vantagem de 0,67% dos votos sobre Leonel Brizola (1922-2004), do PDT.
O que ainda pode ser decisivo, como uma
definição em primeiro turno ou meios de Bolsonaro reduzir a
grande distância para Lula em uma segunda rodada?
Primeiro, sobram cada vez menos votos no
poço de indecisos, nulos e brancos e há menos gente declaradamente propensa a
mudar de ideia. No conjunto do eleitorado, 77% dizem estar decididos; são 86%
entre os eleitores de Lula, 83% entre os de Bolsonaro.
Pode haver votos a explorar no balaio de
Ciro e Simone, ressalte-se: 54% dos eleitores de cada um dizem que podem mudar
de voto. No limite, na ponta do lápis, dariam hoje
uma vitória a Lula na primeira rodada, tudo mais constante.
Segundo, o avanço de Bolsonaro indica o
sucesso relativo de uma estratégia: depredar Lula, recuperar votos em seus
nichos e se aproveitar da discreta melhora socioeconômica. Se dá para tomar os
números ao pé da letra (as diferenças são pequenas), Bolsonaro avançou retomando
votos entre homens, evangélicos e, aparentemente, no interior
do Sudeste.
Lula parece não ter estratégia a não ser
esperar que a rejeição a Bolsonaro continue majoritária e que a campanha
bolsonarista não faça mais estrago na imagem do petista. "Jogar
parado", como se diz.
Terceiro, Lula bate Bolsonaro por 58% a 42%
em um segundo turno. A se repetirem abstenções, nulos e brancos de 2018,
Bolsonaro precisaria tirar uns 9 milhões de votos de Lula a fim de empatar o
jogo. É muito ou é possível?
A rejeição a Bolsonaro entre os eleitores
de Ciro (65%) e de Simone (73%) continua muito maior que sua rejeição média
(51%). Para que esse jogo vire, Lula tem de fazer alguma bobagem grande e/ou
Bolsonaro provocar uma convulsão nas quatro semanas de campanha de um segundo
turno. Por que Bolsonaro não o faria?
De interesse mais imediato, o encerramento
da eleição no primeiro turno ainda é uma hipótese sobre a mesa, embora caindo
pelas beiras. A estratégia bolsonariana dá algum resultado e a melhoria
econômica ainda deve render pontos. Ainda assim, há votos úteis a pescar nos
laguinhos de Ciro e Simone. Mas o lulismo não tem novidades ou inspiração,
quando não parece desnorteado, como na sua relação com evangélicos. Terá algo a
dizer a ciristas ou aos nichos de eleitores com os quais poderia conversar nas
redes ou nas mensagens de celular? Sabe fazê-lo?
Para prestar atenção: uma abstenção mais extensa de certos eleitorados pode decidir a eleição, por ninharias de votos. Engajar o eleitor até o fim, para que vá votar, pode ser decisivo. Pode ser até que décimos de porcentagem da votação de candidaturas de PSTU ou PCB façam diferença em eleição apertada (e o Pros, que ainda apareceu nesta pesquisa, não terá mais candidato e vai apoiar Lula).
Podia encerrar logo,mas tá difícil.
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