Folha de S. Paulo
Lula ainda tem boas chances de vencer, mas
terá que se deslocar ainda mais para o centro
O
resultado do primeiro turno mostrou que, embora Bolsonaro tenha
um alto nível de rejeição, não houve um grande deslocamento ideológico desde a
última eleição presidencial:
a direita, e mesmo a direita radical, continuam muito fortes.
Lula ainda
tem boas chances de vencer, mas terá que se deslocar ainda mais para o centro
enquanto preserva seus eleitores pobres.
Agora a eleição vai se decidir por pequenas
transferências de votos, e a importância das alianças casadas nos pleitos estaduais
e na eleição para presidente será grande.
O PT deve
apoiar Eduardo
Leite no Rio
Grande do Sul em troca
do apoio de Rodrigo Garcia em São Paulo, por exemplo. Os votos de Simone Tebet tornaram-se
desproporcionalmente importantes.
Não vai ser um mês tranquilo. O Brasil tem grandes chances de ser pior nos próximos quatro anos porque haverá segundo turno agora. Há alguma chance de Lula fazer concessões programáticas aos economistas do centro democrático, ou às ideias de Ciro, mas me permitam mostrar o tipo de disputa que pode ser mais decisiva: governadores eleitos pelo Brasil afora leiloarão seu apoio ao candidato que prometer gastar mais dinheiro com eles.
Se Bolsonaro investir tudo na pauta moral,
Lula terá que trair minorias e/ou prometer gastar ainda mais dinheiro com os
pobres para neutralizar esse discurso.
Sobretudo, será mais um mês de ameaça de
golpe e estratégias eleitorais como a presença do farsante Kelmon no debate,
mentindo que era candidato e escondendo que é padre de uma religião inventada
no Peru.
É mais um mês de coisas como Bolsonaro
entrando na Justiça para garantir que pobres não conseguissem votar por não
terem dinheiro para a passagem de ônibus.
De qualquer forma, torço para que eu esteja
errado e seja possível aproveitar o segundo turno para incorporar ao programa
de Lula boas ideias dos programas de Ciro e Tebet.
Isso poderia incluir, além de toda a pauta
educacional adotada em Sobral, as
ideias de Ciro sobre ajuda a trabalhadores endividados, entre outras.
No caso de Tebet, como já defendi aqui,
Lula deveria aproveitar a proposta de reforma tributária proposta pelo deputado
pemedebista Baleia Rossi. Também
acho que o PT deveria ouvir com carinho as propostas de Tebet sobre uma dotação
para estudantes que concluam o segundo grau.
O peso das ideias centristas, é claro, será
proporcional ao tamanho da contribuição dos aliados centristas para a vitória.
Quanto mais governadores, partidos e segmentos sociais de fora da esquerda se
incorporarem à campanha de Lula, mais centrista será seu governo.
Teria sido ótimo se Jair Bolsonaro tivesse
sido humilhado com uma derrota no primeiro turno. Seria
uma homenagem aos 700 mil mortos na pandemia, às jornalistas agredidas, aos
ambientalistas perseguidos, aos funcionários públicos assediados, aos
brasileiros que disputaram osso a tapa em frente ao supermercado esse ano.
Teria sido um grande passo para a
substituição dos fascistas pelos liberais na liderança da direita brasileira.
Teria sido uma chance dos brizolistas derrotarem a extrema direita militar que
não deixou Brizola concorrer à Presidência por 20 anos e entregou a sigla do
PTB ao Padre Kelmon.
Enfim, vamos ter que fazer isso tudo com um mês de atraso.
O sofrimento foi prorrogado.
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