Eu & Fim de Semana / Valor Econômico
O
que está em jogo neste domingo é o marco civilizatório que regulará nosso
destino como nação
Qualquer que seja o resultado da eleição de
30 de outubro, o Brasil da manhã de segunda-feira já não será o mesmo da
véspera. Se vencer Bolsonaro, o país amanhecerá com um desafio de, nas sombras
de seu obscurantismo, se reconstruir, no marco das tradições inconformistas e
poéticas do povo brasileiro. O de reencontrar-se como nação da esperança a
partir dos valores e possibilidades da Constituição de 1988.
Se vencer Lula, ele, o PT e os grupos
também democráticos não petistas terão que compreender os complexos desafios de
superar o autoritarismo residual da ditadura de 1964. E viabilizar o diálogo
entre a sociedade civil e as Forças Armadas, para que se convençam de que sua
missão histórica não é a de tutelar a sociedade nem tratá-la como inimiga do
Estado.
O Brasil não é um quartel, não é uma
confraria religiosa, não é um curral político, não é um cercadinho de
bajuladores de porta de palácio. A imensa maioria do povo brasileiro é
constituída de gente que trabalha e pensa, para a qual o verde e amarelo não é
o da cueca e da veste carnavalesca, mas o do coração.
Para que nos reencontremos na consciência de que a sociedade é a unidade do diverso e da retidão e não a desunião do único e da linha reta.
Se as Forças Armadas não compreenderem que
a modernidade democrática é a da sociedade pluralista, diversificada,
diferençada e não a de direita e menos ainda de extrema direita, nos bloquearão
no meio do caminho. O Brasil não é isso, não é renúncia aos grandes ideais que
deram vida à pátria.
A liberdade de crer só tem sentido se
assegurada a liberdade de não crer. A liberdade de legitimar só tem sentido na
liberdade de discordar e de contestar. Democracia só vale na possibilidade da
alternância de poder. Quem sucede não é uma pessoa, mas um projeto de nação.
Sucede para superar e não para aniquilar o diferente e o adversário.
Pesquisa do Datafolha de 20 de outubro
constata que 79% dos eleitores preferem o regime democrático. No Brasil,
democracia é palavra relativamente vaga. Desvinculada das relações sociais de
alteridade, não expressa legítima consciência social e política.
Temos dois candidatos em confronto: um de
uma frente democrática, liderada por Lula, e outro de uma frente autoritária,
liderada por Bolsonaro. A pesquisa do Datafolha de 19 de outubro indicou que
Lula tem 49% das opções e Bolsonaro tem 45%. Eis aí um dos enigmas desta
eleição.
Supondo que as pesquisas sejam comparáveis,
ao menos indicativamente, o candidato autoritário leva 28% das opções
democráticas, acima das opções pelo autoritarismo. Já o candidato democrático
não tem 30% dos que preferem a democracia.
Muitos dos que se supõem democratas
entendem que democracia é o direito de expressar e impor à sociedade sua
vontade pessoal. Como tem ocorrido nos casos de recusa da vacinação contra a
covid-19, mesmo que a ciência já tenha provado que o não vacinado pode se
tornar portador do vírus e contaminador potencial de outras pessoas, se não
morrer antes.
Isto é, acham que a sociedade não existe
como um ser coletivo que pode ser posto em risco por qualquer deslize derivado
de vontades pessoais. Bolsonaro tem optado por essa concepção antidemocrática
de democracia.
Esse equívoco é uma das matrizes de um
imaginário brasileiro que ficou exposto com o advento do bolsonarismo e suas
concepções de um senso comum desvinculado dos grandes valores da civilização.
Com razão, o erudito pastor batista Ed René
Kivitz, reconhecidamente competente teólogo e exegeta, tem insistido em que o
que está em jogo nesta eleição não é corrupção. O que está em jogo neste
próximo domingo é o marco civilizatório que regulará nosso destino como nação.
Nesse sentido, estará em jogo o destino de
nossos filhos e netos, o legado de nossos antepassados, incluído o grande
legado dos escravos indígenas e negros que ergueram as bases de nossa nação, os
excluídos, as mulheres tratadas como seres de somenos, que só tardiamente
tiveram o direito de voto, os trabalhadores da roça, os operários, as crianças
cujo corpo já abriga um operário adulto, os intelectuais, os professores, os
cientistas, os artistas, os empresários lúcidos e criativos, os soldados que
servem à pátria em vez de servirem-se da pátria.
Gente que, em pouco mais de cem anos,
transformou um país escravista num país moderno, baseado no trabalho livre, na
lenta edificação de um sistema de direitos sociais. Um país da esperança, em
busca da liberdade.
É muito para ser jogado no lixo da história
por decisões levianas, desinformadas ou irresponsáveis na hora de digitar os
números na urna eletrônica, sob inspiração de mentirosos profissionais,
sedentos de poder.
*José de Souza Martins é sociólogo. Professor Emérito da Faculdade de Filosofia da USP. Professor da Cátedra Simón Bolivar, da Universidade de Cambridge, e fellow de Trinity Hall (1993-94). Pesquisador Emérito do CNPq. Membro da Academia Paulista de Letras. Entre outros livros, é autor de "As duas mortes de Francisca Júlia A Semana de Arte Moderna antes da semana" (Editora Unesp, 2022).
do New York Times
ResponderExcluirBolsonaro x Lula: o Brasil enfrenta uma escolha difícil com grandes apostas
Os brasileiros vão às urnas no domingo em uma eleição entre dois pesos-pesados políticos que pode ter repercussões globais.
https://www-nytimes-com.translate.goog/2022/10/29/world/americas/brazil-bolsonaro-lula-presidential-election.html?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt
do The Economist, via bigindynews
Eleição de alto risco do Brasil vai para o fio (da navalha)
https://bigindynews-com.translate.goog/business/brazils-high-stakes-election-goes-down-to-the-wire/?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt
Desculpem...*acima)
ResponderExcluirEleição de alto risco do Brasil vai para o fio (da navalha)
é do Financial Times
do Economist
Eleições no Brasil estão apertadas antes do segundo turno em 30 de outubro
https://www-economist-com.translate.goog/the-americas/2022/10/27/brazils-election-is-tight-ahead-of-a-run-off-on-october-30th?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt
da BBC, via serviço russo
ResponderExcluirEleições no Brasil: fakes, guerras culturais e um desfecho imprevisível
https://www-bbc-com.translate.goog/russian/features-63413942?_x_tr_sl=ru&_x_tr_tl=es&_x_tr_hl=es
Presidente do Brasil transforma Argentina em bicho-papão de campanha
ResponderExcluirhttps://apnews-com.translate.goog/article/jair-bolsonaro-inflation-caribbean-business-31e6fd5d255a1755f99a9be9e7307261?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt
France Info
ResponderExcluirPresidencial no Brasil: da prisão à eleição, Lula voltou de (muito) longe para desafiar Jair Bolsonaro
https://www-francetvinfo-fr.translate.goog/monde/bresil/presidentielle-au-bresil-de-la-prison-a-l-election-lula-est-revenu-de-tres-loin-pour-defier-jair-bolsonaro_5422732.html?_x_tr_sl=fr&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt
Minha campanha é pela paz,fiquem todos com Deus.
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