O Globo
Deputado federal por 28 anos, o presidente
conseguiu se apresentar aos eleitores como 'outsider'
A campanha de Lula para a Presidência foi
cautelosa. Seguiu as recomendações mais prudentes dos especialistas que
indicavam constituir uma frente ampla em defesa da democracia para enfrentar
Jair Bolsonaro. E, embora as pesquisas sugiram que a estratégia deverá ser
bem-sucedida, ela também terminou por confirmar os fantasmas do discurso
populista do atual presidente.
Cientistas políticos e a experiência de outros países recomendavam formar uma frente ampla, da esquerda até a centro-direita, para derrotar Bolsonaro. No meio acadêmico, o cientista político Steven Levitsky, de Harvard, foi o mais preeminente defensor da frente ampla. No influente livro “Como as democracias morrem”, mostrou como frentes amplas podem salvar a democracia de ameaças autoritárias, a exemplo do que aconteceu quando a oposição a Pinochet se uniu para derrotá-lo no plebiscito de 1988. Foi com uma estratégia assim, de união nacional, que Macron derrotou duas vezes a candidata da extrema direita Marine Le Pen, em 2017 e 2022.
Lula parece ter anotado a lição e começou
uma ampla articulação de apoios a sua candidatura. Os economistas que ajudaram
a arquitetar e a sustentar o Plano Real Arminio Fraga, Edmar Bacha, Pedro Malan
e Persio Arida declararam voto nele. Por anos, foram vistos pelos petistas como
o coração das políticas liberais, a encarnação de todo o mal. Não foram apenas
eles. Outros tucanos históricos, como Fernando Henrique Cardoso, José Serra ou
Tasso Jereissati, também apoiaram Lula. Foram por mais de 20 anos os principais
oponentes do petismo.
No meio jurídico, não foi diferente. O
ex-ministro do Supremo e relator do mensalão Joaquim Barbosa declarou voto em
Lula. Também manifestou apoio ao petista Miguel Reale Jr., um dos autores do
pedido de impeachment de Dilma Rousseff. O julgamento do mensalão, liderado por
Barbosa, é um dos marcos fundamentais do antipetismo, e o processo de
impeachment de Dilma, proposto por Reale Jr., sua apoteose.
Reuniram-se também para apoiar Lula os
ex-candidatos a presidente Henrique Meirelles, João Amoêdo, Marina Silva,
Luciana Genro e Cristovam Buarque. O candidato a presidente em 2006 e 2018
Geraldo Alckmin é o vice na chapa de Lula. A candidata Simone Tebet e
o candidato Ciro Gomes,
que ficaram em terceiro e quarto lugares no primeiro turno respectivamente,
também apoiam o ex-presidente.
Lula conseguiu montar uma coalizão tão ampla
que vai do PSTU a dissidentes do Partido Novo, com quase tudo o que está entre
os dois extremos. Mas, se isso parece cumprir a recomendação de Levitsky de
montar uma ampla coalizão em defesa das instituições democráticas, também
fortalece, involuntariamente, o discurso populista de Bolsonaro.
Embora tenha sido deputado federal por
longos 28 anos, o presidente conseguiu se apresentar aos eleitores como outsider,
como um não político e, de certa forma, um antipolítico. De fato, durante todos
esses anos no Congresso, ele foi um político marginalizado, desprezado e
ridicularizado pelas forças dominantes.
Um dos feitos mais notáveis do então
candidato Jair Bolsonaro em 2018 foi converter a vigorosa onda antipetista do
impeachment em disposição antissistema, generalizando críticas antes restritas
ao PT a todos os políticos e partidos “tradicionais”. Naquelas eleições
viralizaram fotos de FH com Lula, nas portas das fábricas nos anos 1970, assim
como fotos de Lula com líderes do Centrão. Elas sugeriam que todos os políticos
tradicionais eram farinha do mesmo saco, e apenas Bolsonaro era diferente.
A constituição da frente ampla, por um
lado, mostra a união responsável das lideranças políticas brasileiras em defesa
das instituições democráticas. Mas, por outro, ilustra, na cabeça dos
bolsonaristas, a convergência de todo o sistema, de todo o establishment para
derrotar Bolsonaro, como sugeriam as fotos “delirantes” de 2018 dizendo que
Lula, FH e o MDB eram iguais.
É a frente ampla de Lula contra a AMPLA FRAUDE que representa Jair Bolsonaro e sua vida de rachadinhas familiares e milhares de mentiras!
ResponderExcluir"E, embora as pesquisas sugiram que a estratégia deverá ser bem-sucedida, ela também terminou por confirmar os fantasmas do discurso populista do atual presidente."
ResponderExcluirNão entendo. O raciocínio do autor embute uma incoerência. É bem-sucedida ao mesmo tempo em q confirma o discurso populista.
Se Lula não tivesse ampliado sua frente, ele seria mais "populista", creio eu.
Como ampliar a frente pode ser sucesso e tb fazer Lula "populista"?
Muito bom artigo, mas joga água para o moinho do boçal. Nenhuma palavra sobre a necrofilia, o machismo, a misoginia do baba-ovo de Lambuzado de fezes e sangue Ustra.
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