terça-feira, 15 de novembro de 2022

Alvaro Costa e Silva - Refém da política, Copa do Mundo está banalizada

Folha de S. Paulo

Divórcio entre a seleção e o torcedor atinge ponto mais alto

Os brasileiros enfim estão descobrindo que em menos de uma semana começa a Copa do Mundo. A bola vai rolar — e quem sabe até ser bem tratada — no deserto do Qatar. Nas ruas daqui, no entanto, não se nota o clima festivo e confiante de outras Copas. A tensão política pós-eleitoral não deixa.

Desde o Mundial do Uruguai, em 1930, não se registrava expectativa tão pequena. Sem consultar o celular, quem é capaz de dizer o nome do primeiro adversário do Brasil? (É a Sérvia.) E a escalação do time? Alguém confia em Neymar para repetir o brilho de um Garrincha em 1962, de um Romário em 1994? O divórcio entre a seleção e o torcedor — que hoje dá preferência ao clube do coração — atingiu um ponto traumático e possivelmente sem volta.

Tite até que deu uma animada nas coisas. A divulgação da lista com os escolhidos para tentar o hexa fez com que se discutisse outra vez futebol nos botequins. O som da corneta está alto: por que chamar dois volantes e nove atacantes? Cadê Gabigol, o artilheiro decisivo na Libertadores? Quem é Martinelli? Dizem que está voando no Arsenal, mas quem conhece a revelação do Ituano?

O professor conseguiu unir lulistas e bolsonaristas na repulsa à convocação de Daniel Alves, dono de invejável coleção de títulos. A suspeita é que sua presença foi imposta pela Fifa, da qual é garoto-propaganda. Aos 39 anos, mais velho jogador a disputar um Mundial pela seleção, ele é investigado pelo MPF por receber do governo Bolsonaro R$ 6,2 milhões através de ONGs que estavam inativas.

Em dias de jogo, ao dobrar uma esquina e deparar-se com o sujeito vestindo a canarinho, como saber se é um torcedor do escrete ou um patriota zumbi? A camisa amarela parece ser um caso irrecuperável, virou símbolo do golpismo. Há quem declare no Twitter que não irá torcer pelo Brasil, como tentaram fazer os adversários do regime militar em 1970. Mas aí já é demais, não?

 

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