O Estado de S. Paulo
Talvez chegue o dia em que todos seremos recebidos como habitantes do ‘país da Amazônia’
“É brasileiro?”, pergunta o funcionário do
aeroporto egípcio, ao olhar meu passaporte. “Que bom! É o país da Amazônia.” É
a primeira vez que me saúdam como alguém que vem de um lugar que tem uma
floresta. Não deve ser por acaso. Estou em Sharm El-Sheikh, cidade que abrigará
a COP-27, a conferência do clima. Os oficiais da imigração devem ter recebido
informações para conversar com os visitantes. Gostei do rótulo, melhor que ser
identificado como um conterrâneo de Neymar. Mas não sei se mereço.
Venho, é verdade, de um dos países dos quais depende o futuro do planeta, por abrigar o maior pedaço de mata tropical do mundo. Acabamos de completar, no entanto, quatro anos de desmatamento crescente da Amazônia. Não fazemos jus ao tesouro que guardamos.
Temos a chance de mudar esse destino em
Sharm El-Sheikh, cidade encravada entre as dunas secas do Sinai e um mar
transparentíssimo, propício ao mergulho. Nunca houve tantos estudos sobre como
preservar a Amazônia, garantindo uma boa qualidade de vida a seus habitantes –
e, ao mesmo tempo, a continuidade do planeta.
“Listamos várias providências para os
primeiros cem dias de governo que podem nos colocar no caminho certo”, diz
Renata Piazzon, diretora do Instituto Arapyaú. Na entrevista que deu ao
minipodcast da semana, ela fala do documento da Concertação Pela Amazônia –
reunião de ideias de vários grupos de estudiosos, entre eles o Arapyaú – que
será lançado na COP-27.
A preservação e o desenvolvimento da
Amazônia são a causa que une o Brasil. Há um grande consenso político a
respeito, da direita de Simone Tebet à esquerda de Luiz Inácio Lula da Silva –
os programas políticos dos dois candidatos traziam boas ideias na área, muitas
delas vindas dos cientistas da Concertação. A exceção, claro, é o bolsonarismo
derrotado nas urnas.
Temos uma sociedade civil mobilizada, que,
mais uma vez, montará um pavilhão para discussão de ideias dentro da COP.
Nossos sistemas de fiscalização de desmatamento são excelentes, e a legislação
é boa. Precisamos recuperar as instâncias de comando e controle, como Ibama e
ICMBio – que, como lembra o governador do Pará, Helder Barbalho, foram
desmontadas na atual gestão federal.
Barbalho é um dos líderes do Consórcio dos
Governos da Amazônia. Ele virá à COP junto com Lula. Pode ser um bom sinal,
externa e internamente. Talvez chegue o dia em que todos seremos recebidos nas
alfândegas como habitantes do “país da Amazônia” – e teremos orgulho disso.
*Escritor, professor da Faap e doutorando em Ciência Política na Universidade de Lisboa
Verdade,o País da Amazônia.
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