terça-feira, 15 de novembro de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

PEC da Transição não deve criar gasto permanente

O Globo

Excluir R$ 175 bilhões do teto para pagar novo auxílio não é melhor ação contra pobreza — e agrava crise fiscal

Na semana passada o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva deu declarações que frustraram quem imaginava uma gestão da economia semelhante à de seu primeiro mandato. O discurso desastrado de Lula é corroborado pelas negociações em curso no Congresso para retirar do teto de gastos o equivalente a R$175 bilhões, destinados a financiar seu novo programa de ajuda aos mais pobres, rebatizado de Bolsa Família.

Na forma como vem sendo encaminhada a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Transição, não há apenas uma permissão excepcional — ou waiver — para gastar R$ 70 bilhões em duas medidas emergenciais: 1) o aumento de R$ 200 reais no Auxílio Brasil previsto no Orçamento de 2023, para mantê-lo em R$ 600 (o gasto subiria de R$ 105 bilhões a R$ 157 bilhões); e 2) um novo benefício de R$ 150 destinado a crianças de até seis anos (mais R$ 18 bilhões). Em vez disso, Lula quer manter todo o programa — R$ 175 bilhões — fora do teto. Isso abriria mais R$ 105 bilhões sob o teto, para o novo governo gastar como quiser.

Há dois problemas nessa proposta. Primeiro, não está claro que cumprir a promessa de manter o auxílio em R$600 e criar um novo adicional para as crianças seja a melhor forma de diminuir a pobreza extrema em que se encontra parte da população. Para a economista Cecilia Machado, o governo eleito deveria garantir a eficácia do novo Bolsa Família no combate à miséria mudando o critério de distribuição.

Não faz sentido, diz ela, um único cidadão receber R$600 e uma família com quatro pessoas ganhar o mesmo valor. A ideia de distribuir R$150 por criança reduz a discrepância, mas não a elimina. É preciso reduzir o valor pago a um indivíduo para poder aumentar o dos demais. O antigo Bolsa Família teve sucesso com bem menos recursos justamente por saber destiná-los com foco a quem de fato precisava.

O segundo problema é a incúria fiscal. A ideia em discussão é estender a licença para gastar por quatro anos, sob a justificativa de bancar outros programas sociais e investimentos. Trata-se de um aumento contratado nos gastos de quase 2% do PIB. De onde sairão recursos para financiá-lo? Não se sabe. Pelo cálculo do economista Samuel Pessôa, estabilizar a dívida pública no patamar atual já custaria 2% do PIB. Com o novo aumento de gastos, seria necessário aumentar a carga tributária entre 3% e 4% do PIB para evitar a explosão da dívida, da inflação e dos juros.

Os economistas a quem Lula tem dado ouvidos podem ser sinceros ao dizer valorizar a gestão das contas públicas. Mas, no pensamento mágico petista, tudo se resolve com o crescimento econômico aumentando a arrecadação e cobrindo o rombo. Só que voluntarismo e investimento público raramente têm o efeito esperado no crescimento. Essa visão não passa de uma quimera.

É inverossímil que alguém com a experiência de Lula acredite que o dinheiro para gastos sociais brotará por geração espontânea. Ao contrário da ex-presidente Dilma Rousseff, ele sempre teve a sabedoria de ouvir pontos de vista diferentes. Há na equipe de transição gente qualificada capaz de aconselhá-lo, a começar pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin. Espera-se que Lula caia em si e que a PEC da Transição traga apenas a autorização para um gasto excepcional em 2023, destinado a um programa social que — qualquer que seja seu nome — precisará ser completamente redesenhado.

Nova primeira-dama precisará achar papel compatível com sua experiência

O Globo

Janja Lula da Silva adquiriu na campanha eleitoral uma influência política que transcende sua história

Foi Rosângela Lula da Silva, a Janja, mulher do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, quem telefonou à senadora Simone Tebet depois do primeiro turno para colocá-la em contato com o marido, de modo a garantir apoio na campanha vitoriosa ao Planalto. “Não tenho nenhum papel de articulação política”, contou Janja em entrevista ao Fantástico. “Pode ter acontecido, mas não que tenha sido uma coisa planejada.” Em comparação com Michele Bolsonaro e cônjuges de outros candidatos, porém, Janja foi bem mais ativa politicamente. Escalou quem entrava em reuniões ou voos com o marido, participou de encontros reservados e nunca deixou de dar sua opinião quando quis. Recentemente, ganhou espaço na transição, com a missão de organizar a festa da posse.

A própria Janja se descreve como “propositiva”, alguém que será “uma soma” ao marido no futuro governo. Na entrevista ao Fantástico, falou em “ressignificar o conteúdo do que é ser primeira-dama” e se disse disposta a assumir um papel de articulação com a sociedade civil em pautas importantes, como violência contra as mulheres, garantia da alimentação ou racismo. Revelou buscar inspiração em nomes como Evita Perón e Michelle Obama.

Cada nova eleição traz de volta a questão antiga, ainda sem solução ideal: o poder concedido aos cônjuges dos candidatos eleitos. A História traz exemplos de quem manteve discrição, sem surfar na onda de popularidade levantada pelos detentores de mandato. Mas também de quem assumiu funções incompatíveis com as atribuições de alguém que não recebeu um só voto.

No primeiro grupo está Denis Thatcher. Nos 11 anos em que sua mulher Margaret esteve no poder no Reino Unido, ele se manteve alheio aos círculos do poder britânico. Ou Joachim Sauer, cujo nome é pouquíssimo conhecido fora da Alemanha — ele é o marido da ex-chanceler Angela Merkel, que governou por 16 anos. No extremo oposto está Hillary Clinton. Quando seu marido Bill assumiu o primeiro mandato nos Estados Unidos, em 1993, ela passou a ter uma sala na Ala Oeste da Casa Branca e foi responsável pelo projeto (fracassado) de mudanças na Saúde. Depois de eleita senadora, Hillary foi derrotada em duas tentativas de chegar à Presidência.

Formada em Sociologia pela Universidade Federal do Paraná, Janja trabalhou por mais de 10 anos na Itaipu Binacional e por cinco na Eletrobras. Embora seja filiada ao PT desde 1983, não tem histórico de cargos eletivos nem de altos postos no partido. Seu currículo não parece justificar a influência que adquiriu na campanha.

Mulheres ou maridos de chefes do Executivo necessariamente passam por uma adaptação uma vez no poder. A eleição exige mudança de casa ou cidade, paciência com o olhar constante da imprensa, uma agenda infindável de reuniões, eventos e problemas a resolver. Igualmente desafiador é encontrar um papel a cumprir como primeira-dama ou primeiro-cavalheiro. O mais importante é sempre lembrar quem foi eleito para tomar decisões.

Legado reformista

Folha de S. Paulo

Novo governo poderá se beneficiar das mudanças na Previdência, 3, e na CLT, 5

O ano de 2022 encerra um período de governos adeptos, ao menos nas intenções declaradas, de uma agenda liberal e de medidas dedicadas à eficiência econômica e à contenção da dívida pública. Desde 2016, as mudanças mais profundas foram as reformas trabalhista, que completou cinco anos, e previdenciária, que chegou aos três.

Cabe mencionar também o teto para os gastos federais inscrito na Constituição, que entretanto tem caráter temporário e se encontra desvirtuado hoje por iniciativas eleitoreiras de Jair Bolsonaro (PL).Ainda assim, serviu para conter o crescimento da dívida pública e as taxas de juros, ao menos até 2021.

A reforma da Previdência teve sucesso bem mais evidente. Corrigiu iniquidades e ajudou a conter o aumento veloz da despesa, limitada ainda pela suspensão dos reajustes reais do salário mínimo.

No quadriênio 2018-2022, o gasto do regime geral de aposentadorias e pensões por morte elevou-se em 5,7% acima da inflação. Entre 2010 e 2018, a título de comparação, os desembolsos se expandiam em cerca de 20% por quadriênio.

Com isso, a conta decresceu como proporção do PIB e está em nível similar ao de 2016, em torno de 8,2% —cifra ainda alta.

Já a velha CLT, com mais de 70 anos, passou por atualização necessária. Seus pontos centrais foram a flexibilização dos tipos de contrato, a prevalência de acordos sobre a lei e o desestímulo ao contencioso trabalhista.

Estudos ainda não permitem dizer qual o saldo concreto. O tempo decorrido desde a sua aprovação foi curto, no que interessa à análise econômica e estatística. De resto, desde 2017, o país passou por mais choques, como o tumulto político de 2018 e a pandemia; a mudança tecnológica se acelerou.

Pode-se dizer que a redução do número de ações trabalhistas limita o custo e a incerteza da despesa com trabalho, que prejudicam contratações. Novas formas de contrato, em tese, contribuiriam para facilitar o emprego formal.

O número de pessoas ocupadas cresceu de modo inesperado neste ano, mas ainda se debate o motivo da surpresa. O salário médio ainda está nos piores níveis em uma década. Não se conhece a natureza dos novos empregos formais.

Em vez de combater as novas normas com slogans vazios, urge estudar a fundo a situação do trabalho, tarefa de um governo que pretende dar prioridade à causa social. O país precisa de mais reforma, tributária, administrativa, do Orçamento, ambiental, no SUS. A oportunidade é de avanço, não de regressão saudosista.

Na defesa de florestas

Folha de S. Paulo

Com desmate em alta, Brasil evita países ricos; cenário tende a mudar com Lula

Como em 2021, o Brasil entrou na COP27, no Egito, sem divulgar informações completas sobre o desmatamento na Amazônia. Sobram razões para o governo Jair Bolsonaro (PL) se mostrar acuado diante da pressão mundial.

Virá decerto nova cifra escabrosa sobre a maior fonte nacional de gases do efeito estufa, quando o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) anunciar a estatística oficial anual do sistema Prodes. A julgar por alertas mensais do programa Deter-B, do mesmo Inpe, a devastação segue firme.

Em outubro, mediram-se 904 km² de corte raso, a maior área registrada para o mês desde que o Deter-B começou, em 2015. Só nos quatro meses desde agosto, registraram-se 4.020 km² de derrubadas, aumento de 45% sobre os 2.779 km² de igual intervalo em 2021.

Sob Bolsonaro, o desmatamento aumentou a partir de 2019 e voltou ao patamar acima de 10.000 km² por ano. Não espanta, assim, que a diplomacia nacional comece a COP27 mais uma vez na defensiva.

O Brasil não toma parte, por exemplo, na Parceria de Líderes para Floresta e Clima lançada no Egito. Há União Europeia e 26 países na lista, inclusive Indonésia, a terceira nação com mais matas tropicais —ainda assim, só um quinto do que se encontra aqui. O segundo posto é da República Democrática do Congo (RDC), que tampouco integra a iniciativa.

O Itamaraty justificou em nota que haveria foros com formato mais adequado para tratar das necessidades dos países em desenvolvimento. Defende, ainda, que se renove o Fundo Verde para o Clima e que países ricos diminuam a resistência a pagamentos por redução do desmatamento.

Seria irônico, se não fosse trágico: o mesmo governo, por pirraça ideológica, congelou R$ 3 bilhões do Fundo Amazônia, depositados por Noruega e Alemanha para recompensar o país por seu desempenho antes de Bolsonaro.

O Planalto vê com bons olhos outra iniciativa, a chamada Opep das Florestas, que reúne as três potências florestais —Brasil, RDC e Indonésia— e foi lançada no G20. Ficam então de fora países da Europa, como França e Reino Unido, que o atual presidente tanto hostilizou.

A ida ao Egito do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pode começar a recompor a liderança brasileira no esforço global para conter a mudança climática.

O país tem muito a ganhar, seja em recursos para a conservação, seja poupando a economia, a agropecuária e a população dos eventos atmosféricos mais extremos previstos pela ciência.

Educação contra a barbárie

O Estado de S. Paulo

Episódios de intolerância de alunos em escolas particulares não podem ser enfrentados apenas com repressão; é preciso aprimorar capacidade de argumentação dos jovens estudantes

A polarização política que divide famílias, amigos e vizinhos está presente também nas escolas. Como noticiou o Estadão, colégios particulares em diferentes cidades do País registraram episódios de intolerância e violência após a eleição presidencial, com estudantes protagonizando ofensas e agressões. Tal realidade, reflexo do clima de beligerância ideológica que tanto mal faz à sociedade brasileira, exige ação imediata por parte de professores e educadores. Não para evitar discussões políticas, fingir que não há divergências nem silenciar vozes. Mais que nunca, é papel das escolas aprofundar os debates, problematizar as diferentes visões de mundo e contribuir para que os alunos aprimorem a sua capacidade de argumentação e diálogo.

A escola é, por excelência, o espaço onde os alunos ampliam seus horizontes, ao entrar em contato com crianças e adultos fora do círculo familiar. A vida escolar prepara os indivíduos para conviver na sociedade. Ora, as manifestações de intolerância nos dias seguintes à eleição presidencial vão na contramão de tudo o que vem a ser o papel da escola. Ainda mais em uma sociedade democrática, cuja característica, ao contrário das ditaduras, é justamente possuir mecanismos que permitam superar divergências com mais, e não menos, debate.

Em sua missão de formar cidadãos, as escolas têm um inadiável desafio pela frente, que exigirá ações coordenadas, na medida em que será preciso garantir respaldo e formação adequada aos professores, bem como atenção às famílias, para que entendam exatamente quais são os objetivos da escola. Na sala de aula, um caminho possível é convidar os alunos a questionar os argumentos uns dos outros, inclusive buscando informações para enriquecer críticas e a compreensão dos assuntos. A premissa, claro, é que as discussões se deem em tom civilizado e com absoluto respeito. 

Entrevistada pelo Estadão, a professora Telma Vinha, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), lamentou a falta de iniciativas para preparar os estudantes brasileiros para a vida democrática. “A escola particular, com medo de perder alunos, tornou-se apolítica e colocou essas questões para debaixo do tapete. Não dá para se preocupar só com português e matemática”, disse ela. De fato, a educação vai muito além das disciplinas tradicionais. Países como Bélgica, França ou Finlândia, por exemplo, reservam espaço em seus currículos para atividades que fomentam, nos jovens, maior apreço por tolerância, equidade e autonomia. Um dos focos é a participação dos estudantes em redes sociais e sua capacidade de identificar fake news, verdadeiros vetores de intolerância e violência extremista. 

A reportagem do Estadão relatou casos como o de uma mãe que, assustada, orientou a filha de 8 anos a não falar de política na escola, depois que a menina se envolveu em discussões a respeito dos candidatos a presidente da República. Em outra escola, alunos de 11 anos gritaram que os pais de quem votou em determinado candidato “morreriam a pauladas”. Para o diretor de Políticas e Direitos do Instituto Alana, Pedro Hartung, as escolas devem usar materiais e abordagens adequados a cada faixa etária. “Sou contra a ideia de que política, futebol e religião não se discutem. Política se discute, sim, e desde cedo”, disse ele.

É lamentável, para dizer o mínimo, que crianças e adolescentes tenham sido contaminados pela polarização política que tomou conta do Brasil. Por outro lado, no entanto, difícil seria imaginar que alguém pudesse ficar imune à escalada extremista e ao acirramento do debate público nos últimos anos. Não é de estranhar, portanto, que o problema se manifeste dentro das escolas. Diferentemente de muitos outros ambientes, porém, as escolas têm condições de solucionar conflitos e de ajudar o País a reduzir os estragos da polarização. O caminho é preparar os alunos para debater mais e melhor, enfrentando o contraditório de maneira civilizada. Enfim, apostar no diálogo – como deve ser em uma democracia. 

Uma rota sustentável para a América Latina

O Estado de S. Paulo

A região é uma das mais afetadas pelas mudanças climáticas. Mas a riqueza de seus biomas oferece oportunidades únicas de extrair ganhos socioeconômicos da transição verde global

Os impactos da pandemia e da guerra na Ucrânia na América Latina são um lembrete de sua baixa resiliência aos choques globais, expondo seus desafios estruturais: sistemas de proteção social frágeis, baixa produtividade e instituições instáveis. Os mais pobres foram os mais afetados. Estima-se, por exemplo, que a inflação para as famílias vulneráveis foi 3,6 pontos porcentuais maior que a média. A degradação ambiental pode implicar um choque semelhante em câmera lenta. Dos 50 países identificados como os mais afetados pelas mudanças climáticas, 13 estão na América Latina. Por outro lado, a região contém metade da biodiversidade mundial, e tem grande potencial para se beneficiar da transição verde global.

A edição deste ano do Panorama da América Latina da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foca nesse potencial. Apresentado na conferência global sobre o clima, a COP-27, ele tem o mérito de equacionar, já no seu subtítulo – Rumo a uma transição verde e justa –, os polos elementares de todo desenvolvimento sustentável: a responsabilidade ambiental e a social. Uma transição verde que não seja justa não é sustentável, assim como um desenvolvimento econômico que não seja verde também não é. Felizmente, segundo a OCDE, “a região está bem posicionada para embarcar em uma transição verde efetiva e acelerar o progresso em direção às suas metas de desenvolvimento econômico, social e ambiental”.

Hoje, a participação da América Latina nas emissões globais de gases de efeito estufa é inferior às emissões per capita em regiões com níveis de desenvolvimento semelhantes. Além disso, sua matriz energética é mais verde: os recursos de energia renovável representam 33% de sua oferta total de energia, bem acima dos 13% globais.

Essas vantagens comparativas devem ser aproveitadas para acelerar a transformação da matriz energética. O investimento em tecnologias renováveis promete um ganho triplo: redução das emissões de gás carbônico, geração de energia a baixo custo e redução da dependência de produtos de combustíveis fósseis importados. A OCDE projeta que uma transição verde efetiva pode adicionar 10,5% a mais em novos empregos até 2030.

Um impulso importante a esses investimentos deve vir de políticas fiscais que, gradual e responsavelmente, eliminem subsídios prejudiciais ao meio ambiente e alavanquem impostos favoráveis. A regulação de títulos verdes também é crucial. O aproveitamento do potencial da região na nova economia global dependerá de investimento em novas tecnologias e competências, e, em especial, na requalificação da força de trabalho. A importância, tanto qualitativa quanto quantitativa, dos biomas da região impõe uma agenda de construção e expansão de parcerias internacionais que envolvam o setor privado e instituições multilaterais para aproveitar novas normas e regulamentos e gerenciar o impacto das políticas adotadas nos países parceiros, como, por exemplo, no comércio.

O Brasil, guardião de 60% de todas as florestas tropicais do mundo, tem um papel-chave. O maior potencial para as políticas de mitigação envolve duas áreas cruciais para a economia nacional: a agropecuária e a energia. O Brasil tem desenvolvido tecnologias e práticas sustentáveis no agro que vêm se mostrando eficazes, mas ainda precisam ser barateadas para ganhar escala. No setor energético, o Plano Nacional de Energia para 2050 põe grande ênfase na expansão da geração de energia hidráulica. Em termos de adaptação às mudanças climáticas, o Plano Nacional de Adaptação, de 2016, traçou 11 áreas prioritárias, mas ainda precisa avançar em termos de financiamento e implementação interfederal.

Políticas para a Amazônia que garantam a preservação da floresta, e, ao mesmo tempo, gerem prosperidade para os povos locais são o grande teste para o compromisso do País com o desenvolvimento sustentável. O bioma é vital para o equilíbrio climático do planeta, e, mais do que em qualquer outro âmbito, é nesse que as parcerias internacionais podem ter um papel decisivo. 

Hospital para a Cracolândia

O Estado de S. Paulo

A oferta de leitos para dependentes é um passo na direção certa para o enfrentamento dessa chaga na cidade

A principal notícia sobre a Cracolândia, no último dia 8 de novembro, passou longe das calçadas, praças e ruas onde usuários de drogas se aglomeram no centro de São Paulo. Finalmente, após oito anos de espera, o governo paulista inaugurou a nova unidade do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), com uma ala para a internação de dependentes químicos. A notícia é boa e reflete a necessária visão multidisciplinar que deve orientar a atuação do Poder Público diante dessa verdadeira catástrofe humanitária, cujo enfrentamento requer uma combinação de ações de segurança pública, assistência social e, acima de tudo, saúde.

Como informou o Estadão, a nova unidade hospitalar, chamada de Instituto Perdizes (antigo Hospital Auxiliar Cotoxó), começou a ser construída em 2013 e deveria ter ficado pronta em 2014, mas só foi entregue neste ano. Tamanho atraso é lamentável e revelador das dificuldades que os governos parecem enfrentar na hora de tirar do papel políticas públicas destinadas ao atendimento de usuários de drogas em geral − e de crack em particular. Não é de estranhar, portanto, que realidades gravíssimas e complexas como a Cracolândia se perpetuem, sem solução, ano após ano, enquanto governadores entram e saem. Sem falar no prejuízo financeiro inerente a obras que demoram para ser concluídas e, por óbvio, acabam demandando mais recursos do que o previsto. 

O Instituto Perdizes tem um total de 200 leitos, dos quais 80 para dependentes químicos da Cracolândia e da Grande São Paulo. As internações serão voluntárias, ou seja, por escolha do usuário. Por ora, como informou o Estadão, o novo hospital, mesmo pronto e equipado, oferece apenas atendimento ambulatorial. A previsão é que a ala de internação passe a funcionar no primeiro trimestre de 2023 e que só atinja 100% de sua capacidade em junho. Antes será preciso contratar e treinar a equipe de 760 funcionários. Considerando-se que a unidade ficou pronta com oito anos de atraso, vale perguntar: por que isso não foi feito antes?

No último mês de maio, o governo paulista, em parceria com a Prefeitura, deflagrou uma série de ações policiais para prender traficantes e dispersar o chamado fluxo de usuários de drogas que se concentravam na Praça Princesa Isabel. Os dependentes químicos passaram, então, a circular em grupos menores e se espalharam. Em setembro, o governador Rodrigo Garcia declarou ao Estadão que a situação estava “longe” do ideal, embora o número de dependentes químicos em circulação tivesse diminuído.

Como já tivemos a oportunidade de enfatizar inúmeras vezes aqui neste espaço, é preciso agir em diversas frentes no enfrentamento da tragédia da Cracolândia. E as operações policiais, embora necessárias, não serão capazes isoladamente de desarticular essa chaga na vida da cidade. Nesse sentido, o Instituto Perdizes do Hospital das Clínicas tem enorme contribuição a dar. Dependentes químicos são doentes que necessitam de tratamento adequado. Com os novos 80 leitos, tão logo sejam disponibilizados, o governo paulista dá um passo na direção certa. 

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