Folha de S. Paulo
Comando lulista briga com a realidade
financeira degradada e também com aliados recentes
Geraldo
Alckmin tentou baixar a fervura desta
quinta-feira (10) desgraçada para as finanças do país, o vulgo
"mercado nervoso". Outros do governo de transição e Luiz Inácio Lula da
Silva decidiram espalhar mais brasa.
Decidiram brigar com a realidade, com os
fatos da vida financeira e com aliados recentes da frentinha ampla, o que pode
ter implicação até para a formação de coalizão no Congresso e na sociedade. Há
meios e tempo para consertar o estrago. Pode ficar apenas uma cicatriz. Ou pode
ser um começo de gangrena.
O que é "brigar com a realidade"? Esses desabamentos nos mercados financeiros significam que os donos do dinheiro passam a cobrar mais caro para manter seus recursos em reais, em títulos da dívida pública (empréstimos para o governo) e, por tabela, em ações de empresas e outros ativos domésticos. Cobram mais caro por causa do aumento do risco de inflação, desordem financeira geral e crescimento baixo, para resumir.
O real se desvaloriza (com risco de
inflação extra). As taxas de juros sobem. O governo tem de pagar mais para
financiar seu déficit; o setor privado vai pagar ainda mais caro a fim de
levantar capital para investir, o crédito encarece. É uma descrição elementar
do problema, que vai bem além.
Essa degradação financeira prejudica o
crescimento econômico, sem o qual não haverá mais trabalho. O rendimento do
trabalho equivalente a 60% dos rendimentos totais dos 20% mais pobres (e muito
mais para outros níveis de renda).
Logo, não se vai diminuir a pobreza sem
mais trabalho, principalmente. "Mercado
nervoso" é uma piadinha tola sobre um problema muito real.
O comando lulista quis dourar a pílula do
que Lula disse: ataques ao controle de déficit e dívida do governo, que seria
um empecilho ao pagamento da "dívida social". "Não é bem
assim", pois Lula já demonstrou ser capaz de fazer as duas coisas em seus
governos.
Suponha-se que seja isso. Então, o que Lula
tem dito seria corretamente compreendido caso já houvesse um ministro da
Fazenda ou um conselho econômico crível e funcional.
Lula fez os discursos avacalhando "a
tal estabilidade fiscal" em um momento em que discute uma gambiarra a fim
de atenuar a pobreza e evitar um estelionato eleitoral de consequências
políticas sérias. A gambiarra está quase aceita. O problema é que não há
programa algum a dizer como a futura instalação elétrica vai ser feita de modo
confiável. Isto é, a criação de algum método para conter o crescimento sem fim
da dívida: um "teto Lula".
Diz-se que o problema imediato é o fato de
que a despesa
com o Bolsa Família seja colocada fora do teto de gastos, pior ainda se
permanentemente fora do teto. Mas o teto de Michel Temer foi avacalhado pelo
governo de trevas (2019-22), precisa de reforma e há como fazê-la, como dizem
até lulistas. O problema maior, pois, é saber como vão ser as novas
"regras fiscais", que podem ser várias, algumas mais, outras menos,
convenientes para a situação brasileira e para os problemas crônicos do país.
Se tudo der certo, vai demorar meses para
se definir a nova "regra fiscal". A fim de que a espera não seja
tumultuada, é preciso ter um programa econômico, que ficaria evidenciado na escolha
de uma equipe econômica confiável, capaz e com respaldo político, de Lula e da
coalizão.
O plano precisa de mais: mudanças nos
impostos, na administração pública e facilitação do investimento privado, para
ficar no estrito mínimo. Estabilizado o paciente, é possível inventar formas
novas e inteligentes de intervenção estatal. Mas, sem um plano de contenção de
déficit e dívida, não vai dar certo. Para ser ameno.
Lula assusta o mercado.
ResponderExcluirSei.