domingo, 11 de dezembro de 2022

Eliane Cantanhêde – O coração do governo

O Estado de S. Paulo

Sem improviso e concessões, Lula é pragmático na escolha dos principais ministros

Ao anunciar o coração do seu governo, com Fazenda, Justiça, Defesa, Itamaraty e Casa Civil, o presidente eleito Lula dá cara, coração e alma ao seu novo mandato, demonstra maturidade e pragmatismo, sem improviso e concessões, e sinaliza que quer pacificação, não guerra. Goste-se ou não de Fernando HaddadFlávio DinoJosé Múcio MonteiroMauro Vieira e Rui Costa, eles não foram surpresa nem tirados da cartola.

Para parte do setor privado, Haddad não se encaixa no perfil de ministro da Economia: nem baita técnico, como Malan, nem baita político, como Palocci, que foi hábil negociador na Economia e lamentável figura na Lava Jato. A sinalização é que o real ministro da Economia será Lula e ele não queima gordura para fazer a coisa certa, se o certo é impopular.

No entorno de Lula, a escolha de Haddad faz sentido: professor, mestre em economia e doutor em filosofia, bom leitor e autor, ele só entrou para a política aos 49 anos, dez anos atrás, e abriu canais à esquerda e à direita como prefeito da principal capital do País e ministro da Educação por sete anos. Una-se a isso o vínculo com o chefe.

Haddad é, pois, economista, tem currículo, experiência política e administrativa na área social, nunca foi radical e mantém confiança e lealdade com Lula. O problema é se prevalecer em ambos a sensação de que “um pouco de inflação não faz mal a ninguém” e que “equilíbrio fiscal é coisa de mercado”.

Flávio Dino foi juiz, deputado e governador do Maranhão e demarcou terreno: é de esquerda, não do PT. Interlocutor sem preconceitos, reuniu-se com policiais federais, civis e rodoviários, PMs, bombeiros. Seu maior desafio é manter a segurança pública e “desbolsonarizar” essas forças Armadas, junto com os governadores.

E quem na Defesa, com os militares conflagrados e... anti-Lula? Um petista, um ex-comunista, um paraquedista, um motociclista? Não. Alguém que nunca foi de esquerda, não é valentão e não duela com generais, brigadeiros e almirantes e defende “pacificação”. Tem de ir com calma e atiçar o (real) espírito patriótico e democrático deles, principalmente depois de Jair Bolsonaro reaparecer dizendo que “as Forças Armadas são o último obstáculo para o socialismo”...

Mauro Vieira, último chanceler de Dilma e maltratado na era Bolsonaro, tem carreira admirável e demonstrou caráter ao manter contato com Lula mesmo na cadeia. Rui Costa foi um bom gestor na Bahia, com responsabilidade e liderança, que é o que se espera na Casa Civil. E vem mais por aí, incluindo mulheres, negros e indígenas muito competentes. Lula está começando bem.

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