Correio Braziliense
A atuação do presidente do TSE foi decisiva
para garantir a realização das eleições
O discurso do presidente do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, na cerimônia de
diplomação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), foi um duro
recado aos golpistas que apoiam o presidente Jair Bolsonaro (PL) de que a
democracia venceu, ancorada no Estado Democrático de Direito e, em especial,
nas urnas eletrônicas, que garantiram eleições livres e limpas.
O choro de Lula ao dizer que sua eleição
representou a reconquista da democracia pelo povo e que pretende exercer seu
mandato em nome da "normalidade institucional" e da
"felicidade", sinaliza a intenção de superar o processo de
radicalização que pautou as eleições e ainda ronda sua posse na Presidência.
Entretanto, nada foi mais simbólico de que estamos virando a pagina do golpismo
do que a chegada de Lula, ao lado da primeira-dama Rosângela, a Janja, pelo
corredor formado pelos Dragões da Independência para receber o novo presidente
da República.
Não fosse a emoção de Lula, o discurso de Alexandre de Moraes teria roubado toda a cena. A atuação do presidente do TSE à frente do processo eleitoral foi decisiva para garantir a realização das eleições e seus resultados. Antes, durante e depois do pleito, se considerarmos o pedido de anulação do segundo turno das eleições apresentado levianamente pelo PL, por exigência de Bolsonaro.
Vale a pena rever alguns trechos do
discurso de Moraes: 1) "Ficou constatada a ausência de qualquer fraude,
qualquer desvio ou mesmo qualquer problema. Jamais houve uma fraude constatada
nas eleições realizadas por meio das urnas eletrônicas, verdadeiro motivo de
orgulho e patrimônio nacional"; 2) "A Justiça Eleitoral se preparou
para garantir transparência e lisura das eleições. A Justiça Eleitoral se
preparou para combater com eficácia ataques antidemocráticos ao Estado de
Direito, e os covardes ataques e violências pessoais aos seus membros e de todo
o Poder Judiciário"; 3) "Os extremistas criminosos atacam a mídia
tradicional para, desacreditando-a, substituir o livre debate de ideias
garantido pela liberdade de expressão e pela liberdade de imprensa por suas
mentiras autoritárias e discriminatórias; 4) "Coube à Justiça Eleitoral,
estudar, planejar e se preparar para atuar de maneira séria e firme, no sentido
de impedir que a 'desinformação' maculasse a liberdade de escolha das eleitoras
e eleitores e a lisura do pleito eleitoral".
É tudo verdade. A atuação da Justiça
Eleitoral garantiu condições de normalidade ao pleito, mesmo diante de fatos
que tinham por objetivo alterar o seu resultado, como o bloqueio de estradas e
avenidas por forças policiais para restringir o acesso de eleitores às urnas,
fatos que Moraes tirou por menos ao proclamar os resultados da eleição, mas nem
por isso devem ser varridos para debaixo do tapete. O pedido de anulação do
pleito, prontamente rechaçado, o bloqueio das estradas pelos caminhoneiros,
financiada por empresários bolsonaristas, e as manifestações ainda em curso à
porta dos quarteis, que pedem uma intervenção militar, são fatos que continuam
sendo investigados por Moraes.
Desafios
Diplomado, Lula se depara com dois desafios:
montar um governo para atender às expectativas populares e contar com
suficiente apoio no Congresso. Uma coisa depende da outra. Com o
vice-presidente Geraldo Alckmin, prestigiadíssimo, os ministros que anunciou
até agora configuram um bom estado-maior (Fernando Haddad na Fazenda; Rui Costa
na Casa Civil; Flávio Dino na Justiça; José Múcio Monteiro na Defesa; e Mauro
Vieira nas Relações Exteriores), mas não representam o arco de forças políticas
que precisa ser organizado para que o governo tenha amplo respaldo no
parlamento, no mercado e na opinião pública.
Por enquanto, é um Clube do Bolinha. Há que
completar o governo com mais mulheres. Até agora, a única é a cantora e
produtora cultural Margareth Menezes no Ministério da Cultura. Confinar
mulheres e negros ao "lugar de fala" é uma armadilha, as políticas
públicas universalistas são aquelas que atendem às necessidades básicas da
população, na saúde, na educação, na habitação, na cidadania, na segurança
pública etc.
Ainda há muita expectativa em relação aos
futuros ministros das áreas econômicas do governo, como Planejamento, Indústria
e Comércio, Agricultura. E salta aos olhos a ausência de quadros que foram
decisivos na campanha de Lula, como a presidente do PT, Gleisi Hoffman, o
ex-senador Aloizio Mercadante, o ex-prefeito Emídio de Souza ou o deputado Rui
Falcão. O governo precisa ter um perfil de centro-esquerda, porém o PT não pode
ser sub-representado. Isso seria um fator de crise igual ou até maior do que a
exclusão dos setores de centro que apoiaram o governo no segundo turno.
A propósito, a grande ausência na diplomação de Lula foi a de Simone Tebet, a candidata do MDB que teve um papel decisivo no segundo turno. Qualquer que seja a desculpa, é um fato significativo. Ainda mais se levarmos em conta que o presidente do Cidadania, Roberto Freire, um velho desafeto de Lula, compareceu à cerimônia.
Bem registrado.
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