terça-feira, 27 de dezembro de 2022

Míriam Leitão - Na manhã do dia primeiro

O Globo

Há o temor de um vazio de poder entre a meia-noite e a posse presidencial e dos ministros. O governo eleito prepara-se para evitar riscos

O amanhecer do dia primeiro de janeiro já encontrará o ministro Flavio Dino no gabinete do Ministério da Justiça mesmo antes de ter tomado posse. Fontes do governo de transição explicaram que o ministro da Justiça nas primeiras horas no seu posto é uma das medidas antecipadas diante da situação inusitada que o país vive. O próprio Dino, em entrevista da qual participei na Globonews, admitiu que haverá antecipação de atos — não disse quais — “porque não pode haver vazio de poder”. Esse é um dos sinais das anomalias do tempo que estamos vivendo em que o governo está deixando de cumprir seu dever em várias áreas, a começar da Presidência. Bolsonaro comete crime por omissão, o ministro Anderson Torres se limitou a avisar, via rede social, que mandou a Polícia Federal acompanhar as investigações.

A Polícia Civil do Distrito Federal está fazendo o máximo que pode, mas os fatos estão se avolumando. Segue o fio. Uma pessoa, de nome George Washington, foi presa e confessou ter planejado, com outras pessoas, a explosão de um caminhão com querosene de aviação no aeroporto de Brasília. Alega que havia também planos de atingir o fornecimento de energia. No dia seguinte, a Polícia encontra 40 quilos de explosivos e coletes à prova de bala no Gama, na região administrativa do Distrito Federal. Tudo isso foi planejado em frente ao quartel-general das Forças Armadas. O nome disso é terrorismo e é crime federal.

O que a fonte me explicou é que o risco é haver sim um vazio de poder, porque o governo Bolsonaro acaba às 24h do dia 31. Pelo artigo 78 da Constituição, o presidente toma posse diante do Congresso Nacional depois de se comprometer a respeitar a Constituição, num ato solene que está marcado para as 15h. A cerimônia no Palácio, em que ele recebe a faixa, é decorrência disso. Mas, normalmente, só após todo esse ritual é que o presidente dá posse aos seus ministros. São várias horas de vácuo, que ninguém sequer perceberia em situação normal. Em um ambiente que foi deliberadamente inflamado pelo presidente Bolsonaro é preciso se cercar de todos os cuidados. Não pode, de fato, haver vazio de poder.

Bolsonaro e Anderson Torres ainda estão em seus cargos. Um foi eleito para a Presidência e o outro foi seu nomeado para comandar o Ministério da Justiça. Eles são responsáveis pelo que acontecer até a meia-noite de sábado para domingo. Se não agem, prevaricam. Nada fazer é fazer. Quem nada faz quando é agente público e tem a obrigação de fazer algo está cometendo crime por omissão. Esse é o momento de o presidente sair do seu patético mutismo e mandar esses seus seguidores voltarem para a casa e acabar com essa falsa ideia de que eles estão numa resistência pela pátria. E Anderson Torres não pode achar que sua obrigação é apenas postar um tuíte mandando a PF “acompanhar” as investigações.

O suspeito preso pediu para retirar a referência que fizera a Bolsonaro, quando disse que se sentiu estimulado aos seus atos pelas palavras do presidente. Sair do Pará todo armado e ir para Brasília. Mesmo que ele tenha pedido para excluir, essa declaração faz sentido. Quantas vezes o presidente estimulou seus seguidores a pensar que alguma coisa aconteceria e que o “seu” Exército estava com ele? Quantos decretos, normas e instruções o presidente baixou para estimular o armamentismo e proliferar os clubes de tiro no país? “Vamos escancarar essa questão do desarmamento”, disse Bolsonaro, diante de seus ministros, no Palácio do Planalto, em abril de 2022. E escancarou.

Bolsonaro perdeu a eleição, e agora a cidade prepara a posse de quem ganhou a eleição, seu adversário Luiz Inácio Lula da Silva. Brasília é dos vencedores. Seus eleitores têm o direito de ocupar ruas e praças e fazer a justa festa da vitória. Há quatro anos quem desembarcava em Brasília eram os eleitores de Bolsonaro, sem que qualquer força política os importunasse ou ameaçasse.

É preciso ter dinheiro para ficar sem trabalhar durante 45 dias em hotel ou em casa alugada em Brasília, depois de ter investido R$ 160 mil em armas. Há vários sinais exteriores de que tudo isso tem sido muito bem financiado. Eles ocuparam hotéis na capital, alugaram imóveis, montaram estruturas para passar o dia em manifestações cenográficas. O governo faz de conta que não vê, que não tem algo a fazer. A estratégia de Bolsonaro é nada dizer que o comprometa, mas insinuar tudo com o seu prolongado silêncio. Isso não o livra da responsabilidade.

 

4 comentários:

  1. "O nome disso é terrorismo e é crime federal." E o chefe dos terroristas é o ex-terrorista Jair Messias Bolsonaro!

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  2. Duas semanas depois das arruaças no DF e do ataque à sede da PF, a PF mandou ONTEM abrir inquérito sobre aqueles atos terroristas...

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  3. Bolsonaro não é só INCOMPETENTE, ele é muito MAL INTENCIONADO!

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  4. Dia 1º está chegando,o Brasil precisa de oração.

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