O Globo
Orçamento secreto deve ser derrubado no STF
por pelo menos seis votos, mas o calendário é apertado para o fim da votação
ainda este ano
O orçamento secreto deve ser considerado
inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Essa é a avaliação que eu
ouvi na Corte. E essa convicção vem do fato de que ele fere o “o princípio da
transparência em relação à administração pública que está no artigo 37 da
Constituição”. Mas será uma corrida contra o tempo. A ministra Rosa Weber
pautou o julgamento da ADPF que ela relata para amanhã, quarta-feira. Não é o
primeiro assunto da pauta e na quinta-feira, 8, é dia da Justiça. Na semana que
vem, haverá sessão nos dias 14 e 15. No dia 19, começa o recesso do Judiciário.
Na visão da fonte que eu ouvi, o tema “não é mais um assunto político, é
assunto jurídico”.
Todos os olhares do novo governo estarão sobre o STF porque esta é a questão do momento. Se o uso das verbas públicas através dessas emendas do relator for considerado inconstitucional, resolve-se o mais espinhoso dilema político do novo governo, mas na Suprema Corte há quem tema que a sua derrubada crie novo conflito do Judiciário com a Câmara e o Senado. “Mais uma vez empurram para o STF algo que seria da competência do Legislativo”, me disse uma fonte do tribunal. Porém, explica um ministro, depois que a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) foi proposta, o STF tem que julgar. “A Constituição determina que o Supremo dê uma resposta”, disse esse integrante da Corte.
O Orçamento Público é o pilar da
democracia. Através dele, o país decide como o dinheiro recolhido aos cofres
públicos será distribuído entre as várias ações governamentais. Tem que ser
transparente. Isso é mandamento constitucional. Todos os esforços para que as
pessoas no Brasil tivessem mais acesso às informações do Orçamento foram passos
que fortaleceram a democracia. Parcelas do dinheiro coletivo só podem ser
entregues a parlamentares, para que eles destinem os recursos aos seus redutos,
se essa distribuição for impessoal e igualitária. Nada disso existe no
orçamento secreto. A repartição é feita de forma opaca, desigual e
discricionária.
Essas emendas assumiram uma proporção
enorme nos últimos anos. São R$ 19 bilhões no Orçamento de 2023 . Dão ao
relator, e aos presidentes das duas Casas, o poder de ordenar despesas nos
ministérios. Durante a campanha, o presidente Lula as definiu como usurpação de
poder.
Em entrevista ao GLOBO no domingo, o
presidente do PSD, Gilberto Kassab, o defendeu. “Primeiro vamos aqui ser
justos: não é secreto. Hoje ele é público e as pessoas sabem para onde vão os
recursos”. “Não”, disseram os jornalistas Jan Niklas e Thiago Prado. E fizeram
muito bem quando discordaram do entrevistado, explicando que existe até a
figura do “usuário externo”, mecanismo que burla a transparência e coloca nomes
de pessoas estranhas à representação política, ou ao setor público, ordenando
despesas no Orçamento.
No artigo de sábado, o colunista deste
jornal Pablo Ortelado definiu orçamento secreto como
“um dos mais danosos legados institucionais do bolsonarismo”. E faz um
histórico importante dessa figura tortuosa que se tornou a forma oficial de
compra de apoio político por Bolsonaro. Bolsonaro costuma dizer que o vetou.
Porém, foi sua base que manteve o instrumento para a alegria do presidente, que
assim conseguiu manter o Congresso na coleira.
O jornalista Breno Pires, na época no
“Estado de S. Paulo”, fez a primeira de uma série de reportagens que revelaram
o esquema. Depois, na “Piauí”, ele mostrou como o dinheiro alimentava um
sistema pulverizado de corrupção, usando suposta prestação de serviços de
saúde. Um dos casos que ficou notório foi o de uma cidade que declarou mais
extração de dentes do que havia na boca de seus habitantes. Em artigo publicado
na semana passada na “Folha de S.Paulo”, o colunista e professor Conrado Hubner
escreveu que “essa potente turbina da corrupção bolsonarista foi costurada pelo
general Luiz Eduardo Ramos e Arthur Lira. A relação entre Executivo e
Legislativo foi redefinida por mecanismo puramente ilícito”.
Pelas contas feitas por um magistrado, pelo
menos seis votos contra o orçamento secreto estão garantidos. E os dois
ministros nomeados por Bolsonaro podem não ter motivos para votar a favor
nestes últimos dias de Pompeia. O que precisa nortear o STF é a defesa da
Constituição. Esse é o papel da Corte. Será difícil o julgamento terminar nesta
quarta, mas precisa encerrar antes do recesso.
Muito bom o artigo de Míriam Leitão.
ResponderExcluirTão escorreito, concatenado e límpido o texto, que não condiz com o discurso hesitante, tatibitate e confuso das apresentações ao vivo da pretensa jornalista.
ResponderExcluirAo menos num dos dois casos a autoria é presumivelmente falsa.