Rigor da lei tem de ser usado contra
arruaças bolsonaristas
Valor Econômico
O futuro ministro da Justiça e Segurança
Pública, Flávio Dino, afirmou que se não houver punições aos responsáveis
agora, o próximo governo os punirá
Poucas horas depois que Luiz Inácio Lula da
Silva foi diplomado presidente da República pelo Tribunal Superior Eleitoral,
em cerimônia onde a democracia foi exaustivamente louvada, seus inimigos
provocaram arruaças públicas em Brasília. Cinco ônibus foram queimados, a sede
da Polícia Federal e da 5ª Delegacia de Polícia sofreram tentativas de invasão
e botijões de gás vazios foram espalhados pelo Setor Hoteleiro Norte. A
segurança do hotel onde estão hospedados Lula e o vice-presidente eleito
Geraldo Alckmin foi reforçada e um clima de tensão na capital federal varou a
madrugada. A Esplanada dos Ministérios e a Praça do Três Poderes amanheceram
fechadas ontem.
No TSE, foram lembradas as circunstâncias
de uma das eleições mais conturbadas desde a redemocratização, com as
tentativas do próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, de desacreditar
as urnas, instigar as Forças Armadas a exercerem funções que não são as suas -
verificar a lisura das urnas, por exemplo - e conclamar apoiadores radicais a
se insurgirem contra o resultado.
Bolsonaro manteve-se quieto desde que foi derrotado nas urnas, mas interrompe seu silêncio para instigar seus apoiadores mais extremistas, que há semanas acampam na frente de quartéis pedindo que os militares intervenham e ponham fim à democracia. “Por que chegamos a esse ponto?”, indagou Bolsonaro um dia antes da baderna de seus correligionários em Brasília. “Demoramos a acordar? Nunca é tarde para acordarmos e sabermos a verdade”.
O estopim da violência bolsonarista foi a
prisão, pedida pela Procuradoria Geral da República e autorizada pelo ministro
Alexandre de Moraes, do indígena José Acácia Tsrere Xavante, acusado de
instigar atos violentos para impedir a posse de Lula e perseguir membros do
Supremo Tribunal Federal. Na diplomação de Lula, Moraes deixou claro o que
acontecerá com manifestações que extrapolem os limites legais. “Diversos grupos
organizados já identificados, garanto, serão integralmente responsabilizados
para que isso não retorne nas próximas eleições”, afirmou.
Caminhoneiros identificados pelas
autoridades do Mato Grosso, que participaram de comboio organizado em Cuiabá em
novembro, começaram a ser multados e proibidos de circular. A Polícia Federal
descobriu algo mais além de eventuais fervores ideológicos de alguns
participantes dos bloqueios de estradas no Centro-Oeste: envolvimento em crimes
ambientais, contrabando e tráfico de drogas (Folha de S. Paulo, ontem). Houve
mais de 100 bloqueios de estradas e caminhoneiros também participam de
concentrações em frente a quartéis do Exército em vários pontos do país.
Bolsonaro nunca reconheceu direito a
derrota nem pediu aos bolsonaristas que deixassem os militares em paz, após
cantilenas incessantes por um golpe. O objetivo dessas manifestações é
antidemocrático, mas enquanto se limitarem a pacificamente manifestar opiniões,
ainda que extremas, podem ser toleradas. O mesmo não pode ser dito de
empresários que patrocinam e financiam esses protestos, que estão sendo
investigados e poderão ser, se for o caso, processados. Da mesma forma,
ultrapassaram claramente a legalidade os atos com violência na noite de
segunda-feira em Brasília.
Assim como a tentativa de Bolsonaro de
invalidar o resultado das urnas foi barrada imediatamente pelo reconhecimento
da vitória de Lula pelo comando do Legislativo e do Judiciário, os tumultos
bolsonaristas de agora provocaram a mesma reação. Arthur Lira, presidente da
Câmara, manifestou “repúdio” veemente “à desordem, violência, risco à
integridade física ou de patrimônio privado”. Rodrigo Pacheco, no comando do
Senado, condenou as “minorias raivosas” e considerou “absurdos” os atos de
vandalismo. O secretário da Segurança do Distrito Federal, Julio Ferreira,
disse que já tem todos os meios para identificar os baderneiros. O futuro
ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, afirmou que se não houver
punições aos responsáveis agora, o próximo governo os punirá porque os crimes
não terão prescrito até a posse.
Os bolsonaristas radicais devem continuar testando os limites legais para desgastar e intimidar as instituições, e demonstrar força política. Podem se tornar uma fonte perene de intranquilidade durante o governo de Lula, caso, dentro dos estritos limites da lei, não sejam chamados a responder por eventuais crimes e sejam punidos por eles.
Vândalos não têm lugar na democracia
O Estado de S. Paulo
Eis o final do governo Bolsonaro:
manifestantes bolsonaristas incendiando ônibus e depredando prédios públicos.
Que a lei prevaleça, assim como prevaleceu em todo o processo eleitoral
Na sexta-feira passada, o presidente Jair
Bolsonaro disse que as manifestações contrárias ao resultado das eleições,
alegando supostas fraudes, eram organizadas por “cidadãos de bem” e estavam “de
acordo com as nossas leis”. Anteontem, em Brasília, alguns desses “cidadãos de
bem”, acampados desde o fim das eleições presidenciais diante do
Quartel-general do Exército para pedir que os militares impeçam a posse do
vencedor, o petista Lula da Silva, mostraram que a única lei que respeitam é a
da selva.
Horas depois da diplomação de Lula da Silva
e de seu vice, Geraldo Alckmin, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ato que
encerrou o processo eleitoral, os vândalos, a pretexto de protestar contra uma
ordem de prisão temporária de um de seus líderes, incendiaram ônibus e carros,
depredaram prédios públicos e privados e tentaram invadir a sede da Polícia
Federal.
Não há argumento retórico que faça dessa
barbárie uma maneira legítima de manifestação. Não faz muito tempo, nos idos do
governo da petista Dilma Rousseff, parlamentares que hoje se identificam com o
bolsonarismo pugnaram pela aprovação de uma lei que enquadrasse como
terroristas os manifestantes que incendiassem veículos e depredassem prédios
públicos. O objetivo, claro, era constranger os movimentos sociais. Mas eis
que, quando é a extrema direita que reivindica o direito à truculência, os
“terroristas” se transformam em “patriotas”.
Não podia acabar em outra coisa um governo
que começou sob o signo da divisão e da violência retórica. É quase natural que
apoiadores do presidente instaurem o caos na capital do País porque não se
conformam nem com o resultado das eleições nem com decisões da Justiça – sejam
as que permitiram a candidatura de Lula, sejam as que tolheram o golpismo
bolsonarista no processo eleitoral. No caso da prisão contestada pelos
baderneiros, a ordem, do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal
Federal (STF), foi dada depois de pedido da Procuradoria-geral da República
(PGR) justamente por indícios de crimes contra a democracia. A violência dos
manifestantes confirmou o acerto da decisão da Justiça.
Mas os atos de vandalismo em Brasília
revelam mais do que o desprezo de bolsonaristas pela lei e pela democracia.
Eles evidenciam que a contínua confrontação de Jair Bolsonaro contra o sistema
eleitoral e o Judiciário produziu e continua a produzir danos inéditos sobre o
País. Antes de Bolsonaro empreender sua campanha contra as urnas eletrônicas,
nunca tinha havido nada minimamente parecido em termos de resistência e de
violência contra o resultado de uma eleição.
Vale lembrar que, na sexta-feira passada,
Jair Bolsonaro voltou a fazer declarações golpistas, instigando apoiadores em
frente ao Palácio da Alvorada. “Quem decide para onde eu vou são vocês. Quem
decide para onde as Forças Armadas vão são vocês. Quem decide para onde o
Congresso vai são vocês”, disse o presidente, como se estivesse numa anarquia,
e não num Estado Democrático de Direito. Os atos de vandalismo em Brasília
explicitaram a gravidade das palavras irresponsáveis de Bolsonaro.
Perante um presidente da República que
ignora solenemente a Constituição, é possível entender o motivo pelo qual foi
dada tanta solenidade ao ato de diplomação da chapa presidencial no TSE. Não
eram circunstâncias normais. Não era apenas diplomar os ganhadores das
eleições, reconhecendo oficialmente a regularidade e a legitimidade da vitória.
Neste ano, por força dos ataques e ameaças praticados contra a democracia, a
diplomação representou uma celebração do regime democrático. Foi o
reconhecimento de que, apesar de todas as dificuldades, o processo eleitoral
funcionou. “Essa diplomação atesta a vitória plena e incontestável da
democracia e do Estado de Direito contra os ataques antidemocráticos”, disse o
presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes.
A especial solenidade do ato de diplomação
foi também um importante alerta em defesa da democracia. As instituições estão
atentas e vigilantes. No Estado Democrático de Direito, não há espaço para o
golpismo, para a violência ou para a barbárie. Aos que trilham esse caminho, a
lei prevê punição – a inelegibilidade é uma delas.
A Lei das Estatais diz a que veio
O Estado de S. Paulo
Petistas acham que a lei que impede
indicações políticas para cargos de direção e Conselhos de Administração de
empresas públicas atrapalha; só isso basta para justificar sua existência
Uma análise divulgada pela consultoria
Eurasia deu conta de que a escolha da equipe do governo eleito tem esbarrado em
restrições da Lei das Estatais. Os dispositivos do artigo 17 da Lei
13.303/2016, que estabelecem critérios para a indicação de diretores e membros
do Conselho de Administração de empresas públicas e sociedades de economia
mista, impõem uma série de exigências sobre experiência e formação aos
candidatos a assumir as funções, assim como proíbe a nomeação de ministros,
secretários e detentores de cargos de confiança, parlamentares, dirigentes
partidários e pessoas que tenham atuado em campanha eleitoral ou que tenham
qualquer conflito de interesses, além de seus parentes.
Tais requisitos seriam uma barreira à
nomeação de aliados do presidente eleito a cargos estratégicos vinculados ao
Executivo federal, entre eles o senador Jean Paul Prates (PT-RN) e o ex-senador
Aloizio Mercadante (PT-SP), cotados, respectivamente, para o comando da
Petrobras e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em
uma reunião na semana passada, Lula da Silva teria aventado a possibilidade de
alterar essas limitações por meio de uma medida provisória.
Integrantes da equipe de transição não
confirmaram nem negaram os rumores, elevando as incertezas dos investidores e o
receio de que as empresas, sobretudo sociedades de economia mista com ações em
bolsa, possam sofrer interferências políticas. Não é um temor desarrazoado,
pelo contrário. As circunstâncias que levaram à aprovação da Lei das Estatais,
em 2016, remetem a fatos praticados em administrações petistas que causaram
enormes prejuízos financeiros às próprias companhias.
A Petrobras foi uma das maiores vítimas de
intervencionismo no governo Lula e na gestão de Dilma Rousseff. Além de perder
dinheiro em investimentos controversos e esquemas que alimentavam o caixa de
partidos políticos, a empresa foi usada como instrumento de controle da
inflação – tanto que os reajustes precisavam do aval prévio do Ministério da
Fazenda. O BNDES, por sua vez, alavancou companhias selecionadas para serem
campeãs nacionais com empréstimos subsidiados e financiados pelo contribuinte.
Já seria uma medida bastante questionável mesmo se a política ao menos tivesse
dado certo. Mas, como todos sabem, não deu, haja vista a recuperação judicial
da Sete Brasil e da Oi.
A aprovação da Lei das Estatais criou
níveis mínimos de governança para o comando das empresas públicas. Exigir dos
executivos e conselheiros formação específica, experiência prévia ou que tenham
trabalhado no setor em que a companhia atua não é nenhum absurdo. O risco de
serem responsabilizados por atos que venham a prejudicá-la tende a conduzir à
tomada de decisões tecnicamente fundamentadas.
Nenhuma lei, no entanto, é perfeita, e a
própria Lei das Estatais abre margem para interpretações divergentes. Artigos
que tratam da defesa do interesse da empresa, de alguma forma, podem
contrapor-se a trechos que dispõem sobre a função social das companhias e o
interesse coletivo, termo no qual cabe quase tudo. A lei não constrangeu o
presidente Jair Bolsonaro quando este decidiu trocar o presidente da Petrobras
várias vezes até encontrar alguém disposto a fazer exatamente o que ele queria
– evitar reajustes nos combustíveis em um ano eleitoral. A legislação foi
olimpicamente ignorada quando o Conselho de Administração da petroleira aceitou
a nomeação de Jônathas Assunção, secretário executivo da Casa Civil e braço
direito do ministro Ciro Nogueira, a despeito da recomendação de três
instâncias da companhia pelo veto.
Aperfeiçoamentos são sempre desejáveis, e é
possível que a Lei das Estatais enseje ajustes, mas não neste momento e nem por
medida provisória, norma cuja tramitação célere impede o necessário
amadurecimento do debate no Congresso. Mas é muito simbólico que o único trecho
criticado pelo mundo político seja o que estabelece limites aos nomes para a
direção e o Conselho de Administração das empresas públicas. É das raras
unanimidades, pelas piores razões, a unir os interesses da direita, da esquerda
e do Centrão.
Incerteza mantém os juros bem altos
O Estado de S. Paulo
Copom confirma que cenário externo ruim e
insegurança sobre o novo governo dificultam a redução
Juros altos e crédito escasso continuarão
complicando o dia a dia dos brasileiros por muito tempo, se o novo governo,
gastando sem cuidado, tornar mais incerta a evolução de suas contas e, de modo
especial, da dívida pública.
Obviamente dirigida ao presidente eleito e
ao futuro ministro da Fazenda, esta é a principal mensagem contida na ata da
última reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC).
Tendo mantido em 13,75% a taxa básica de juros, o Comitê se absteve de indicar
seus próximos passos, limitando-se a admitir um aperto maior, no próximo ano,
se a desinflação for mais lenta do que se espera. A ata foi divulgada na última
terça-feira, mas a decisão sobre os juros foi anunciada ao anoitecer da quarta-feira
anterior, depois da reunião. No mercado, estimativas de juros para 2023 foram
logo ajustadas para cima.
Juros altos, e talvez em alta, tornarão
mais desafiador o primeiro ano do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de sua
equipe econômica. Dinheiro caro dificultará o consumo e agravará os problemas
de centenas de milhares de famílias já endividadas. Muitos brasileiros
precisarão de ajuda para sair do buraco financeiro. Além disso, empresários
terão menor disposição de investir em capacidade produtiva, se as condições de
financiamento forem muito desfavoráveis.
Tudo parece reforçar a expectativa de baixo
crescimento econômico em 2023. Pelas últimas projeções do mercado, a expansão
do Produto Interno Bruto (PIB) dificilmente será superior a 1%. Mas juros
altos, além de prejudicarem a atividade e a arrecadação tributária,
restringindo o poder de gasto do governo, ainda encarecem a dívida pública,
prolongando os problemas.
Há motivos mais que suficientes, portanto,
para a cúpula do próximo governo se preocupar com as incertezas e inquietações
dos membros do Copom, dos empresários e dos consumidores. O presidente eleito
já deixou clara a intenção de expandir os gastos sociais e de estimular o
crescimento econômico e o emprego. Não apresentou, no entanto, um roteiro de
trabalho nem explicou como cuidará da saúde financeira do governo. Não basta
lembrar a condução das contas públicas em seu primeiro governo. O mundo
exterior mudou, o Brasil também, e os desafios são outros.
Se o presidente eleito se dispusesse a ler a ata da reunião do Copom, ficaria provavelmente impressionado com a descrição quase dramática do ambiente externo, com perspectiva de menor crescimento, inflação desafiadora, forte aperto financeiro e enorme insegurança. No ambiente interno, combinam-se a desaceleração do crescimento, a inflação ainda elevada, apesar de algum recuo recente, a melhora ainda lenta do emprego e a ampla incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal. No cenário básico, a inflação projetada ainda supera amplamente a meta oficial em 2022 e em 2023 e só se aproxima dela em 2024. É cedo para programar um relaxamento da política de juros, especialmente quando há promessa de maiores gastos federais e nenhuma indicação de como isso será compensado.
O Globo
Congresso precisa criar mecanismo
transparente para o Executivo negociar apoio a seus projetos
Não é exagero afirmar que o julgamento do
Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o orçamento secreto previsto para hoje
será decisivo para o futuro da democracia brasileira. Se não houver pedido de
vista nem acordo espúrio para deixar a decisão para depois da aprovação do
Orçamento de 2023, o Supremo terá a oportunidade de reparar uma falha do nosso
presidencialismo de coalizão: as relações opacas, nem sempre republicanas,
entre Executivo e Legislativo.
Não há dúvida de que o orçamento secreto —
tecnicamente, as emendas do relator-geral identificadas pela sigla RP9 — é uma
excrescência que precisa ser extinta. Trata-se de mecanismo que confere ao
Parlamento o poder de destinar dezenas de bilhões sem transparência nem
critério técnico. Transformou-se em meio para compra de apoio político pelos
caciques parlamentares.
A extinção das RP9s, porém, não resolverá o problema de fundo. Dada a fragmentação política do Legislativo, o Executivo continuará precisando de instrumentos para negociar apoio a seus projetos. Foi justamente a falta de mecanismos transparentes de negociação que tornou o Congresso um balcão de negociatas no mensalão, no petrolão e no próprio orçamento secreto.
Transparência absoluta deve ser exigência
inegociável nas demandas que o STF fizer ao Legislativo. Como acontece com as
emendas individuais, as demais deveriam estar associadas ao nome dos
beneficiários. A destinação dos recursos deveria ser baseada em estudos. Tais
informações deveriam ser publicadas no Portal da Transparência. Sem isso, nem
um centavo dos impostos deveria ser entregue. O mesmo critério deveria servir
para toda indicação a cargo público, que precisaria estar sujeita à análise de
qualificação e conflitos de interesses do indicado. Mas a transparência não
encerra a questão.
No caso das emendas individuais, a Emenda
Constitucional (EC) 86 estabeleceu em 2015 distribuição igualitária de
recursos, sujeitos a restrições. Em troca, tornou-as impositivas, retirando do
Executivo a prerrogativa de autorizar a execução quando conveniente. Em 2019, a
EC 100 adotou o mesmo princípio para emendas de bancada. As emendas do relator
surgiram como manobra para driblar essas restrições, devolvendo às lideranças
políticas o poder de dar, em segredo, mais para uns e menos para outros.
No atual governo, esse poder ficou nas mãos
dos presidentes da Câmara e do Senado. A equipe de transição tenta resgatá-lo
para o Executivo. Pelo texto da PEC da Transição aprovado no Senado, os gastos
autorizados acima do teto poderão ser alocados por emendas do relator como
obrigatórios, sem estar sujeitos aos limites das demais emendas, nem às
restrições das impositivas. A Câmara, que examina hoje a PEC, tem o dever de
derrubar esse absurdo.
Extinguir a emenda do relator é um passo
necessário, mas insuficiente. Para evitar outra resposta obtusa do mundo
político, seria preciso criar um mecanismo por meio do qual o Executivo possa
negociar com o Legislativo de modo transparente, sem receio de favorecer
aqueles de cujo apoio depende. Desde que às claras, respeitando limites
fiscais, boa gestão e critérios técnicos, a destinação de recursos por emendas
poderia ser uma resposta. Não há por que se preocupar com a distribuição
desigual, pois a transparência exporia distorções e vínculos espúrios. Criar
tal mecanismo é dever não do STF, mas do próprio Parlamento.
Fim da política Covid Zero é sintoma de
esgotamento do modelo chinês
O Globo
Diante da onda de protestos, Xi não teve
alternativa. Terá de enfrentar agora consequências imprevisíveis
O todo-poderoso líder chinês Xi Jinping não
teve alternativa. As manifestações contra a política de Covid Zero se
espalharam e, na semana passada, Pequim viu- se obrigada a recuar nos lockdowns
e nas medidas destinadas à supressão do vírus. Pudera. A política era tão
rígida que impediu até bombeiros de socorrer moradores de um prédio em chamas
em Xinjiang, tragédia que matou dez pessoas e deu impulso aos protestos.
Os testes em massa compulsórios, até em
locais públicos, foram drasticamente reduzidos. Foram autorizadas quarentenas
em casa, não mais nos impopulares centros do governo. O célebre aplicativo para
rastreamento de contatos foi abandonado. As autoridades chinesas passaram a
alardear que a contaminação está em queda. Cuidadosas com o formalismo, rebaixaram
a categoria de risco da infecção pela variante Ômicron. Antes, era considerada
pelo governo chinês tão séria quanto peste bubônica ou cólera, agora passou à
classe das síndromes respiratórias.
A verdade é que o governo chinês insistiu
por tempo demais numa estratégia que, embora acertada e necessária no início da
pandemia, depois não passou de pretexto para a manutenção de restrições
autoritárias, cobrando um preço elevadíssimo na forma de queda da atividade
econômica. Desde o vacilo inicial diante da descoberta da Covid-19 em Wuhan, em
2019, a China adotou normas draconianas para deter a transmissão do
coronavírus. A paralisação sucessiva de linhas de montagem de componentes
eletrônicos e outros produtos criou dificuldades para cadeias globais de
suprimento e, ao lado de uma crise imobiliária criada pelo excesso na oferta de
crédito público, tirou o lustro da economia chinesa.
A ênfase na prevenção do contágio deixou a
vacinação em segundo plano, sobretudo em grupos vulneráveis. Tal estratégia fez
da China, país com a maior população do mundo, o maior reservatório de
suscetíveis à infecção pelo vírus. O governo também resistiu a importar vacinas
estrangeiras de tecnologia mais eficaz, insistindo nas desenvolvidas
localmente. Nos últimos dias, a procura por vacinas na China disparou, mas a
vacinação continua baixa entre os idosos, enquanto o inverno se aproxima.
Em janeiro, milhões de chineses costumam se
deslocar para comemorar o Ano Novo Lunar, e há temores fundamentados de uma
explosão no contágio. Vizinhos como Taiwan e Cingapura se preparam para o
ressurgimento forte da doença, com estoques de vacinas, antivirais e Unidades
de Tratamento Intensivo (UTIs). Não há notícia de plano semelhante na China.
É possível que, como o Vietnã há um ano, os chineses consigam driblar a nova onda, já que a Ômicron e suas subvariantes, apesar de mais contagiosas, são menos letais. Mas é impossível prever as consequências de surtos fora de controle em grandes cidades e asilos. Hong Kong teve de voltar atrás depois de uma abertura atabalhoada. Mais imprevisível é o efeito da mobilização popular no regime autoritário de Xi, num momento em que o modelo econômico dá sinais de esgotamento.
Gastando por conta
Folha de S. Paulo
Detalhamento de despesas em 2023 escancara
excessos da PEC irresponsável de Lula
O relator do Orçamento de 2023, senador
Marcelo Castro (MDB-PI), correu a detalhar como será a distribuição da
dinheirama a ser liberada pela proposta de emenda constitucional destinada
a ampliar o teto das despesas federais, que faz jus ao epíteto PEC da Gastança.
A pressa do parlamentar, que se antecipou à
votação do texto pela Câmara dos Deputados, talvez se justifique pela
proximidade do próximo exercício, com o início do governo Luiz Inácio Lula da
Silva (PT).
Entretanto a relação de intenções
apresentada acaba por escancarar os excessos da PEC, que ainda enfrenta
resistência no Congresso.
A finalidade básica da proposta é garantir
a continuidade do pagamento do Auxílio Brasil, ou Bolsa Família, de R$ 600
mensais —isso, de fato, é imperativo. Para tanto, estão previstos mais R$ 75
bilhões para o Ministério da Cidadania, suficientes também para benefícios
adicionais para famílias com crianças de até seis anos.
Resolvida essa prioridade evidente, a PEC
ainda eleva em outros R$ 70 bilhões, no mínimo, os gastos do próximo ano. Cerca
de um décimo desse montante, ou R$ 6,8 bilhões, vai permitir um reajuste pouco
acima da inflação para o salário mínimo, prometido por Lula na campanha
eleitoral.
O restante é alegremente espalhado pelas
mais diversas áreas da administração, de saúde e educação até habitação,
ciência e tecnologia, turismo, defesa, agricultura, ambiente e outras —sem esquecer
um reajuste salarial para os servidores do Executivo.
É plausível que alguns, muitos ou todos os
setores necessitem de mais dinheiro, mas a tarefa de quem elabora o Orçamento
consiste em escolher prioridades de acordo com os recursos disponíveis.
Uma PEC de caráter emergencial, de fato
necessária em razão da desordem fiscal criada por Jair Bolsonaro (PL) com o
aumento do Auxílio Brasil, não poderia estabelecer um novo patamar geral de
despesa sem que nem mesmo tenham sido considerados ajustes em outros programas.
Em valores corrigidos e sem considerar
juros da dívida, o governo federal desembolsou R$ 1,8 trilhão nos 12 meses
encerrados em outubro, montante até um pouco superior ao verificado no final do
governo Dilma Rousseff (PT). Não se sustenta, portanto, a tese de que a máquina
pública foi sucateada.
Com a PEC, a conta poderá se aproximar dos
R$ 2 trilhões, num aumento que será necessariamente coberto com endividamento
público. Sem corrigir distorções, eliminar privilégios e abandonar políticas
menos eficientes, futuro governo e Congresso empurrarão para toda a sociedade o
preço das bondades de agora. Os pobres, com certeza, sofrerão mais.
Não à baderna
Folha de S. Paulo
Vandalismo bolsonarista em Brasília requer
resposta firme das autoridades
A violência dos radicais bolsonaristas que
atacaram a sede da Polícia Federal, incendiaram
carros e ônibus e depredaram equipamentos públicos em Brasília na noite de
segunda (12) recebeu merecido repúdio em toda parte.
O tumulto começou quando um grupelho
resolveu protestar
contra a detenção do líder indígena José Acácio Serere Xavante, cuja
prisão temporária foi decretada à tarde pelo ministro Alexandre de Moraes, do
Supremo Tribunal Federal.
Acusado pela Procuradoria-Geral da
República de incitar atos antidemocráticos contra o presidente eleito, Luiz
Inácio Lula da Silva (PT), e ministros do STF, o xavante não opôs resistência
ao ser detido e foi assistido por seus advogados.
Mesmo assim, os desordeiros foram até a
sede da PF e ameaçaram invadir o prédio. Repelidos pelos policiais, que usaram
bombas de efeito moral, a turba se dirigiu a outras partes da cidade.
José Acácio gravou na prisão um vídeo para
pedir que cessassem os distúrbios, mas os arruaceiros só se dispersaram após
horas de confusão, em que tentaram até derrubar um ônibus de um viaduto sobre
uma via de grande circulação.
A polícia do Distrito Federal bloqueou
acessos à praça dos Três Poderes, à Esplanada dos Ministérios e reforçou a
segurança no hotel em que Lula tem se hospedado quando está na capital.
Nesta terça (13), as autoridades prometeram
empenho para identificar e responsabilizar os culpados.
Espera-se que o façam com a rapidez
necessária para afastar as suspeitas de que fizeram corpo mole na véspera,
quando eles estavam em ação e nenhum foi preso.
Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), condenaram os atos de violência.
Alvo principal dos baderneiros, Lula acusou
Jair Bolsonaro (PL) de incentivar os que protestam inutilmente contra o
resultado da eleição acampados na porta de quartéis em Brasília
e outras capitais.
O presidente derrotado nas urnas pediu que
apoiadores desbloqueassem as estradas nos dias que se seguiram ao pleito, mas é
certo que seu silêncio, desde então rompido apenas por uma fala desconexa na
última sexta (9), não contribui para desencorajar fanáticos.
Não há tolerância para tentativas de subversão da ordem democrática por meios violentos. Cabe às autoridades deter e julgar aqueles que foram às ruas de Brasília, para que a lição sirva aos recalcitrantes.
Bolsonaro não sabe o que é Verdade. O que ele chama de verdade é MENTIRA PURA! Ele e Trump são os maiores MENTIROSOS do mundo!
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