terça-feira, 27 de dezembro de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

O que nos une é muito maior que nossas diferenças

O Globo

Pontos de convergência entre lulistas e bolsonaristas apontam caminho para vencer polarização

Os brasileiros têm opiniões idênticas, semelhantes ou convergentes em alguns dos temas mais relevantes para o futuro do país. Por mais surpreendente que isso possa parecer, a maior parte dos simpatizantes do presidente Jair Bolsonaro e do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, concordam sobre questões relacionadas a educação, política social, impostos e segurança. Essa é a principal conclusão de uma pesquisa com 2.005 brasileiros de todas as regiões publicada pelo GLOBO. Os resultados mostram que, a despeito do calor e do ruído que emanam dos radicais de lado a lado, o povo brasileiro está unido em torno de ideias que apontam um caminho para vencer a polarização que marcou a campanha eleitoral.

Na educação, ampla maioria (89% dos petistas e 85% dos antipetistas) acredita que o governo deveria implantar aulas em tempo integral no ensino médio. A mesma fração de petistas e antipetistas (85%) defende mais investimento em educação básica que nas universidades. A maioria entre os petistas (60%) e antipetistas (53%) é a favor das cotas raciais nas universidades.

Na área social, mais concordância. Para 78% dos lulistas, o Estado é responsável por reduzir a desigualdade social — exatamente o mesmo percentual entre os bolsonaristas. A convergência persiste noutros campos. Policiais deveriam usar câmeras nas fardas, segundo 90% dos bolsonaristas e 88% dos lulistas. Tanto petistas como antipetistas rejeitam a facilitação da compra e posse de armas (73% e 67%, respectivamente). Juízes têm privilégios demais para 74% dos simpatizantes de Bolsonaro e 72% dos que se identificam com Lula. As igrejas deveriam pagar impostos na opinião de 57% dos petistas e de 54% dos antipetistas. O eleitor também tem opiniões conservadoras consistentes em relação à legalização da maconha (são contra 73% dos apoiadores de Bolsonaro e 71% dos que apoiam Lula), à redução da maioridade penal (são favoráveis 91% dos lulistas e 93% dos bolsonaristas) e à legalização do aborto (rejeitada por 65% dos petistas e 79% dos antipetistas).

A pesquisa descreve em números o que já era claro para quem via além da superfície nos bate-bocas intolerantes das redes sociais. Nas muitas reuniões de família para celebrar o Natal em que os presentes se negaram a alimentar a discórdia, também ficou claro que aquilo que nos une é quase sempre maior do que aquilo que nos separa.

Há obviamente temas em que persiste a discordância. Entre os simpatizantes do PT, 64% disseram ser a favor do debate de sexualidade nas escolas, ante apenas 46% dos bolsonaristas. Beijos gay em público incomodam 38% dos primeiros, mas 61% dos segundos. Pontos de vista diferentes exigem que cada lado faça o esforço de ouvir quem pensa de outra maneira. A alternativa é pior: isolar-se numa bolha ou partir para a agressão.

Embora o sentido da palavra possa ser distinto para cada um, a democracia é tão valorizada por lulistas quanto por bolsonaristas, apontada por três quartos de cada campo como, de longe, o melhor regime. Em sua essência, a democracia depende da capacidade de escutar e tentar construir pontes. Lula e Bolsonaro deveriam abandonar estratégias baseadas no “nós contra eles”. A polarização tribal é um dos maiores obstáculos aos consensos necessários para que o país avance.

Novo governo precisará reconstruir políticas de controle do vírus da aids

O Globo

Em 2021, casos e mortes voltaram e subir pelo esvaziamento de práticas que deram certo no passado

Algo vai mal no sistema de controle da aids brasileiro, outrora considerado um dos melhores do mundo. Depois de sete anos de queda nas infecções e mortes pela doença, ambas voltaram a crescer em 2021: respectivamente 8% e 5% em relação a 2020. Os percentuais são altos, considerados a estrutura e os protocolos eficientes de prevenção e tratamento, gratuito na rede pública de saúde.

A contaminação entre jovens de 19 a 29 anos de idade cresceu nos últimos dez anos. Entre os homens, houve 20% de aumento. Parte da explicação está na atitude displicente que deriva da própria eficácia dos coquetéis de antiretrovirais. Eles podem manter a doença sob controle e até fazê-la regredir, se usados adequadamente aos primeiros sinais da infecção. Mas o HIV continuará hospedado no organismo do paciente — que poderá levar uma vida normal, sob cuidados preventivos. Aos jovens, transmitem a impressão enganosa de que a aids é uma doença curável. Como resultado, surgem o descuido nas relações sexuais e a piora nos indicadores.

Mas essa não é a única explicação. O governo Jair Bolsonaro foi omisso na manutenção dos programas de combate à doença. No enfrentamento de doenças transmissíveis, a divulgação de informações é fundamental. Uma das explicações para o ressurgimento do HIV é a falta delas. O Ministério da Saúde, assim como falhou na Covid-19, chegou atrasado no caso da aids: programou para dezembro, último mês do governo, uma campanha de alerta aos jovens contra a contaminação pelo HIV.

Chama a atenção que, entre os 12.511 novos casos diagnosticados e as 7.613 mortes registradas, mais da metade seja de negros. Faltam também campanhas de prevenção destinadas especificamente à população negra, segundo Veriano Terto, vice-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia).

O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, assume com a tarefa de reconstruir diversas estruturas da máquina do Estado esvaziadas na gestão Jair Bolsonaro. Aconteceu no meio ambiente e também no enfrentamento da aids, área sensível para o conservadorismo retrógrado, contrário à educação sexual em sala de aula, essencial para evitar que jovens contraiam o HIV.

É inadmissível que o Departamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde, fundamental para o combate ao HIV, tenha passado a integrar outro setor, que se dedica a doenças como hanseníase e tuberculose. Também foram encerradas as redes sociais relacionadas à doença. É como se o vírus pudesse ser censurado, e o problema estivesse resolvido. O resultado se viu no aumento de casos.

No governo Lula, será necessário recuperar as práticas que começaram a ser implementadas na década de 80, quando se lançaram as bases de uma política de Estado contra a aids. Seu sucesso foi reconhecido no mundo todo. Não há motivo para o país ter retrocedido em mais uma área em que já foi um exemplo internacional.

Desarmar bombas

Folha de S. Paulo

Desmobilização de atos antidemocráticos demanda inteligência e rigor da lei

Depois de ter sido surpreendida por atos de vandalismo em 12 dezembro, quando ônibus e automóveis foram incendiados por bolsonaristas radicais, Brasília foi palco, na véspera do Natal, de uma sinistra tentativa de explosão de bomba num caminhão-tanque nas imediações de seu aeroporto.

Preso pela Polícia Civil como suspeito de arquitetar o ataque, George Washington de Oliveira Sousa, que se declarou gerente de um posto de combustível no Pará, estava de posse de uma coleção de armas de fogo, que adquiriu, segundo sua versão, incentivado por pronunciamentos de Jair Bolsonaro (PL).

O detido relatou ligações com os grupos que permanecem acampados diante do Quartel-General do Exército, recusando-se a aceitar o o resultado da eleição presidencial. Descreveu o que seria um plano para "dar início ao caos" na capital federal, com o intuito de criar condições para a decretação do estado de sítio pelo Executivo.

Tal situação, segundo um raciocínio desvairado, facilitaria uma intervenção militar contra as instituições democráticas. Segundo Sousa, também seriam colocados explosivos em postes da rede elétrica em Taguatinga, cidade-satélite do Distrito Federal.

O episódio lança, inevitavelmente, apreensões sobre a cerimônia de posse do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Providências vêm sendo tomadas por membros do futuro governo e autoridades da segurança pública para garantir um ambiente pacífico durante a solenidade de 1º de janeiro.

Não se deve duvidar da existência de criminosos em potencial, fanatizados e com acesso a armas de fogo, entre os grupelhos que fazem manifestações antidemocráticas. Isso, claro, sem contar os celerados que já foram às vias de fato.

É evidente a semelhança entre o plano descrito pelo homem preso em Brasília e métodos do terrorismo —embora a lei brasileira, de 2016, seja mais clara em atribuir essa palavra a atos motivados por "xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião".

O impulso autoritário mobiliza uma parcela diminuta da sociedade, decerto, e uma aventura contra o Estado de Direito tem chances nulas de prosperar. Há que conter, de todo modo, os danos que os desatinados são capazes de provocar.

A desmobilização dos manifestantes e a identificação dos focos de perigo devem ser conduzidas com rigor, tempestividade e inteligência. Autoridades civis e militares comprometidas com a defesa da Constituição estarão à altura da tarefa. De Bolsonaro não se espera nada melhor que omissão.

Carandiru, epílogo

Folha de S. Paulo

Indulto a PMs é triste desfecho para caso de morosidade inaceitável da Justiça

Na sexta-feira (23), Jair Bolsonaro (PL) concedeu o último indulto natalino de seu mandato aos policiais militares condenados pelas mortes de 111 presos na antiga Casa de Detenção de São Paulo, em 1992.

O perdão aos policiais do massacre do Carandiru coroa uma trajetória marcada por políticas pró-arma e defesa da violência policial —antes de chegar à Presidência, o então deputado afirmou que daria carta branca para que PMs matassem e que "preso não deve ter direito nenhum, não é mais cidadão".

Os envolvidos não são citados nominalmente. Entretanto não restam dúvidas de que o decreto se refere ao episódio. Segundo o texto, estão perdoados "agentes públicos que tenham sido condenados, ainda que provisoriamente, por fato praticado há mais de 30 anos e não considerado hediondo no momento de sua prática".

A remissão não pode ser concedida a condenados por crime hediondo, e homicídio qualificado entrou nessa categoria somente em 1994 —dois anos depois da trágica intervenção policial.

Desde o seu primeiro indulto natalino, Bolsonaro usa o dispositivo para beneficiar policiais condenados por crimes culposos. Neste ano, o mandatário buscou fidelizar sua base política entre agentes de segurança perdoando uma das maiores barbáries na história das forças de segurança —nenhum policial foi baleado e 90% dos presos mortos foram alvejados na cabeça.

Diferentemente da anistia, que é concedida pelo Congresso Nacional por lei, e da graça, que é dada pelo presidente da República em ato individualizado mediante provocação, o indulto presidencial configura perdão de caráter coletivo e concedido de ofício.

O que Bolsonaro fez, todavia, foi mascarar o perdão a um alvo específico —os policiais do Carandiru— a partir de uma medida legal que exige texto nominalmente neutro e genérico, o que suscita questionamentos sobre a sua legalidade.

Apenas um dia após o indulto, o procurador-geral de Justiça de São Paulo solicitou que o Ministério Público Federal acione o Supremo Tribunal Federal para contestar a constitucionalidade da ação.
Sabe-se que julgamento de casos de violência coletiva é complexo, dada a dificuldade de individualizar as condutas, sobretudo quando a investigação é precária.

Isso não exime o Estado de cumprir a obrigação de dar uma resposta célere a violações de direitos humanos, em particular a mortes violentas de pessoas sob sua custódia. Nesse sentido, o indulto de Bolsonaro é um triste desfecho para um caso de inaceitável morosidade.

País sedento de novas políticas públicas

O Estado de S. Paulo.

País precisa de políticas públicas inovadoras. O novo mandato de Lula não pode ser uma volta de ideias atrasadas. O Brasil já sofreu muito com dogmas petistas, dilmistas e bolsonaristas

O novo mandato de Lula não pode ser uma volta de ideias atrasadas.

Não é difícil de apontar as deficiências do governo de Jair Bolsonaro. Ao longo desses quatro anos, foram implementados retrocessos evidentes em diversas áreas. Como escreveu Simon Schwartzman no Estadão (As três agendas da transição, dia 9/12), a primeira e indispensável agenda do próximo governo é a de “desfazer as ações de terra arrasada do bolsonarismo na saúde, na educação, na política ambiental, na cultura, na ciência, tecnologia e no estímulo ao ódio, ao armamentismo e à violência política”. Mas isso não é suficiente. A agenda mais importante, lembrou Schwartzman, “é a de iniciar políticas públicas inovadoras, capazes de lidar de forma efetiva com as condições de pobreza e precariedade da população brasileira e fazer o País retomar um ritmo saudável de desenvolvimento econômico e social”.

O País precisa de políticas públicas inovadoras. A eleição presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva – e isso vale para qualquer outro cargo público – não pode representar uma volta no tempo. As soluções para os problemas nacionais não estão no passado. Quando se diz que o interesse público estará mais bem atendido se a política econômica do novo governo aproximar-se mais de Lula I do que de Lula II, não significa pleitear uma volta ao passado – a aplicação das mesmas políticas do primeiro mandato petista –, mas simplesmente reconhecer que a virtude da responsabilidade (no caso, em matéria fiscal) tem de permear toda ação governamental.

Um novo governo deve ser – é isso, afinal, o que se espera de um novo mandato – um governo realmente novo, oxigenado com boas ideias, propostas e iniciativas. O País tem muitos desafios. A fome voltou. A educação avançou nas últimas décadas, mas precisa progredir muito. Os índices de aprendizagem são severamente insatisfatórios. O saneamento básico é uma chaga aberta. Falta infraestrutura e sobram entraves para quem deseja empreender. É normal que, numa campanha eleitoral, o postulante ao cargo público fale de seus feitos em governos passados. Mas – eis o ponto que não pode ser ignorado – mesmo as melhores ideias e iniciativas dos governos petistas são insuficientes para os desafios contemporâneos do País.

Nem se fale, por óbvio, que o PT não tem o direito de repetir seus erros passados. A eleição de Lula não significa uma espécie de absolvição em relação aos muitos equívocos do partido, com uma autorização para replicá-los. Achar isso denotaria grave incompreensão do cenário político, verdadeiro alheamento da vontade do eleitor, bem como um indesculpável desprezo pelo País. Governar é ter a responsabilidade de cuidar do bem comum, e não fazer o que bem entender. Vale lembrar que foi justamente esse modo despótico de exercer o poder que o eleitor rejeitou nas urnas de 2022, ao não conceder um segundo mandato presidencial a Jair Bolsonaro.

Reconstruir a racionalidade pública é, em sua primeira e imediata etapa, remover os retrocessos dos últimos quatro anos. Mas requer muito mais do que isso. É fazer um correto diagnóstico dos problemas nacionais. É detectar boas políticas públicas implementadas ao longo dos anos, também por governos não identificados com as ideias petistas. É não destruir o bom trabalho feito pelo Congresso, também em relação a projetos em que o PT pode ter sido, durante sua tramitação, oposição. É essa racionalidade, esse compromisso com o interesse público, que se espera de todo novo governo.

Depois de quatro anos de bolsonarismo no Palácio do Planalto, o País está sedento por um novo patamar de responsabilidade, o que inclui de forma muito especial planejamento, estudo, reflexão e diálogo. Há muito a fazer, mas não basta ativismo ou voluntarismo. Nesse sentido, um governo genuinamente amplo, que esteja de fato conectado com muitos e diversos setores da sociedade brasileira, pode proporcionar uma compreensão mais abrangente dos problemas e das possíveis soluções. Basta de estreiteza de visão. O País já sofreu muito com ideias fixas e dogmas, sejam eles petistas, dilmistas ou bolsonaristas.

As duas lutas da Educação

O Estado de S. Paulo.

As escolas brasileiras têm o duplo desafio de elevar os níveis de aprendizagem nas disciplinas tradicionais e de investir no desenvolvimento de competências socioemocionais

Não bastasse o desafio de elevar, e muito, o nível de aprendizagem das disciplinas tradicionais, como língua portuguesa e matemática, a educação brasileira precisa avançar em outra frente tão ou mais complexa: a das chamadas competências socioemocionais. O conceito é amplo e engloba habilidades variadas, que vão desde autonomia e capacidade de trabalhar em equipe até empatia e tolerância. Tais características, cada vez mais, são exigidas pelo mercado de trabalho em um mundo onde as inovações tecnológicas transformam empregos e relações humanas em velocidade crescente. Sim, é dever da escola ir além do desenvolvimento cognitivo.

A questão, claro, é como fazer isso na prática, considerando que o Brasil enfrenta déficits históricos de aprendizagem − agravados, nos últimos anos, pelo fechamento das escolas durante a pandemia de covid-19. Em recente entrevista ao Valor, a psicóloga e presidente do Instituto Ayrton Senna, Viviane Senna, comparou a situação do País à de um espadachim que deve travar duas lutas simultaneamente. De um lado, observou ela, a educação brasileira precisa superar desafios que já deveriam ter sido vencidos no século passado: é o caso da alfabetização das crianças e do ensino de matemática ou de pensamento lógico. De outro, as escolas têm de dar conta da formação dos alunos para o século 21. Aí entram as habilidades socioemocionais.

Não se trata, em hipótese alguma, de diminuir a ênfase nas disciplinas tradicionais. Por óbvio, é dever da escola assegurar que as crianças aprendam a ler e a escrever, a fazer contas e a raciocinar, adquirindo conhecimentos sobre a vida, a sociedade e o mundo. A questão, como bem destacou Viviane Senna, é que isso “deixou de ser a linha de chegada e agora é apenas a largada”. Ou seja, a educação tem que ir além do currículo tradicional. Não por modismo ou capricho, mas por uma imposição da realidade. Vale reproduzir um exemplo citado pela presidente do Instituto Ayrton Senna: no Japão, crianças nas turmas de educação infantil recebem brinquedos exageradamente grandes, de modo que precisem umas das outras para conseguir brincar. O objetivo, desde cedo, é estimular atitudes de colaboração.

No Brasil, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) enfatiza a importância das habilidades socioemocionais. Entre as dez competências gerais a serem desenvolvidas por todos os alunos da educação básica, há menções a “empatia”, “diálogo”, “resolução de conflitos”, “cooperação”, “respeito ao outro”, “flexibilidade” e “determinação”. A BNCC, documento que serve de referência para os currículos, preconiza também que os estudantes sejam capazes de tomar decisões a partir de “princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários”.

Fica evidente que as competências socioemocionais atendem a diferentes propósitos. Servem tanto para aumentar as chances de êxito dos jovens em sua futura carreira profissional quanto para reduzir a violência nas escolas. Ou mesmo para a construção de uma cultura de paz na sociedade, fortalecendo valores como o respeito pelo outro, algo que, infelizmente, anda em falta no País. Por ocasião do segundo turno das eleições presidenciais, colégios particulares em diferentes cidades registraram manifestações inaceitáveis de racismo, nazismo e ódio por parte de estudantes descontentes com o resultado das urnas. A esse propósito, como lembrou a colunista do Estadão Rosely Sayão, é tarefa concomitante da família e da escola contribuir para os processos de autonomia e socialização dos alunos. Maior ênfase às competências socioemocionais, nas salas de aula do Brasil inteiro, bem que poderia ajudar.

Viviane Senna mencionou outro argumento para que as escolas abracem as competências socioemocionais: quando bem trabalhadas, elas favorecem o aprendizado das disciplinas tradicionais. Simples assim: alunos motivados aprendem mais. Como o espadachim evocado acima, é hora de encarar os dois desafios simultaneamente. A educação só tem a ganhar.

Na crise, uso eficiente de energia

O Estado de S. Paulo.

Guerra na Ucrânia estimula uso de fontes limpas; a meta de emissão zero até a metade do século parece alcançável

Não foi por altruísmo nem por preocupação com o futuro do planeta, mas o mundo passou a utilizar a energia com mais eficiência em 2022. Menos por inquietação com a qualidade de vida nos próximos anos e mais por aflição com gastos adicionais no presente, em razão da alta dos combustíveis depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, os consumidores usaram fontes limpas e renováveis de energia mais intensamente do que fizeram nos anos anteriores, de acordo com o relatório Energy Efficiency 2022, da Agência Internacional de Energia (AIE). E essa é uma boa notícia. Depois de alguns anos estagnada, a eficiência energética aumentou 2%. Se essa evolução se mantiver nos próximos anos, será possível alcançar, até a metade deste século, a meta de emissão zero de gases de efeito estufa.

Houve em 2022 um “impulso sem precedentes” no desenvolvimento de energias renováveis, em razão de decisões governamentais e dos consumidores de utilizar mais essas fontes como resposta às dificuldades no abastecimento de alguns países, sobretudo da Europa, e da alta generalizada dos preços da energia em razão da crise gerada pela guerra na Ucrânia. Os ganhos observados podem caracterizar uma mudança essencial no uso mais eficiente da energia, depois de anos de progresso muito lento, diz a AIE.

Dados preliminares indicam que os investimentos em eficiência energética – reformas de edifícios, mudanças nos sistemas de transporte público e expansão da infraestrutura para o uso de carros elétricos – alcançaram US$ 560 bilhões em 2022, com aumento de 16% em relação ao ano anterior.

O resultado foi o aumento da eficiência energética, que em 2022 foi quase quatro vezes maior do que o crescimento observado nos dois anos anteriores e quase o dobro da média dos últimos cinco anos. Nos cálculos da Agência, as ações voltadas para a eficiência energética desde 2000 propiciaram a redução de até US$ 680 bilhões nas contas pagas pelos consumidores, ou uma redução de 15% sobre o que se pagaria caso essas ações não tivessem existido.

A história registra reações positivas às crises energéticas, como a observada em 2022 diante dos problemas enfrentados pelos países para a substituição dos derivados antes fornecidos em grande escala pela Rússia. Os choques de petróleo da década de 1970, por exemplo, pressionaram os governos a adotar programas de eficiência energética, com resultados muito expressivos sobre a eficiência de automóveis, eletrodomésticos e edifícios, lembrou o diretor executivo da AIE, Fatih Birol. Observam-se efeitos semelhantes atualmente. Além de propiciar melhores condições para o enfrentamento da crise, a eficiência energética tem “enorme potencial para ajudar a encarar os desafios de acessibilidade energética, segurança energética e mudança climática”, lembrou Birol.

Destaque-se, no entanto, que os avanços no campo energético, como em vários outros, são mais notáveis nos países desenvolvidos do que nos demais. Também em eficiência energética, o mundo está dividido.

Estado e empresas perdem com disputas tributárias

Valor Econômico

Custo dos litígios tributários em todo o país equivale a 75% do PIB, segundo pesquisa

Mais um ano vai começar com o Judiciário com uma pauta tributária bilionária de casos para julgar. A expectativa era que as gavetas fossem limpas nos últimos meses, inclusive com a facilidade dos julgamentos em plenário virtual no Supremo Tribunal Federal (STF), mas o Judiciário está deixando para trás cerca da metade dos casos esperados. No plenário virtual, não há debate entre os ministros.

Os dez processos que não serão julgados neste ano têm impacto financeiro estimado em mais de R$ 46 bilhões para a arrecadação, de acordo com o levantamento do Valor (14/12). Soma-se a isso mais R$ 265 bilhões se a União for obrigada a devolver o que foi recolhido pelos contribuintes nos últimos cinco anos. As informações têm como base o Anexo de Riscos Fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022 e memoriais da Advocacia-Geral da União (AGU).

O estoque total de pendências é muito maior. Segundo o mesmo anexo da LDO, chega a R$ 807,4 bilhões a soma das ações judiciais de natureza tributária no STF, e a R$ 35,2 bilhões no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Só o processo que trata da exclusão do PIS e da Cofins da sua própria base de cálculo, ainda sem previsão de julgamento, tem impacto potencial de R$ 12 bilhões para a arrecadação e de R$ 60 bilhões com uma possível devolução do que foi pago pelos contribuintes. Já a repercussão financeira da exclusão do ISS da base de cálculo das contribuições sociais é de R$ 6,1 bilhões e R$ 32,3 bilhões, respectivamente.

Um dos julgamentos suspensos neste fim de ano com perspectiva de retomada em 2023 é chamado de “bomba fiscal” porque envolve R$ 115 bilhões e refere-se à cobrança de PIS e Cofins das instituições financeiras. A discussão, que já dura mais de uma década, é se a Fazenda Nacional pode exigir PIS e Cofins sobre receitas financeiras, como as obtidas com juros, por exemplo. Os bancos argumentam que só devem recolher os tributos sobre receitas com a prestação de serviços, venda de mercadoria ou a combinação das duas, como a emissão de talão de cheques, a abertura de conta corrente e a realização de transferências.

A discussão começou em 2000 e durou até 2014, exemplo cabal de que o calendário não pesa para a Justiça. Naquele ano, foi publicada a Lei 12.973, que passou a prever a tributação pelo PIS e Cofins sobre todas as receitas da atividade empresarial. As instituições financeiras passaram a recolher os tributos também sobre as receitas financeiras, mas contestaram a posição no Judiciário. Apenas o relator, ministro Ricardo Lewandowski, votou até o momento e concordou com a tese dos bancos. O ministro Dias Toffoli, no entanto, pediu vista e jogou a definição para 2023.

Há questões complexas envolvendo outros níveis de governo. Também ficou para o próximo ano a discussão entre empresas e governos estaduais sobre a cobrança do diferencial de alíquotas (difal) do ICMS, que estava no plenário virtual, mas passou para o presencial depois do pedido de destaque da ministra Rosa Weber, atendendo a solicitação de governadores. Não há mais agenda para o debate presencial neste ano e ele só deve ocorrer em 2023. Com a mudança, a votação recomeça do zero.

A discussão é sobre a data de início das cobranças do diferencial de ICMS, neste ano ou a partir de 2023. A diferença de tempo tem custo elevado para os Estados: R$ 9,8 bilhões estão em jogo. Do outro lado da mesa estão as empresas que estavam ganhando na votação ocorrida até agora. As de varejo são as mais atingidas. Quem vendeu sem o imposto vai ter prejuízo se tiver que recolher a diferença.

Todo esse labirinto de regras reforça a necessidade de uma reforma tributária, com simplificação e a racionalização das regras. A burocracia e demora nos julgamentos têm um custo. O Observatório do Contencioso Tributário do Insper calculou que chegava a 73% do Produto Interno Bruto (PIB) o custo das disputas tributárias nos tribunais federais, estaduais e municipais em 2018. No ano seguinte, subiu para 75% do PIB. Embora não existam dados mais recentes, nada indica que o percentual tenho recuado.

Do lado das empresas, pesquisa do Insper constatou que a litigância relacionada a tributos equivale, em média, a 57% do faturamento anual da operação brasileira de empresas transacionais. Nos outros países em que operam, é de 3,3% da receita. O contencioso no Brasil representa 98,7% de toda a litigância que essas empresas enfrentam considerando todos os países em que atuam, e é importante fator desfavorável aos investimentos no país.

2 comentários:

  1. O Globo
    "Lula e Bolsonaro deveriam abandonar estratégias baseadas no “nós contra eles”. A polarização tribal é um dos maiores obstáculos aos consensos necessários para que o país avance."

    Não há, definitivamente, esta simetria, sr. articulista. LULA, e seus adeptos, não promovem terrorismo, mesmo tendo prisão julgada ilegal e juiz condenado por parcialidade, mesmo tendo perdido eleições.
    Já bolsonaro e seus adeptos bloqueiam vias, agridem e, não surpreende, aterrorizam (vide o terrorista q quer explodir o DF).

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  2. O Globo
    "Novo governo precisará reconstruir políticas de controle do vírus da aids"

    O novo governo terá q reconstruir tudo. Bozo deixou escombros. Só destruiu.

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