O Globo
O presidente eleito está de olho não só em
votos no Congresso como também na sucessão em 2026
Ao montar a sua primeira equipe ministerial
em dezembro de 2002, Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) disse que descobriu "o que sofre um
técnico da seleção". Naquela época, o então presidente eleito encarou
durante a transição chiadeiras públicas de aliados logo após fazer as primeiras
indicações e tentou, sem sucesso, atrair o MDB. Duas décadas depois e a quatro
dias da posse, o futuro mandatário revive o dilema de escalar o seu time do
terceiro mandato. Mas por que, afinal, o petista demora tanto para
mostrar a cara do seu governo?
Tancredo Neves, que também deixou para a véspera da posse o anúncio do seu time, dizia que durante a composição da Esplanada dos ministérios é preciso "deixar as ondas baterem umas nas outras para estudar a espuma". Sabendo disso, Lula observou os movimentos — e as colisões — dos seus aliados cotados para integrar o novo governo. O petista sabe que, desta vez, está em jogo não só o sucesso biográfico da sua terceira passagem pelo poder, que depende de uma composição política, como também a sucessão presidencial em 2026.
Para chegar ao fim do mandato sem
solavancos, Lula precisa sedimentar uma base de apoio e contar votos no
Congresso. Em seu primeiro teste no poder, o então presidente manteve em sua
órbita legendas minoritárias, concentrou a maior parte da máquina pública nas
mãos do comissariado petista, destinou um ministério para cada aliado e
ofereceu um naco de poder a ministros não partidários. Após a reeleição, Lula
entregou metade da Esplanada aos seus correligionários, embora a sua bancada
representasse um quarto da coalizão, e contemplou o MDB com cinco lotes do
primeiro escalão do governo, enquanto os demais coligados ficaram com um
gabinete cada. Desta vez, o futuro titular do Palácio do Planalto também
manterá aglutinado sob a influência do PT postos-chave da administração e
barganhou o apoio do MDB, União Brasil e PSD, que representam 28% das cadeiras
da Câmara e 38% do Senado, em troca de duas pastas para cada sigla.
Lula entende que a divisão de ministérios
terá reflexo no centro do tablado eleitoral de 2026. Não à toa, decidiu ceder
aos apelos de correligionários para não entregar de mão beijada à
senadora Simone Tebet (MDB-MS)
o Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família. A pasta, considerada
uma vitrine política, ficou sob o domínio do ex-governador do Piauí Wellington
Dias (PT). Essa manobra frustrou a expectativa da parlamentar de ser
recompensada pelo apoio a Lula no segundo turno. À congressista foram
oferecidas outras opções, mas ela acabou topando ficar com o Planejamento.
Na nova função, Tebet terá de aprender a
bater carimbos da máquina pública e contornar divergências com o futuro
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que, por sua vez, preferia fazer uma
dobradinha com um ex-governador como Renan Filho (Alagoas) e Jorge Viana
(Acre). A parlamentar, mais inclinada ao liberalismo econômico, poderá ter os
seus primeiros conflitos na Esplanada com o ex-prefeito de São Paulo, afeito ao
desenvolvimentismo. Eventuais desavenças, porém, serão arbitradas por Lula, que
dará as cartas na Economia e tem uma predileção clara por Haddad como o seu
sucessor natural.
Colocado à prova em um discurso para
banqueiros, Haddad seguiu à risca o discurso ensaiado com o presidente eleito
e, aos poucos, tem buscado dobrar as resistências do mercado. O maior desafio
do futuro ministro da Fazenda será, a um só tempo, resistir à pressão do
Congresso por mais gastança pública e alavancar a economia em meio à
desaceleração da economia mundial. Se tiver sucesso, poderá trilhar um caminho
semelhante ao de Fernando
Henrique Cardoso — que subiu a rampa do Palácio do Planalto
após ganhar projeção com o Plano Real.
Trafegando em outra via, Geraldo
Alckmin (PSB) e Rui Costa (PT)
foram escolhidos por Lula para comandar postos-chave na Esplanada. O vice-presidente
eleito foi escalado para estar à frente do ministério da Indústria e Comércio,
enquanto o governador da Bahia irá chefiar a Casa Civil, cadeira ocupada por
candidatos a vestir a faixa presidencial. Com perfis semelhantes, os dois
gestores públicos podem se tornar nomes fortes para a disputa eleitoral de 2026
— que deverá contar com um especialista em canteiro de obras, o futuro
governador de São Paulo, Tarcísio Freitas, ex-ministro da Infraestrutura. Até
lá, Lula continuará estudando as espumas em torno dos seus aliados.
Boa, Bronzatto.
ResponderExcluir... 'Ali, onde as espumas se encontram' ...