quarta-feira, 27 de abril de 2022

Entrevista Roberto Freire: “Lula e Bolsonaro cheiram a naftalina

Márcio Allemand / Revista ISTOÉ
Edição 21/04/2022 - nº 2726

Roberto Freire está há mais de 60 anos na política, desde os tempos que ainda era estudante da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Em 1972, Freire se candidatou pela primeira vez em uma eleição. Concorreu à prefeitura de Olinda pelo então MDB, partido com o qual ele tinha relações desde seu surgimento, em 1965. Na época, chegou a ser o mais votado, mas perdeu para a soma dos votos das duas sublegendas do Arena, partido que apoiava o regime militar. Dois anos depois, ele foi eleito para seu primeiro mandato como deputado estadual em Pernambuco, também pelo MDB, e foi um dos protagonistas na luta pela redemocratização. Ali ele despontava como um dos expoentes da esquerda nordestina e começava sua carreira política em nível nacional. Foi eleito para quatro mandatos sucessivos de deputado federal. Em 1989, nas primeiras eleições diretas depois do regime militar, foi candidato à Presidência da República e foi o primeiro voto de muitos dos que estavam indo às urnas pela primeira vez. Perdeu. Em 1994 foi eleito senador e, em 2002, voltou à Câmara para o seu 5° mandato como deputado federal. Hoje, aos 80 anos, é presidente do Cidadania e está articulando uma nova sigla que deve unir o seu partido ao PSDB.

Como o senhor avalia o país nas duas últimas décadas?
Perdemos uma grande oportunidade, principalmente no início do século XXI, quando o mundo cresceu como nunca em sua história. Tivemos um processo muito importante com a chegada da China ao mercado mundial e que provocou grandes ganhos para o Brasil. Só que esses ganhos não foram aproveitados, mas sim, dilapidados. Ao invés de investirmos em obras de infraestrutura, partimos para um consumo desenfreado.

Mas não é bom que a população consuma mais?
É ótimo para um governo populista. Mas para um país que tem problemas graves, com uma população carente de vários serviços, não. E pouco se fala disso. A verdade é que o Brasil jogou fora uma oportunidade. Ele não surfou na onda do mundo que cresceu no início dos anos 2000, mas aproveitou-se da onda como um bom malandro. Logo depois o mundo entrou numa recessão profunda.

Acha que houve excessos da Operação Lava Jato?
A Lava Jato teve um papel importante no combate à corrupção, mas cometeu alguns excessos. Nós sabemos que ninguém apura e investiga um mecanismo daqueles, que envolvia o ex-presidente da República, grandes estatais e os capitães da indústria brasileira, usando luvas de pelica. Tanto é verdade que desmancharam tudo o que foi feito. Quero ver alguém apontar um juiz que não fale com a polícia, com o Ministério Público, que não mantenha diálogo com alguém envolvido no processo de investigação. Isso é um purismo que se buscou e que nunca deveria existir.

O senhor acredita que o ex-juiz Sergio Moro errou ao deixar o Podemos e ir para o União Brasil?
Acho que em relação a Moro faltou orientação política desde o começo. Ele deveria ter analisado melhor a questão da candidatura e se tivesse entrado no União Brasil lá atrás, a disputa interna poderia ter sido resolvida para que ele fosse o candidato do partido para disputar as eleições presidenciais. O nome dele surgiu muito bem num primeiro momento, mas rapidamente começou a cair. Infelizmente, eleição não é concurso, não há mérito. Há emoção e carisma. Falta ao Moro vivência política.

Luiz Carlos Azedo: A longa angústia da terceira via na corrida presidencial

Correio Braziliense

A eleição para a Presidência parece um jogo de cartas marcadas, porém, não é; muita água vai rolar antes e após o início da campanha eleitoral, que só começa em 16 de agosto

A angústia se caracteriza por uma situação na qual a pessoa se sente ameaçada por algo que pode acontecer, o que leva à preocupação excessiva, causa irritabilidade e insegurança, provoca dor de cabeça e até dores musculares, além de alterações na frequência cardíaca. Na política, além desses sintomas, a angústia pode provocar uma sequência de atitudes equivocadas, atritos e desavenças que, muitas vezes, só colaboram para que a ameaça se concretize. É o que acontece com alguns protagonistas da terceira via, que continuam se digladiando, em vez de buscar o verdadeiro entendimento.

Uma das causas da angústia é óbvia: a polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) está cada vez mais cristalizada, segundo as pesquisas de intenção de voto. Há três fatores principais. O primeiro: ambos têm uma base eleitoral muito resiliente, com identidade ideológica e organicidade. Lula em razão de um partido enraizado na sociedade; Bolsonaro devido à relação, por meio de redes sociais, com setores da sociedade com os quais se identifica, como militares, policiais, caminhoneiros, garimpeiros, ruralistas, atiradores etc.

Hélio Schwartsman: Jogo pesado bolsonarista

Folha de S. Paulo

Presidente não inventou as 'hardballs' nem foi o primeiro a lançá-las, mas as usa com apavorante desenvoltura

"Constitutional hardball", ou "jogo pesado constitucional". A expressão é de Mark Tushnet (Harvard), mas foi popularizada por Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, autores de "Como as Democracias Morrem". Eles sustentam que o uso repetido de "constitutional hardballs" ocasionou a erosão democrática em países tão variados como EUA, Brasil, Hungria, Argentina, Venezuela, alguns dos quais se converteram em autocracias.

Mas o que exatamente são "hardballs"? É a exploração de procedimentos, leis e instituições por atores políticos para obter ganhos pessoais ou partidários de modos que violam costumes preestabelecidos e forçam os limites da legalidade. A concessão de graça por Jair Bolsonaro a Daniel Silveira é um exemplo perfeito de "hardball". No Brasil, o presidente tem a prerrogativa de perdoar criminosos. Praticamente não há limitações explícitas a esse poder nem na Carta nem nas leis. Mas perdoar amigos era algo considerado fora dos limites, de acordo com as normas não escritas da política e até da decência.

Julio Wiziack: Samba manjado

Folha de S. Paulo

Bolsonaro usa estratégia de enfraquecer instituições que vão arbitrar eleições

No carnaval tardio deste ano, o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) sambou na cara do Supremo. Dado o comportamento afrontoso demonstrado antes e durante o julgamento, é de se desconfiar que já sabia do indulto que Jair Bolsonaro lhe concederia pelos ataques contra ministros e o próprio STF.

O episódio é inédito, mas a estratégia do presidente é a mesma de sempre. Não comprou briga dessa magnitude para proteger os direitos de um deputado inexpressivo. Busca enfraquecer a Corte mais alta do país no ano em que ela própria e o TSE vão arbitrar as eleições mais desafiadoras da Nova República.

O bolsonarismo, agora no comando na máquina federal, tenta se perpetuar no poder com as mesmas armas de 2018: fake news e uma ampla campanha contra as instituições democráticas e a confiabilidade das eleições.

Nada mais ardiloso que desferir, de quando em quando, um golpe na credibilidade daqueles que têm a missão de resguardar a lisura do processo, pregando-lhes a pecha de débeis e parciais.

Maríliz Pereira Jorge: Um peso, duas medidas

Folha de S. Paulo

Se Bolsonaro tivesse dito o mesmo que Lula, o mundo teria vindo abaixo

Nesta terça (26), Lula disse que "o mundo está chato pra cacete" e que "todas as piadas agora viraram politicamente erradas". As declarações foram feitas num encontro com influenciadores e mídia independente. "Nós não queremos um mundo unipolar, em que só pode estar na mesa um pensamento, uma tese. Não. Nós queremos um mundo multipolar, que tenha 500 pessoas discutindo na mesa. Aí, sim, a gente vai ter um mundo feliz. O cara contando piada de nordestino, e eu rindo. Eu contando piada de outras pessoas, e as pessoas rindo."

Jair Bolsonaro já disse coisas parecidas. É um crítico ferrenho do politicamente correto. Fosse ele o protagonista desse episódio, o mundo teria vindo abaixo. Ao contrário, não houve manifestações de repúdio. Nem de eleitores, nem de políticos de esquerda. Apenas os ciristas aproveitaram para demonstrar seu desdém ao petista.

Lula não perderá um voto. E isso explica por que parte dos eleitores de Bolsonaro não se abala com suas declarações preconceituosas e, às vezes, criminosas. Não é esse tipo de coisa que define a preferência eleitoral. Para os eleitores de Lula é a mesma coisa. No máximo, progressistas, defensores da censura de piadas de mau gosto, vão engolir quadrado a defesa do petista de "ofender" em nome da liberdade de pensamento e de um mundo menos chato.

Vinicius Torres Freire: O dólar e a ruina brasileira

Folha de S. Paulo

Sem projeto, economia à deriva e deprimida padece também de epidemia de destruição institucional

tamanho da valorização do real e da entrada de dinheiro no Brasil do primeiro trimestre foi surpresa quase geral. Fez com que a manada dos mercados financeiros, então pessimista quanto ao câmbio, mudasse de direção. Parte do gado até passaria a correr para a porteira do dólar a R$ 4,50.

Desde a semana passada, os bois se atropelam na direção contrária porque a biruta da finança mundial virou, sabe-se lá até quando. O dólar está perto de R$ 5 outra vez, valorização mais ou menos disseminada pelo mundo, mas mais forte por aqui, como de hábito.

Na maior parte do tempo, os mercados daqui são toureados pelo que se passa nas praças do centro do mundo, não é novidade. Talvez o preço do dólar fosse um tanto menos instável se a economia brasileira não fosse tão conturbada. Isto é, se tivesse crescimento regular, inflação estável e dívida pública contida, para ficar apenas no feijão com arroz.

Marcelo Godoy: Barroso e o mito de Sísifo

O Estado de S. Paulo

Bolsonaro podia se valer de trecho em que o magistrado elogiou o general Santos Cruz

Há aqueles que se dedicam a interpretar o mundo; outros querem transformá-lo. Luís Roberto Barroso pretende julgá-lo. Ele contou a uma plateia de estudantes sua visão sobre as relações entre civis e militares na República. Acredita que as Forças Armadas no governo Bolsonaro resistiram até aqui às três tentações de Brasília: dinheiro, poder e privilégio. Mas mencionou o risco do que chamou de “retrocesso cucaracha”, a “tradição latino-americana de envolver o Exército na política”.

A despeito de toda civilização antiga e mesmo as suas hierarquias terem se erguido em torno da posse e do uso da palavra, a vida que se criou em Brasília parece desconhecer esse fato. “Platão trata disso em vários diálogos. Dizer as ‘coisas oportunas’ é, por si só, a atividade política, considerada antes de tudo como ‘palavra’”, escreve o filósofo Luciano Canfora.

Eis uma lição que Barroso e tantos deviam aprender. O descaso com as palavras trai os protagonistas da República. Não só pelo uso do termo “cucaracha”, impróprio pela carga racista e depreciativa dos povos latino-americanos ou pelas frases impugnadas pelos militares. 

Jair Bolsonaro podia se valer de outro trecho da fala de Barroso para dizer que, se o magistrado pretende agir politicamente, deve se filiar a partido e se submeter às urnas. Trata-se daquele em que o ministro elogiou generais deixados para trás pelo capitão. Citou Santos Cruz, Maynard Santa Rosa e Fernando Azevedo. Disse que eram “profissionais admirados e respeitadores da Constituição”.

Fábio Alves: A eleição, o perdão e o ingênuo

O Estado de S. Paulo

Há menos tolerância dos investidores para perdoar ataques à democracia ou crises institucionais

Quando a guerra na Ucrânia estourou, muitos analistas atribuíram o aumento no fluxo de capital estrangeiro para ativos brasileiros à fuga dos investidores da Rússia em direção a uma grande economia emergente mais estável política e institucionalmente. A mais recente crise entre o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF) deve afetar essa visão favorável ao Brasil pelos investidores globais.

Já eram esperadas, em 2022, maior volatilidade e turbulência na Bolsa de Valores brasileira e em outros ativos, como o câmbio, em razão das eleições presidenciais. Esperava-se, contudo, que o nervosismo dos investidores com o ciclo eleitoral fosse afetar o mercado brasileiro a partir de agosto, quando normalmente a corrida presidencial pega fogo.

Mas, ao conceder indulto ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado a oito anos e nove meses de prisão, o presidente Jair Bolsonaro desafiou o STF e deflagrou uma crise sobre a qual, hoje, ninguém garante que o pior ficou para trás e a tensão acabou.

Bernardo Mello Franco: Mais Lexotan, por favor

O Globo

Bolsonaro e generais se unem em cerco ao Supremo

A usina de crises do bolsonarismo não para nem nos feriados. No dia de Tiradentes, o capitão deflagrou uma nova ofensiva contra o Supremo Tribunal Federal. Numa canetada, concedeu perdão ao aliado Daniel Silveira, condenado na véspera a oito anos e nove meses de cadeia.

O decreto cumpriu duas funções: afrontar a Corte e inflamar a militância de ultradireita contra seus juízes. A estratégia de arrastar o Supremo para o ringue já é conhecida. O deputado marombado foi apenas o pretexto da vez.

No domingo, o ministro da Defesa moveu outra peça para cercar o tribunal. Em nota ríspida, o general Paulo Sérgio Nogueira chamou o ministro Luís Roberto Barroso de “irresponsável” e o acusou de cometer “ofensa grave” contra as Forças Armadas. O general distorceu uma palestra em que o juiz elogiou os militares, mas lamentou a tentativa de usá-los para desacreditar o processo eleitoral.

Elio Gaspari: A luz do Sol desinfeta as urnas

O Globo

O TSE pode eliminar a confusão

Com seu conhecimento da História da República e com sua experiência no poder, Fernando Henrique Cardoso adverte há tempos contra crises que saem do nada. A maior delas foi a renúncia de Jânio Quadros, em 1961. Colocou o país na borda de uma guerra civil, sem motivo nem propósito. Jânio tinha um golpe na cabeça, é verdade, mas a maquinação estava só na cabeça dele, como se viu.

Jair Bolsonaro alimenta uma crise semelhante e colocou no tabuleiro conflitos com o Supremo Tribunal Federal e com a Justiça Eleitoral. Para quê? Afora a vontade de permanecer no governo, não se conhece seu projeto para reduzir o desemprego ou a inflação.

Em poucos dias, surgiram dois focos críticos.

Um é o perdão concedido ao deputado Daniel Silveira. Como o alcance da medida não afeta a inelegibilidade do cidadão, a encrenca desemboca num falso problema. A menos que o Congresso aprove uma lei mudando a regra, o que será jogo jogado.

O segundo foco surgiu com a nota do ministro da Defesa, general Paulo Sérgio de Oliveira, vendo “ofensa grave” numa afirmação “irresponsável” do ministro Luís Roberto Barroso. O magistrado havia dito que as Forças Armadas vêm sendo orientadas para duvidar das urnas eletrônicas.

Barroso não ofendeu as Forças Armadas, basta ler o que ele disse. Elogiou-as. Ademais, a suspeição contra o processo eletrônico de votação é arroz de festa na retórica do presidente Bolsonaro.

Roberto DaMatta: Carnaval, guerra e tortura

O Globo

Os inabaláveis negam justamente o que nos faz humanos: nossa capacidade de mudar mesmo aceitando que o pecado de ontem é, hoje, trivial.

A consciência da nossa finitude certamente explica a atração pelo permanente. Por isso os que pregam certezas atraem tanto. Eles nos impingem que existe mesmo a lâmpada de Aladim e o próprio Aladim. Coisas permanentes como o Everest, ou incorruptíveis como o ouro, compensam nossa impotência diante da morte e do esquecimento. Eventos ou contextos extraordinários — carnaval, guerra, tortura — reavivam identidades que não são inatas, mas internalizadas por nossas línguas e culturas.

No entanto sabemos que injustiças e erros são cometidos e descobertos — a menos que se acredite numa sociedade perfeita — em todo lugar. A subordinação da mulher, a crueldade da escravidão, o machismo feminicida, o preconceito estrutural com os velhos, os lucros promovidos pelo capital contra o trabalho, o tabu de escolher sexualidades, nacionalidades e etnias, de contrariar costumes e, por fim, a abjeta tortura praticada no regime militar revelaram o lado perverso do nosso “bom-mocismo”, graças ao historiador Carlos Fico e à jornalista Míriam Leitão.

Hoje, a tortura, além de vergonha e desonra, é uma abominação jurídica afim aos totalitarismos, mas ela tem uma sólida história. Na Contrarreforma (séculos XVI e XVII), torturar foi legal contra hereges. Fora do nosso lado, era válido extrair confissões pela tortura, que despe de humanidade sobretudo o torturador.

Vera Magalhães: Judiciário emparedado

O Globo

Jair Bolsonaro conseguiu, às vésperas do início oficial de uma campanha há muito já em curso, emparedar o Judiciário. Não foram poucas as vezes em que tentou anteriormente, com arroubos como os atos que culminaram no 7 de Setembro de 2021 ou com a campanha pelo voto impresso.

Nos lances anteriores, fracassou sem exatamente ser contido pelas instituições. Suas manifestações e gestos, que já denotavam a intenção de minar a Justiça, foram enfrentados com inquéritos no próprio Supremo Tribunal Federal, cujo efeito foi sendo diluído no tempo graças a um conjunto de omissões — a começar pelo Ministério Público Federal.

Pois agora, com o decreto em que concedeu a graça presidencial ao deputado Daniel Silveira, Bolsonaro conseguiu encurralar o Supremo de tal maneira que se torna difícil prever os próximos passos.

Como a investida foi de tal forma bem aplicada, o Legislativo também passou a claramente vislumbrar uma nova realidade em que seus integrantes são inatingíveis pela Justiça, algo que também não começou agora, com o parlamentar anabolizado que se recusa a usar tornozeleira eletrônica.

Desde que se organizou a reação à Lava-Jato, de tal modo que todos os políticos escapassem incólumes, foram votadas e aprovadas pelo Congresso várias medidas que minam instrumentos de investigação de crimes do colarinho branco que haviam sido instituídos ou endurecidos nos anos subsequentes. A Vaza-Jato mostrou relações indevidas entre procuradores de Curitiba e o juiz Sergio Moro? Sim, mas a reação coordenada já havia começado antes e não diz respeito apenas aos investigados da 13ª Vara.

Aylê-Salassié F. Quintão*: Navegando nas águas turvas da lei

Quando não cabe um calafrio, vem um desencanto, um desapontamento. A retórica é sempre autoritária, bárbara e vulgar:  

- Invade a casa deles, pô!

- Todos terão de obedecer ao indulto.

- Enfia goela abaixo.

- As Forças Armadas receberam orientação para efetuar ações contrárias à democracia".

Onde estamos?  Que país é este?!!! bradava, há trinta anos, Renato Russo. Todo o tempo, daqui e dali, tem gente tentando incendiar o Brasil. Queira Deus essas ameaças não passem de fanfarronices pré-eleitorais! Nenhuma tem efeito prático ou tem   a ver com a "desprezível" angústia da população com a inflação, com o desemprego, ou acenam com novas esperanças. 

O indulto é o tema da vez. Seria constitucional ou inconstitucional?  Para a população não é nem uma coisa, nem outra. Nesse e em casos similares do passado recente é uma imoralidade. Ajuda somente a encher as piscinas dos que adoram banhar-se em controvérsias amplas da lei para ajudar a confundir a população. Por analogia, crimes maiores por aqui geraram preocupações e dúvidas jurídicas menores aí atrás. Mas as jurisprudências aceitam esses mergulhos infinitos e aventurosos nas águas da lei. 

O Supremo Tribunal Federal tem boa parte da culpa. Cada ministro adora fazer justiça com as próprias mãos, ajudado pela conivência de quem navega, na História, em águas turvas. Não se ouve falar na Corte Suprema dos Estados Unidos, da França, da Inglaterra, de Portugal e até da Argentina. Mas, aqui nossos juízes maiores são manchetes na imprensa diária. Ninguém vê isso.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

A política de Bolsonaro é a da crise permanente

Valor Econômico

Ao STF cabe agora agir com sensibilidade e firmeza

O presidente da República, Jair Bolsonaro, convicto defensor da ditadura militar, voltou a bater os tambores da guerra contra o Supremo Tribunal Federal e as instituições em nome da “liberdade de expressão”. Menos de 24 horas após o STF ter condenado por 10 votos a 1 o deputado Daniel Silveira (PSL) a 8 anos e 9 meses de prisão, um decreto presidencial contestou a interpretação do Supremo sobre os limites do mandato parlamentar e concedeu “graça” a Silveira, que ofendeu integrantes da Corte, defendeu a volta do AI-5 e incitou as Forças Armadas contra a instituição.

O líder do Centrão e presidente da Câmara, Arthur Lira, recorreu ao Supremo para que fique clara que é atribuição da Casa, e não do STF, a cassação de mandatos de parlamentares. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que o decreto de Bolsonaro é legal e nada há a fazer a respeito.

O choque em curso traz riscos evidentes de degradação institucional. O presidente voltou à catilinária contra as urnas eletrônicas e à desmoralização da Justiça, mais passos na marcha constante para contestar os resultados das próximas eleições, caso não seja vencedor. Pior do que isso, a banda fisiológica do Congresso parece ter se alinhado a um ataque antidemocrático de Bolsonaro, o que não havia ocorrido nesta extensão antes.

A investida de Bolsonaro nada teve de amadora ou intempestiva. Explorou as ambiguidades do ativismo do Supremo e suas contradições para fulminar a decisão do STF, revisando-a na prática. O presidente diz estar certo da legalidade do decreto com base em julgamento da Corte sobre o indulto a ex-condenados pela Lava-Jato concedido pelo então presidente Michel Temer em dezembro de 2017 e nos argumentos do voto do ministro Alexandre de Moraes na ocasião. O tribunal aprovou o indulto por 7 a 4.