O Globo
Discretamente após a vitória nas urnas,
intensamente após a gravíssima tentativa de golpe bolsonarista, o presidente da
República vem agindo para civilizar o governo, desmilitarizar a política,
despolitizar as Forças Armadas. Tomara seja essa a santíssima trindade do
terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da
Silva na missão de fortalecer a democracia, para a qual foi eleito tanto quanto
para enfrentar as desigualdades e, mais uma vez, superar a fome, que ora acossa
33 milhões de brasileiros.
Civilizar o governo é, ao mesmo tempo, admitir civis e banir a brutalidade. Seja nas indicações para cargos da administração pública, seja na recomposição das vias de diálogo entre governo e sociedade, é visível a intenção de convidar à mesa um Brasil que o ex-presidente execrou. Já na noite da posse, em 1º de janeiro, Lula assinou resoluções que reaproximam o Executivo federal de organizações da sociedade civil. Num decreto, revogou a extinção de órgãos colegiados determinada por Jair Bolsonaro; noutro, incluiu representantes de ONGs no Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente. Por Medida Provisória, restabeleceu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea), cuja dissolução fora denunciada ao Supremo Tribunal Federal em arguição da OAB a pedido da Ação da Cidadania.
Nos dias seguintes à tentativa violenta de
abolição do Estado Democrático de Direito, o presidente participou de atos
importantes de fortalecimento das instituições e estreitamento de relações com
o mundo civil. Reuniu governadores ou vices de todas as 27 unidades da
Federação e chefes do Legislativo e do Judiciário no Planalto e, em desagravo,
com eles caminhou até a sede do Supremo Tribunal Federal (STF), ainda às
escuras pelo ataque dos bárbaros. Também no palácio, participou da posse das
ministras Sonia
Guajajara, dos Povos Indígenas, e Anielle Franco, da Igualdade Racial,
ambas içadas ao primeiro escalão do governo a partir de organizações indígenas
e de mulheres negras.
Há mais exemplos bem-vindos de abertura ao
diálogo, fundamental na reconstrução da democracia. Nada a ver com adesismo,
cooptação, submissão. Esse tempo passou. Na quarta-feira, o presidente esteve,
também na sede do Executivo, com sindicalistas e representantes de
trabalhadores intermediados por aplicativos. Anunciou a formação de grupos de
trabalho para propor regulação dos contratos da era digital e o modelo de
correção real do salário mínimo:
— Foram quatro anos em que trabalhadores
não eram ouvidos pelo governo federal. Vamos voltar a dialogar com todos para
pensar as transformações no mundo do trabalho. Acham que o mundo moderno não
precisa de sindicatos. Mas a democracia, quanto mais forte, mais precisa de
sindicatos — deu o papo.
No mesmo encontro, deu a largada no debate
popular sobre uma reforma tributária, que — prometida para este semestre pelo
ministro da Fazenda, Fernando Haddad — desonere os mais pobres e eleve
contribuições sobre renda e patrimônio dos ricos. Ontem, recebeu reitores das
universidades públicas, atacadas ao limite pelo bolsonarismo. O Ministério da
Justiça, por sua vez, anunciou a criação do Observatório Nacional da Violência
contra Jornalistas, outra categoria espancada na era Bolsonaro.
Lula nomeou um civil, José Múcio Monteiro,
para o Ministério da Defesa, recuperando uma tradição interrompida por Michel
Temer e sepultada por Bolsonaro. Na reação ao golpe tentado, nomeou Ricardo
Capelli, secretário executivo de Flávio Dino no Ministério da Justiça,
interventor na Segurança Pública do Distrito Federal. Desconfiado, descartou
tanto a indicação de um general para a função, como fez Temer com Walter Braga
Netto no Rio de Janeiro em 2018, quanto a decretação de Garantia da Lei e da
Ordem (GLO). Na sequência, exonerou quase seis dezenas de militares lotados no
Gabinete de Segurança Institucional e na Secretaria-Geral da Presidência.
O antropólogo Luiz Eduardo Soares,
ex-secretário nacional de Segurança Pública, sublinha que, por ora, o
presidente está “restaurando a situação anterior a Bolsonaro, que não apontava
para um compromisso estratégico de desmilitarização”. Atitude modesta, mas não
trivial diante de uma instituição com resistência evidente e na sequência de um
governo que pôs militares da ativa ou reformados em ministérios, agências
reguladoras e até na presidência da Petrobras.
Na ótima entrevista concedida à jornalista
Natuza Nery, da GloboNews, Lula disse com todas as letras:
— Quem quiser fazer política, que tire a
farda.
Espera que os militares se limitem às
atribuições constitucionais, que não são de poder moderador. Assim, na reunião
desta sexta-feira com os comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica,
cobrará os planos para fortalecer a estrutura de defesa do território nacional.
Na política, a ordem é desmilitarizar. Nas Forças Armadas, despolitizar. É
assim na democracia.
"Tomara seja essa a santíssima trindade do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva na missão de fortalecer a democracia, para a qual foi eleito tanto quanto para enfrentar as desigualdades e, mais uma vez, superar a fome."
ResponderExcluirO "tomara" e o "tanto quanto" ficam por sua conta, Flávia, pois a fome é a 1a até a 8a em importância; as demais começam a partir da 9a e isso Lula deixou claro. Mas sigamos seu raciocínio.
Bravíssimo!, Flávia.
ResponderExcluir"Nada a ver com adesismo, cooptação, submissão. Esse tempo passou."
ResponderExcluirSim, passou no governo atual. Q bom. No entanto, alguns setores da sociedade continuam nessa toada - é o caso dos milicos, q continuam aderentes, cooptados e submissos ao genocida.
Nossos milicos tiveram sua honra jogada na lama pelo genocida mas continuam trabalhando contra o atual governo.
Será q tamanha submissão pode ser explicada pela Síndrome de Estocolmo? Os milicos sofreram abusos nos nos quais se viciaram e parecem gostar do abusador. Impressionante!
"Síndrome de Estocolmo é uma condição psicológica na qual vítimas de abusos passam a desenvolver simpatia ou até laços emocionais mais fortes com seus agressores." Guilherme da Cunha, 15/07/22
Pazzuello, por ex., naquela cena grotesca, sorridente, dizendo com ignorância orgulhosa q manda quem pode, obedece quem tem juízo foi muito humilhante pra todas as FA.
Você jura que chama de Síndrome de Estocolmo? Sua inteligência e aderente, kkikikikiki
Excluir"Na política, a ordem é desmilitarizar. Nas Forças Armadas, despolitizar. É assim na democracia."
ResponderExcluirIsso! Sem poder moderador, só existem três e nenhum deles é militar. Militar é buricracia e ponto final.
Ótimo texto, Flávia!
Falou o Zarathustra de araque.
ExcluirCada ASN(o)neira.
Excluir"Civilizar o governo [depois da barbárie do DESgoverno de trevas do GENOCIDA], desmilitarizar a política, despolitizar as Forças Armadas"! Assim é que precisa começar o governo Lula!
ResponderExcluirMilitares pelo menos não falam tanta besteiras em blogs - quem faz isto são os desocupados do PT,.
ResponderExcluirIh, o gado voltou. Foram liberados pela PF.
ExcluirKkkkkkkkkkkk
Desocupados na frente dos QG.
ExcluirKkkkkkkkkkkk
Levando jato de pimenta.
Kkkkkkkkkkk
Voltaram pra cá, pra casa.
Kkkkkkkkkkkk
''Civilizar o governo'' pode ser muita coisa.
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