Pacote de leis pela democracia tem efeito incerto
O Globo
Não foi por falta de policiais que vândalos
atacaram em 8 de janeiro, mas porque houve negligência
O governo federal apresentará ao Congresso
um pacote de medidas para coibir novos ataques às instituições democráticas. O
ministro da Justiça, Flávio Dino, entregou ao presidente Luiz Inácio Lula da
Silva um documento com quatro propostas que, a partir de agora, serão
debatidas. O governo segue um roteiro conhecido diante de fatos graves: a
correria para criar instituições ou leis, como se o país tivesse sido vítima de
um grande trauma devido à falta de ambas. Todos sabem que não foi bem assim.
Uma das propostas é descabida. Dino sugere criar uma guarda nacional para proteger a Esplanada dos Ministérios e a Praça dos Três Poderes. A ideia parte de uma premissa falsa. Não foi por falta de policiais que ocorreram os ataques golpistas do dia 8 de janeiro. O problema foi a cooperação entre as forças de segurança e os vândalos. A simples criação de uma nova guarda não a tornaria imune ao golpismo. Tampouco eximiria as autoridades de restabelecer o comando nas instituições que falharam no dia 8. A guarda nacional ainda demandaria a contratação de cerca de 6 mil novos servidores, onerando os cofres públicos em momento de crise fiscal aguda.
Faz mais sentido outra proposta apresentada
por Dino: obrigar as plataformas digitais a moderar o conteúdo que circula nas
redes sociais com ameaças, tentativas de abolir o Estado Democrático de Direito
ou incentivo a terrorismo. É fato que os golpistas se reuniram, se organizaram
e se prepararam com a ajuda dos meios digitais.
Está certo Dino ao defender “uma
congruência lógica” do que é autorizado nas ruas e nas redes. Não é permitido
instalar um quiosque num shopping center para ensinar a montar uma bomba ou
aliciar conspiradores para um golpe de Estado, então ninguém deveria poder
fazer isso na internet. É um erro acreditar que as plataformas tomarão medidas
na base da autorregulação, já que nada fizeram até agora, escoradas na visão
peculiar que confunde liberdade de expressão com liberdade de agressão. Essa
constatação, porém, não significa que o caminho sugerido por Dino seja o mais
adequado.
O governo faria melhor se incluísse suas
propostas no Projeto de Lei 2.630, o PL das Fake News, atualmente na Câmara, e
trabalhasse pela sua aprovação. “O PL é a chance de a sociedade dar uma
resposta mais ampla e forte. A desinformação de todo tipo é o que cria o
terreno favorável para reações condenáveis nas mais diferentes áreas, inclusive
na política”, afirma o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto.
O pacote de Dino inclui ainda dois projetos
de lei. Um criminaliza financiadores e organizadores de atos antidemocráticos,
estabelecendo sanções a pessoas físicas e a empresas, como a proibição de
participar de licitações ou receber benefícios fiscais. O outro aumenta a pena
de quem atentar contra a integridade física ou a vida de chefes dos Três
Poderes.
As duas medidas podem ajudar a dissuadir
radicais, mas seu efeito é incerto. Mais importante seria o Congresso derrubar
vetos do ex-presidente Jair Bolsonaro à Lei dos Crimes contra o Estado
Democrático de Direito (Lei 14.197/21) que a enfraqueceram. Um dos itens
vetados aumenta a pena para militares que cometerem crimes contra a democracia,
com perda de patente ou do posto. O trecho deveria ser restaurado na lei.
Plano de usar BNDES para financiar projetos
no exterior traz preocupação
O Globo
Embora missão do banco inclua fomento a
exportações, retrospecto do PT no poder recomenda cautela
Em encontro com empresários brasileiros e
argentinos na sua primeira viagem internacional como presidente, Luiz Inácio
Lula da Silva afirmou que o o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES) “vai voltar a financiar as relações comerciais do Brasil e
projetos de engenharia no exterior”. Levando em conta o retrospecto do PT no
poder, a ideia desperta preocupação.
Claro que é de interesse nacional fomentar
as vendas externas de bens e serviços — sinônimo de empregos, renda,
recolhimento de impostos, moeda forte e crescimento econômico. Com diferentes
níveis de atuação, todos os países dispõem de instituições financeiras voltadas
para financiar projetos com esse objetivo, os bancos de fomento, também
conhecidos como eximbanks. Se bem feito, o apoio do BNDES aos setores mais
dinâmicos da economia pode, em teoria, ajudar na expansão externa das empresas
brasileiras.
Na prática, contudo, muita coisa já deu
errado. O Brasil pagou um preço alto pela promoção a “campeões nacionais” no
exterior. O apoio dos governos petistas via BNDES a empresas como Odebrecht ou
JBS entrou na crônica dos escândalos de corrupção.
Para não falar no histórico de calotes. De
US$ 10,5 bilhões em empréstimos a obras no exterior (76% da Odebrecht, num
total de cinco grandes empreiteiras), houve calote de US$ 1 bilhão (sobretudo
de Venezuela, Cuba e Moçambique). Ainda falta pagarem US$ 573 milhões. “Se
vamos fazer, que seja feito de outra forma”, afirmou a ex-presidente do BNDES
Maria Silvia Bastos Marques ao jornal Valor Econômico.
Um dos pontos críticos é a análise das
garantias dos empréstimos. Na Argentina, o governo anunciou uma linha de
crédito para financiar o comércio bilateral, e a equipe de Lula disse que o
governo argentino oferecerá garantias com liquidez internacional, como títulos
de países ricos ou contratos futuros de commodities. Apesar das promessas de
risco baixo, é incerto se a Argentina, envolta numa crise econômica crônica,
terá condições de cumpri-las. Se não tiver, todo o plano da linha de crédito
precisaria ser reavaliado.
Desde que assumiu, Lula não tem mostrado
disposição em mudar suas ideias econômicas. Parece tratá-las como dogmas. É um
erro. Os laços com a Argentina, mercado para produtos industrializados
brasileiros, são estratégicos, mas nossa situação fiscal não permite jogar
dinheiro pela janela. Lula deveria lembrar que o BNDES já teve de cobrir
dívidas não honradas por países como Venezuela e Cuba, pelos quais Lula
manifestou ter “muito carinho”. Seria imperdoável se o governo do PT decidisse
repetir o mesmo tipo de “carinho” com a Argentina.
Pacote temerário
Folha de S. Paulo
Não se pode usar ataque a Brasília para
aprovar leis repressoras às pressas
O ataque bolsonarista de 8 de janeiro a
Brasília despertou justificadas reações do meio político, das instituições
públicas e da sociedade civil em defesa da democracia. A barbárie estimulou os
Poderes, em especial o Executivo e o Judiciário, a adotar prontamente medidas
com vistas a punir os envolvidos e evitar novas investidas.
O ativismo do Supremo Tribunal Federal
aprofundou-se perigosamente, com prisões em larga escala e o afastamento do
governador do Distrito Federal. Já Luiz Inácio Lula da Silva (PT), fortalecido
pelo apoio que recebeu, decretou intervenção na segurança pública brasiliense,
trocou o comando do Exército e demitiu dezenas de militares, acertadamente.
O governo agora ensaia passos temerários
com um conjunto
de projetos apresentado pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, para
coibir a circulação nas plataformas digitais de conteúdos considerados
contrários ao Estado de Direito, além de endurecer punições a condenados por
crimes do tipo.
Como a Folha revelou, o pacote, ainda
nebuloso, atribui às chamadas big techs o "dever
de cuidado" para impedir a disseminação de mensagens que preguem o fim da
democracia, estimulem a violência para a deposição de governantes e
incitem animosidades entre as Forças Armadas e os Poderes.
Pretende-se ainda impor a apresentação de
relatórios de transparência sobre moderação de conteúdos e reduzir o prazo para
remoção deles após determinação judicial.
Cogita-se que parte das propostas de Dino,
encaminhadas à apreciação de Lula, venha a ser objeto de uma medida provisória
—alternativa em tudo inoportuna.
Compreende-se a preocupação com atividades
antidemocráticas nas redes sociais —compartilhada, aliás, por muitos, em
diversos países. Não convém, no entanto, valer-se de um momento de indignação
para avançar de maneira açodada e irrefletida na regulação dessas ferramentas.
O tema já vem sendo debatido no Congresso
Nacional há dois anos e envolve textos com escopo mais amplo, como o PL 2.630,
o controverso projeto das fake news já aprovado pelo Senado, mas não à toa
estacionado na Câmara.
Há inúmeras facetas a discutir, dentre as
quais as instâncias que decidirão se determinada mensagem constitui de fato um
ataque às instituições ou se situa-se no campo da liberdade de expressão.
Tratando-se de um presidente que insiste em
propagar a tese
partidária farsesca segundo a qual houve golpe de Estado no impeachment de
Dilma Rousseff (PT), conduzido pelo Legislativo e pelo Judiciário,
deveria estar claro o perigo de lidar às pressas com o direito à pluralidade de
opiniões.
Vacinar mais
Folha de S. Paulo
Campanha de incentivo à imunização contra
Covid deve superar atraso de Bolsonaro
Com a saída do negacionismo científico de
Jair Bolsonaro (PL), o combate à Covid-19 pelo governo federal finalmente
começa a seguir rumos sensatos. Na quinta-feira (27), o Ministério da Saúde
anunciou que lançará uma
campanha nacional de vacinação contra o vírus a partir de 27 de fevereiro.
Até agora, 85,04% dos brasileiros tomaram a
primeira dose, e 80,55% têm duas doses ou a dose única da Janssen. Mais da
metade não tomou a dose de reforço. Entre crianças de 3 a 11 anos, os índices
caem para 60,13% e 42,09%.
Para preencher essas lacunas, especialistas
apontam, desde o ano passado, a necessidade de uma politica pública de
esclarecimento.
Com a queda no número de mortes (3.938 no
mês passado, ante mais de 85 mil em abril de 2021), é natural que diminua a
sensação de medo, o que leva à falta de atenção na prevenção. No entanto há
também motivações ideológicas.
Segundo pesquisa da Unifesp, 46,8% dos
entrevistados acham que a vacinação não deve ser obrigatória, e para
30% os imunizantes não têm comprovação científica.
Ademais, deve-se ressaltar que a situação,
embora melhor, ainda inspira cuidados, principalmente para idosos. No último
trimestre, 81% dos mortos por Covid no estado de São Paulo tinham mais de 60
anos (65% tinham mais de 70).
Assim, além de incentivar a imunização de
grupos a partir de 12 anos, com doses monovalentes, o governo pretende reforçar
a vacinação com o tipo bivalente da Pfizer —que utiliza as cepas do Sars-CoV-2
e da variante ômicron BA.1— para grupos prioritários.
Na primeira fase, serão imunizadas pessoas
com 70 anos ou mais, seguidas da faixa de 60 a 69 anos, gestantes e
profissionais de saúde. A meta é atingir 90% de cobertura.
Crianças pequenas também receberão atenção
especial. A partir de fevereiro, serão distribuídas 8,5 milhões de doses da
Pfizer para o grupo de 6 meses a 4 anos, e 9,5 milhões para 5 a 11 anos.
O esforço de conscientização do governo
também precisará focar, em algum momento, nas enfermidades
comuns na infância que já foram erradicadas, mas que ameaçam retornar.
Desde 2016, a cobertura vacinal contra poliomelite e sarampo vêm caindo.
Trata-se de mostrar que só é possível erradicar doenças infecciosas quando uma ampla parcela da população está imunizada. Deixar claro, enfim, que vacinar-se é cuidar de si e da comunidade.
Antes tarde do que nunca
O Estado de S. Paulo.
Depois do 8 de janeiro, Aras deflagrou
iniciativas em defesa da democracia que há muito deviam estar em funcionamento.
A PGR tem de servir à lei, e não a interesses de ocasião
Os atos de 8 de janeiro puseram por terra a
particular percepção de Augusto Aras de que não havia nada de anormal ocorrendo
no País. Desde então, o procurador-geral da República deu início a uma série de
iniciativas que, a bem da verdade, deveriam estar em funcionamento havia muito
tempo. De toda forma, é preciso reconhecer: antes tarde do que nunca.
No dia 10 de janeiro, Augusto Aras
instituiu, no âmbito do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), a
Comissão Temporária de Defesa da Democracia. Segundo o comunicado oficial, o
objetivo da comissão é acompanhar a atuação do Ministério Público na defesa da
democracia e do Estado Democrático de Direito. Ora, era exatamente sobre isso
que a sociedade vinha questionando a Procuradoria-geral da República (PGR)
desde 2019. Se a missão constitucional do Ministério Público é a defesa da
ordem jurídica e do regime democrático, o que a PGR fez diante das várias
afrontas e ameaças antidemocráticas de Jair Bolsonaro e de seus seguidores?
Outra iniciativa de Augusto Aras depois dos
atos de 8 de janeiro foi a criação do Grupo Estratégico de Combate aos Atos
Antidemocráticos, destinado a coordenar as ações e o trabalho de investigação
dos crimes junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e às demais instâncias de
atuação do Ministério Público Federal (MPF). Segundo a Portaria 24/2023, a
participação da PGR no caso faz-se necessária diante da necessidade de
identificar “autoridades com prerrogativa de foro que tenham participado,
cooperado ou incentivado os atos antidemocráticos”.
Aqui, uma vez mais, fica evidente a
incrível cegueira da PGR até o dia 8 de janeiro. Há muito tempo eram abundantes
os indícios de que autoridades com foro privilegiado estavam participando,
cooperando e incentivando eventos e ameaças contra o regime democrático. Que a
PGR, despertada pela brutalidade dos atos de 8 de janeiro, não atenue a
responsabilidade dessas pessoas e tome as medidas legais cabíveis.
No dia 16 de janeiro, o Grupo Estratégico
de Combate aos Atos Antidemocráticos apresentou a primeira denúncia contra 39
pessoas envolvidas na invasão e depredação das dependências do Senado Federal
no dia 8 de janeiro. Na ação, foi pedido o bloqueio de R$ 40 milhões em bens
dos investigados, para reparar danos materiais e morais.
Entre os crimes elencados na acusação estão
associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de
Direito, golpe de Estado, deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado
pela violência e grave ameaça com emprego de substância inflamável contra o patrimônio
da União. A mera lista dos tipos penais revela a gravidade das ações dos
bolsonaristas e, por consequência, a gravidade das atenuações feitas ao longo
desses três anos e meio pelo procurador-geral da República, afirmando que tudo
estava em ordem. Recorde-se que, para Augusto Aras, o 7 de Setembro do ano
passado, capturado pelo presidente Bolsonaro para fins eleitorais, foi
“pacífico e ordeiro, sem violência”, ignorando a grande tensão que cercou a
cerimônia, que exigiu medidas extraordinárias de segurança.
O País precisa de um Ministério Público
atuante e impessoal, que cumpra zelosamente suas funções institucionais. Nos
últimos anos, a PGR foi palco de atuações pouco alinhadas aos trilhos
constitucionais, seja com os excessos de Rodrigo Janot, seja com as omissões
vistas até o fim de 2022. Não é papel do órgão arbitrar pendências políticas ou
promover a judicialização de assuntos que, num regime democrático, devem ser
decididos pelo Legislativo. Mas também não é sua função proteger o presidente
da República ou fazer a representação da categoria, como almejam os defensores
da lista tríplice para o cargo de procurador-geral da República.
A missão do Ministério Público é servir à
lei e, para tanto, ele não pode estar subordinado a interesses políticos ou corporativistas.
Os atos de 8 de janeiro explicitaram a relevância do seu trabalho – e da sua
omissão.
A coragem do pequeno Uruguai
O Estado de S. Paulo.
Na Celac, o presidente uruguaio pediu, como
todos, mais integração e democracia. Mas lembrou, como poucos, que para tanto é
preciso que a Celac não aja como confraria ideológica
No encerramento da 7.ª Cúpula da Comunidade
dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac), o presidente do Uruguai,
Luis Lacalle Pou, defendeu mais integração entre os 33 membros e entre a região
e o mundo. Seria uma fala meramente protocolar, se ele não tivesse lançado um
alerta: essa integração depende de que as autoridades dessas nações se mostrem
capazes de integrar palavras e atos.
Com efeito, o documento final, com mais de
100 tópicos e quase 30 páginas, é eivado de propósitos grandiloquentes de
“solidariedade” e “cooperação” em temáticas diversas, como a recuperação
pós-pandêmica, segurança alimentar e energética, saúde, meio ambiente, ciência,
tecnologia, infraestrutura e, claro, a democracia. A Cúpula também ratificou a
decisão de realizar uma reunião com a União Europeia em 2023 e com a China em
2024.
Mas, realisticamente, o desafio da
cooperação se dá num contexto de múltiplas crises internas nos países
latinoamericanos, com protestos no Peru, Bolívia e Venezuela. Além disso, a
nova “onda rosa” dos governos de esquerda marca, na prática, uma Cúpula com
tendências mais orientadas ao protecionismo. Como se sabe, o Uruguai vem
promovendo uma cruzada pela abertura e a associação de livre comércio com
outros mercados e, compreensivelmente, vê na Celac reflexos de um tempo em que
tratados como a Aliança do Pacífico ou o Mercosul promoviam grandes cúpulas
deliberativas, mas sem resultados concretos. O Mercosul, por exemplo, não logra
uma resolução econômica ou comercial efetiva desde 1998.
“Não será o momento de impulsionar desde a
Celac uma zona de livre comércio?”, perguntou Lacalle Pou, alertando que, para
tanto, ela não pode ser um “clube de amigos ideológicos”: “Na variedade, na
mudança e na alternância, estará a força desta organização”. Exemplificando o
pragmatismo que advoga, o presidente uruguaio citou as propostas de seu
homólogo colombiano, Gustavo Petro, um esquerdista, de estratégias para agregar
reservas de água doce, oceanos e criação intelectual. No dia seguinte, recebeu
o presidente Lula no Uruguai e desde o ano passado vem promovendo conversas com
o ex-presidente José Mujica, líder da oposição de esquerda, para concertar
consensos.
Lacalle Pou fez coro às muitas condenações
na Cúpula aos atentados antidemocráticos no Brasil, mas criticou uma “visão
hemiplégica” – em referência à doença que paralisa metade do corpo. “Fala-se de
respeito à democracia, de respeito aos direitos humanos e de cuidado com as
instituições, mas claramente há países aqui que não respeitam nem a democracia,
nem os direitos humanos, nem as instituições”, disse, sem citar expressamente,
por ser desnecessário, Venezuela, Cuba ou Nicarágua. De fato, enquanto Lula ou
o presidente argentino, Alberto Fernández, alardeavam ameaças “neofascistas”,
evitaram qualquer crítica a essas ditaduras de fato. Atribuindo todas as
mazelas desses povos aos EUA, só as abordaram com palavras vazias, como
“carinho” ou “diálogo”.
Já outros líderes da esquerda se mostraram
capazes de sobrepor princípios fundamentais às suas afinidades ideológicas. O
esquerdista colombiano Petro, por exemplo, defendeu um “pacto democrático” para
que “direitas e esquerdas” não creiam que quando chegam ao poder “é para
eliminar seus adversários fisicamente”. Como ele, o presidente chileno, Gabriel
Boric, outro esquerdista, defendeu a volta da Venezuela aos fóruns multinacionais,
mas pediu abertamente, citando a carta da Celac, eleições “livres, justas e
transparentes” na Venezuela e conclamou os outros presidentes a exigir a
liberação dos presos políticos na Nicarágua.
São atitudes que refletem o apelo de
Lacalle Pou: “Pratiquemos com a ação o que dizemos em nossos discursos, porque,
para que esse tipo de fórum subsista no tempo, tem de gerar esperança, e a
esperança se gera sobre o caminho andado, sobre a palavra posta em prática na
ação”. No fundo, a advertência de Lacalle Pou é – ou deveria ser – apenas uma
obviedade: para que os países latino-americanos extraiam concretudes de suas
grandiosas teorias da integração, é indispensável que seus líderes demonstrem
mais integridade.
O problema dos restos a pagar
O Estado de S. Paulo.
Restos a pagar se tornaram um orçamento
paralelo, sintoma da dificuldade do governo de enfrentar interesses
O governo Jair Bolsonaro deixou um total de
R$ 255,2 bilhões em restos a pagar (RAPS) para o ano de 2023. São despesas
contratadas ao longo de seu mandato e que não foram pagas até o fim dele, e
que, agora, automaticamente transferidas, passam a competir por espaço no
Orçamento deste ano. Não é um caso único. Inscrever restos a pagar e deixá-los
como herança para o sucessor tem sido uma prática recorrente, que deslinda
várias das distorções do processo orçamentário e de seu caráter ficcional.
O valor só não foi ainda maior porque o
estoque de RAPS com prazo superior a três anos foi cancelado em 2018. Parte do
que Bolsonaro deixou para Lula pagar foi autorizada pela Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) da Transição, elaborada pela própria equipe do petista.
Semanas depois, o mesmo governo mandou bloquear contratos com valor acima de R$
1 milhão – e que totalizam R$ 33,7 bilhões – até a conclusão de uma análise da
pertinência de cada um deles.
É comum que gastos referentes a dezembro
sejam efetivamente pagos em janeiro, como é o caso dos benefícios da
Previdência Social. É esperado que investimentos, com várias fases desde a
elaboração do projeto, compra de materiais e contratação de trabalhadores, não
sejam concluídos no mesmo exercício. É para isso, em tese, que existe a rubrica
de restos a pagar, mas é fato que ela tem sido usada para outras finalidades
que nada têm a ver com essas situações.
No governo Dilma, os restos a pagar eram
uma forma de pedalar despesas para cumprir o resultado primário. Na gestão
Bolsonaro, por sua vez, os RAPS se tornaram instrumento para a manutenção do
orçamento secreto. Pelo caráter paroquial e desvinculado de políticas públicas,
marca das emendas de relator, boa parte delas apresenta problemas desde sua
concepção. A construção de uma escola, por exemplo, requer um projeto e, se ele
não existe, todas as etapas da realização de uma despesa pública – empenho,
liquidação e pagamento – atrasam. Resolver essas pendências exige tempo. Nos
últimos anos, essas emendas passaram a inchar a rubrica dos restos a pagar, o
que explica não apenas seu volume bilionário, como também os motivos pelos
quais o País tem milhares de obras paradas, atrasadas e abandonadas.
Parte dos restos a pagar, principalmente os
ligados às emendas de relator, poderia e deveria ser simplesmente cancelada.
Mas um volume expressivo dos RAPS é composto por despesas obrigatórias, entre
elas as emendas parlamentares impositivas – mais uma das distorções do
Orçamento. Com tantos dispêndios obrigatórios competindo por recursos e espaço
no teto de gastos, o Executivo, sob Bolsonaro, preservou emendas de relator e
contingenciou gastos discricionários, deixando órgãos públicos à míngua no fim
do ano, e recorreu a exceções a serem contabilizadas fora do teto, corroendo a credibilidade
do arcabouço fiscal.
Restos a pagar não são causa, mas sintoma
da recusa do governo em enfrentar interesses e fazer escolhas. O colapso do
processo de elaboração orçamentária é sua maior consequência.
"A ideia parte de uma premissa falsa. Não foi por falta de policiais que ocorreram os ataques golpistas do dia 8 de janeiro.:
ResponderExcluirMas a quantidade de policiais NÃO é a premissa, Globo. A premissa é q as forças atuais são milicas e q NÃO são confiáveis, sendo necessária uma força com comando civil e confiável.
Simples assim.
Milicos atuais são golpistas e devem ser punidos - todos vimos o coroné sendo chamado de maluco e a proteção miliquenta q deram aos terroristas. TODOS VIMOS, OS VÍDEOS TÃO NAS REDES SOCIAIS!
"Folha de S. Paulo
ResponderExcluirNão se pode usar ataque a Brasília para aprovar leis repressoras às pressas"
Sim, a pressa é inimiga da perfeição. Por outro lado, golpearam o Brasil e golpistas continuam golpeando.
Portanto, falha de sampa, HÁ PRESSA!
Não será este jornaleco q ditará o ritmo.
O Globo tem razão. A proposta de "criar uma guarda nacional para proteger a Esplanada dos Ministérios e a Praça dos Três Poderes" é realmente descabida! Ideia de jerico mesmo...
ResponderExcluirPara isso existem câmaras de segurança, em Usa usam-nas até em ruas ordinárias.
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