sábado, 14 de janeiro de 2023

Oscar Vilhena Vieira* - Debelando a crise

Folha de S. Paulo

Ataque violento do bolsonarismo está submetendo o sistema de defesa constitucional da democracia brasileira ao seu maior teste

A crise constitucional instaurada pela tentativa de abolição do Estado democrático de Direito em 8 de janeiro ainda não foi completamente debelada. O termo crise, de origem grega, está associado à necessidade de tomada de uma decisão fundamental, da qual depende a própria sobrevivência de um corpo. Assim como um paciente em crise demanda ações urgentes para que não venha a óbito, a crise atual exige medidas contundentes para que a República não pereça.

Em Roma, o remédio para a superação das crises da República era a instauração de uma dictadura, termo que não guarda semelhança com seu significado atual. A dictadura seditionis, instalada pelos cônsules, a pedido do Senado, mais se assemelha à nossa intervenção federal ou estado de defesa, pois conferia ao seu executor poderes de emergência, para o reestabelecimento da ordem constitucional. Jamais para a sua usurpação, como nas ditaduras contemporâneas.

Com o surgimento dos regimes liberais, pautados na regra da lei, no pluralismo, na representação política, na tolerância e laicidade do Estado, houve a crença de que as dissidências poderiam ser continuamente processadas pelos canais institucionais e resolvidas de forma pacífica. Mas isso nem sempre ocorre, especialmente frente ao surgimento de populistas autoritários.

A ausência de mecanismos eficientes para lidar com os inimigos internos da democracia, nos anos 1930, na Alemanha, deixou evidente que as democracias precisavam reforçar seus mecanismos de autodefesa, pois há setores que simplesmente não se submetem às regras do jogo democrático. O ataque violento do bolsonarismo —que se consolidou como facção política antidemocrática— contra as instituições do Estado democrático de Direito está submetendo o sistema de defesa constitucional da democracia brasileira ao seu maior teste.

intentona de 8 de janeiro foi uma consequência direta da radicalização visceral de parcela da direita brasileira, fomentada pelo ex-presidente e seus acólitos. Mais do que isso, a invasão e a depredação dos Poderes da República somente foram possíveis graças à colaboração de parte do aparato de segurança e de seguimentos das forças militares, capturados pela facção bolsonarista, e a erros das autoridades.

É importante destacar que os comandos militares resistiram à reiterada e criminosa incitação do ex-presidente contra os poderes civis (artigo 286, parágrafo único, do Código Penal). E isso deve ser enaltecido. Nossos comandantes, no entanto, devem aos cidadãos brasileiros uma manifestação inequívoca, como a proferida pelo alto comando das Forças Armadas norte-americanas, após a tomada do Capitólio, de que "apoiamos e defendemos a Constituição. Qualquer ato para romper o processo constitucional não é apenas contra as nossas tradições, valores e juramentos, é contra a lei".

As autoridades civis estão cumprindo suas obrigações. O presidente decretou a intervenção federal, ratificada pelo Congresso Nacional. As instituições de aplicação da lei estão envidando todos os esforços para apurar e responsabilizar aqueles que praticaram crimes. O Supremo Tribunal Federal está empregando o seu poder cautelar, em toda sua extensão, para prevenir novos ataques à democracia e assegurar a integridade do processo de responsabilização dos culpados. O afastamento das autoridades envolvidas na tomada da sede dos Poderes da República sinaliza, para governadores e policiais, em todo o Brasil, que a sublevação e a traição à Constituição não serão toleradas.

Debelada a crise, será necessário um amplo esforço para desbolsonarizar segmentos sensíveis do Estado, da sociedade e das redes sociais, para que a República não permaneça mais sob a constante ameaça de seus inimigos.

*Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP.

 

2 comentários:

  1. E AÍ, BOLSONARO?
    JÁ QUE VOCÊ ACHA QUE LULA NÃO FOI ELEITO, QUE AS ELEIÇÕES FORAM FRAUDADAS, E QUE VOCÊ AINDA TEM TODO O PODER, FAZ UMA GRAÇA AÍ:

    UMA GRAÇA CONSTITUCIONAL LIVRANDO O ANDERSON TORRES, IGUAL FEZ COM O DANIEL SILVEIRA!

    TOPA, TCHUTCHUCA?

    ResponderExcluir
  2. Seguimento e segmento,ele usou as duas palavras como se tivessem o mesmo significado.Todo mundo erra,eu erro sem parar,rs.

    ResponderExcluir