domingo, 26 de fevereiro de 2023

Celso Rocha de Barros - Lula e a Ucrânia

Folha de S. Paulo

Presidente devolve ao Brasil papel de voz razoavelmente importante, mas raramente decisiva

A posição de Lula sobre a Guerra da Ucrânia começou muito ruim, refletindo um viés comum na esquerda brasileira de um ano atrás. Embora o discurso sempre tenha sido de defesa da paz, as críticas a Zelenski eram mais frequentes do que as críticas a Putin, e o quadro de referência conceitual parecia ser: "Se os Estados Unidos apoiam um cara, nós apoiamos o outro".

Mas 2022 foi um longo ano, que mostrou que o embate internacional atual é mais complexo do que isso.

Putin recebeu Bolsonaro quando o resto do mundo o tratava como lixo tóxico. Seu grande aliado na União Europeia, Viktor Orbán, é uma grande inspiração dos bolsonaristas. As posições anti-LGBT do governo Putin são muito populares entre os fanáticos de direita do Ocidente.

Ao mesmo tempo, a posição de Biden e da União Europeia contra o golpe de Bolsonaro foi importante para isolar os golpistas brasileiros. Em seu pronunciamento à nação no final de 2022, Mourão reclamou de gente que pedia que o Exército desse um golpe que "colocaria o Brasil em uma posição difícil diante da comunidade internacional". Felizmente, não sabemos o que teria acontecido com a democracia brasileira se Trump tivesse sido reeleito.

Não por acaso, Lula admitiu, durante sua viagem aos Estados Unidos, que a invasão da Ucrânia foi "um erro histórico".

O Brasil não deve se tornar aliado automático dos Estados Unidos, mas ficou claro que há um conflito ideológico sobre democracia que não apaga as disputas geopolíticas tradicionais, mas as torna mais complexas.

A notícia de que Vladimir Putin estaria avaliando a proposta de paz feita pelo governo brasileiro disparou os gatilhos de sempre em nosso comentariado. Duvido que o ChatGPT não conseguisse escrever 90% do que foi dito se você contasse para ele se gosta ou não do Lula e mencionasse a palavra "Ucrânia".

Na verdade, o que Lula está fazendo é devolvendo ao Brasil seu papel tradicional: uma voz razoavelmente importante, mas raramente decisiva, de uma potência média, com alguma influência no Sul Global e em fóruns multilaterais.

Ninguém, muito menos Lula, acha que Putin ou Zelenski vão fazer alguma coisa porque o Brasil mandou. Mas a entrada de cena do Brasil na negociação sinaliza que grandes potências estão procurando um mediador, e o Brasil, que não tem conflitos geopolíticos com ninguém, é um bom candidato para essa tarefa.

Parece novidade porque isso não aconteceu nos últimos quatro anos, quando fomos governados por um maluco que: a) mentia que o presidente da maior potência global havia roubado sua eleição, e b) mentia que a pandemia de Covid era uma conspiração da segunda maior potência global. Se considerarmos a União Europeia como uma única potência (o que faria dela a terceira potência global), foram quatro anos recusando dinheiro para cuidar da Amazônia e xingando a esposa do Macron.

Por menor que seja a capacidade de o Brasil influenciar o conflito entre Rússia e Ucrânia, Lula faz bem em tentar exercer qualquer influência que seja pela paz. Não só por idealismo, mas porque o Brasil, como o resto do mundo, sofre com as consequências econômicas do conflito. Garanto para você que, se não fosse pelo choque externo da guerra sobre os preços, o debate todo sobre juros estaria transcorrendo com mais tranquilidade.

 

3 comentários:

  1. Erro histórico foi achar que uma potência nuclear iria aceitar passivamente que os EUA, através da OTAN, instalassem bases militares e mísseis nucleares na Ucrânia, a 5 minutos de Moscou.
    O resto é mentirinha de uma mídia sabuja, que se nega a informar e a discutir seriamente a origem dessa guerra provocada, que poderia ter sido evitada, não fossem os interesses econômicos e militares que ganham com os conflitos.

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  2. Ei Demetrio Magnoli, aprende um pouco com esta coluna, e tenta escrever menos bobagem! Não gostar do Lula é um direito de qualquer cidadão, mas um colunista supostamente capaz de análises complexas não pode ser tão preconceituoso quanto Magnoli frequentemente se mostra.

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  3. Lula e sua importância mediana.

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