Correio Braziliense
Criticado pela forma e oportunidade das
declarações, Lula manteve sua posição em reunião com presidentes de partidos e
líderes da bancada, ontem, no Palácio do Planalto
Um mês após a tentativa de golpe de Estado
de 8 de janeiro, cujos responsáveis estão sendo investigados, a polêmica sobre
os juros altos e a atuação do presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos
Neto, mudaram o foco do debate político da questão democrática para a economia,
principalmente a retomada do crescimento e a questão social. O presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, que contava com a irrestrita solidariedade do mundo
político, dos agentes econômicos e da mídia, em decorrência dos atos antidemocráticos,
passou a sofrer fortes críticas em razão das suas declarações contra Campos
Neto e a taxa Selic 13,75%.
Criticado pela forma e oportunidade das declarações, Lula manteve sua posição em reunião com presidentes de partidos e líderes da bancada, ontem, no Palácio do Planalto. Entretanto, a oposição no Congresso passou à ofensiva. A independência do BC não está em questão, segundo o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mas a política de juros realmente passou a ser a grande preocupação do presidente. A situação da economia é um flanco aberto para a oposição bolsonarista e moderada.
No Senado, ontem, o senador Rogério Marinho
(PL-RN), ex-ministro do Desenvolvimento Regional de Bolsonaro, tentava
reagrupar as forças que o apoiaram na eleição para a Presidência da Casa,
quando teve 32 votos, enquanto o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) endurecia
o discurso contra os extremistas que participaram dos atos de vandalismo. Nos
bastidores, as articulações para a distribuição dos cargos nas comissões
permanentes da Casa estavam quase concluídas, mas o tema dos juros ganhou
relevância. A deputada Soraya Santos (PL-RJ) anunciou que pretende pedir a
convocação de Campos Neto ao Senado. Advogada tributarista, não avançou nenhuma
posição em relação à taxa de juros. Obviamente, a convocação muda o foco dos
debates do 8 de janeiro para a economia.
Na Câmara, o deputado Aécio Neves
(PSDB-MG), que voltou a dar as cartas na legenda, ria à toa ao comentar a
polêmica sobre os juros e as declarações de Lula. Na avaliação do tucano, se o
governo não fizer um ajuste fiscal e agir com austeridade neste ano e no
próximo, não terá a menor chance de dar certo. Ex-presidente da Câmara e
ex-governador de Minas, Aécio defendeu uma candidatura própria do PSDB nas
eleições passadas e não esconde o desejo de que a legenda volte a ser uma
alternativa ao PT. A grande aposta é na candidatura do governador do Rio Grande
do Sul, Eduardo Leite, novo presidente da legenda.
Torcida
Muita gente torce para que o governo Lula
fracasse e a proposta de “terceira via” renasça das cinzas. Para isso,
acreditam que o populismo de Lula e o hegemonismo petista acabarão afastando do
governo as ministras do Planejamento, Simone Tebet, e do Meio Ambiente, Marina
Silva. Imaginam até que haveria uma possibilidade de deriva do vice-presidente
Geraldo Alckmin (PSB), ministro do Desenvolvimento Econômico e Comércio
Exterior, para a oposição, o que não combina com sua personalidade. A
insatisfação com as declarações de Lula acalanta esses cenários. A reunião do
chefe do Executivo com os partidos políticos, porém, sinalizou a estabilização
da base parlamentar.
Na sociedade civil, muitos intelectuais e
economistas convergiriam para um posicionamento de ampla condenação às
declarações de Lula. Os que defendem o governo nesse quesito são uma minoria.
Existe um dogma de que a atual taxa de juros é o instrumento adequado para
conter a inflação. Como Lula não tem um plano econômico e está tateando o
caminho a seguir, há incertezas quanto ao futuro. Os ministros do Palácio do
Planalto, que formam seu estado maior, não têm massa crítica para conter os
arroubos e comportamento errático do presidente.
O governo está sem um foco claro para a
retomada do crescimento. Lula insiste em dar continuidade às obras públicas
paralisadas para aquecer a economia, uma velha fórmula keynesiana, mas
insuficiente devido à baixa capacidade de financiamento do governo. A equipe
econômica aposta mais na reforma tributária, cuja negociação avançou no
Congresso, durante o governo Bolsonaro. Resultado: passou o momento de
unanimidade devido à tentativa de golpe de 8 de janeiro, sem um programa
mobilizador dos agentes econômicos para a economia, Lula se mantém no palanque
e fala o que o povo quer ouvir, na definição do líder do governo no Senado,
Jacques Wagner (PT-BA).
Um levantamento feito pela Modal & AP Exata, na terça-feira, mostrou que suas críticas aos juros altos e ao BC tiveram repercussão positiva nas redes sociais, território onde a extrema direita bolsonarista continua muito ativa. A aprovação de Lula subiu de 38% para 40%, enquanto a negativa caiu de 62% para 60%. A avaliação do governo chegou a 35,4% de bom e ótimo, 26,2% de regular e 38,4% de ruim e péssimo. Ou seja, o ambiente é muito volátil.
A desaprovação é grande.
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