Folha de S. Paulo
Direita radical representa algo como 1/4 do
eleitorado
A imensa maioria dos ricos e muito ricos
certamente votou em Bolsonaro nos dois turnos. Muitos deles, decerto, terão
desejado que, vitorioso, Lula não conseguisse tomar posse. É provável que
alguns tenham ajudado de diferentes formas a invasão
golpista de 8/1. É de esperar que as investigações em curso os
identifiquem. Mas é irrealista imaginar que seja obra exclusiva deles a
fracassada tentativa de negar pela força a vontade das urnas. Muito menos supor
que a direita neles se esgote.
A força dos populismos de ultradireita que prosperam mundo afora –assim como a de seus antecessores do nazifascismo– vem do fato de serem policlassistas, ou seja, recrutam adeptos em diferentes estratos da sociedade e, sobretudo, mostram-se capazes de atrair a simpatia de contingentes consideráveis das camadas populares. Daí por que constituem alternativa eleitoral viável; nessa medida, quando a disputa é polarizada, acabam conquistando o voto dos mais moderados.
Eis o ponto: o populismo golpista e
autoritário é perigoso exatamente porque pode vencer eleições dentro das regras
da democracia. No Brasil, desde 2018, a falange que abomina essa mesma
democracia comanda nas contendas presidenciais um campo político e social mais
amplo, amalgamado no antipetismo. Lá estão pessoas de diferentes níveis de
renda, riqueza, valores políticos e crenças religiosas.
Estudiosos da opinião pública calculam que
a direita radical, hoje encarnada no populismo bolsonarista, represente algo
como 1/4 do eleitorado —uma minoria robusta, radicalizada e fiel ao líder. Sua
ascensão, nas circunstâncias muito peculiares da crise política que se seguiu
ao impeachment de Dilma Rousseff, deveu-se em boa medida ao fato de ter sido
capaz de apresentar um candidato popular, com cara de brasileiro comum —logo,
eleitoralmente mais promissor do que os egressos da elite política tucana.
Impossível prever se o populismo de extrema
direita continuará a encarnar o antipetismo em âmbito nacional. Afinal, a máquina
de ódio e mentiras alimentada durante quatro anos pela Presidência da
República teve efeitos: criou uma cisão profunda na sociedade, dividiu
famílias, destruiu amizades e enclausurou pessoas comuns em circuitos fechados
de absurdas crenças compartilhadas. Mas bem fariam os democratas e
progressistas se não simplificassem o campo opositor e, ao revés, tratassem de
entender e falar para os milhões de brasileiros que, tendo embora votado em
Bolsonaro, não são extremados nem golpistas, muito menos ricos.
Afinal, desradicalizar a política não
significa senão isolar os radicais.
*Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.
Apoiada.
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