sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Rever cadastros é essencial para deter a farra dos auxílios

O Globo

Suspeita-se que, às vésperas da eleição, 4,1 milhões foram incluídos entre os beneficiários sem filtros

A cada dia fica mais evidente o descontrole que impera nos cadastros de programas sociais. Os escassos recursos públicos chegam ao bolso de quem não precisa e faltam no de quem passa necessidade. O governo informou que um apagão nos sistemas em agosto “impactou negativamente” a prestação de serviços como Auxílio Brasil (atual Bolsa Família). Suspeita-se que 4,1 milhões de beneficiários tenham sido incluídos no cadastro entre julho e dezembro quase sem filtro.

Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) constatou em dezembro que a ajuda fora paga a 3,5 milhões de famílias que não se encaixavam nas regras do programa. A maior distorção estava no Nordeste, com 6,76 milhões de famílias elegíveis e 9,75 milhões de benefícios. O descontrole pode ser ainda maior, já que a análise do TCU considerou apenas os trabalhadores com carteira assinada.

O Auxílio Brasil foi um dos temas de maior destaque na campanha eleitoral. O ex-presidente Jair Bolsonaro empenhava mundos e fundos para tentar a reeleição em meio a um cenário desfavorável nas pesquisas. Tanto Bolsonaro quanto Luiz Inácio Lula da Silva prometeram manter o valor do benefício em R$ 600, embora não houvesse previsão orçamentária. Para cumprir a promessa depois de eleito, Lula apoiou uma PEC que atropelou o teto de gastos e gerou incerteza na economia.

Não se discute a importância de auxílios emergenciais e programas de complementação de renda em momentos de grave crise econômica e social. Mas é preciso ter critérios rigorosos para evitar injustiças e desperdício de dinheiro público. Não faltam indícios de que a farra é grande.

O pagamento do Auxílio Emergencial na pandemia já dera origem a escândalos. Auditorias revelaram que a lista de beneficiários incluía servidores públicos, militares, trabalhadores com emprego fixo, residentes no exterior e até mortos. Um “empresário” que tentou vender vacinas ao Ministério da Saúde num esquema nebuloso admitiu, na CPI da Covid, ter recebido auxílio emergencial. A aluna de Medicina da USP acusada de desviar quase R$ 1 milhão da festa de formatura da turma foi brindada com a ajuda que deveria se destinar aos necessitados. Esses são casos que vieram à tona. E o resto?

Todos os cadastros deveriam passar por revisão rigorosa. Parece óbvio que não têm cumprido seu objetivo. Passou da hora de botar ordem na casa. Não deve ser difícil para o governo cruzar os dados do auxílio com bases de dados federais para impedir pagamento indevido. É inadmissível que a seleção de famílias seja feita com base em critérios político-eleitorais. As normas precisam ser objetivas, transparentes e privilegiar os mais necessitados. É fundamental também voltar a cobrar contrapartidas dos beneficiários, como manter as crianças na escola e a caderneta de vacinação em dia. A assistência social não pode ser uma via de mão única.

Auxílios também não podem ser eternos. O país precisa crescer e gerar empregos, para que os cidadãos dependam menos da assistência governamental. A fila de beneficiários dos programas sociais jamais acabará se a fábrica de miséria se mantiver a todo vapor. A realidade mostra que, quanto mais famílias são incluídas, mais a fila aumenta. Nunca haverá recursos suficientes para atender a todos. O melhor benefício que o governo pode dar ao cidadão é a oportunidade para que ele ganhe seu próprio dinheiro.

Fim da guerra na Ucrânia depende de armas, mas também de diálogo

O Globo

Ocidente precisa fazer o necessário para trazer russos e ucranianos de volta para a mesa de negociação

Estados Unidos, Alemanha, França, Reino Unido e Polônia liberaram o envio de tanques de última geração para ajudar a Ucrânia a retomar territórios invadidos pela Rússia. Conselheiros do ucraniano Volodymyr Zelensky cogitam pedir caças americanos F-16, e entrou nas discussões até a retomada da península da Crimeia, sob domínio russo desde 2014.

Ninguém pode deixar de ter simpatia pelas razões ucranianas, vítima da agressão brutal e sem sentido da Rússia. Mas, depois de um ano de guerra, ainda não está claro como será o desfecho. Ao mesmo tempo que armam os ucranianos para a ofensiva, era hora de Estados Unidos e Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) atuarem para restabelecer o diálogo entre Moscou e Kiev. Não interessa a ninguém um conflito na Europa, ameaça constante à paz e à economia mundial.

No afã de armar a Ucrânia, é preciso toda atenção para evitar que o russo Vladimir Putin, acuado por derrotas no campo de batalha, decida usar seu arsenal nuclear. De acordo com os analistas Samuel Charap e Miranda Priebe, da Rand Corporation, nem Moscou nem Kiev conseguirão se declarar vencedores do conflito. Além da ameaça nuclear, eles apontam, entre os riscos para o Ocidente, o aumento da dependência russa da China, vista como maior rival dos americanos na disputa pela hegemonia mundial.

O Kremlin, como repete o porta-voz de Putin, Dmitry Peskov, entende que a guerra na Ucrânia é contra a Rússia, uma ameaça à integridade do país. A Ucrânia, como disse Zelensky ao Fórum Econômico Mundial em Davos, deseja ter força para “apanhar de volta o que é nosso” (inclusive a Crimeia). Por essa lógica, não haverá chance para a paz. Mesmo que as forças ucranianas expulsem os russos do seu território, os analistas da Rand lembram que Putin ainda contará com Marinha, Força Aérea e mísseis para continuar a causar mortes e destruição na Ucrânia. O prolongamento do conflito não é bom negócio para nenhum dos lados.

Por tudo isso, é preciso que americanos e aliados trabalhem para que Moscou e Kiev cheguem a um armistício. Hoje, segundo Charap e Priebe, nem um cessar-fogo é possível. Será preciso que as lideranças russas e ucranianas se convençam de que não é mais possível avançar com armas para então se sentarem para conversar. O excesso de confiança na guerra tem impedido qualquer acordo.

Nas conversações patrocinadas pela Turquia em Istambul, faz parte de um esboço de acordo de paz o compromisso da Ucrânia de ser um país neutro, sem entrar na Otan nem se alinhar automaticamente com o Ocidente. A formalização desse entendimento, afirmam os analistas, pode reduzir a incredulidade do Kremlin diante de qualquer oferta de Kiev e Washington.

Em contrapartida, Estados Unidos e aliados se comprometeriam a zelar pela segurança da Ucrânia diante de qualquer ameaça russa. Mesmo desafiadora, a tarefa de traçar fronteiras com concessões territoriais de lado a lado não é impossível. A guerra foi longe demais. O Ocidente tem de se preocupar em encerrá-la para debelar as ameaças.

Colhendo juros

Folha de S. Paulo

BC aponta que taxa vai demorar a cair, resultado de gastança e falatório de Lula

Se era esperada a decisão do Banco Central de manter sua taxa de juros em elevadíssimos 13,75% ao ano, o alerta quanto aos impactos inflacionários do aumento dos gastos públicos foi reação proporcional às indicações temerárias do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"A conjuntura, particularmente incerta no âmbito fiscal e com expectativas de inflação se distanciando da meta em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária", disse o comunicado da instituição, lido como uma indicação de que os juros podem ficar onde estão até o final do ano.

Eis o resultado, nada surpreendente, da aprovação da PEC da Gastança e do falatório de Lula contra a responsabilidade fiscal, a autonomia do BC e as metas de inflação, a seu ver muito baixas.

As projeções de mercado para o IPCA deste ano e dos próximos vêm subindo desde novembro. Na última coleta, o ponto médio das expectativas foi de 5,74% em 2023, bem acima da meta de 3,25%. Para 2024, o quadro também se agrava com variação esperada de 3,9%, ante a meta oficial de 3%.

Se há poucos meses havia um claro caminho para cortes da Selic (a taxa do BC) para até 11% ainda neste ano, a perspectiva agora é de permanência do arrocho.

Em nada ajuda, ademais, o questionamento pueril de Lula a respeito da autonomia legal da instituição. A cultura de gestão monetária foi assentada na prática seguida por sucessivos governos, incluindo os do próprio petista, culminando na sua formalização em 2021.

Retroceder nesse quesito abalaria a credibilidade da política econômica, com a consequência óbvia de mais inflação, que penaliza sobretudo os mais pobres.

Tampouco convém mexer nas metas anuais já definidas até 2025. A tese dos defensores dessa intervenção é a de que desequilíbrios econômicos do país, inclusive o do próprio Orçamento federal, tornam as metas irrealistas.

Sua elevação, por esse argumento, permitiria queda mais rápida dos juros e melhor desempenho da atividade econômica no curto prazo. A tese é questionável teoricamente, porque subir a meta pioraria ainda mais as expectativas, e o momento seria péssimo.

O temor de descompromisso com as contas públicas e a adoção de velhas fórmulas intervencionistas ameaçam a evolução da economia e do emprego. A boa notícia é a aparente disposição dos ministros Fernando Haddad, da Fazenda, e Simone Tebet, do Planejamento, para desfazer o estrago.

Será imperativo fazer escolhas sensatas nos próximos meses, em especial com a apresentação de uma regra rígida e crível para o controle das despesas.

Foco nos líderes

Folha de S. Paulo

Maquinações apatetadas ocorreram sob Bolsonaro; resta apurar o papel de cada um

A esta altura está claro que maquinações apatetadas de golpismo circularam em conversas sibilinas de autoridades federais ao menos desde que as urnas revelaram a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a Presidência.

Não bastasse a minuta de decreto subversivo encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, veio de Valdemar Costa Neto, chefão do PL do ex-presidente Jair Bolsonaro, a afirmação de que documentos com teor semelhante eram lugar-comum à época.

Agora o senador Marcos do Val (Podemos-ES) afirma que houve tentativa de aliciá-lo para uma dessas "operações Tabajara". Ela envolveria gravar conversas com o ministro Alexandre de Moraes e teria sido urdida diante do próprio Bolsonaro e do notório ex-deputado Daniel Silveira.

Do Val foi e voltou com versões contraditórias, e Costa Neto à Polícia Federal diz que mencionou apenas metaforicamente o golpismo desenfreado.

Nenhum dos dois é flor que se cheire, e a hipótese de estarem fabricando cortinas de fumaça para embaraçar as investigações não deveria ser descartada.

Silveira voltou para a cadeia nesta quinta (2), por razão aparentemente distinta da rocambolesca história de Do Val —violou requisitos da liberdade restrita que lhe havia sido imposta por Moraes.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) confirmou ter havido o encontro entre seu pai e a dupla de parlamentares, mas disse que não houve crime nenhum, e sim a tentativa de dissuadir outros participantes de praticar uma sandice. A PF ouviu Do Val nesta quinta.

Como se nota, há muito ainda a ser apurado, e é preciso que as autoridades policiais avancem com total segurança nesse vespeiro.

Durante os 60 dias entre o segundo turno e o fim do mandato de Bolsonaro, não resta dúvida de que a patuscada golpista correu pelos altos gabinetes do Executivo federal. Falta esclarecer o papel de cada um na chanchada.

Ainda que tenham ficado muito longe de derrubar a democracia —porque o Brasil do século 21 não admite quarteladas—, os aloprados que ocupavam posições de alta responsabilidade precisam ser investigados e processados pelos crimes que cometeram.

Identificar, condenar e afastar da vida pública os líderes do devaneio autoritário deveria galvanizar as energias da Procuradoria-Geral da República e da Justiça.

O jogo começou

O Estado de S. Paulo.

Mais do que simples repetição dos últimos dois anos, reeleição de Lira e de Pacheco é possibilidade do resgate da política. Nessa tarefa, parte relevante da responsabilidade é de Lula

O início de mais uma legislatura, com a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado, inaugura uma nova fase na relação entre Legislativo e Executivo. Assim como ocorreu dois anos atrás, o governo federal conseguiu que seus candidatos às chefias das duas Casas Legislativas fossem eleitos. Por ironia, são exatamente os mesmos nomes apoiados, em 2021, pelo presidente Jair Bolsonaro. No entanto, as atuais circunstâncias são muito diferentes. Tem-se agora a perspectiva, que não se viu ao longo dos últimos quatro anos, de que Palácio do Planalto e Congresso queiram efetivamente trabalhar. Eis a novidade: há condições para voltar a tratar de política.

O reconhecimento desse novo cenário – certamente positivo – não significa ignorar os muitos e graves desafios envolvendo o Poder Legislativo e o Executivo. Basta pensar em quem ocupará a presidência da Câmara pelos próximos dois anos: o deputado Arthur Lira. A votação histórica que ele obteve na quarta-feira não significa unidade dos deputados em torno de objetivos comuns programáticos ou mesmo um compromisso coletivo para enfrentar os problemas nacionais. Sua acachapante reeleição é primordialmente resultado de sua habilidade em estabelecer relações fisiológicas com as mais variadas correntes ideológicas.

Há muito tempo não se via tanto poder concentrado numa mão só – e isso nunca é bom sinal. Neste início de legislatura, o que cabe é cobrar compromisso com o interesse público. Arthur Lira disse que sua prioridade é a reforma tributária. Conseguir aprovar um novo marco jurídico para os impostos – mais simples, mais funcional, mais distributivo, mais indutor da economia e dos empregos – é tarefa mais árdua do que alcançar a impressionante marca de 464 votos para se reeleger. Só o tempo dirá se Arthur Lira está realmente disposto a que conste, em sua biografia, esse legado ao País.

Ainda que reeleito em situação muito diferente da que se viu na Câmara, pois no Senado o bolsonarismo conseguiu a proeza de reunir votos de 32 senadores em favor da antipolítica, Rodrigo Pacheco tem desafios e responsabilidades similares aos de Arthur Lira. É tempo de especial responsabilidade. Durante os quatro anos de governo Bolsonaro, o Senado exerceu, em vários momentos, um papel de resistência ao negacionismo e à barbárie. Cedeu em situações delicadas – por exemplo, ao aprovar a PEC Kamikaze –, mas foi também, não se pode ignorar, contrapeso importante ao Palácio do Planalto e à própria Câmara. Agora, distanciando-se o mais possível do bolsonarismo – que a nada serve, só destrói –, o Senado tem a missão de defender a Federação, barrar eventuais retrocessos – um risco especialmente alto quando o PT está no governo – e promover as mudanças legislativas necessárias para o desenvolvimento social e econômico do País.

O novo ano legislativo é também ocasião de relembrar a responsabilidade do Executivo. A reeleição de Arthur Lira e de Rodrigo Pacheco, candidatos apoiados pelo Palácio do Planalto, não significa que o governo Lula tenha uma base de apoio confortável no Congresso. Observa-se, na verdade, o exato contrário. Poucas vezes se viu tamanha disparidade político-ideológica entre Executivo e Legislativo. Tal circunstância, se por um lado, demanda cuidado do Palácio do Planalto em relação à governabilidade – o que, em tese, é um aspecto negativo, pela instabilidade envolvida –, por outro, pode exercer uma função positiva, ao exigir moderação e responsabilidade do presidente da República. Mais do que slogan de campanha ou discurso de vitória eleitoral, a construção de um governo realmente amplo, desapegado dos dogmas e hábitos petistas, é condição necessária se Lula deseja fazer política: se de fato pretende governar e enfrentar os problemas nacionais.

O cenário é desafiador, mas os caminhos para a política já não estão obstruídos. Não é questão de alimentar ingenuidades, e sim de exigir responsabilidade das lideranças políticas, no Executivo e no Legislativo. Há muito a fazer e, se quiserem, elas podem realizar muito.

O duro e necessário recado do BC

O Estado de S. Paulo.

Ao sinalizar que manterá os juros altos por mais tempo, BC deixa claro que a maior fonte de incertezas é a relutância do governo Lula em assumir um compromisso fiscal

Como esperado, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu manter a taxa básica de juros em 13,75% ao ano nesta semana. Até aí, jogo jogado, uma vez que o órgão já havia indicado essa intenção na reunião de dezembro, quando anunciou que a Selic seria mantida no atual patamar por um período “suficientemente prolongado”. Assim, na primeira reunião do ano, ciente de que as atenções estariam voltadas para as sinalizações sobre seus movimentos futuros, o BC deu um duro e necessário recado ao governo de Lula da Silva.

Não foi por falta de aviso. As incertezas relacionadas à política fiscal do governo já vinham deteriorando as expectativas de inflação havia semanas. Na mais recente pesquisa Focus, as projeções para a inflação subiram de 5,48% para 5,74% para este ano, acima da meta de 3,25%. As previsões para a inflação de 2024 também aumentaram, de 3,84% para 3,90%, superior à meta de 3%. O BC, naturalmente, incorporou essas expectativas ao cenário de referência com o qual trabalha para guiar suas decisões – e mesmo nesse horizonte mais amplo, que mira 18 meses à frente, a inflação ultrapassaria a meta e atingiria 3,6% no terceiro trimestre de 2024.

Nessa situação, não restam alternativas. Tendo em vista que seu objetivo é manter a inflação sob controle e que seu instrumento para conduzi-la à meta é a Selic, o BC terá de mantê-la elevada por mais tempo. A principal consequência dessa decisão é que ela jogou por terra as esperanças de que os juros pudessem começar a cair neste ano. É algo muito ruim para o crescimento da economia, mas poderia ser pior. No cenário alternativo do BC, levar a inflação a 2,8% em 2024 exigiria que os juros seguissem em 13,75% pelos próximos 18 meses. Fosse este o panorama a orientar a instituição, mesmo as pífias projeções da Focus para o PIB, de 0,80% neste ano e de 1,50% para 2024, já seriam absurdamente otimistas.

No comunicado, o BC reafirmou o óbvio, mas há momentos em que até o óbvio precisa ser reafirmado. Este é um deles. De maneira incisiva, a instituição explicitou o quanto os cenários para a inflação têm sido influenciados pela hesitação do governo Lula a respeito do futuro do arcabouço fiscal. E, assim, reafirmou sua autoridade e autonomia para conduzir a política monetária na direção do cumprimento das metas de inflação.

“O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas, que têm mostrado deterioração em prazos mais longos desde a última reunião. O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, disse o comunicado.

Em vez de comprar uma briga com o BC, o governo Lula faria muito bem se tentasse compreender esse recado. Quando as políticas monetária e fiscal estão alinhadas, a inflação permanece sob controle e os juros podem ser reduzidos. Trata-se de uma premissa para um crescimento sustentável, como o presidente almeja. Definido o comando da Câmara e do Senado, disputa que monopolizou as atenções do Executivo nas últimas semanas, o governo precisa apresentar de uma vez a âncora fiscal que substituirá o teto de gastos. Se ela for crível, terá a capacidade de ajustar as expectativas dos agentes de maneira imediata, algo que facilitaria o trabalho do Banco Central e abriria espaço para um ciclo de corte de juros como o desejado por Lula da Silva.

Agilizar o debate sobre a âncora fiscal não é interesse apenas do mercado. É algo que vai ao encontro dos interesses do próprio governo – dado que, se não conseguir aprovar o novo dispositivo até a metade deste ano no Legislativo, terá de seguir os limites do teto na elaboração do Orçamento de 2024. Nesse sentido, o comunicado do BC, que costuma ser bastante cifrado, é de uma clareza cristalina. Sob o ponto de vista do equilíbrio fiscal, a âncora é a maior das prioridades para o BC e para os investidores. Deveria ser também para Lula.

A urgência da vacinação

O Estado de S. Paulo.

Após o longo inverno negacionista, com baixa cobertura vacinal, finalmente teremos campanha de imunização

Fez bem o Ministério da Saúde ao anunciar que dará prioridade à vacinação da população brasileira, com uma primeira campanha nacional já marcada para começar em 27 de fevereiro, logo após o carnaval. Os baixos índices de cobertura vacinal no País, hoje, representam verdadeira ameaça à saúde pública, com risco até mesmo de que doenças erradicadas, caso da poliomielite, voltem a se espalhar. Após quatro anos de negacionismo científico ditando rumos no governo anterior, é hora de investir fortemente na conscientização de todos acerca da importância das vacinas. Antes tarde do que nunca.

O primeiro alvo da campanha será a covid-19, doença que já matou quase 700 mil pessoas no Brasil. Ao contrário do que muita gente parece imaginar, a pandemia não terminou − e essa equivocada sensação de que a situação estaria sob controle acaba servindo de desestímulo à vacinação. Um erro.

A campanha terá início com a aplicação de doses de reforço bivalentes para grupos prioritários, como idosos (acima de 60 anos) e gestantes. Ou seja, pessoas mais propensas a desenvolver formas graves da covid-19 − para as quais a vacina oferece proteção. Em março, a mobilização será estendida a toda a população, primeiramente para quem tem mais de 12 anos e, a seguir, para crianças e bebês a partir de 6 meses.

Corretamente, a estratégia prevê o engajamento das redes de ensino básico, algo que pode fazer a diferença. O Ministério da Educação (MEC), governos estaduais e prefeituras serão parceiros, mas é imperioso que tal apoio não se limite a procedimentos burocráticos. Já passou da hora de somar forças e dar um salto na cobertura vacinal: uma ação bem coordenada tem potencial para atingir quase toda a população em idade escolar, considerando que as taxas de matrícula no País superam 90% das crianças e dos adolescentes na faixa de 4 a 17 anos. Em maio, também deverá ser promovida uma campanha de multivacinação contra a pólio e o sarampo nas escolas − mais um passo na direção certa.

Outra decisão acertada do Ministério da Saúde foi incluir a vacinação contra a covid-19 no Plano Nacional de Imunizações (PNI), de modo a garantir periodicidade e planejamento às ações. Isso ocorreu no início da atual gestão, ainda na primeira semana de janeiro, indicando que o tema passou a ser tratado com a devida seriedade. Infelizmente, o negacionismo do então presidente Jair Bolsonaro perante a pandemia contaminou o Ministério da Saúde à época. Tanto que, agora, o simples fato de que o atual governo não está fazendo nada além de sua obrigação, ao incentivar a vacinação, já é digno de elogio.

A desinformação alimentada por boatos e falsas notícias é inimiga das vacinas e, portanto, da saúde. Daí a necessidade de que as campanhas se contraponham à onda de mentiras e meias-verdades que minam a confiança da população. É preciso disseminar informações com base científica, enfatizando o papel essencial da imunização para uma vida saudável. Defender as vacinas é defender a vida, e o Ministério da Saúde tem motivos de sobra para repetir isso em alto e bom som.

Aperto monetário prossegue, mas cenário pode mudar

Valor Econômico

Avanços na reforma tributária e quedas consistentes do dólar podem melhorar o cenário da inflação e mudar o calendário de corte de juros

O Banco Central entrou em estado de alerta e apontou, em primeiro lugar, que os juros altos de hoje deverão ficar por mais tempo em ação do que antes se previa, mesmo que o nível de atividade siga dando sinais de prostração crescente. Em segundo lugar, se isto não for suficiente, o próximo passo será aumentar a Selic, embora seja um caminho indesejável. A PEC de Transição deu sinais ruins que levam à deterioração fiscal. As declarações do presidente Lula e do ministro da Fazenda contribuiram para o mal-estar e para o aperto das condições financeiras, jogando para cima os juros futuros, que influem no preço do crédito.

A queda da inflação no Brasil, como de resto nos Estados Unidos e Europa, tiveram a mesma causa: queda dos preços da energia. No Brasil, houve uma particularidade decisiva, a redução de impostos federais e estaduais com fins eleitorais. Ao que tudo indica, o corte será revertido no fim deste mês, tirando de cena o principal fator de queda do IPCA que, em dezembro, foi de 0,62% e poderá subir no início do ano, impulsionado sazonalmente pelos preços dos alimentos, sobrecarga de impostos sobre habitação e veículos e aumento de matrículas escolares.

O recuo da inflação brasileira é frágil. O Comitê de Política Monetária, em seu cenário de referência, elevou a projeção dos preços administrados. Entre uma reunião e outra, subiram de 9,1% para 10,6% este ano e diminuíram de 5% para 4,2% em 2024. Apesar da carga pesada de juros reais, perto de 8%, e da desaceleração da economia, as previsões de inflação dos analistas privados no Focus seguem piorando: 5,7% este ano, e se descolando progressivamente da meta do anos seguintes.

O ano de 2023 mal começou, mas já está perdido quanto à inflação. Diante da deterioração das expectativas e de sua progressiva desancoragem, o BC fez um exercício simulando a trajetória futura do IPCA com a manutenção da Selic em 13,75%. O resultado foi 5,5% em 2023, e praticamente abaixo do alvo, 2,8%, no fim de 2024. Isso significa que, se tudo continuar como está, os juros continuarão altos por quase todo ano e poderão no máximo recuar um pouco ao fim do segundo semestre, já que a carga atual é excessiva como mostra a projeção de 2024.

Nem tudo será igual, porém. O cenário externo, visto como menos ameaçador no comunicado do Copom, pode ser melhor. A recessão na zona do euro e nos EUA não são mais favas contadas e o FMI melhorou um pouco a previsão de crescimento global. A volatilidade dos ativos financeiros se reduziu recentemente e o fim das restrições sanitárias na China abre espaço para maior expansão global.

Além disso, o balanço de riscos pode se tornar mais favorável. Entre fatores de alta, sem dúvida as pressões inflacionárias globais persistirão, mas possivelmente em magnitude menor, enquanto que a desaceleração doméstica alargará o hiato do produto, e deverá diminuir pressões latentes no mercado de trabalho. A redução do número de postos de trabalho em 2022, ao lado da queda dos salários, retirarão fôlego dos preços.

Fatores de baixa tem boa probabilidade de prevalecer. Um deles entrou em cena tardiamente, mas pode mudar o jogo: a valorização do real, diante da perda de vigor global do dólar, permitindo queda em moeda local dos preços das commodities. Diminuíram ainda as chances de retração mais acentuada da economia global.

Restam, no entanto, dois fatores de risco que podem potencializar a inflação. A manutenção dos cortes de impostos sobre a gasolina, ao que tudo indica, será revertida agora. Já a elevada incerteza sobre o arcabouço fiscal e os “estímulos à demanda agregada” da PEC da Transição estarão presentes ao longo de boa parte do ano. As novas regras fiscais deverão ser apresentadas até agosto e só serão analisadas após as discussões sobre a reforma tributária, que tomarão o primeiro semestre do ano.

Igualmente, o exame do pacote fiscal apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, poderá trazer algum alento se as medidas de redução de gastos forem reforçadas e o déficit previsto encolher para perto de R$ 100 bilhões.

Ruídos fiscais e rusgas sobre juros e meta de inflação, é certo, elevam o “custo da desinflação necessária”, como registra o Copom. Avanços na reforma tributária e quedas consistentes do dólar podem não só melhorar o cenário da inflação e mudar o calendário de corte de juros. Isso hoje não parece provável, mas é possível desde que o governo fale menos e faça a coisa certa.

 



8 comentários:

  1. Anônimo3/2/23 12:13

    "O Globo
    Suspeita-se que, às vésperas da eleição, 4,1 milhões foram incluídos entre os beneficiários sem filtros"

    Isso foi criminoso, como tudo relacionado com o bozo, e objetivava angariar votos pro genocida.
    Ao resolver esse problema, a raiva antiLula adere/aumenta nas pessoas q perdem o benefício ilegal e automaticamente passam a idolatrar o fujão (se já não o idolatravam antes).
    Não é fácil ser correto neste país.

    ResponderExcluir
  2. Anônimo3/2/23 12:19

    Folha
    "BC aponta que taxa vai demorar a cair, resultado de gastança e falatório de Lula"

    Bobagem do Bacen. Se verdadeiramente independente, as taxas de juros não teriam subido no desgoverno bozo - era sua missão, sabe, tanto agora, q quer atuar, quanto nos 4 anos de desastre em q ficou inerte.

    Com Lula, juros cairão APESAR DO BACEN, q, agora, quer cantar de galo enquanto piava nos tempos do genocida.
    Vergonhoso, Bacen, vergonhoso!

    ResponderExcluir
  3. Anônimo3/2/23 12:23


    Estadão
    "Nessa tarefa, parte relevante da responsabilidade é de Lula"

    Lula deve estar cantando "tudo eu, tudo eu...", ou " all by myself ..."

    ResponderExcluir
  4. Anônimo3/2/23 12:26

    Valor, sobre economia E OS JUROS

    "Avanços na reforma tributária e quedas consistentes do dólar podem melhorar o cenário da inflação e mudar o calendário de corte de juros"

    É o Lula trabalhando, Folha e Estadão (seus respectivos editoriais neste blog).

    ResponderExcluir
  5. Anônimo3/2/23 16:13

    Aposto uma nota de R$ 3 com a efígie do Bolsonaro que o jornal ESP tem lá seus dedinhos sujos com as tintas das 'Patetadas' para destituir Lula nos golpes

    ResponderExcluir
  6. Anônimo3/2/23 19:38

    A tal nota de 3 reais vale muito mais que o sujeito da efígie dela.

    ResponderExcluir