domingo, 26 de fevereiro de 2023

Vinicius Torres Freire - Lula e o imposto sobre gasolina

Folha de S. Paulo

Isenção de tributo beneficia mais ricos de várias maneiras e piora situação da economia e do governo

Jair Bolsonaro tirou impostos sobre combustíveis, uma de tantas fraudes eleitoreiras que cometeu, arrebentando as contas do governo. Luiz Inácio Lula da Silva tem medo de voltar a cobrar tais impostos.

É fácil entender. A volta do tributo federal sobre a gasolina vai provocar algum aumento na inflação e desgosto entre um eleitorado que, na maioria, não votou em Lula. São os pelo menos remediados, que costumam ter um veículo.

Até terça-feira (28), Lula tem de decidir se prorroga ou não a isenção de imposto (já o fez para o diesel). O Ministério da Fazenda quer o dinheiro. O entorno político de Lula quer evitar a "reoneração". Acha que pode dar um jeitinho, à moda de Dilma 1.

Lula deveria voltar a cobrar o imposto. Sem essa receita, tem de tomar ainda mais dinheiro emprestado, entre outros problemas, pois o governo é muito deficitário.

Gasolina sem imposto beneficia os "mais ricos" ou menos pobres. Pegar ainda mais dinheiro emprestado beneficia os muito ricos, os credores do governo.

Tributação muito baixa sobre combustíveis é uma distorção econômica: desorienta decisões eficientes de consumo e investimento. Incentiva o uso de energia mais poluente. Mascarar o custo econômico e ambiental de poluentes, barateando artificialmente seu consumo, é um empecilho para o desenvolvimento de alternativas melhores.

E a inflação? Se a política econômica vier a ser sensata, esse reajuste será diluído e a carestia em geral tenderá a arrefecer.

A dita "ala política" do governo quer empurrar o problema com a barriga. Diz que Lula deve esperar a nova política de preços da Petrobras. Isto é, os preços da petroleira deixariam de acompanhar as cotações internacionais.

Em resumo, trata-se de um tabelamento mais ou menos duradouro de preços. Assim, a Petrobras deve faturar menos. Em decorrência, terá menos recursos para investir e crescer; seus custos de financiamento vão aumentar. Deste modo, pagará menos impostos e dividendos para o governo, que precisa muito desse dinheiro. O problema sai por uma porta e volta por outra.

Talvez se invente um método inteligente de evitar variação excessiva de preços da Petrobras. Porém, mesmo um sistema bem bolado não diminuiria o preço dos combustíveis. Isto é, a gasolina ou o diesel podem ficar mais baratos durante altas no mercado mundial, mas mais caros durante as baixas. Em algum momento, a conta aparece.

Problema: como é muito difícil prever o valor de petróleo e derivados, seria também difícil determinar por quanto tempo a petroleira deveria manter seus preços baixos ou altos além da conta.

Diante de aumento de impostos, a reação costuma ser a de querer passar a conta para outrem, como os muito ricos. Tudo bem, é preciso cobrar mais deles, até porque o governo tem déficit enorme e será social e politicamente inviável fazer um corte de gasto suficiente.

Em vez de pedir emprestado a ricos, a juros altos, melhor tomar um tanto desse dinheiro via impostos. Sim, é possível manipular as taxas de juros, mas assim se perde o controle da inflação (ou coisa pior).

Cobrar mais imposto não é simples. Aumento de tributação muda comportamentos. O dinheiro tributável vai para outro lugar (e não se trata aqui de evasão). De resto, pelo menos em alguns casos, há evidências da teoria econômica do peso morto: o imposto baixa o nível de consumo e o faturamento de empresas, mas não eleva a arrecadação do governo em valor equivalente ao perdido pelo setor privado.

O resultado total, "social", como se diz em economia, é negativo.

É fácil perceber que o assunto é difícil. Mas manter o déficit alto, beneficiando de resto os mais ricos, é a pior solução.

 

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