O Estado de S. Paulo
É preciso andar rápido e bem, pois a
extrema direita recuou após o 8 de janeiro, foi golpeada com o escândalo das
joias, mas está sempre pronta a ressurgir
O ano político começa, de fato, com o envio
do projeto de arcabouço fiscal ao Congresso e, em seguida, o debate sobre a
reforma tributária. Alguns anos começam mais tarde, outros custam a acabar,
como o último de Bolsonaro. Foi prolongado pelos acontecimentos de 8 de
janeiro, a tragédia Yanomami e, agora, mais recentemente, o escândalo das joias
presenteadas pela Arábia Saudita.
A reforma tributária é vista por muitos
como um projeto que vai fazer o País avançar, tanto quanto o Plano Real, no
passado. Há um otimismo em relação ao resultado, mas também em relação às
possibilidades. Parece que o tema amadureceu e a maioria no Congresso concorda
em aprovar algum tipo de texto nesse sentido.
Como o tema envolve muitos interesses conflitantes, há quem duvide da sua viabilidade, com o argumento de que a reforma foi tentada muitas vezes e fracassou. De fato, há um emaranhado de interesses, mas é difícil de ver o tema com o olhar da história natural, uma simples repetição, como o curso das estações do ano.
Embora ainda não se conheça o texto final,
que englobará propostas do governo e as que existem na Câmara e no Senado, há
uma dúvida sobre se é possível uma reforma do tipo ganha-ganha: alguém perderá.
O que se sabe até o momento, ao optar pela
transparência, é que esse tipo de reforma vai deixar de fora subsídios que
enfraquecem o sistema tributário brasileiro. Se for assim, já se sabe quem
perderá e as possibilidades de resistência.
Isso sem falar nas dúvidas municipais e
estaduais diante de um projeto capitaneado pelo governo federal. Haverá perdas
entre os próprios entes federados? Se houver, certamente as coisas ficarão mais
difíceis.
Mas será preciso, mesmo, esperar a reforma
tributária para ter a sensação de um país em movimento? Sem prejuízo do debate,
o que é possível fazer de uma forma mais ou menos independente?
O governo tem insistido em terminar obras
inacabadas, a partir, inclusive, de reuniões com governadores. Mas o problema
que as paralisou continua de pé: falta de dinheiro. São quase 9 mil obras e
completálas é um desafio que tomará mais de dois anos.
Em todas as reuniões, o governo fala em
aumentar o investimento público como uma premissa do crescimento econômico. Ao
menos no discurso, quase não se acentua o papel da iniciativa privada, muito
menos as diversas possibilidades de integrá-la no esforço de crescimento. É
como se a responsabilidade toda fosse do governo, quando, na verdade, as
grandes parcerias seriam uma forma mais atualizada de tocar o barco.
Um dos campos em que os projetos de
parceria poderiam florescer é o do meio ambiente.
Já existe financiamento de governos no
Fundo Amazônia, que, além de Noruega e Alemanha, deve incorporar também a ajuda
norte-americana.
É uma área em que empresas, fundos de
pensão e mesmo personalidades internacionais deveriam ser convidados a
contribuir, desde que se formulem projetos atraentes.
Os discursos feitos pelo governo até o
momento foram bem recebidos. No entanto, a prática, nestes meses iniciais,
ainda não se sintonizou com a teoria – houve um recorde de desmatamento em
fevereiro: 322 km2.
É preciso andar rápido e bem, porque a
extrema direita recuou após o 8 de janeiro, foi golpeada com o escândalo das
joias, mas está sempre pronta a ressurgir. Há um fator que a mantém de pé: a
capacidade de racionalizar, de inventar versões positivas para um público
aberto a acreditar em tudo o que vem destes subterrâneos da desinformação e das
fake news.
Alguma tentativa de manter a fidelidade do
público mais pobre certamente será bem-sucedida. É o caso do programa
Desenrola, que, em princípio, poderá atenuar a situação de 37 milhões de
consumidores inadimplentes. Foi construído para funcionar, inclusive, com a
previsão de um fundo oficial de R$ 10 bilhões para garantir a dívida.
Outras tentativas, como a ideia de
passagens de avião a R$ 200, não passam de boa intenção. O próprio Lula
advertiu que ideias desse tipo deveriam passar por um exame do governo,
inclusive para saber se são prioritárias e, principalmente, se há dinheiro para
financiá-las.
O lançamento de ideias embrionárias revela
um problema de comunicação interna que, somado às dificuldades de navegar num
mundo dominado pelas grandes plataformas e redes sociais, expõe um nó que o
governo da frente democrática não conseguiu desatar.
Na verdade, mesmo avançando em projetos
como o da reforma tributária e em alguns outros campos da administração, as
dificuldades de uma boa comunicação tornam-se decisivas nos tempos de hoje. Não
se pode atribuí-las de modo genérico às esquerdas. Os russos, por exemplo,
desenvolveram táticas tão sofisticadas que acabaram sendo considerados por
muitos países uma ameaça mundial nesse campo.
Ainda assim, navegar num tsunami de fake
news num período chamado pós-verdade não significa fazer o jogo sujo, como os
russos e a extrema direita fazem, mas, ao menos, parar para pensar no assunto e
tentar um novo caminho.
O bom Gabeira!
ResponderExcluirPerfeito.
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