Correio Braziliense
Se o blocão foi muito bom para Lira, não foi
para o governo. Fortaleceu o presidente da Câmara, que teve a reeleição mais
consagradora da história, mas o presidente Lula não conseguiu estruturar sua
base
Ao contrário do que aconteceu no Senado, onde a disputa entre o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que foi reeleito, e o candidato bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN) foi um divisor de águas entre a base do governo e a oposição, o blocão formado para reeleger Arthur Lira (PP-AL) presidente da Câmara criou uma espécie de “terra de ninguém” entre a base do governo e a oposição. Com 495 deputados, a base de Lira é um terreno pantanoso para o Palácio do Planalto, que não sabe ainda com quem poderá contar nos partidos do Centrão. Somente o PSol-Rede e o Novo ficaram de fora do blocão, que agora está se desmanchando.
Se o blocão foi muito bom para Lira, não
foi nem um pouco para o governo. Fortaleceu o presidente da Câmara, que teve a
reeleição mais consagradora da história, mas o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva não conseguiu estruturar sua base. Mesmo que o deputado Rui Falcão(PT-SP)
venha a presidir a Comissão de Constituição e Justiça, em acordo com Lira, sua
composição é o primeiro sinal de que a governabilidade de Lula depende da “boa
vontade” do presidente da Câmara. Dos 64 assentos, PT e aliados, como o PDT e o
PSB, têm apenas cerca de 15 deputados, dos quais 10 são petistas ou deputados
federados do PCdoB e PV. Com 26 integrantes, PP, Republicanos e Podemos formam
a oposição, sendo 13 do PL, o partido de Bolsonaro. União Brasil, MDB, PSD e
deputados do Centrão ligados a Lira somam 18 deputados na CCJ. Restam mais
cinco independentes, entre os quais os deputados da federação PSDB-Cidadania.
Parece que não caiu a ficha para o líder do
governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), que não conseguiu formar um bloco
com os aliados tradicionais do presidente Lula, como o PSB, o PDT e o
Solidariedade. Ontem, com a presença do vice-presidente Geraldo Alckmin, a
Executiva do PSB aprovou a decisão de formar uma federação com as duas
legendas, mirando a construção de uma grande força de centro-esquerda, espaço
que o PT não conseguiu ocupar e, aparentemente, também não o deseja. Os três
partidos tiveram desempenho aquém de suas próprias expectativas no ano passado:
PSB caiu de 32 deputados para 14; PDT, de 28 para 17; Solidariedade, que
incorporou o Pros, tem sete. Com isso, o bloco terá 48 deputados.
Na terça-feira próxima, as cúpulas das três
legendas vão se reunir para consolidar a federação. A decisão dos três partidos
é uma resposta ao hegemonismo petista, principalmente em relação à orientação
política e composição dos ministérios. Nem mesmo o ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, está a salvo do fogo amigo petista. Mesmo que as pressões do
PT sejam um jogo combinado entre o presidente Lula e a deputada Gleisi
Hoffmann, os resultados não estão sendo bons para o governo, que parece ao
sabor dos acontecimentos e disperso na ação política.
Falta de foco
Pressionado pelos acontecimentos, o
presidente Lula tem se saído bem, como nos casos da tentativa de golpe de
Estado de 8 de janeiro, que enfraqueceu muito a extrema direita; do genocídio
de ianomâmis, em Roraima; e, agora, o escândalo das joias presenteadas pela
Arábia Saudita à ex-primeira-dama Michele Bolsonaro, no valor de R$ 16 milhões,
no qual o ex-presidente Bolsonaro está cada vez mais encalacrado. Entretanto, o
governo parece disperso e sem foco nas suas prioridades. Todos os ministros e
partidos da coalizão de governo deveriam estar mais preocupados com a
articulação da base governista no Congresso para aprovar os principais projetos
de governo, entre os quais a reforma tributária.
O Centrão é mais venha a nós do que ao
vosso reino. Os ministros do União Brasil Daniela Carneiro (Turismo), Waldez
Góes (Integração) e Juscelino Filho (Comunicações) desgastam o governo. A
primeira por causa do apoio eleitoral das milícias da Baixada Fluminense; o
segundo, ex-governador do Amapá, foi condenado por peculato. Juscelino só foi
mantido no cargo porque o presidente da Câmara pressionou o governo. O
parlamentar maranhense usou um avião da FAB para compromisso privado: um leilão
de cavalos.
Desde a indicação dos três ministérios,
numa negociação conduzida pelo senador Davi Alcolumbre (AP), que acaba de ser
reeleito para a presidência da Comissão de Constituição e Justiça, a bancada do
União Brasil na Câmara está rebelada. Não há nenhuma garantia de que os três
ministros possa realmente assegurar os votos que o governo precisa ter na Casa.
O líder da legenda na Câmara, deputado Elmar Nascimento (BA), é mais aliado de
Lira, que deseja fazê-lo seu sucessor, do que do presidente Lula.
Lira é o principal artífice da negociação entre o PP (47 deputados) e o União Brasil (59) para a formação de uma federação, quiça uma fusão, que está emperra por causa dos conflitos regionais. Caso as divergências sejam superadas, os dois partidos serão a maior forca política da Câmara, com 106 deputados, suplantando o PL (99) e a federação PT-PCdoB-PV (81).
Uma sopa de siglas.
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