Democracia ganha com fragmentação partidária em baixa
O Globo
Agrupamentos políticos no Congresso já
caíram de 30 para 14. Previsão é que em 2026 não passarão de dez
Fracassaram na semana passada as
negociações para criar a federação entre PP e União Brasil que formaria o maior
partido da Câmara, com cem deputados. Mas que ninguém se engane: em meio às
incertezas e percalços, vai ficando para trás a profusão de partidos no
Congresso. Tal fato positivo vem se consolidando de modo gradual, mas
incontornável.
É verdade que ainda há 32 legendas registradas na Justiça Eleitoral e que 22 têm representação no Legislativo. Mas sete delas integram três federações — PT, PCdoB e PV; PSDB e Cidadania; PSOL e Rede —, obrigadas a atuar como partidos únicos por quatro anos e vistas como embriões de possíveis fusões no futuro. É, portanto, como se houvesse apenas 18 legendas, quando em 2018 já houve 30. A consolidação não deverá ficar nisso. Mesmo com o fracasso da negociação entre PP e União, às três federações existentes poderá se somar uma quarta, a depender das conversas entre PSB, PDT e Solidariedade.
“A
farra da pulverização partidária acabou”, afirma o cientista político Jairo
Nicolau, da Escola de Ciências Sociais da FGV. Nas eleições do ano passado,
apenas 12 legendas atingiram a cláusula de desempenho de 2% dos votos válidos
para garantir acesso ao fundo partidário, tempo gratuito de propaganda e outros
benefícios. Sete elegeram deputados mesmo sem atingi-la (Avante, PSC, Patriota,
Solidariedade, PROS, Novo e PTB). Nove não elegeram ninguém (PCB, PCO, PMB,
PRTB, PSTU, UP, Agir, DC e PMN). A depuração é inexorável. Nicolau prevê que,
nas eleições gerais de 2026, haja de seis a dez agrupamentos de partidos.
“Ficará mais inteligível para o eleitor.”
As razões para a consolidação partidária
são conhecidas. Primeira, o fim das coligações nas eleições proporcionais.
Segunda, a cláusula de desempenho, que tem subido a cada eleição desde 2018,
quando foi de 1,5% dos votos válidos (até chegar a 3% em 2030). Por fim,
segundo Nicolau, o financiamento público dos partidos tem favorecido fusões e
dado impulso às federações.
A redução da pulverização partidária é
extremamente benéfica para a democracia brasileira. Com mais partidos, o
governo é levado a fazer negociações espúrias de modo a obter apoio para seus
projetos de partidos sem coerência programática nem ideológica, as legendas de
aluguel. Com menos partidos, o governo tem mais facilidade para negociar. Tudo
se torna mais claro, na medida em que as agremiações aderem a plataformas mais
coerentes ideologicamente. Diminui, portanto, o espaço para a contaminação das
negociações políticas entre Executivo e Legislativo.
O fisiologismo e o clientelismo são pragas
difíceis de extirpar da política, mas ficarão mais expostos à vigilância da
opinião pública se houver menos legendas. O direito de reunião e de constituir
partidos deve obviamente ser garantido. Mas o bom funcionamento do Congresso e
das demais casas legislativas exige das legendas um mínimo de
representatividade. É um conceito simples e racional que tem dado certo nas
democracias representativas mais fortes do mundo. Aos poucos, o Brasil chega
lá.
VLT de Cuiabá é exemplo de tudo o que dá
errado em obras no Brasil
O Globo
Após consumir R$ 1 bilhão em meio a
denúncias de corrupção, projeto foi extinto faltando 25% para conclusão
Em 2012, o governo de Mato Grosso começou a
construir uma moderna linha de Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), uma espécie de
bonde, na Região Metropolitana de Cuiabá. Orçada em R$ 1,4 bilhão, a obra era
parte do pacote para a Copa de 2014. Mais de dez anos depois, outras duas Copas
começaram e acabaram, 2014 é apenas uma lembrança incômoda para o torcedor
brasileiro, os trilhos por onde passariam os vagões estão sendo substituídos
por pistas, e o VLT se transformou de uma hora para outra num sistema que será
operado por ônibus. Mais de R$ 1 bilhão foi gasto, e nada ficou pronto até
hoje.
O histórico da obra do VLT Cuiabá-Várzea
Grande é um triste exemplo dos descaminhos do dinheiro dos contribuintes,
duplamente punidos. Primeiro, ao ser obrigados a pagar por uma obra eivada de
irregularidades. Segundo, ao ser privados de um transporte moderno num setor em
que o país apresenta carências crônicas. Quando o projeto foi lançado, na
gestão do governador Silval Barbosa (MDB), a expectativa era que os trens
transportassem 160 mil passageiros por dia numa linha de 22 quilômetros e 33
estações.
Num roteiro desastroso, misturam-se
incompetência, megalomania, longas batalhas jurídicas e muita roubalheira. Em
2017, uma operação da Polícia Federal com o sugestivo nome de Descarrilho
apontou na obra e na compra de equipamentos indícios de fraudes em licitação,
corrupção ativa e passiva, associação criminosa, peculato e lavagem de
dinheiro. Segundo a PF, as empreiteiras pagaram R$ 18 milhões em propina ao
governo. Estima-se um sobrepreço de R$ 120 milhões só na compra dos trens. O
próprio Barbosa admitiu o esquema de corrupção. As obras foram paralisadas em
dezembro de 2014 com 75% dos serviços executados.
Em 2020, o governador Mauro Mendes (União
Brasil) decidiu trocar trens por ônibus. O governo alegou que concluir o VLT
custaria mais que o dobro. Os trilhos trazidos da Polônia começaram a ser
arrancados por retroescavadeiras. Não se sabe o que será feito dos 260 vagões
já comprados na Espanha. O novo projeto foi orçado em R$ 468 milhões, com
conclusão prevista para 2025. Nesse valor não estão computados os ônibus
elétricos, estimados em R$ 200 milhões.
Por mais que a implantação do VLT de Mato
Grosso tenha sido um erro de avaliação, é preciso considerar que já foi gasto
mais de R$ 1 bilhão. Se houve roubalheira, que se punam os culpados e se peça
ressarcimento. Não tem cabimento mudar um projeto quando faltam 25% para sua
conclusão.
Do início ao fim, a história do VLT Cuiabá-Várzea Grande mostra tudo o que dá errado com as obras de infra-estrutura no Brasil: planejamento malfeito, contratos superfaturados, promiscuidade entre fornecedores e Estado, corrupção e dinheiro jogado fora em troca de nada para a população. Nas sábias palavras do economista Mário Henrique Simonsen, teria saído mais barato e melhor para todos pagar apenas as propinas.
Teto rebocado
Folha de S. Paulo
Qualquer que seja a regra fiscal, é
inescapável limitar o crescimento de gastos
O ministro Fernando Haddad, da Fazenda,
cumpriu o prometido ao entregar com
antecedência ao Palácio do Planalto sua proposta de regra orçamentária para
conter a escalada da dívida pública —pelo que foi estabelecido durante a
transição de governo, o prazo para apresentação do projeto ao Congresso
Nacional vai até agosto.
O texto de Haddad ainda não veio a público,
mas já suscita especulações diversas nos bastidores brasilienses e nas mesas de
operação dos mercados financeiros. Trata-se, afinal, da primeira indicação
fundamental dos rumos econômicos a serem seguidos por Luiz Inácio Lula da Silva
(PT).
O pouco que se sabe de mais concreto acerca
da proposta é a avaliação da Fazenda de que com ela será possível eliminar o
déficit das contas do Tesouro Nacional, excluindo gastos com juros, no próximo
ano.
Se tal cálculo foi feito com parâmetros
realistas, a regra implica um ajuste ambicioso.
Para uma ideia da tarefa, o Orçamento deste
2023 prevê um rombo na casa de R$ 230 bilhões, que a equipe de Haddad tenta
reduzir pela metade com medidas temporárias e de eficácia incerta. Zerar essa
conta só é possível com uma contenção clara de despesas —a menos que se espere
algum salto pouco provável da arrecadação.
Foi o bastante para que setores do PT e do
governo fizessem saber de suas preocupações a respeito da proposta, das
ideológicas às mais pragmáticas. Entre estas, como noticiou a Folha, Lula, que se
manteve em silêncio sobre o assunto, poderia ser acusado de um estelionato
eleitoral.
Em meio a tantas declarações anônimas e motivações
difusas, pode-se ter a certeza de que uma regra fiscal crível e eficiente
—conforme a expectativa criada— será bombardeada por petistas e associados
defensores do aumento contínuo do gasto do Estado.
Como também é evidente, Lula começa a pagar
o preço de sua ambiguidade quanto à agenda econômica desde a campanha. As
promessas e bravatas fáceis dos palanques agora dão lugar a compromissos de
governo que têm consequências para todo o país.
A menos que se aposte em teses milagreiras
já fartamente desmentidas pela realidade, é preciso conter a dívida pública
para que os juros baixem e o país possa crescer. No contexto brasileiro, não se
vê caminho mais óbvio do que fazer com que as despesas do governo cresçam menos
que as receitas.
Em português mais claro, há que impor algum
limite, um teto, para os gastos, embora a palavra tenha sido demonizada em
discursos para militantes. A regra pode ser mais ou menos flexível, gradual e
palatável, mas Lula colocará seu governo e o país em risco se imaginar que pode
prescindir de credibilidade na política econômica.
Horrores da guerra
Folha de S. Paulo
Mesmo de escassa concretude, mandado contra
Putin tem valor simbólico importante
Na sexta-feira (17), o Tribunal Penal
Internacional emitiu
mandado de prisão contra o presidente da Rússia, Vladimir Putin,
sob acusação de crimes de guerra durante o conflito na Ucrânia —no caso, a
deportação ilegal de crianças de territórios ocupados.
Deve-se lembrar que a Rússia, a Ucrânia, os
Estados Unidos e a China, entre outros países, não ratificaram o Estatuto de
Roma, tratado que fundamenta a decisão da Corte em Haia, responsável por punir
indivíduos por crimes internacionais, como os de guerra, contra a humanidade e
genocídios.
Não é a primeira vez que o tribunal emite
ordem de prisão contra um chefe de Estado. Omar al-Bashir, do Sudão, Muamar
Kadafi, da Líbia, e Laurent Gbagbo, da Costa do Marfim, já foram alvos de mandados
em outras ocasiões.
O caráter primordialmente simbólico da
decisão, dada a dificuldade de sua execução, não deveria ofuscar a gravidade
das acusações, se comprovadas.
No final de fevereiro, Moscou anunciou com
pompa a transferência
de crianças ucranianas à Rússia para serem adotadas. Pelos objetivos
da propaganda oficial de Putin, o projeto de reassentamento à força projetaria
o país como salvador de crianças órfãs.
Já de acordo com relatos de crianças e pais
ao jornal americano The New York Times, forças pró-Rússia interceptaram menores
em busca de abrigo e, em alguns casos, segundo Kiev, após prisão ou morte dos
pais. Não se sabem com certeza os próximos passos da investigação em curso.
A transferência forçada de civis por parte
da nação ocupante para seu território é um crime de guerra em potencial, de
acordo com o tratado de Roma. No caso de crianças, a medida poderia em tese até
configurar genocídio —o que não foi a qualificação da corte em Haia.
Existe óbvia dificuldade em caracterizar
esse tipo de crime, seja em razão da nebulosa intencionalidade de dizimar um
grupo étnico, seja devido ao compartilhamento de história e cultura entre os
dois países beligerantes.
A decisão contra Putin, embora de escassa concretude agora, é no mínimo um registro para a história, numa guerra ainda sem fim à vista. Mesmo com as limitações de cortes internacionais, é necessário que se apurem atrocidades que nem mesmo em um conflito armado são permitidas.
Regulação das redes não é bala de prata
O Estado de S. Paulo.
Uma nova lei não resolverá todos os
problemas. A rigidez pode gerar distorções.
Há crescente consenso da necessidade de
regulação das redes sociais. O atual regime jurídico tem dado margem a muitos abusos,
como se o mundo digital fosse território sem lei. Sob pretexto de liberdade de
expressão, verifica-se intensa difusão de ameaças, ataques e notícias
mentirosas, que tensionam o tecido social, distorcem o debate público e colocam
em risco as instituições democráticas. Nesse cenário, o Judiciário tem sido
instado a atuar e, apesar de indispensável para a defesa das liberdades e do
Estado Democrático de Direito, sua atuação acaba por gerar novas distorções e
tensões. É urgente prover um novo marco legal para as redes sociais.
No entanto, por mais evidente que seja a
necessidade de regulação do setor, é preciso advertir que o desenho desse novo
marco legal exige especial cuidado, começando por calibrar, de maneira
realista, as expectativas em relação a seus efeitos. Os desafios sociais e
políticos decorrentes das redes sociais não serão resolvidos simplesmente com
uma nova lei, por mais perfeita que ela possa ser.
Por exemplo, os atos do 8 de Janeiro
explicitaram e confirmaram uma vez mais o perigo que as redes sociais trazem
para a democracia. Muitos dos crimes ali praticados foram incentivados,
anunciados e organizados nas plataformas digitais. A ideia, bastante difundida,
de que essas empresas seriam totalmente irresponsáveis pelo conteúdo publicado
em seus canais permitiu a ocorrência dos crimes. Além disso, as empresas operam
com algoritmos que ampliam a exposição de mensagens que geram engajamento,
favorecendo a difusão de conteúdos radicais e extremistas. Na prática, as redes
sociais não só foram indiferentes, como também ajudaram a construir o ambiente
de desinformação e de ameaça ao regime democrático.
Ao mesmo tempo, seria ingenuidade achar que
uma adequada regulação das redes sociais resolva – ou deva resolver – todos os
problemas sociais e políticos envolvidos no 8 de Janeiro. Não é só uma questão
de expectativa irreal, o que depois vai gerar frustração. O problema é mais
grave. Essa expectativa desequilibrada modifica a própria ideia do que deve ser
uma adequada regulação das redes sociais.
Há quem proponha, por exemplo, que empresas
como Google ou Facebook recebam o mesmo tratamento jurídico que as companhias
de comunicação, que têm uma responsabilidade muito mais acentuada sobre o
conteúdo publicado. A proposta, que talvez possa entusiasmar muita gente –
seria um modo imediato de acabar com a circulação irresponsável de conteúdo
criminoso –, ignora, no entanto, o fenômeno específico das redes sociais,
inviabilizando seu funcionamento. Seja para qual setor for, uma adequada
regulação jurídica tem como condição indispensável o conhecimento do seu modus
operandi. A lei não pode ignorar a realidade.
Relacionada com a primeira proposta, outra
ideia, que vez por outra se ventila, consiste em conceder às plataformas
digitais poder irrestrito para retirada de conteúdo, sem necessidade de decisão
judicial. Diz-se que essa autorização proveria a tão sonhada agilidade na
contenção de conteúdos criminosos. O mecanismo acarreta, no entanto, problemas
sérios em relação à liberdade de expressão, com riscos de abusos e distorções
ainda maiores no debate público.
Há de se conceder razão, portanto, ao
presidente da Câmara, Arthur Lira, quando defendeu a necessidade de “encontrar
o caminho do meio para legislar sobre e julgar questões envolvendo liberdade de
expressão, redes e democracia”. No dia 13 de março, em evento sobre o tema,
Lira reconheceu que se trata de “equilíbrio delicado”, que “envolve valores
inestimáveis para a vida pública brasileira”. E advertiu: “Esse equilíbrio não
é uma utopia, mas uma necessidade”.
Com suas duas Casas, o Legislativo existe
precisamente para esses casos: quando, diante de muitos interesses e
perspectivas possíveis, o País precisa de um marco jurídico equilibrado, que
expresse os vários anseios da população, respeite a Constituição e defenda a
democracia. Não se espera menos do Congresso.
O alto custo dos transtornos mentais
O Estado de S. Paulo.
Doenças mentais reduzem a produtividade e
causam prejuízos bilionários. Cabe a governos e empresas enfrentar o problema,
começando pela luta contra o preconceito
Transtornos mentais não são fonte apenas de
enorme sofrimento individual: em suas mais variadas formas, afetam diretamente
a economia do País. Um estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas
Gerais (Fiemg) estimou os impactos econômicos e sociais das doenças mentais.
Entre eles, uma redução equivalente a 4,7% no Produto Interno Bruto (PIB), com
perdas bilionárias no faturamento das empresas e na arrecadação de impostos,
além da redução de R$ 165 bilhões ao ano na renda das famílias. Os prejuízos
atingem também a geração de empregos, com 801 mil vagas que deixam de ser
criadas anualmente. Números impressionantes que falam alto sobre a necessidade
de que governos e o mundo corporativo deem mais atenção ao tema.
O estudo da Fiemg analisou dados e
projeções ligados à produtividade dos trabalhadores. Um deles dá conta de que
pessoas acometidas de transtornos mentais perdem, em média, 51 dias de vida
saudável por ano. Isso se reflete na diminuição da capacidade produtiva. Há
problemas de todo tipo: desde o absenteísmo, medido em número de dias sem
atividade profissional, até aposentadorias precoces e mortes prematuras,
incluindo suicídios. A soma de tudo o que deixa de ser produzido, claro,
resulta em prejuízos vultosos − um ciclo vicioso que joga para baixo a
atividade econômica.
Infelizmente, não faltam obstáculos para o
enfrentamento das doenças mentais e de suas consequências. Um deles é o estigma
que cerca o assunto, ainda mais em ambientes profissionais. Vale notar que foi
só na pandemia de covid-19, após o período mais agudo de isolamento social, que
muitas empresas acordaram para o problema – como se distúrbios que afetam a
saúde mental não demandassem a mesma atenção que outras doenças. Felizmente,
esse erro começa a ser reparado.
A lista de transtornos mentais é longa, mas
ansiedade e depressão respondem por mais da metade dos casos no País. Segundo
estimativa da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do IBGE, citada no estudo, 10,2%
da população brasileira acima de 18 anos sofria de depressão em 2019. Esse
porcentual corresponde a um universo de 16,3 milhões de pessoas, sinal evidente
de que o assunto não pode ser ignorado nas empresas nem nos órgãos públicos.
Isso vale também para escolas, universidades e, por óbvio, o Sistema Único de Saúde
(SUS), que precisa ser fortalecido na sua capacidade de tratar e prevenir
distúrbios.
O estudo da Fiemg cita estimativa da
entidade independente britânica Royal Society for Public Health (Sociedade Real
para Saúde Pública) de que 20% da população ocupada − 1 em cada 5 pessoas no
mercado de trabalho − sofre de algum tipo de transtorno mental. Trata-se de um
problema global: a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que quase 1
bilhão de pessoas no mundo viviam com transtornos mentais em 2019, antes ainda
da pandemia.
O psicólogo e terapeuta Alexandre Coimbra
Cabral falou recentemente ao Valor sobre a barreira do preconceito, destacando
que há subnotificação de casos de doença mental no País. Ele mencionou também o
perigoso hábito da automedicação, afirmando que teria havido aumento no consumo
de remédios para dormir durante a pandemia. “As empresas estão percebendo que a
saúde mental não é problema específico de um grupo de pessoas. A ansiedade e a
depressão atingem desde o chão de fábrica até o CEO”, disse Cabral.
De fato, ninguém escolhe ficar doente e
isso vale obviamente para transtornos mentais. A luta contra o estigma só tem a
ganhar à medida que mais pessoas, especialmente quem ocupa cargos de liderança,
falarem abertamente sobre o assunto. Foi o que fez recentemente nos Estados
Unidos o senador democrata John Fetterman ao se internar num hospital para
tratar de depressão. Que sua atitude seja inspiradora. Doenças mentais causam
prejuízos bilionários, e fingir que não existem − ou que são problema só dos
outros − está longe de ser a solução.
Disparidades no ensino integral
O Estado de S. Paulo.
Estados que priorizaram a ampliação da
jornada escolar são bons exemplos para o País
A educação tem o desafio de garantir
igualdade de oportunidades para todos os estudantes. Mas a chance de um aluno
da rede pública frequentar uma escola em tempo integral varia enormemente no
País, a depender do Estado onde esteja matriculado. Tamanha disparidade ficou
evidente nos resultados do Censo Escolar 2022: no ensino médio, por exemplo,
62,5% dos alunos da rede pública em Pernambuco estudavam em tempo integral no
ano passado, ante apenas 4,4% no Paraná. No ensino fundamental, o índice no
Ceará era de 41%, enquanto o Amapá registrava meros 2,1%. Não é preciso ser
especialista para perceber que há algo estranho. Afinal, por que alguns Estados
conseguem desempenho tão melhor do que outros na hora de ampliar a jornada
escolar?
Bem, a despeito da distância que separa os
Estados brasileiros em termos de arrecadação e pujança econômica, todos
enfrentam restrições fiscais. Além disso, as unidades da Federação que mais se
destacam na oferta de educação em tempo integral estão longe de ser as
principais potências econômicas do País. Ao contrário, os dados do Censo
Escolar divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (Inep) revelam uma prevalência de Estados do Nordeste e do
Norte nas primeiras posições. Motivo a mais para que se preste atenção às taxas
de matrícula em tempo integral em cada unidade da Federação.
No ensino fundamental, Ceará, Piauí e
Maranhão apresentavam os maiores índices. São Paulo, o Estado mais rico do
País, aparecia em quinto lugar, com 19,1% de cobertura, atrás do Tocantins. No
ensino médio, por sua vez, a proporção de estudantes em escolas de tempo
integral era maior em Pernambuco, Paraíba,
Ceará, Sergipe e Amapá − com São Paulo na
sexta posição (24,9%), empatado com Minas Gerais. Vale notar que a média
nacional ficou em 14,4%, no ensino fundamental, e em 20,4%, no ensino médio. Ou
seja, frequentar escolas públicas de tempo integral, exceto em um ou outro
Estado, continua um direito restrito a pequena parcela da população.
Os benefícios educacionais da ampliação da
jornada escolar são indiscutíveis para a melhoria da aprendizagem, com reflexos
positivos até mesmo na segurança pública. Sim, há evidências de que investir no
ensino em tempo integral é uma iniciativa transformadora, algo que diversos
governantes já perceberam − e a forma como priorizaram essa política
educacional deveria servir de exemplo para o resto do País. A propósito, é isso
que governos de países desenvolvidos já fazem há mais tempo.
O Brasil demorou a acordar para a urgência da oferta de ensino em tempo integral. O atual Plano Nacional de Educação (PNE) estabeleceu a meta de que pelo menos 25% dos alunos da educação básica sejam contemplados até 2024. Ora, é preciso esforço não só para atingir, mas para ir além dessa meta. Em janeiro, o ministro da Educação, Camilo Santana, prometeu priorizar o tema. Fará bem o governo federal se, em colaboração com os governos estaduais e municipais, acelerar o ritmo. A experiência de alguns Estados, inclusive a do Ceará, que Camilo Santana governou, é uma boa referência.
Governo faz muitas concessões, mas os
resultados são incertos
Valor Econômico
Nas negociações, o que mais apareceu até
agora foi toma lá, sem dá cá. Não é bom augúrio
O ano legislativo mal andou até agora e
mesmo assim o governo tem feito concessões demais à espera de uma reciprocidade
política que pode não vir. O apoio ao presidente da Câmara, Arthur Lira
(PP-AL), para aprovar a PEC da Transição cobra previamente um alto custo, em
cargos e verbas no Executivo e posições de relevo no Legislativo - sem que o
resultado das concessões tenha sido testado em apoio a projetos do Planalto.
Lira deseja manter o poder que teve com o
governo Bolsonaro, dobrando desejos de um presidente que é o antípoda do que
veio antes. Tem cartas na manga. A equipe política de Lula, após o Supremo
Tribunal Federal derrubar a excrescência do orçamento secreto, aceitou, em
troca da PEC da Transição, remanejar metade das verbas de relator (R$ 19
bilhões), para os deputados e a outra metade para projetos dos legisladores que
se encaixassem de comum acordo nas prioridades orçamentárias.
O interesse de Lira na PEC da Transição
envolvia estritamente esses recursos, com os quais mantém uma clientela
assegurada entre as legendas, e sua aceitação pelo novo governo antes da posse
trazia, embutido, outro entendimento que o favorecia: um segundo mandato no
comando da Câmara. Com isso, Lula reconhecia sua posição minoritária no
Congresso e dava quase um cheque em branco ao presidente da Câmara. O que
parecia uma proeza, a obtenção de R$ 180 bilhões extras para gastos, antes
mesmo da posse, pode ter como efeito um espaço muito menor para Lula governar.
Lira, ao reunir direita, esquerda e centro
em apoio a sua reeleição, e, depois, ao mais que dobrar as comissões da Câmara,
ganhou o poder de determinar a distribuição política dos cargos. O PT ficou com
o comando da de Constituição e Justiça (CCJ), uma das mais importantes, mas
ficou em minoria nela. O PL, que abriga a tropa bolsonarista, ficará com a de
Fiscalização sob o comando de Bia Kicis - um pesadelo para o Planalto. E, para
criar ainda mais dificuldades, e vender facilidades, Lira quer que seu partido,
o PP, relate o projeto de lei complementar que instituirá o novo regime fiscal,
peça central para o futuro de Lula.
Sob pressão, o governo não consegue mais
represar cargos no segundo escalão que são cobiçados pelo Centrão, depois que
nem mesmo os partidos agraciados com ministros se reconhecem como aliados da
base governista. Os que pertencem à União Brasil - Juscelino Oliveira, Daniela
do Waguinho e Waldez Góes -, além de não serem tidos pela legenda como
indicações suas, trazem constrangimentos vários para o governo.
Em reunião com Lira, Lula prometeu
normalizar as nomeações, o que, por um lado, pode facilitar as relações com o
Centrão, por outro pode trazer mais dores de cabeça ao governo. O Planalto está
cedendo ao loteamento da Codevasf, um feudo de Elmar Nascimento, líder do União
Brasil na Câmara, que indicou o presidente da estatal, Marcelo Moreira. Manteve
a influência de Lira ao dar a um indicado seu a diretoria que gere os empreendimentos
de irrigação.
As licitações da Codevasf são um alvo óbvio
de qualquer investigação séria, por indício de roubalheiras abastecidas com os
recursos do orçamento secreto. A conta já recai sobre o governo Lula, que
assinou liberação de R$ 650 milhões para a continuidade de obras coalhadas de
suspeitas de favorecimento, leilões viciados, empresas laranjas etc.
Em seus dois mandatos, o presidente Lula se
aliou ao Centrão, como os governos antes dele, e se viu em maus lençóis: a
proximidade das más práticas políticas dos aliados contaminou o partido e então
vieram primeiro o mensalão, depois o petrolão, que arrasaram ética e
eleitoralmente a legenda por algum tempo. Como era alta a popularidade do
presidente e dele as iniciativas no Legislativo, houve bom grau de aprovação
das matérias. O jogo de forças político mudou muito, e a vitória por pequena
margem diminuiu seu cacife político.
Lula cercou-se de políticos experientes, os
ex-governadores como Camilo Santana (Educação), Flavio Dino (Justiça) e Rui
Costa (Casa Civil), mas isso não parece tê-lo ajudado muito até agora a furar o
bloqueio da maioria conservadora e fisiológica no Congresso. Pior, Lula parece
ter deixado a equipe econômica ao relento, sob fogo cruzado, amigo e inimigo,
na questão vital do regime fiscal. O presidente parece ver o ajuste fiscal com
muita desconfiança e seu núcleo político, e do PT, com marcada ojeriza. Não
param de sair “genialidades” irreais de seus ministros, o que desgasta o
governo. E, nas negociações, o que mais apareceu até agora foi toma lá, sem dá
cá. Não é bom augúrio.
É como se houvesse 18 legendas, mas o Quadrilhão bolsonarista está infiltrado em várias e é formado por centenas de cúmplices eleitos do miliciano das motociatas, também conhecido como GENOCIDA.
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