O Globo
Democracias precisam entregar serviços
públicos de qualidade, economias sustentáveis e condições para mobilidade
social
“Investimento
social não pode ser considerado gasto”. Essa têm sido uma afirmação frequente
do presidente Lula, quando confrontado com o discurso de que determinada
política fundamental para o bem-estar da população poderia gerar descontrole
nas contas públicas.
De fato, o investimento em áreas como saúde, educação e combate à pobreza precisa ser considerado prioritário, tanto pelo retorno de longo prazo quanto pela garantia imediata de direitos básicos, especialmente dos mais vulneráveis.
Por vezes esta fala é interpretada como defesa de uma irresponsabilidade fiscal, mas os sinais dados pelos ministérios das áreas econômica e de planejamento mostram que há um compromisso do governo federal em preservar a saúde financeira, mantendo espaço para os investimentos tão necessários na área social.
A busca por esse equilíbrio não é simples,
e é necessário colocar nessa equação também outra dimensão: a qualidade do
investimento.
Resultados sociais não serão realizados por
geração espontânea, senão por uma cadeia de resultados referenciada pelo bom
uso dos recursos públicos, com frequente monitoramento e avaliação, e pela
execução de processos adequados de forma consistente.
Quando o gasto é orientado pela eficiência,
eficácia e efetividade, ele se traduzirá em melhoria nas condições de vida da
população, objetivo principal de qualquer política pública social.
A agenda de defesa da responsabilidade
fiscal não é monopólio de uma única corrente de pensamento, e não deve ser
entendida como a negação da responsabilidade social.
Um governo responsável e comprometido com a
garantia de direitos deve reconhecer que o necessário investimento público não
pode ser financiado pelo aumento descontrolado da inflação ou da dívida
pública, mantendo compatibilidade com o nível de arrecadação. Afinal, uma boa
política fiscal tem por finalidade distribuir renda e prover bens públicos,
podendo fortalecer a agenda de justiça social.
Para tanto, quando qualificado, o gasto
social tem muito a contribuir, sendo capaz de promover o crescimento econômico
e desenvolvimento humano ao mesmo tempo.
Segundo relatório publicado pelo Ipea, em
2011, para cada 1% a mais investido em educação e saúde, há um efeito
multiplicador que aumenta em 1,78% o PIB e em 1,56% a renda das famílias. Seu
efeito supera os retornos de investimento na construção civil, na exportação de
commodities agrícolas e no pagamento de juros.
Isso é explicado, em parte, pelo gasto
social beneficiar principalmente os estratos mais pobres e a classe média da
população brasileira. Assim, o gasto social mostra-se profícua estratégia para
fortalecer economicamente o país, garantindo um arranjo social equilibrado.
Por outro lado, a redução abrupta no
investimento social pode contribuir para o enfraquecimento das democracias e
para a ascendência de movimentos autoritários, conforme vimos nos últimos anos
no mundo e no Brasil, em particular.
Uma das implicações de fragilizar o pacto
social, segundo Daron Acemoglu e coautores, em artigo de 2019, é dirimir o desempenho econômico no
longo prazo. Os autores argumentam que isso ocorre porque, em geral, as
democracias tendem a aumentar investimentos, incentivar reformas econômicas e,
sobretudo, qualificar a educação e a saúde.
Com efeito, reduzir gastos sociais pode ser
altamente custoso para governos não efetivos na garantia dos direitos às
populações. Democracias precisam entregar serviços públicos de qualidade,
economias sustentáveis e condições reais para mobilidade social ascendente.
Em vários lugares do globo, infelizmente,
elas têm falhado nessa missão, frustrando expectativas de grande parte da
população e colocando em risco sua estabilidade.
O debate sobre o investimento e a qualidade
do gasto social é de grande relevância para o Brasil, pois as políticas sociais
formam um complexo sistema que materializa esforços históricos para a garantia
de direitos da população brasileira. Também não resta dúvida de que a
estabilidade fiscal é uma condição fundamental para o crescimento econômico sustentável.
No entanto, quando isso acontece em
detrimento do Estado garantir tais direitos, os pactos sociais que sustentam as
democracias contemporâneas ficam ameaçados, abrindo espaço para movimentos
extremistas mundo afora. É neste contexto, com intencionalidade, que o
investimento social com qualidade é dimensão-chave para o dinamismo econômico e
para democracia.
Gasto Social é um gasto como qualquer outro; se houver qualidade na decisão desse gasto, ele pode, no futuro, ter características de investimento.
ResponderExcluirMas sempre será um gasto e, tendo ou não tendo qualidade, terá as mesmas consequências sobre as Contas Púicas e o Orçamento.
Gasto social, se bem feito, gera mais riqueza do que outros gastos, diz o Autor. Esta seria a diferença ...
ResponderExcluirMas no meu comentário não considerem nenhum reparo ao conteúdo deste artigo. Em um Orçamento de escassez, eu concordo que o arbitramento precisa priorizar totalmente os gastos que atendem aos que mais precisam do Estado por serem socialmente mais frágeis.
ResponderExcluirEssa priorização dos mais frágeis não é o que vejo Lula praticar de forma saudável, mas por puro populismo, e consequentemente, sem a devida consideração por critérios técnicos de qualidade.