terça-feira, 18 de abril de 2023

Andrea Jubé - Decisão de Lula para STF será “top down”

Valor Econômico

Lula e Lewandowski devem encerrar impasse sobre STF

Um afiado observador do mundo político explica que as grandes decisões são coletivas, ou vêm de cima para baixo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é reconhecido pelo estilo de “assembleia” por causa do hábito de ouvir vários atores de diferentes segmentos até formar sua convicção a respeito de um tema.

No caso concreto da indicação do próximo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que assumirá a vaga do agora aposentado Ricardo Lewandowski, existe a percepção de que o mandatário optará desta vez pelo estilo “top down”, ou em bom português, a caneta é minha, quem manda sou eu.

Sobre esta opção, Lula foi transparente como água nesta declaração: “É um problema meu”, justificou sobre a indicação ao STF, em entrevista ao portal Brasil247 no dia 21 de março. Em seguida, ele reforçou que será uma escolha solitária: “no que eu tiver que tomar a decisão, eu vou sentar sozinho e tomar a minha decisão, e vou mandar o nome para o Senado”.

O capítulo final desta jornada está previsto para esta semana. Fontes que acompanham de perto o assunto afirmam que Lula quer viajar para Portugal, nesta quinta-feira (20), com o impasse liquidado.

Para isso, falta uma conversa decisiva com o ex-ministro Ricardo Lewandowski, a quem o presidente tem em conta como um dos quadros mais sérios e leais que já cruzaram a sua trajetória política, marcada por traições.

Lewandowski indicou para sua vaga o advogado e professor da Universidade de São Paulo (USP) Manoel Carlos de Almeida Neto, que foi um de seus principais assessores na Corte. Ele foi secretário-geral do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas gestões de Lewandowski como presidente de ambos os tribunais.

Em 2016, deixou o cargo para se tornar diretor jurídico da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Há algumas semanas, Manoel Carlos abriu sua casa para receber Lula e Lewandowski em um jantar, a fim de que o presidente o conhecesse de perto.

Pessoas próximas do ex-ministro afiançam que sua elegância e discrição o impedem de pleitear expressamente a Lula a nomeação de seu apadrinhado. Ao fim, entretanto, a indicação de Manoel Carlos se impôs como a única opção com alguma chance razoável para que o nome do advogado Cristiano Zanin, defensor de Lula na Operação Lava-Jato, não vingasse por WO.

No entorno de Lula, afirma-se que o presidente teve seus momentos de dúvida sobre indicar Zanin imediatamente para esta vaga ao STF. Em um jantar reservado em São Paulo, próximo ao feriado da Semana Santa, Lula admitiu a poucos interlocutores que não tinha batido o martelo sobre a escolha.

Na conversa com Lewandowski, Lula deverá agradecer o jurista pelos anos de lealdade em que atuou na Suprema Corte e elogiar a indicação de Manoel Carlos para a sua vaga. O mais provável, entretanto, é que o mandatário justifique, com delicadeza, por que indicará Zanin para suceder ao ex-ministro no tribunal.

(Abra-se um parênteses: menos improvável, mas não impossível, Lula comunicará Lewandowski que nomeará Manoel Carlos para substitui-lo na Corte. Esta ressalva é necessária porque nada é certo na política, enquanto o fato político não se consumar).

É fato que Lula está ouvindo (poucos) conselheiros sobre a sucessão de Lewandowski, mas ainda assim, esta será uma escolha de caráter pessoal.

Embora a “assembleia” sobre o tema tenha sido instaurada, a sutil diferença é que a convicção de Lula pelo nome de Zanin já estava formada desde quando venceu Jair Bolsonaro no dia 30 de outubro.

O seleto círculo de conselheiros tenta persuadir o petista não a afastar o nome de Zanin, mas, sim, a adiar sua indicação para outubro, quando abrirá a vaga da presidente do STF, Rosa Weber.

Estratégia semelhante foi a de Bolsonaro, após se comprometer em indicar um jurista “terrivelmente evangélico” para a Corte. Ele se referia ao então ministro da Advocacia-Geral da União, André Mendonça, pastor da Igreja Presbiteriana.

Contudo, em meio à sucessão de crises no governo, Bolsonaro requisitou Mendonça para substituir Sergio Moro no Ministério da Justiça. Dessa forma, optou por contemplar o Centrão com a primeira indicação ao STF, que coube ao desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), Kassio Nunes Marques.

O argumento de quem pede a Lula para indicar Zanin para a vaga de Rosa Weber no STF é de que, com esse gesto, poderia equilibrar o seu legítimo direito de escolha com a responsabilidade de preservar o legado da Lava-Jato.

Isso porque ao assumir a vaga de Lewandowski, Zanin herdará todos os processos do ministro, muitos deles relacionados à operação que levou Lula à prisão. Fatalmente, ele teria que se declarar impedido ou suspeito na maior parte das ações, com o risco de que os processos sejam redirecionados para ministros de perfil mais favorável à Lava-Jato.

Por exemplo, a ação relativa às acusações do advogado Rodrigo Tacla Duran contra o senador Sergio Moro (União-PR) seria redistribuída. Outro exemplo é o processo relativo à “Vaza-Jato”, em que Zanin reivindicou o acesso aos diálogos da Operação Spoofing em 2020.

O fato é que Lula nunca escondeu o fator emoção ao se referir ao seu defensor. “O Zanin foi a grande revelação jurídica nesses últimos anos”, disse na mesma entrevista ao Brasil247. Lembrou que Zanin o defendeu quando muitos achavam que ele já era caso perdido e estava excluído da vida política: “fez muito que outros advogados não fariam porque não acreditavam naquilo”, enfatizou o presidente.

Lula é transparente em suas declarações e já deixou claro, ao menos nas entrelinhas, o favoritismo de Cristiano Zanin. Senão porque atribui a ele sua absolvição e sua liberdade, ao menos porque não haveria maior contraponto ao algoz Sergio Moro do que nomear seu defensor para o STF. Um prêmio que Bolsonaro ofereceu ao ex-juiz nos bastidores do poder, mas jamais entregou.

 

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